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sexta-feira, 10 de março de 2017

Nazismo de esquerda? (Ian Kershaw) O que os Historiadores nos dizem sobre o Nazismo SER de (extrema) Direita - Parte 03

Destaque inicial da edição espanhola do livro (Título em castelhano: "Descenso a los infiernos. Europa 1914-1949"), sobre Kershaw (tradução minha): "Ian Kershaw, um dos mais prestigiosos historiadores europeus de nosso tempo, autor de uma monumental biografia de Hitler, oferece-nos agora sua obra mais ambiciosa: uma história da Europa desde a primeira guerra mundial até nossos dias, que arranca com esse relato das terríveis décadas que vieram a se acumular no continente os efeitos de duas guerras mundiais, da crise econômica dos anos trinta e das comoções sociais que conduziram, por um lado, à revolução bolchevique e, por outro, a ascensão do fascismo e do nazismo. Kershaw não se limita ao relato dos sucessos políticos e militares, senão que procura registrar a sociedade que os protagonizou, aprofundando-se nas condições de vida dos europeus ou explorando sua cultura, para saber como viam e interpretavam os acontecimentos de seu tempo. Seu propósito, relata-nos, foi o de explorar no passado as forças que determinaram a configuração do presente em que vivemos."

Ainda sobre Ian Kershaw: "Sir Ian Kershaw é um historiador e professor britânico. É professor de História Moderna na Universidade de Sheffield, e uma das principais autoridades académicas sobre Adolf Hitler."

A quem não pegou a série desde o começo: Parte 1, Parte 2

Abaixo seguem trechos sobre a extrema-direita europeia (fascismo e nazismo) contidos no livro. Da série "Nazismo de esquerda? O que os Historiadores nos dizem sobre o Nazismo SER de (extrema) Direita", que mostra o quanto são ridículos e desonestos (além da falta de fontes sérias, e muitas vezes bastante ignorância e um pedantismo fora do comum) os grupos (em geral grupos neoliberais radicais) que panfletam este mantra panfletário no Brasil. O mais engraçado foi ter sido rotulado de "doutrinado" quando os textos publicados foram tirados de livros de dois historiadores britânicos (pelo visto esta direita que se contorce com os textos mal lê os posts direito), que reforçam como a discussão política no Brasil se empobreceu com essa cretinice generalizada impulsionada em grande parte pela mídia corporativa brasileira.

E um aviso ao pessoal mal educado que vem com esses sopros de "autoridade" (autoritarismo) descendo a lenha nos comentários: sugiro moderarem o tom. Discordar é bom e saudável, "fazer pregação" não. Em vez de se alterarem com apelos de "ordem", leiam os livros destacados e tirem suas próprias conclusões, ninguém está impedindo vocês de os lerem, mas ninguém tem obrigação de aturar "afetação" alheia. Evitem também repetir mantras/clichês/baboseiras de lunáticos de internet ou "gurus de seitas virtuais" que se proliferam no país dessa "Nova Direita" ou mesmo de algum "coletivo psolento pós-moderno", melhorem o nível da discussão (e mais honestidade também e menos fanatismo), isso é possível (espero...).

Autor: Ian Kershaw
Livro: De Volta do Inferno: Europa, 1914-1949
Título original: To hell and back (2015)

"Resenhas" do livro (em inglês):
https://www.theguardian.com/books/2015/oct/30/to-hell-and-back-ian-kershaw-review
https://www.nytimes.com/2015/11/29/books/review/ian-kershaws-to-hell-and-back-europe-1914-1949.html?_r=0
http://www.hsozkult.de/review/id/rezbuecher-25264
https://www.ft.com/content/ba50c1ec-7c10-11e5-98fb-5a6d4728f74e

Pág. 16-17

O nacionalismo estrepitoso surgido depois da Primeira Guerra Mundial ganhou ímpeto não com as rivalidades étnicas, mas também devido ao conflito de classes. A percepção de unidade nacional podia ser enormemente intensificada pelo foco em supostos “inimigos” de classe dentro ou fora do Estado-nação. A imensa turbulência econômica que se seguiu à guerra e as medonhas consequências da crise da década de 1930 potencializaram o antagonismo de classes em toda a Europa. O conflito de classes, com frequência violento, já havia pontuado, naturalmente, toda a era industrial. No entanto, com a Revolução Russa e a criação da União Soviética, ele se tornou muito mais forte em comparação com o período anterior à Primeira Guerra Mundial. Tratava-se da proposição de um modelo alternativo de sociedade, que tinha derrubado o capitalismo e criado uma “ditadura do proletariado”. As ideias da eliminação da classe capitalista, a expropriação dos
meios de produção pelo Estado e a redistribuição das terras em grande escala a partir de 1917 atraíram amplas parcelas das massas empobrecidas. Contudo, a existência do comunismo soviético também dividiu a esquerda, debilitando-a de forma fatal, ao mesmo tempo que fortalecia muitíssimo as forças da extrema direita nacionalista. Elementos revitalizados da direita podiam direcionar as energias violentas daqueles que se sentiam ameaçados pelo bolchevismo — de modo geral, as elites proprietárias tradicionais, as classes médias e os camponeses proprietários de terras — para movimentos políticos novos e extremamente agressivos.

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A contrarrevolução, tal como o apelo revolucionário da esquerda, explorava o rancor e as angústias do conflito de classes. Os movimentos contrarrevolucionários ganharam maior popularidade onde foram capazes de combinar o nacionalismo extremado com um antibolchevismo virulento. Também nesse caso, os países da Europa Central e Oriental, onde a ameaça bolchevique era vista como iminente, foram os mais afetados. O maior perigo internacional, porém, ocorreu onde a combinação de nacionalismo extremo e ódio quase paranoico ao bolchevismo estimulou o surgimento de movimentos de massa de direita — que conseguiram ascender ao poder na Itália e, mais tarde, na Alemanha. Nesses casos, quando as energias nacionalistas e antibolchevistas carregadas de ódio que haviam impelido a extrema direita ao poder puderam ser canalizadas para a agressão externa, a paz na Europa se viu gravemente ameaçada.

Pág. 18

Os sonhos da Alemanha de dominar a Europa se extinguiram com sua completa derrota, devastação e divisão em dois Estados. Surgiu na Europa Ocidental uma nova disposição de desarmar o antagonismo nacionalista em favor de cooperação e integração. As fronteiras tornaram-se fixas, devido à presença das novas superpotências. A transição do antigo antibolchevismo, que fortalecera a extrema direita, para uma ideologia de Estado na Europa Ocidental promoveu uma política conservadora estável. E, principalmente, o capitalismo reformado (dessa vez com liderança ativa dos Estados Unidos) gerou uma inacreditável prosperidade na metade ocidental do continente, apoiando com isso a estabilidade política. Essas mudanças fundamentais ocorridas depois de 1945 combinaram-se, todas elas, para remover a matriz de elementos de crise que quase destruíram o continente em duas guerras mundiais.

Pág. 125

A SOBREVIVÊNCIA DA DEMOCRACIA NA ALEMANHA
A Marcha sobre Roma dos fascistas de Mussolini teve efeito imediato sobre a extrema direita radical no cenário político cada vez mais turbulento da Alemanha. Desde 1920, um incendiário nacionalista e racista de notável talento demagógico, Adolf Hitler, chamava a atenção nas cervejarias de Munique, embora praticamente só nelas. Em 1921, ele se tornara líder do Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (nsdap), que em certos aspectos, como a formação de um violento braço paramilitar, assemelhava-se ao Partido Fascista de Mussolini em sua faseinicial. O Partido Nazista, como o nsdap passou a ser chamado, diferia pouco de outros movimentos nacionalistas e racistas da Alemanha. No entanto, Hitler era capaz de arrebatar multidões como nenhum outro orador. Embora ainda pequeno, seu partido tinha adquirido seguidores rapidamente, em especial na Baviera — estado que tinha considerável autonomia regional dentro do sistema federativo alemão e, desde 1920, bastião da oposição nacionalista ao que se entendia como a democracia “socialista” na Prússia, de longe o maior estado da Alemanha.

Pág. 127

Mais do que qualquer outra coisa, a questão das reparações de guerra manteve a tensão política em alta durante 1921-2, funcionando como oxigênio para a direita nacionalista. A violência política estava sempre próxima. Terroristas de direita cometeram 352 assassinatos políticos entre 1919 e1922. A democracia parlamentar era atacada tanto pela esquerda como pela direita. Um malogrado levante comunista no cinturão industrial da Saxônia, no segundo trimestre de 1921, provocou lutas ferozes durante alguns dias, antes que a polícia prussiana o sufocasse. Apesar da derrota, os comunistas continuaram a ganhar apoio nas áreas industriais. Já na Baviera, onde o governo estadual recusou-se a pôr em vigor a Lei de Proteção da República, aprovada pelo Reichstag em 1922 para combater o extremismo e a violência, a extrema direita nacionalista ganhava novos adeptos.

Pág. 127-128

O comando do Exército assumira uma postura ambivalente desde a fundação da república, defendendo o Estado em teoria, mas somente tolerando a nova democracia, sem entusiasmo. O comandante supremo do Reichswehr, general Hans von Seeckt, enviava sinais pouco claros. Recusou-se a intervir para restaurar a ordem na Baviera, mas, quando cresceram os boatos de um putsch, recomendou aos líderes políticos bávaros que não apoiassem os clamores nacionalistas cada vez mais veementes e inflamados por parte das milícias paramilitares de extrema direita. O comando bávaro do Reichswehr dera sinal verde para uma marcha sobre Berlim e a proclamação de uma ditadura nacional — ecos dos feitos de Mussolini na Itália —, mas, quando Von Seeckt jogou água fria na ideia e declarou que não atuaria contra o governo legal em Berlim, a ala bávara do Exército voltou atrás e deixou de apoiar o golpe.

Encurralado, Hitler decidiu que não tinha alternativa senão agir, para não ver seu apoio sumir pelo ralo. A tentativa de putsch, que ele lançou teatralmente numa grande cervejaria de Munique em 8 de novembro de 1923, frustrou-se vergonhosamente na manhã seguinte, debaixo de uma fuzilaria da polícia no centro da cidade. O malogro do putsch da cervejaria foi como a lancetada de um abscesso no organismo político. Seus participantes foram detidos e, alguns meses depois, os líderes, inclusive Hitler, foram julgados e condenados à prisão, ainda que essas penas fossem lenientes. A extrema direita fragmentou-se. A crise passou. A moeda esta bilizou-se logo depois, e foi aprovado um novo plano, mais condescendente, para o pagamento das reparações. A democracia sobrevivera — mas por um triz.

Pág. 128

Até que as reparações pudessem ser liquidadas, o afrouxamento dos grilhões de Versalhes e a reconstrução do Exército teriam de esperar (ainda que acordos secretos com a União Soviética, depois do Tratado de Rapallo, em 1922, tenham criado certo grau de cooperação para o treinamento de oficiais, contornando restrições impostas em Versalhes). Mas, sem apoio do Exército, a extrema direita nacionalista da Alemanha não tinha, em 1923, a menor possibilidade de emular a ascensão do fascismo ao poder que ocorrera na Itália no ano anterior. O perigo para a democracia passou. Tempos novos e melhores estavam por vir. A ameaça, porém, apenas diminuíra, mas não desaparecera.

Pág. 129

Até que as reparações pudessem ser liquidadas, o afrouxamento dos grilhões de Versalhes e a reconstrução do Exército teriam de esperar (ainda que acordos secretos com a União Soviética, depois do Tratado de Rapallo, em 1922, tenham criado certo grau de cooperação para o treinamento de oficiais, contornando restrições impostas em Versalhes). Mas, sem apoio do Exército, a extrema direita nacionalista da Alemanha não tinha, em 1923, a menor possibilidade de emular a ascensão do fascismo ao poder que ocorrera na Itália no ano anterior. O perigo para a democracia passou. Tempos novos e melhores estavam por vir. A ameaça, porém, apenas diminuíra, mas não desaparecera.

Pág. 163

Nem todas as ligas eram fascistas. Algumas delas, na verdade, rejeitavam essa associação. E nem toda a extrema direita francesa foi atraída pelas ligas. Como em toda parte, os limites entre a direita conservadora e a extremista eram tênues. O movimento perdeu força. A mão estabilizadora de Poincaré e a sensação de segurança restabelecida entre as classes proprietárias desarmou a crise. As ligas perderam apoio — pelo menos por algum tempo. Com o conservadorismo dominando, a sensação de necessidade de uma extrema direita diminuiu. Mas não desapareceu. Numa nova crise — mais prolongada, mais desestabilizante, mais perigosa —, a ameaça da extrema direita poderia voltar, de forma mais intensa, a pôr em perigo a república francesa.

Pág. 164

Na Alemanha dos “anos dourados” do fim da década de 1920, não parecia haver motivo de inquietação. O crescimento econômico era firme. Os padrões de vida estavam melhorando. O país passou a fazer parte da Liga das Nações. As fronteiras ocidentais tinham sido fixadas em Locarno. Quatro mudanças de governo entre 1925 e 1927 não afetaram a sensação de que, depois do período de inquietação no início da década, a democracia estava instalada. Os extremismos políticos tinham perdido apoio. A base de sustentação do comunismo caíra para 9% em 1924, com o correspondente aumento de votos para os sociais-democratas moderados. A extrema direita, embora fragmentada depois da frustrada tentativa de golpe empreendida por Hitler em novembro de 1923, permanecia viva nos setores mais marginais da política — ao sair da prisão, no ano seguinte, ele refundara seu Partido Nazista. Na opinião de um observador em 1927, este não passava de “uma dissidência incapaz de exercer influência digna de nota sobre a grande massa da população e sobre o curso dos acontecimentos políticos”.

Pág. 170/171

Com os preços dos produtos agrícolas no chão, as torneiras de crédito secas e as taxas de juros nas alturas, a insolvência reduziu muita gente à penúria. As propriedades agrícolas eram vendidas ou iam a leilão. Na Baviera, as vendas forçadas de propriedades entre 1931 e 1932, por exemplo, chegaram a mais de 50%. Os trabalhadores agrícolas lutavam para conseguir trabalho. Pequenos proprietários se mantinham com a agricultura de subsistência. Às vezes, tratava-se de sobrevivência em sentido estrito. As famílias de um vilarejo pobre no sul da França ficaram reduzidas a uma única refeição diária, composta apenas de castanhas, azeitonas, rabanetes e alguma verdura que não conseguiam vender. Compreensivelmente, esses camponeses da França e de muitas outras partes da Europa dirigiam seu ódio a qualquer alvo que acreditassem culpado de seu infortúnio — o Estado, os burocratas, a gente da cidade, agiotas, estrangeiros, judeus —, alimentando o radicalismo da extrema direita.

Pág. 175/176

O desastroso agravamento da situação econômica radicalizou não apenas o pensamento social, mas a ação política em toda a Europa. À medida que as tensões de classe se aguçavam, aprofundava-se a polarização política. A esquerda, que em muitos países estava dividida entre socialistas mais moderados e partidos comunistas alinhados com Moscou, mutuamente antagônicos, procurava, quase sempre em vão, evitar a deterioração drástica no padrão de vida da classe trabalhadora. A militância na esquerda era, em boa medida, também uma resposta aos perigos de uma maré montante de movimentos extremistas de direita e antissocialistas. Em quase todos os países fora da União Soviética, a Depressão trouxe um surto de apoio a movimentos fascistas que pretendiam destruir a esquerda e reorganizar as sociedades por meio de uma unidade nacional artificial e forçada. Quanto mais abrangente a crise, maior a probabilidade de mobilização de amplos setores da população pela extrema direita. A crise era mais generalizada na Alemanha; portanto, não surpreende que a reação no país fosse mais extrema do que em qualquer outro lugar da Europa.

Pág. 183/184

A Inglaterra aderiu firmemente à ortodoxia financeira que tinha como objetivo o equilíbrio orçamentário. As teorias que pregavam o combate à Depressão por métodos heterodoxos de financiamento deficitário ainda estavam engatinhando. Keynes, que pouco depois da quebra da bolsa fizera uma constrangedora previsão de que não haveria consequências graves para Londres e que “achamos o futuro decididamente animador”, ainda não concluíra sua teoria econômica anticíclica. Quando a Depressão se instalou, o mais ambicioso esquema de planejamento econômico mediante empréstimo para financiar o crescimento veio de Oswald Mosley, em quem a ambição política, a impaciência e o descompromisso eram tão notáveis quanto sua indiscutível capacidade. Mosley, de formação aristocrática, a princípio era um conservador. Desencantado com os conservadores, saiu do partido no começo da década de 1920 para tornar-se membro independente do Parlamento antes de entrar para o Partido Trabalhista. Suas posições sobre política econômica e social eram claramente de esquerda. Quando suas ideias sobre a estimulação da economia mediante financiamento deficitário foram rejeitadas sem contemplação, ele provocou uma secessão no Partido Trabalhista e criou o Partido Novo. E, quando o Partido Novo fracassou na eleição geral de 1931, em que não teve votação significativa, ele passou para a extrema direita, expressando abertamente sua admiração por Mussolini. Fundou a União Britânica dos Fascistas em 1932 e assim empreendeu o caminho para o ostracismo político.

Pág. 191/192

A atração do fascismo Alguns movimentos da extrema direita radical copiavam abertamente os métodos, os símbolos e o léxico usados pelos seguidores de Mussolini e Hitler, e se autointitulavam “fascistas” ou “nacionalsocialistas” com orgulho. Outros aceitavam algumas ou muitas das ideias dos movimentos, mas negavam-se a usar o rótulo. A questão é basicamente de definição — e tentar definir fascismo é como tentar pregar gelatina na parede. Cada um dos numerosos movimentos de extrema direita tinha suas características e suas ênfases. E, como cada um deles se dizia representante “verdadeiro”, “real” ou “essencial” de uma nação e baseava grande parte de seu apelo ultranacionalista na suposta singularidade dela, não podia haver uma organização internacional autêntica que representasse para a direita radical um equivalente do que a Comintern era para a esquerda. Em dezembro de 1934, uma reunião de representantes da extrema direita de treze países (Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, França, Grécia, Irlanda, Lituânia, Noruega, Países Baixos, Portugal, Romênia e Suíça), realizada às margens do lago Léman, tentou estabelecer um contexto para uma ação colaborativa, porém o país mais importante, a Alemanha nazista, boicotou o encontro — que nem sequer foi capaz de entrar em acordo sobre uma base doutrinária comum.

Pág. 192

Não obstante, existiam algumas características ideológicas comuns aos movimentos de extrema direita, fossem autointitulados “fascistas” ou não: a ênfase ultranacionalista na unidade da nação, que ganhava sua própria identidade por meio da “limpeza”, eliminando todos os que não pertencessem a ela — estrangeiros, minorias étnicas, “indesejáveis”; exclusão racial (embora não necessariamente racismo biológico como na variante nazista), expressa na reiteração da qualidade “especial”, “singular” e “superior” da nação; compromisso radical, extremo e violento com a destruição absoluta dos inimigos políticos (especialmente marxistas, mas também liberais, democratas e “reacionários”); comportamento calcado na disciplina, na “virilidade” e no militarismo (normalmente envolvendo organizações paramilitares); e crença numa liderança autoritária. Outros traços foram importantes, até mesmo centrais, para a ideologia de algum movimento específico, mas não onipresentes. Alguns países orientaram seu nacionalismo para objetivos irredentistas ou imperialistas, com consequências desastrosas, mas nem todos eram intrinsecamente expansionistas. Alguns ainda, embora não todos, tinham forte tendência anticapitalista. Com frequência, mas nem sempre, defendiam a reorganização da economia segundo uma orientação corporativista, a abolição dos sindicatos e a regulação da política econômica por “corporações” de interesses, dirigidas pelo Estado.

Pág. 192/193

A exatidão acadêmica da terminologia é uma questão absolutamente indiferente tanto para os que sofreram nas mãos da extrema direita como para os que, sendo de esquerda, fizeram decidida oposição aos movimentos que eles mesmos não hesitavam em chamar de “fascistas”. Naturalmente, os requintes da precisão semântica não devem obscurecer a questão maior da guinada para a direita — em qualquer de suas formas — durante a Depressão.

Pág. 196

A força do conservadorismo bloqueou qualquer possível abertura para a extrema direita. A União Britânica de Fascistas (buf), de Oswald Mosley, fundada em 1932, nunca teve chance de se disseminar. A essa altura, tinha cerca de 50 mil membros, uma clientela variada de profissionais liberais de classe média, insatisfeitos, ex-soldados, pequenos empresários, comerciantes, funcionários de escritório e trabalhadores sem qualificação de algumas áreas decadentes da Inglaterra e do East End de Londres (área pobre tradicionalmente, ocupada por imigrantes, onde vivia um terço da população judaica do país). O estilo da buf mais parecia uma tosca imitação importada. As camisas pretas dos fascistas, as marchas, a ação política e a iconografia, para não falar da revoltante violência pública contra judeus e opositores políticos, não combinavam com a cultura política britânica. Confrontos com a esquerda antifascista causavam perturbações cada vez maiores na ordem pública. Seu apoio — inclusive o de Lord Rothermere, dono do muito lido jornal The Daily Mail — desabou depois que uma grande passeata, realizada em Londres em junho de 1934, foi acompanhada de uma brutalidade repulsiva contra os opositores de Mosley, infiltrados às centenas na multidão de 15 mil manifestantes. Mosley tinha tanta certeza da humilhação eleitoral que seu partido sofreria que a buf nem sequer concorreu à eleição de 1935. Em outubro daquele ano, os membros da organização já não passavam de 5 mil, e ela só se recuperou lentamente às vésperas da Segunda Guerra Mundial, quando chegou a 22,5 mil membros. Quando da eclosão do conflito, Mosley e outros líderes da buf foram presos, e o partido foi dissolvido. A União Britânica de Fascistas representou uma ameaça para aqueles que seus membros consideravam inimigos raciais ou políticos e um considerável incômodo para a ordem pública, mas seu impacto sobre a política institucional britânica foi mínimo.

Pág. 197/198

Nos Países Baixos, apesar do desemprego de 35% em 1936, a direita radical conseguiu pouca inserção nas estruturas políticas, que permaneceram solidamente vinculadas às subculturas protestante, católica e social-democrata. Os governos mudavam, mas na verdade existia uma continuidade na burocracia, e muita adaptação prática e concessões entre os partidos governantes. O medo cada vez maior da Alemanha nazista contribuiu também para uma ideia de unidade nacional que ajudou a manter a coesão do sistema parlamentar em vigor. O fascismo era visto como “estrangeiro” e como uma ameaça nacional. O ponto alto do principal movimento fascista, o Nationaal Socialistische Beweging, foi alcançado em 1935, quando obteve 8% dos votos. Mas em dois anos esse percentual caiu para 4%, e o apoio à extrema direita continuou em baixa durante o que restava do período anterior à guerra.

A Bélgica testemunhou uma breve lufada de apoio a um movimento corporativista católico e autoritário que beirava o fascismo. Em 1936, o Partido Rex (que tomou o nome de uma editora católica chamada Christus Rex, por sua vez assim chamada por causa da recém-instituída festa de Cristo Rei) conquistou 11,5% dos votos — em boa medida como protesto das classes médias de língua francesa nas partes industrializadas do sudeste do país contra a corrupção dos partidos convencionais. Mas esse eleitorado em pouco tempo encolheu, restando dele apenas uns poucos adeptos. Da mesma forma que nos Países Baixos, as forças tradicionais do meio social e político — católicos, socialistas e liberais — preencheram o espaço que os novos movimentos de extrema direita poderiam ter ocupado. Na Bélgica, a inexistência de um nacionalismo genuinamente belga era também um obstáculo. O Rex tinha uns poucos adeptos em Flandres, onde havia movimentos
nacionalistas e protofascistas (embora sem apoio majoritário).

Durante algum tempo, considerou-se que a Terceira República na França podia estar seriamente ameaçada pela extrema direita. O sistema político não dava ensejo a mudanças frequentes de governo (que quase sempre se resumiam a uma dança das cadeiras, com as mesmas pessoas em torno da mesa do gabinete), mas sim a alianças pragmáticas variadas entre os partidos. Essas alianças quase sempre incluíam os radicais, que constituíam o partido central da república. Os radicais eram anticlericais, defendiam princípios econômicos liberais, apoiavam-se firmemente nas classes médias e se dispunham a acordos com facções moderadas da direita ou da esquerda com intuito de permanecer no poder (o que geralmente acontecia). Nas eleições de 1932, quando a Depressão ainda estava se instalando, o Partido Socialista e os radicais, numa incômoda aliança de esquerda moderada, tiveram ganhos importantes. A derrota do bloco direitista integrado pelos partidos conservadores desencadeou uma reação exagerada da direita, num clima de xenofobia, acentuado nacionalismo, antissemitismo, antifeminismo e medo da “ameaça vermelha” (embora os comunistas só tivessem obtido doze das 605 cadeiras na Câmara dos Deputados). O clima de agitação foi exacerbado pelos acontecimentos dramáticos do outro lado do Reno. As Ligas — organizações paramilitares e extraparlamentares da direita nacionalista, formadas por grandes associações de veteranos, algumas delas com pelo menos algumas características fascistas — ganharam novo fôlego depois do declínio sofrido durante a estabilização financeira no governo de Poincaré.

Pág. 202

Campo fértil para a direita: A Europa Central e a Oriental

A Espanha era um caso excepcional na Europa Ocidental. No centro e no leste do continente, a guinada para a extrema direita era o lugar-comum. Os maiores movimentos fascistas surgiram na Áustria, na Romênia e na Hungria. Para a Áustria, a chegada de Hitler ao poder na vizinha Alemanha foi um acontecimento determinante. Na Romênia e na Hungria, a turbulência persistente que decorreu dos ajustes territoriais do pós-guerra foi um pré-requisito de peso. Grande parte dos que não simpatizavam com o socialismo na Áustria já eram protofascistas à época da Depressão. O colapso do sistema financeiro em 1931 e o desemprego galopante minaram a economia do país e as condições de vida de grande parte da população. Sob o impacto da Depressão, a divisão da política austríaca em três setores se aprofundou e radicalizou. Dois grandes movimentos fascistas, o Heimwehr [Defesa da Pátria], de origem local, e o Partido Nazista da Áustria, inspirado nos acontecimentos da vizinha Alemanha e em franco crescimento, defrontavam-se com um grande Partido Socialista que mantinha o sólido apoio da classe de trabalhadores industriais. Em 1930, os seguidores do Heimwehr eram duas vezes mais numerosos que os do Partido Nazista da Áustria, que muitos viam como uma versão local de uma organização estrangeira. Mas os nazistas vinham ganhando terreno com rapidez. Nas eleições regionais e municipais de 1932, conseguiram 16% dos votos.

Pág. 204

Na Hungria, onde os graves ressentimentos irredentistas gerados pelas perdas territoriais determinadas pelos acordos do pós-guerra ainda eram uma ferida aberta, a Depressão, que trouxe uma queda vertiginosa na produção agrícola e desemprego para um terço da força de trabalho industrial, exacerbou as tensões sociais e políticas. No entanto, principalmente entre 1932 e 1936, durante o governo do primeiro-ministro Gyula Gömbös, cujas inclinações para a extrema direita dividiram e desarmaram por algum tempo as pequenas forças fascistas, as elites governantes, depois de reconquistar sua força com a restauração conservadora da década de 1920, conseguiram controlar e manipular o Parlamento e se adaptar à administração da crise, de modo que nenhum grande partido fascista surgiu até 1937. A fragilidade da esquerda socialista, que nunca se recuperou do massacre a que foi submetida depois do colapso do regime de Béla Kun em 1919, e a limitada participação das massas nos anos seguintes na democracia de fachada do regime autoritário de Miklós Horthy desempenharam seu papel em reduzir as chances de uma mobilização fascista. Só a partir de 1937, por influência do que acontecia na Alemanha e pelas rápidas mudanças no horizonte da política internacional, surgiu um movimento fascista de grandes proporções. O Partido Nacional Socialista da Hungria — amálgama de oito grupos nacionalistas extremistas — nasceu do Partido da Vontade Nacional, fundado pelo oficial da reserva Ferenz Szálasi em 1935, e em 1939 assumiu o nome de Partido da Cruz Flechada. Começou a recrutar apoio com sucesso entre profissionais do setor público, oficiais do Exército e trabalhadores das áreas industriais de Budapeste, chegando a 250 mil membros em 1939-40. O breve momento de glória da Cruz Flechada — embora tenha sido de horror para suas vítimas — viria mais tarde, durante a guerra, com a Hungria sob domínio alemão e a derrota cada vez mais próxima.

Pág. 208/209

O sentimento antibelicista na esquerda alemã contrastava com o militarismo escancarado e a exaltação da guerra na extrema direita. Na década de 1920, a popularidade de Tempestades de aço, livro de memórias de Ernst Jünger que glorificava a guerra, já dera uma indicação clara do quanto a população alemã se achava dividida em relação à Primeira Guerra Mundial. Não foi surpresa, portanto, que Nada de novo no front enfurecesse a direita, principalmente os membros de seu incipiente grupo de vanguarda, o Partido Nazista. Ao ser distribuído na Alemanha, em dezembro de 1930, o filme americano baseado no romance provocou tamanha chuva de protestos por parte da direita, encabeçada pelos nazistas, que o consideraram um insulto à honra alemã, que as projeções públicas foram proibidas por “colocar em perigo a reputação internacional da Alemanha” e por “menosprezo ao Exército”.

Pág. 244/245

Uma falsa alvorada na França
Em meio à derrocada da esquerda na Europa, uma eleição em particular trouxe um raio de esperança. O resultado da eleição geral na França, em 1936, pareceu um triunfo para o antifascismo, uma reviravolta, enfim, naquilo que durante anos tinha sido a tendência rumo à extrema direita militante em todo o continente. Terminada a apuração dos votos do segundo turno, em 3 de maio de 1936 (o primeiro fora uma semana antes, em 26 de abril), a Frente Popular de Socialistas, Comunistas e Radicais obteve uma vitória assombrosa, ficando com 376 cadeiras, muito mais que as 222 da Frente Nacional, de direita. Foi imensa a euforia por parte dos eleitores da esquerda — principalmente trabalhadores, mas também a maioria dos intelectuais, escritores e artistas. Manes Sperber era um escritor judeu, nascido em 1905 na Polônia, mas exilado em Paris desde sua breve experiência na prisão na Alemanha, em 1933, e membro do Partido Comunista, do qual foi se tornando cada vez mais crítico até abandoná-lo em 1937. Mais tarde, escreveu a respeito
de sua empolgação com o resultado do pleito. Para ele, e para muitos outros, foi mais do que uma vitória eleitoral. Foi como uma lufada de vento fresco a arejar um ambiente abafado. Uma meta durante longo tempo vista como impossível parecia alcançável. “Nunca a fraternidade se divisou tão próxima como naquele maio de 1936”, escreveu Sperber. “Vindos de todas as direções, homens, mulheres e crianças acorriam às praças da Bastilha e da nação”, com suas canções e brados de alegria chegando às ruas vizinhas, convocando todos para se unir na busca de justiça e liberdade, e tudo sem recorrer à violência revolucionária. Não tardou para que as esperanças humanitárias de Sperber se mostrassem um sonho de desvairado otimismo.

Pág.245

A França continuou dividida de alto a baixo. O ódio da direita nacionalista à Frente Popular ia muito além da oposição política convencional. A fúria maior se voltava contra Léon Blum, intelectual judeu que fora um dos primeiros defensores de Dreyfus. Blum tinha sido agredido fisicamente por uma horda nacionalista em fevereiro de 1936. No ano anterior, Charles Maurras, líder da Action Française, de extrema direita, denunciara Blum, de forma chocante, como “um homem a ser baleado — pelas costas”. O triunfo eleitoral da esquerda não diminuiu a polarização ideológica na França. Na realidade, a vitória fora muito menos contundente do que parecera à primeira vista. A votação da esquerda, de 37,3%, tinha sido apenas um pouco superior aos 35,9% obtidos pela direita. A principal mudança se dera no seio da própria esquerda, o que só fez aumentar o antagonismo da direita. Os radicais, do principal bloco centrista da república, perderam terreno, caindo de 157 cadeiras em 1932 para apenas 106 em 1936. Os socialistas, grupo majoritário na Frente Popular, tinham passado de 131 para 147 cadeiras. Pequenos partidos de esquerda obtiveram em conjunto 51 cadeiras, catorze a mais que em 1932. O que mais preocupava a direita era o fato de os comunistas terem sido os mais beneficiados: haviam saltado de dez para 72 cadeiras.

Pág. 246

Entre suas promessas eleitorais estava a adoção de um programa de obras públicas (que assinalava o fim da política econômica deflacionária), a redução da semana de trabalho, a instituição de pensões de aposentadoria e a criação de um fundo de desemprego. Como reflexo do forte clima antifascista, as entidades paramilitares seriam postas na ilegalidade. Entretanto, evitaram-se medidas radicais capazes de amedrontar as classes médias. A revolução social teria de esperar. Os socialistas puseram de lado o desejo de estatizar a economia; os comunistas não fizeram referência a sovietes ou coletivos camponeses. A cúpula administrativa do Banque de France seria ampliada para acabar com o controle exercido por uma oligarquia fechada de acionistas, mas o banco não foi estatizado. O valor do franco deveria ser mantido — para tranquilizar a classe média, que perdera suas poupanças no governo anterior de coalizão esquerdista —, embora isso logo tenha se revelado um compromisso imprudente. Garantiu-se o direito das mulheres ao trabalho, mas, na ânsia de evitar a abertura do debate sobre uma possível reforma da constituição (defendida por grande parte da extrema direita), não se fez menção alguma a seu direito ao voto.

Pág. 247

A enorme onda de greves fez com que os empregadores abrissem bem os olhos. Numa única tarde, em 7 de junho, numa reunião na residência do primeiro-ministro, no Hôtel Matignon, eles atenderam às principais exigências dos sindicatos, e as relações trabalhistas transformaram-se de um dia para o outro. Aprovaram-se o direito à sindicalização, a negociação coletiva de contratos de trabalho, a representação dos trabalhadores e a proscrição de medidas punitivas contra grevistas, além de aumentos salariais da ordem de 15%. Em poucos dias tornaram-se lei a semana de trabalho de quarenta horas e as férias remuneradas anuais de duas semanas (o que, com o apoio de passagens de trens a baixo custo, deu início ao êxodo de verão, de Paris e outras cidades, o que se tornou um aspecto permanente da vida social francesa). Aos poucos, as greves diminuíram. O dilúvio de novas leis prosseguiu com a proibição de ligas paramilitares, em 18 de junho, o que reduziu a desordem política e a violência nas ruas (apesar de levar setores da extrema direita à clandestinidade). Outras leis instituíram a reforma do Banque de France, elevaram para catorze anos a idade mínima para sair da escola, nacionalizaram as indústrias de armamentos e apaziguaram os agricultores ao aumentar os preços dos cereais. Criou-se o Ministério dos Desportos e do Lazer, que tinha como meta democratizar o acesso a atividades recreativas ao ar livre (uma reação à militarização desse setor nas organizações fascistas), oferecer formas atraentes de distração à classe trabalhadora e melhorar a saúde pública. O resultado foi o estímulo ao ciclismo, às caminhadas, aos albergues para a juventude e ao turismo popular, a melhoria das instalações esportivas e o fomento do interesse pelos esportes e sua prática. De modo geral, foi notável o alcance da intervenção realizada pelo governo da Frente Popular em tão pouco tempo.

Pág. 390/391

Ao desprezo pelo fascismo e à obstinada rejeição pelo eleitorado dos grupos conservadores, que no passado haviam se consorciado com a extrema direita, somava-se o desejo de amplas reformas sociais e econômicas da espécie que, acreditava-se, só a esquerda poderia proporcionar. Nos países escandinavos, onde a guerra fora menos destrutiva (embora a Noruega tivesse perdido 20% de sua infraestrutura econômica), a esquerda social-democrata pôde consolidar a base de poder constituída antes do conflito e introduzir reformas importantes e duradouras na previdência social. Na Dinamarca, os sociais-democratas, de início um pouco prejudicados por sua participação no governo colaboracionista durante a guerra, logo recuperaram as perdas sofridas para os comunistas. A social-democracia fortaleceu-se na Noruega, favorecida por seu envolvimento na resistência, e se manteve forte na Suécia. Na pequena Islândia, um dos raros países europeus que prosperaram na guerra e que se tornara independente da Dinamarca em 1944, os social-democratas continuaram a perder para o Partido Comunista de Unidade Popular. Ambos, porém, uniram-se ao Partido da Independência, conservador, numa coalizão que, extraordinariamente, enfrentou poucas discórdias para modernizar o país e melhorar o padrão de vida, mediante o apoio à frota pesqueira. Na Escandinávia, a guerra interrompeu, mas não destruiu as estruturas políticas ou os programas de reforma econômica e social.

Pág. 413

Por mais precários e insuficientes que tenham sido os expurgos dos colaboracionistas e dos culpados dos piores crimes de guerra, foram medidas que proporcionaram certa dose de catarse às vítimas do nazismo e do colaboracionismo, além de mostrar que os métodos violentos da extrema direita não teriam mais como envenenar as sociedades como acontecera depois de 1918. Um elemento crucial da instabilidade política do entreguerras havia praticamente desaparecido. As mudanças de fronteiras e as transferências de populações na Europa Oriental, embora realizadas à custa de muito sangue, geraram uma homogeneidade étnica muito maior à que tinha se registrado no entreguerras, o que também contribuiu para a pacificação da metade oriental do continente, muito embora sob a mão pesada da repressão soviética.

Notas
(Depois verei se é possível colocar todas as notas, pois ficam no fim do livro e parecem não estar organizadas, e são muitas)

|***| Nazismo de esquerda? (Mark Mazower) O que os Historiadores nos dizem sobre o Nazismo SER de (extrema) Direita - Parte 04
|***| Nazismo de esquerda? (Richard J. Evans) O que os Historiadores nos dizem sobre o Nazismo SER de (extrema) Direita - Parte 02

sábado, 5 de novembro de 2016

Nazismo de esquerda? (Richard J. Evans) O que os Historiadores nos dizem sobre o Nazismo SER de (extrema) Direita - Parte 02

A quem não entendeu o post, sugiro ler a Parte 01, pois haverá muitas outras partes (espero) sobre o que nos dizem os Historiadores da segunda guerra, nazismo e neonazismo (neofascismo) sobre o nazismo ser de direita. Não só de Historiadores como também de memórias (de peso) e de jornalistas, como o livro clássico sobre o tema que é o "Ascensão e Queda do III Reich" (PDF aqui), do jornalista William Shirer.

Os posts surgiram em virtude da ampla panfletagem de direita feita no Brasil (não só aqui) de grupos de extrema-direita liberal-conservadores tentando empurrar o nazismo pro "campo esquerda" da política, o que não só provoca um problema de entendimento do fenômeno e histórico, como é pura distorção e desonestidade intelectual aguda pra fins políticos. Em grande parte, no caso brasileiro, esta neurose desses grupos (pelo que observo) é porque em muito suas atitudes autoritárias, preconceituosas e saudosas de ditadura se assemelham com parte do nazismo e fascismo, daí o incômodo em querer se livrarem do xingamento de "nazistas", isso quando alguém da esquerda usa pois da parte da esquerda (e do campo democrático, que é mais amplo) há um combate débil a esse tipo de problema (disseminação de panfletagem mentirosa).

Do segundo livro da trilogia do historiador britânico Richard J. Evans, "O Terceiro Reich no poder", com tradução Lúcia Brito. Vol. 2 da trilogia.

Trechos sobre o caráter direitista e conservador do nazismo, e isso porque não selecionei as partes que só falam dos conservadores/conservadorismo porque ficaria extenso os textos, tanto nesta parte como na primeira parte. Serviço de utilidade pública em um país onde uma direita "radicaloide" (principalmente) e ignorante (e pedante) dá um golpe de Estado contra o país e entrega as riquezas do mesmo a petroleiras como se fosse "algo banal" ao mesmo tempo em que cobravam "melhores escolas e hospitais" (podem pedir esmola pra Shell pras escolas e hospitais agora ou pra Chevron, não era isso que queriam? Ou não sabiam do que estava realmente em jogo com todo o ataque promovido pra desestabilizar o país?). Em outros países esse ato dessa gente seria considerado crime de traição grave.
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Pág. 23
Havia uma enorme variedade de grupos extremistas antissemitas de ultradireita em 1919, especialmente em Munique, mas, em 1923, um deles pairava acima dos restantes: o Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães, dirigido por Adolf Hitler. Tanta coisa foi escrita sobre o poder e o impacto de Hitler e dos nazistas que é importante destacar que o Partido situava-se na periferia distante da política até o final da década de 1920. Em outras palavras, Hitler não era um gênio político que angariou sozinho o apoio em massa para si e seu partido. Nascido na Áustria em 1889, era um artista fracassado com um estilo de vida boêmio que possuía um grande dom: a capacidade de mobilizar as massas com sua retórica. Seu partido, fundado em 1919, era mais dinâmico, mais implacável e mais violento que outros grupos periféricos da extrema direita.

Em 1923, o Partido sentiu-se confiante o bastante para tentar um golpe de Estado violento em Munique como prelúdio para uma marcha sobre Berlim na linha da bem-sucedida Marcha sobre Roma de Mussolini no ano anterior. Mas o Partido fracassou em conquistar o Exército ou as forças políticas conservadoras da Baviera, e o golpe foi dissipado com uma saraivada de tiros. Hitler foi condenado e colocado na prisão de Landsberg, onde ditou seu tratado político autobiográfico, Minha luta, para seu lacaio Rudolf Hess. Por certo não era um plano para o futuro, mas um compêndio das ideias de Hitler, sobretudo a respeito do antissemitismo e da conquista racial da Europa oriental, para todos aqueles que se interessassem em ler.
Pág. 51
Houve mais detenções e fuzilamentos na manhã seguinte, em 1º de julho. No clima geral de violência, Hitler e seus lacaios aproveitaram a oportunidade para acertar velhas contas ou eliminar rivais pessoais. Alguns, claro, eram grandes demais para se atingir, notadamente o general Erich Ludendorff, que andara causando algumas dores de cabeça para a Gestapo com suas campanhas de extrema direita e antimaçonaria; o herói da Primeira Guerra Mundial foi deixado em paz; viria a morrer pacificamente em 20 de dezembro de 1937, sendo-lhe conferidas exéquias respeitosas pelo regime. Mas, na Baviera, o exministro-presidente Gustav Ritter von Kahr, que havia desempenhado um papel-chave ao esmagar o golpe de Hitler em 1923, foi trucidado pelos homens da SS. O crítico de música Wilhelm Eduard Schmid também foi morto na crença errônea de que era Ludwig Schmitt, um ex-partidário do irmão radical de Gregor Strasser, Otto, que havia sido forçado a renunciar ao Partido devido a suas visões revolucionárias e desde então mantinha, da segurança de seu exílio, uma avalanche constante de críticas a Hitler.

O político conservador bávaro Otto Ballerstedt, que tivera êxito em processar Hitler por interromper uma reunião política na qual ele falava em 1921, resultando em um mês de prisão para o líder nazista em Stadelheim, foi detido e fuzilado em Dachau em 1º de julho. Um alto oficial da SS, Erich von dem Bach-Zelewski, escolheu o momento para se livrar de um rival odiado, o líder da cavalaria da SS, Anton von Hohberg und Buchwald, que foi devidamente abatido em casa. Na Silésia, o chefe regional da SS, Udo von Woy rsch, fez fuzilar seu ex-rival Emil Sembach, a despeito de acordo prévio com Himmler de que Sembach seria enviado a Berlim para que lá tratassem do caso dele. A violência também transbordou para outro setor sem conexão. Quatro judeus foram detidos em Hirschberg e “abatidos ao tentar escapar”. O líder da liga de veteranos judeus em Glogau foi levado a um bosque e fuzilado44.
Pág. 102
Sob o Terceiro Reich, o sistema judiciário e penal regular também continuou a lidar com crimes comuns, não políticos – furto, assalto, assassinato e outros –, bem como a impor a nova repressão do Estado policial. Nisso também houve uma rápida expansão da pena capital, à medida que o novo sistema mexia-se para cumprir sentenças de morte pronunciadas contra criminosos capitais na extinta República de Weimar, mas não levadas a cabo devido à incerteza da situação política no começo da década de 1930. Os nazistas prometeram que não haveria mais longos adiamentos de execução enquanto as petições de clemência fossem consideradas. “Os dias de sentimentalismo falso e piegas acabaram”, declarou com satisfação um jornal de extrema direita em maio de 1933. Em 1936, cerca de 90% das sentenças de morte proferidas pelos tribunais estavam sendo cumpridas.  

Promotores e tribunais agora eram encorajados a acusar todos os homicidas de assassinato doloso em vez do crime não capital de homicídio culposo, chegar ao veredito de culpado e proferir a sentença mais dura, resultando em um aumento do número de sentenças de homicídio doloso para cada mil adultos da população de 36 em 1928 para 76 em 1933-3722. Criminosos eram em essência degenerados hereditários e deviam ser tratados como párias da raça, argumentavam os nazistas, recorrendo à obra de criminologistas ao longo das últimas décadas e deixando de lado as qualificações e sutilezas que cercavam as teses principais de tais estudos23.
pág. 180
No final da década de 1920, Rosenberg havia se tornado líder da Liga de Combate pela Cultura Alemã (Kampfbund für deutsche Kultur), uma das muitas organizações especializadas estabelecidas dentro do Partido na época. Em 1933, a Liga agiu depressa para tomar sob seu controle as instituições teatrais alemãs “coordenadas”46. Rosenberg também estava ávido para impor pureza ideológica sobre muitos outros aspectos da cultura alemã, inclusive música e artes visuais, igrejas, universidades e vida intelectual, todas elas áreas que Goebbels originalmente tencionava que caíssem sob o controle do Ministério da Propaganda47.  

A Liga de Combate pela Cultura Alemã era pequena, mas muito ativa. Sua afiliação aumentou de 2,1 mil em janeiro de 1932 para 6 mil um ano depois, 10 mil em abril de 1933, e 38 mil no outubro seguinte. Muitas das investidas contra músicos judeus e esquerdistas que ocorreram na primavera e no começo do verão de 1933 foram organizadas ou inspiradas pela Liga de Combate pela Cultura Alemã, integrada por um número substancial de críticos de música e escritores de extrema direita. Além disso, Rosenberg tinha uma poderosa arma de propaganda à sua disposição na forma do Observador Racial, o jornal diário nazista, do qual ele era o editor-chefe. Para piorar a situação para Goebbels, as visões de Rosenberg sobre arte e música eram muito mais afinadas com as de Hitler que as dele, e em mais de uma ocasião o pendor de Goebbels por inovações culturais ameaçou dar a vantagem para Rosenberg48.
pág. 265
No fim das contas, porém, composições como Carmina Burana, a despeito de toda a popularidade, ficaram em segundo lugar no panteão musical, atrás dos grandes compositores de épocas passadas mais admirados por Hitler. O primeiro entre esses era Richard Wagner. Hitler era um adorador de suas óperas desde a juventude em Linz e Viena antes da Primeira Guerra Mundial. Elas encheram sua cabeça com retratos míticos de um passado alemão heroico. Wagner foi também o autor de um notório panfleto atacando o Judaísmo na música. Contudo, a influência do compositor sobre Hitler com frequência tem sido exagerada.

Hitler jamais referiu-se a Wagner como fonte de seu antissemitismo, e não há evidência de que tenha lido qualquer um dos textos de Wagner. Ele admirava a coragem resoluta do compositor na adversidade, mas não reconheceu nenhuma dívida a suas ideias. Se Wagner teve influência sobre os nazistas, foi menos direta, por meio de doutrinas antissemitas do círculo que sua viúva Cosima reuniu após a morte dele, e do mundo mítico retratado em suas óperas. Ao menos nessa área eles habitavam o mesmo espaço cultural, repleto de nacionalismo mítico alemão. A devoção de Hitler a Wagner e sua música era óbvia. Já na década de 1920 ele havia se tornado amigo da nora inglesa de Wagner, Winifred, e de seu marido Siegfried Wagner, guardiães do templo do compositor na grande casa de ópera que ele construiu em Bay reuth. Eram partidários resolutos da extrema direita. No Terceiro Reich, tornaram-se algo muito parecido a uma nobreza cultural28.
pág. 293-294
Um exemplo pessoal característico da fusão de patriotismo, militarismo e religiosidade na tradição dominante do protestantismo alemão foi proporcionado por Martin Niemöller, pastor de Berlim nascido em 1892 e filho de um pastor luterano, embora batizado como calvinista. Niemöller tornou-se cadete-oficial da Marinha alemã e então serviu a bordo de submarinos na Primeira Guerra Mundial, assumindo o comando de um em junho de 1918. Suas reminiscências da guerra não são nenhuma obra-prima da literatura, mas exsudam um espírito empolgado comparável a Tempestade de aço, de Ernst Jünger, celebrando com gosto o afundamento de navios mercantes inimigos. Ao atracar em Kiel no final de novembro de 1918 após ouvir pelo rádio as notícias sobre o encerramento da guerra e o colapso da monarquia, ele viu-se, conforme escreveu mais tarde, como “um estranho em meu próprio país”. 

Não havia “um ponto de agrupamento para homens de mentalidade nacionalista” que se opunham “aos manipuladores dessa ‘Revolução’”3. Um período de trabalho em uma fazenda convenceu-o de que devia se encarregar de resgatar sua nação da catástrofe espiritual que julgava ter se abatido sobre ela, e começou a formação de pastor na Westfália. Ativo na liga de estudantes dos nacionalistas alemães, apoiou o golpe abortado de Kapp que tentou derrubar a República em março de 1920. Ajudou a fundar uma unidade das Brigadas Livres de 750 estudantes para lutar contra o Exército Vermelho formado por grupos de esquerda na região. Mais adiante, envolveu-se em outro grupo paramilitar de extrema direita, a Organização Escherich. Em 1923, Niemöller e seus irmãos carregaram o esquife do sabotador nacionalista Albert Leo Schlageter, abatido por tropas francesas em Düsseldorf durante a ocupação do Ruhr4.
pág. 404-405
O sucesso dos nazistas em adequar as universidades a seus propósitos ideológicos foi, portanto, surpreendentemente limitado26. O ensino continuou com mudanças apenas relativas e superficiais na maior parte dos setores. Estudos sobre as teses de doutorado concluídas durante a era nazista mostraram que não mais de 15% delas poderiam ser classificadas de nazistas na linguagem e abordagem27. Professores esnobes e elitistas do tipo tradicional desprezavam abertamente os aventureiros políticos trazidos para dentro das universidades pelo regime, ao passo que a maioria destes ficava tão enfronhada na administração universitária que tinha pouco tempo para propagar suas ideias aos estudantes. Por outro lado, o anti-intelectualismo do movimento nazista assegurou que muitas figuras importantes do Partido, de Hitler para baixo, ridicularizassem muitas daquelas ideias e as julgassem obscuras demais para ter qualquer relevância política real.

Nem Bernhard Rust nem Alfred Rosenberg, as duas lideranças nazistas eminentes no campo da educação e ideologia, eram politicamente hábeis ou determinados o bastante para driblar professores astutos cujas aptidões para intriga e dissimulação haviam sido aguçadas em décadas de luta interna nos comitês universitários. A fundação de um novo instituto dedicado ao estudo de alguma obsessão nazista favorita podia ser saudada pelos professores conservadores como uma forma de se livrar de um colega impopular por meio de um desvio acadêmico, como aconteceu quando o rabugento historiador de extrema direita Martin Spahn ganhou o seu próprio Instituto de Política Espacial na Universidade de Colônia em 1934. Isso matou dois coelhos com uma única cajadada, visto que removeu Spahn do Departamento de História, onde ele era profundamente impopular, para um setor em que não tinha que entrar em contato com os colegas, e ao mesmo tempo demonstrou o comprometimento da universidade com as ideias geopolíticas do novo regime28.
pág. 407
Pacifista, judeu, teórico e partidário da República de Weimar, Einstein representava tudo que Lenard mais odiava. Além disso, os cientistas que tinham validado sua teoria eram britânicos. No debate que se seguiu sobre a relatividade, Lenard assumiu a liderança da rejeição à teoria de Einstein como uma “fraude judaica” e da mobilização da comunidade da física contra ela. Lenard foi parar nos braços dos nazistas quando sua recusa em aderir ao luto oficial pelo assassinato do ministro de Relações Exteriores Rathenau – cujo extermínio ele havia defendido publicamente não muito tempo atrás – desencadeou uma manifestação sindical contra ele em 1922, e Lenard teve que ser levado em custódia policial para sua própria proteção.  

Proibido de retornar ao trabalho por sua universidade, Lenard foi reintegrado em consequência da pressão dos estudantes de extrema direita, em cuja órbita ele então gravitava. Em 1924, louvou em público o golpe da cervejaria de Hitler no ano anterior e, embora não entrasse formalmente para o Partido Nazista até 1937, já era para todos os fins e efeitos um seguidor do movimento e participou ativamente do trabalho de grupos como a Liga de Combate pela Cultura Alemã de Rosenberg. Saudou a chegada do Terceiro Reich com entusiasmo desenfreado, celebrou a remoção de professores judeus das universidades e publicou um texto em quatro volumes sobre Física alemã em 1936-37 que ele com certeza esperava que proporcionasse os fundamentos para uma nova “física ariana” de base racial que eliminaria de uma vez por todas a doutrina da relatividade da ciência alemã33.
pág. 453
Schacht foi catapultado para a fama perto do final de 1923 pelo papel como comissário para a moeda nacional, cargo a que foi indicado por Hans Luther, na época ministro das Finanças. Ele provavelmente deveu a nomeação às extensas conexões que havia construído nos círculos financeiros, ao longo dos anos anteriores, como diretor de uma sucessão de grandes bancos. Seu papel para acabar com a hiperinflação levou-o à indicação para presidente do Reichsbank após a morte súbita do prévio detentor do cargo em 20 de novembro de 1923. Ali ele consolidou a reputação de mago financeiro ao manter com sucesso a estabilidade do rentenmark e depois – com um coro de desaprovação da extrema direita – desempenhar um papel-chave na renegociação das reparações sob o Plano Young.

No começo de 1930, quando o governo renegociou partes do Plano que Schacht considerava que deveriam ter sido mantidas, ele exonerou-se e entrou em aposentadoria temporária. Isso sugeriu que então havia se deslocado para a extrema direita nacionalista em termos políticos; de fato, na época ele deixou o Partido Democrata, embora sem transferir sua lealdade para nenhum outro. Apresentado a Hitler em um jantar dado por Hermann Göring no começo de 1931, ficou favoravelmente impressionado com o líder nazista. Como muitas outras figuras do sistema, Schacht achou que o radicalismo de Hitler poderia ser domado com a associação do nazista a outras figuras mais conservadoras e mais experientes, como ele mesmo62
pág. 472
Não foi surpreendente, portanto, que ele escolhesse um representante de destaque da comunidade empresarial como ministro da Economia do Reich após a saída forçada do intratável nacionalista alemão Alfred Hugenberg5. O escolhido foi Kurt Schmitt, diretor-geral da seguradora Allianz. Nascido em 1886 na modesta família burguesa de um médico, Schmitt foi um entusiasmado membro das fraternidades de duelo na universidade, onde estudou direito comercial, e a seguir trabalhou por curto período no serviço público bávaro sob Gustav Ritter von Kahr, que mais tarde ficaria famoso na extrema direita da Baviera. Pouco depois da eclosão da guerra, Schmitt entrou na filial de Munique da Allianz. Embora trabalhasse muitíssimo, não tinha nada de burocrata insensível. Ele desenvolveu uma abordagem humana para o seguro, fazendo pessoalmente a mediação entre reclamantes e segurados, reduzindo com isso de modo substancial o número de dispendiosas ações judiciais com que a companhia tinha que lidar.

Como era de se prever, isso levou à sua rápida ascensão pelos escalões administrativos, uma ascensão que não foi seriamente interrompida pela guerra, da qual ele teve baixa por invalidez no começo, com um ferimento pequeno que infeccionou repetidas vezes e o impediu de voltar ao front. Tornou-se diretor-geral aos 34 anos de idade. Em breve, encorajado pelos subordinados, Schmitt vestia dispendiosos trajes sob medida e convivia com os maiorais nos clubes de cavalheiros de Berlim. Sob a liderança de Schmitt, a Allianz expandiu-se rapidamente com fusões e tomadas de controle que caracterizaram também outros setores do mundo empresarial na década de 1920. A exemplo de outros empresários, Schmitt estava insatisfeito com as condições sob as quais a iniciativa privada tinha que operar na era de Weimar e fez lobby por uma reforma na lei referente aos seguros por meio da Associação do Seguro Privado do Reich. Isso colocou-o em contato com políticos importantes, dos quais muitos ficaram impressionados com sua competência, determinação e evidente sagacidade financeira. No começo da década de 1930, Schmitt havia se tornado uma figura pública de certo renome. Ele incrementou sua reputação com o desempenho no Conselho Consultivo Econômico implantado por Brüning. Tanto Brüning quanto Papen ofereceram-lhe o cargo de ministro das Finanças. Ele recusou as ofertas na crença de que a situação econômica reinante não lhe permitiria fazer o trabalho com qualquer grau de sucesso6.
pág. 576
No final do século XIX e começo do século XX, o campesinato alemão em geral enquadrava-se no peculiar grupo social amorfo conhecido no discurso político pelo intraduzível termo alemão Mittelstand. A palavra expressava em primeiro lugar as aspirações dos propagandistas de direita de que as pessoas que não eram nem burguesas nem proletárias tivessem um lugar reconhecido na sociedade. Mais ou menos equivalente ao francês petite bourgeoisie ou ao inglês lower middle class (classe média baixa), no início da década de 1930 passou a simbolizar muito mais que um grupo social: na política alemã, representava um conjunto de valores. 

Situado entre as duas grandes classes antagonistas em que a sociedade havia se dividido, representava as pessoas autossuficientes, independentes, que trabalhavam duro, o cerne saudável do povo alemão, injustamente deixado de lado pela guerra de classes que grassava ao redor delas. Era a pessoas como essas – pequenos lojistas, artesãos habilidosos que administravam suas oficinas, fazendeiros camponeses autossuficientes – que os nazistas haviam inicialmente dirigido seu apelo. O programa do Partido Nazista de 1920 era, entre outras coisas, um produto típico da política de extrema direita do Mittelstand alemão; o apoio dessas pessoas estava entre os fatores que de início fez o Partido decolar1.
pág. 583
Artesãos e lojistas não foram o único grupo social que esperou uma melhora de status com a chegada do Terceiro Reich. Funcionários de escritórios e empregados assalariados de empresas privadas há muito invejavam os vencimentos, status e privilégios superiores do funcionalismo público. Conhecidos popularmente como o “novo Mittelstand”, estavam, entretanto, profundamente divididos em termos de política, com organizações social-democratas rivalizando com as de extrema direita, e seus votos no Partido Nazista nos anos de Weimar não ficaram acima da média do país como um todo. Muitos esperavam que o Terceiro Reich estabelecesse mais uma vez as barreiras de status entre funcionários de escritórios e trabalhadores manuais que os anos anteriores haviam derrubado.

O medo da proletarização” havia sido uma importante força motriz dos sindicatos de funcionários de escritórios, seja de esquerda, centro ou direita. Mas eles ficaram amargamente decepcionados quando Hitler chegou ao poder. Os líderes das três alas políticas dos sindicatos de funcionários de escritórios foram detidos e colocados em campos de concentração, e os sindicatos, junto com todas as outras organizações da categoria, foram amalgamados na Frente de Trabalho Alemã16. Além disso, o fato de os operários e suas organizações serem formalmente integrados à comunidade nacional desmantelou mais uma barreira. Os funcionários de escritórios não possuíam as tradições de união ou a cultura distinta de que o trabalho organizado havia desfrutado no movimento social-democrata e em menor grau no comunista, de modo que eram mais vulneráveis à atomização e aterrorização e menos capazes até de resistência passiva17.
pág. 781-782
Ideias e políticas semelhantes podiam ser encontradas em outros países do centro-leste da Europa que lutavam para construir uma nova identidade nacional na época, mais notadamente Romênia e Hungria71. Esses países tinham movimentos fascistas próprios na forma da Guarda de Ferro na Romênia e da Cruz de Flecha na Hungria que pouco ou nada deviam aos nacional-socialistas alemães na virulência do ódio aos judeus; assim como na Alemanha, o antissemitismo ali também estava ligado ao nacionalismo radical, à crença de que a nação não havia atingido a realização plena e de que eram sobretudo os judeus que a impediam de chegar a ela.  

Na Romênia, havia cerca de 750 mil judeus no início da década de 1930, ou 4,2% da população, e, como na Polônia, eram contados como uma minoria nacional. Sob pressão crescente da Guarda de Ferro radical fascista no final dos anos de 1930, o rei Carol nomeou um regime de direita de curta duração que começou a sancionar a legislação antissemita que o monarca continuou a aplicar quando tomou o poder como ditador em 1938. Em setembro de 1939, pelo menos 270 mil judeus haviam sido privados da cidadania romena; muitos haviam sido expulsos da profissão, inclusive do Judiciário, polícia, ensino e corpos de oficiais, e todos estavam sob forte pressão para emigrar72.
pág. 813
Ribbentrop estava longe de ser um nazista de primeira hora. Durante a maior parte da República de Weimar ele compartilhou o ódio da maioria dos alemães de classe média pelo Acordo de Paz, desprezou o sistema parlamentar e ficou consideravelmente alarmado com a ameaça do comunismo, mas não gravitou para a extrema direita até 1932. Como membro do elegante Herrenclub, o clube de cavalheiros de Berlim frequentado pela aristocracia, inclusive Papen e seus amigos, Ribbentrop conheceu Hitler e envolveu-se nas complexas negociações que por fim levaram à sua nomeação como chanceler do Reich em janeiro de 1933. Para o provinciano Hitler, Ribbentrop, assim como Putzi Hanfstaengl, velho amigo íntimo do Líder nazista, parecia um homem do mundo, experiente em viagens ao exterior, poliglota, conhecedor da vida social. Hitler começou a usá-lo em missões diplomáticas especiais, ignorando o Ministério de Relações Exteriores, conservador e limitado pela rotina.

Indubitavelmente com a aprovação de Hitler, Ribbentrop montou um gabinete próprio independente, no estilo do escritório de Alfred Rosenberg, para desenvolver e influenciar a política de relações exteriores. Não demorou muito e tinha uma equipe de 150 pessoas engajadas em uma espécie de guerrilha institucional com os mandarins do Ministério de Relações Exteriores. O sucesso de Ribbentrop ao negociar o Acordo Naval Anglo-Alemão conferiu-lhe a reputação de se dar bem com os britânicos, e no fim do verão de 1936 Hitler nomeou-o embaixador em Londres, com a missão de melhorar ainda mais as relações e se possível produzir uma aliança anglo-alemã38.
Série: Nazismo de esquerda? Parte 1 (Richard J. Evans)

Notas:

Cap. 1 O ESTADO POLICIAL (Repressão e resistência)

44 Göring mais tarde declarou: “Estendi meu dever ao aplicar um golpe também contra esses descontentes”. Que ele tenha feito isso de modo espontâneo e por iniciativa própria ao ouvir falar dos eventos em Munique, conforme sustentaram alguns historiadores, é de se duvidar em vista do cuidado com que todo o restante da operação foi preparado e a veemência com que Hitler havia denunciado Papen e seus associados poucos dias antes. Para a ideia de que a ação foi “improvisada”, ver Longerich, Die braunen Bataillone, p. 218 (embora sua principal evidência, a afirmação de Göring, de fato não demonstre que ele decidiu “estender” sua tarefa espontaneamente e sem consultas; a necessidade de se explicar era óbvia, dado que a justificativa para o expurgo foi proporcionada pelas supostas atividades de Röhm, não de Schleicher e Papen); para evidência do cuidadoso planejamento de antemão, ver Bessel, Political Violence, p. 133-7. Mais detalhes em Kershaw, Hitler, I, p. 512-5; e Heinz Höhne, The Order of the Death’s Head: The Story of Hitler’s SS (Londres, 1972 [1966]), p. 85-121. Sauer, Die Mobilmachung, p. 334-64, nota o trabalho sistemático de preparação executado por Hitler e lideranças do Partido de abril em diante, ressaltando a importância da ofensiva da propaganda contra Röhm e a SA, particularmente dentro do Partido. Para Ballerstedt, ver Evans, The Coming of the Third Reich, p. 181. Para Ludendorff, ver Harald Peuschel, Die Männer um Hitler: Braune Biographien, Martin Bormann, Joseph Goebbels, Hermann Göring, Reinhard Heydrich, Heinrich Himmler und andere (Düsseldorf, 1982).

“Inimigos do povo” III

23 Para um levantamento exaustivo das variedades de teorias sobre criminalidade hereditária e parcialmente hereditária ou moderada, ver Richard Wetzell, Inventing the Criminal: A History of German Criminology 1880-1945 (Chapel Hill, NC, 2000), p. 179-232.

Cap. 2 - A MOBILIZAÇÃO DO ESPÍRITO. Esclarecendo o povo

47 Ver Reinhard Bollmus, Das Amt Rosenberg und seine Gegner: Studien zum Machtkampf im nationalsozialistischen Herrschaftssystem (Stuttgart, 1970).

48 Hildegard Brenner, Die Kunstpolitik des Nationalsozialismus (Reinbek, 1963), p. 7-21, 73-86, fornece uma boa narrativa.

28 Frederic Spotts, Bayreuth: A History of the Wagner Festival (New Haven, 1994), esp. p. 159-88; Brigitte Hamann, Winifred Wagner oder Hitlers Bayreuth (Munique, 2002); Hans Rudolf Vaget, “Hitler’s Wagner: Musical Discourse as Cultural Space”, em Kater e Riethmüller (eds.), Music and Nazism, p. 15-31.

3 Martin Niemöller, From U-Boat to Pulpit (Londres, 1936 [1934]), p. 143.
4 Ibid., p. 180-3, 187; James Bentley, Martin Niemöller (Oxford, 1984), p. 20-30, 39-40.

27 Léon Poliakov e Josef Wulf, Das Dritte Reich und seine Denker: Dokumente (Berlim, 1959), p. 73; Wilhelm Ribhegge, Geschichte der Universität Münster: Europa in Westfalen (Münster, 1985), p. 194.

28 Golczweski, Kölner Universitätslehrer, p. 338-49.

33 Ibid., p. 85-102; citação (93) das memórias não publicadas de Lenard, mencionada em Charlotte Schmidt-Schönbeck, 300 Jahre Physik und Astronomie an der Kieler Universität (Kiel, 1965), p. 119.

61 Hjalmar Schacht, My First Seventy-Six Years: The Autobiography of Hjalmar Schacht (Londres, 1955), p. 10-154.
62 Ibid., p. 155-306.

6 Gerald D. Feldman, Allianz and the German Insurance Business, 1933-1945 (Cambridge, 2001), p. 1-50.

1 Para uma ampla literatura, ver em particular Heinz-Gerhard Haupt (ed.), Die radikale Mitte: Lebensweisen und Politik von Kleinhändlern und Handwerkern in Deutschland seit 1848 (Munique, 1985); David Blackbourn, “Between Resignation and Volatility : The German Petty Bourgeoisie in the Nineteenth Century ”, em idem, Populists and Patricians: Essays in Modern German History (Londres, 1987), p. 84-113; Heinrich August Winkler, Mittlestand, Demokratie und Nationalsozialismus: Die politische Entwicklung von Handwerk und Kleinhandel in der Weimarer Republik (Colônia, 1972); Adelheid von Saldern, Mittlestand im “Dritten Reich”: Handwerker-Einzelhändler-Bauern (Frankfurt am Main, 1979).

16 Günther Schulz, Die Angestellten seit dem 19. Jahrhundert (Munique, 2000), p. 36-7; Michael Prinz, Vom neuen Mittelstand zum Volksgenossen: Die Entwicklung des sozialen Status der Angestellten von der Weimarer Republik bis zum Ende der NS-Zeit (Munique, 1986), p. 92-143, 229.

17 Prinz, Vom neuen Mittelstand, p. 334-5.

71 Mendelsohn, The Jews; Bela Vago, The Shadow of the Swastika: The Rise of Fascism and Anti-Semitism in the Danube Basin, 1936-1939 (Londres, 1975).

72 Mendelsohn, The Jews, p. 171-211; David Schaary, “The Romanian Authorities and the Jewish Communities in Romania between the Two World Wars”, em Greebaum (ed.), Minority Problems, p. 89-95; Paul A. Shapiro, “Prelude to Dictatorship in Romania: The National Christian Party in Power, December 1937-February 1938”, Canadian-American Slavic Studies, 8 (1974), p. 45-88.

38 Jacobsen, Nationalsozialistische Aussenpolitik, p. 298-318.

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quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Nazismo de esquerda? (Richard J. Evans) O que os Historiadores nos dizem sobre o Nazismo SER de (extrema) Direita - Parte 01

A quem perdeu o bonde", o Denilton, nos comentários do post sobre a morte de Ernst Nolte, perguntou se eu concordava que o nazismo foi de extrema-direita, e sobre se fazer um post pra mostrar aos "revis" (negacionistas) que o nazismo é de extrema-direita.

A quem estranhar de onde vem a questão ("Nazismo de direita ou esquerda"), com a expansão da internet no mundo(principalmente na segunda metade da década passada), com a sombra da derrocada da URSS (que caiu nos anos noventa, logo no começo) e o vácuo de poder e instabilidade que isso gerou, com a crise global do neoliberalismo (propagado principalmente pelos Estados Unidos desde sua ascensão como única superpotência, agora em crise interna e por conta da ascensão chinesa), grupos de extrema-direita (radicais) de cunho liberal passaram a disseminar na web a panfletagem de que o "nazismo é de esquerda". Um joguete retórico pra limpar a "mancha" da direita no século XX (principalmente a dos liberais) e a ligação (ou simpatia) da direita tradicional de vários países com os movimentos nazistas e fascistas (e ditaduras conservadoras nacionais), que são de direita. Alguém que está lendo este post não ouviu falar desta panfletagem antes? Vou colocar link da web em inglês com os termos pra verem como a coisa é bem difundida. Link:
nazism is leftist

Tem mais de uma combinação com esses termos, mas uma só basta (é só uma amostragem). Saiu há pouco um texto que menciona isso, também em cima da morte do Ernst Nolte (historiador alemão e de extrema-direita). A quem quiser ler (não foi possível traduzir, está em inglês), segue o link, só que não registrei a existência desse segundo blog aqui, depois comento sobre:
Ernst Nolte’s Revenge

Pois bem, eu já respondi o que penso na parte dos comentários (primeiro link do post), mas concordei que seria relevante fazer um post mostrando o que os historiadores da segunda guerra, nazismo etc descrevem/pensam sobre o que o nazismo é (o nazismo continua existindo com o neofascismo) ou "tenha sido" (o nazismo original), um movimento de extrema-direita (fascista).

Já havia pensado num post deste tipo antes mas... com a onda de extremismo da direita liberal "norte-americanoide" (que é hegemônica no país) que tomou conta do país (e isso desde aquelas malfadas marchas de 2013 (Tag: marchas de 2013), que pôs o país de ponta-cabeça), com direito a golpe de Estado e destruição da soberania do Brasil com um surto de vira-latice profunda (e burrice), bateu um desânimo se as pessoas neste país (a maioria) estão mesmo interessadas em aprender algo ou se só querem repetir idiotices (galhofas) que leem de "gurus" de internet ou youtubers pra encher o saco alheio ou tentar impor opinião sem embasamento algum, negando coisas ou distorcendo outras (ao gosto do "cliente").

Confesso que não tenho mais paciência pra discutir com esse tipo de perfil bitolado político que passou a achar que é detentor de uma certa "sabedoria" porque as "manadas" perderam a modéstia e enchem a "bola" desses caras, seguindo "gurus de internet", e de acharem que por gritar mais alto isso é suficiente pra terem algum tipo de "razão".

Independente destes fatos que mencionei acima, farei o post (ou posts), pois como os trechos são longos, acho que será melhor dividir os posts por historiadores (os de destaque) e trechos de seus livros mostrando o que descrevem ou pensam sobre o nazismo e dele ser de extrema-direita. Alguns desses livros foram lançados no país, mas, infelizmente, a "turba do urro" prefere ler ou ouvir astrólogos (gurus) e seus congêneres dizendo besteira na internet. Aqui vocês ficarão com o que historiadores de peso do nazismo pensam sobre a natureza do movimento e regime, a quem se interessar por "fantasias" e "devaneios" sobre segunda guerra, acho que há pilhas de site dessa natureza pela web pra vocês extravasarem essas touperices por lá, poupe-nos disso aqui.

Em um país normal eu acho que coisas como essa (o assunto do post) seriam encaradas como algo marginal (à margem) ou algo "excêntrico", uma vez que a imprensa de fora sempre cita grupos neonazis e neofascistas como extrema-direita e existe um entendimento melhor desses grupos, mas eu não estou em um país normal então não posso me dar ao luxo de ignorar o problema.

Saiu no país a trilogia sobre nazismo ou Terceiro Reich, do Richard J. Evans, e só no primeiro volume há várias passagens que mostra a posição ideológica do nazismo. Estou dizendo isso pois não dá pra copiar um livro inteiro e ainda tem mais dois volumes. Então, sem mais delongas, seguem alguns trechos do livro, primeiro volume.

Quem é Richard J. Evans, um dos mais prestigiados historiadores sobre nazismo da atualidade: professor régio de História na Universidade de Cambridge e presidente da Wolfson College, Cambridge.

Richard J. Evans - A Chegada do Terceiro Reich Vol. 1
___________________________________________________

pág. 17
A despeito de todas as impropriedades, a tentativa de entendimento de Meinecke levantou uma série de questões-chave que, conforme ele previu, continuaram a ocupar as pessoas desde então. Como uma nação avançada e altamente culta como a Alemanha pôde ceder à força brutal do nacional-socialismo tão rápida e facilmente? Por que houve tão pouca resistência séria à tomada nazista? Como pôde um partido insignificante da direita radical ascender ao poder com subitaneidade tão dramática? Por que tantos alemães fracassaram em perceber as consequências potencialmente desastrosas de ignorar a natureza violenta, racista e assassina do movimento nazista?18

As respostas para essas questões variaram amplamente ao longo do tempo, entre historiadores e comentaristas de diferentes nacionalidades, e de uma posição política para outra.19 O nazismo foi apenas uma de uma série de ditaduras violentas e implacáveis estabelecidas na Europa na primeira metade do século XX, uma tendência tão disseminada que um historiador referiu-se à Europa dessa era como um “Continente Sombrio”.20 Isso, por sua vez, levanta questões sobre até que ponto o nazismo estava enraizado na história alemã, e até que ponto, por outro lado, foi produto do desenrolar de acontecimentos europeus mais amplos, e a extensão em que compartilhava características centrais de origem e domínio com outros regimes europeus da época. Tais considerações comparativas sugerem ser
pág. 165
Nessa situação, uma unidade em pânico do Exército Vermelho começou a cometer atos de represália contra os reféns aprisionados em uma escola local, o Ginásio Luitpold. Estes incluíam seis membros da Sociedade Thule, uma seita pangermânica e antissemita fundada perto do fim da guerra. Nomeada em homenagem ao suposto local da pureza “ariana” última, a Islândia (“Thule”), a seita usava o símbolo da suástica “ariana” para denotar suas prioridades raciais. Com raízes na “Ordem Germânica” pré-guerra, outra organização conspiratória de extrema direita, era dirigida pelo pretenso barão von Sebottendorf, que na realidade era um falsificador condenado, conhecido pela polícia como Adam Glauer.

A sociedade incluía pessoas que viriam a ser proeminentes no Terceiro Reich.8 Sabia-se que Arco-Valley, o assassino de Kurt Eisner, havia tentado tornar-se membro da Sociedade Thule. Em um ato de vingança e desespero, os soldados do Exército Vermelho enfileiraram dez reféns, colocaram-nos diante de um pelotão de fuzilamento e os abateram. Entre os executados estavam o príncipe de Thurn e Taxis, a jovem condessa von Westarp e mais dois aristocratas, bem como um professor idoso que havia sido preso por fazer um comentário desfavorável sobre um cartaz revolucionário. Cinco prisioneiros capturados das Brigadas Livres invasoras completaram o grupo.
pág. 173
Os cursos que Hitler frequentou destinavam-se a arrancar quaisquer sentimentos socialistas remanescentes nas tropas regulares da Bavária e doutriná-las com as crenças da extrema direita. Entre os palestrantes estavam Karl Alexander von Müller, professor conservador de história de Munique, e Gottfried Feder, economista teórico pangermânico, que colocou um verniz antissemita na economia ao acusar os judeus de destruir o meio de vida de esforçados trabalhadores “arianos” usando o capital de forma improdutiva. Hitler assimilou as ideias desses homens tão prontamente que foi selecionado por seus superiores e enviado como instrutor em um curso semelhante em agosto de 1919. Ali, descobriu pela primeira vez o talento para falar a um grande público.

Os comentários daqueles que assistiram às suas palestras referiram-se de forma admirada à sua paixão e comprometimento e à sua capacidade de se comunicar com homens simples, comuns. Também foi notada a veemência de seu antissemitismo. Em uma carta escrita em 16 de setembro, Hitler expôs suas crenças sobre os judeus. Em uma metáfora biológica do tipo a que iria recorrer em muitos discursos e textos subsequentes, escreveu que os judeus provocavam “a tuberculose racial dos povos”. Rejeitou o “antissemitismo com base puramente emocional” que levou aos pogroms em favor de um “antissemitismo da razão”, que devia almejar “o combate e a remoção legislativos planejados dos privilégios dos judeus”. “A meta final e inabalável deve ser a remoção dos judeus por completo.”23
pág. 178
No final de 1920, a ênfase inicial de Hitler no ataque ao capitalismo judaico havia se modificado para ter como alvo o “marxismo” ou, em outras palavras, social-democracia e também bolchevismo. As crueldades da guerra civil e o “terror vermelho” de Lênin na Rússia estavam causando impacto, e Hitler pôde usá-los para garantir ênfase às visões comuns da extrema direita sobre a suposta inspiração judaica por trás dos levantes revolucionários de 1918-19 em Munique. Entretanto, o nazismo também teria sido possível sem a ameaça comunista: o antibolchevismo de Hitler era produto de seu antissemitismo, e não o contrário.33 Seus principais alvos políticos permaneceram os social-democratas e o espectro mais vago do “capitalismo judaico”.

Tomando emprestados os argumentos do repertório antissemita de antes da guerra, Hitler declarou em numerosos discursos que os judeus eram uma raça de parasitas que só podiam viver subvertendo outros povos, sobretudo a mais superior e melhor de todas as raças, a ariana. Assim sendo, eles dividiam e jogavam a raça ariana contra si mesma, por um lado organizando a exploração capitalista e por outro liderando a luta contra isso.34 Os judeus, disse ele em um discurso proferido a 6 de abril de 1920, deveriam “ser exterminados”; a 7 de agosto do mesmo ano, falou para a plateia que não deveria acreditar que “se possa lutar contra uma doença sem matar a causa, sem aniquilar o bacilo, nem pensar que se pode lutar contra uma tuberculose racial sem cuidar para que as pessoas fiquem livres da causa da tuberculose racial”. Aniquilação significava a remoção violenta dos judeus da Alemanha por quaisquer meios. A “solução para a questão judaica”, disse ele a seus ouvintes em abril de 1921, só poderia ser resolvida pela “força bruta”. “Sabemos”, disse Hitler em janeiro de 1923, “que, se eles chegarem ao poder, nossas cabeças vão rolar pelo chão; mas também sabemos que, quando pusermos nossas mãos no poder: ‘Que Deus então tenha piedade de vocês!’.”35
pág. 182
Àquela altura, esses homens e muitos mais como eles haviam se filiado ao Partido Nazista; o movimento novato tinha um programa oficial, composto por Hitler e Drexler com uma mãozinha do “economista racial” Gottfried Feder, e aprovado em 24 de fevereiro de 1920. Seus 25 pontos incluíam a exigência da “união de todos os alemães em uma Alemanha Maior”, a revogação dos tratados de paz de 1919, “terra e território (colônias) para alimentar nosso povo”, a prevenção de “imigração não germânica” e pena de morte para “criminosos comuns, agiotas, especuladores, etc.”. Os judeus deveriam ter os direitos civis negados e ser registrados como estrangeiros, e proibidos de possuir ou escrever em jornais alemães. Uma nota pseudossocialista era dada pela exigência da abolição de rendas indevidas, confisco de lucros de guerra, nacionalização dos cartéis empresariais e introdução da participação nos lucros. O programa concluía com a exigência da “criação de um poder estatal central forte para o Reich e a substituição efetiva dos parlamentos dos estados federados por corporações baseadas em estado e ocupação”.42 Era um documento de extrema direita típico da época. Na prática, não significava muita coisa, e, como o programa de Erfurt dos social-democratas de 1891, era com frequência desviado ou ignorado na luta política cotidiana, embora logo fosse declarado “inalterável”, para evitar que se tornasse um foco de dissensão interna.43
págs. 188-189
O nazismo inicial, portanto, assim como a miríade de movimentos rivais da extrema direita nos anos imediatos do pós-guerra, inseria-se firmemente nesse contexto mais amplo do surgimento do fascismo europeu. Por um longo tempo, Hitler fitou Mussolini com admiração, como um exemplo a seguir. A “marcha sobre Roma” galvanizou os movimentos fascistas nascentes da Europa, assim como a marcha sobre Roma de Garibaldi e a subsequente unificação da Itália haviam galvanizado os movimentos nacionalistas da Europa cerca de sessenta anos antes. A maré da história parecia mover-se na direção de Hitler; os dias de democracia estavam contados. À medida que a situação na Alemanha começou a se deteriorar com rapidez crescente ao longo de 1922 e 1923, Hitler começou a pensar que poderia fazer na Alemanha o mesmo que Mussolini havia feito na Itália. Quando o governo alemão não cumpriu os pagamentos de reparação e tropas francesas ocuparam o Ruhr, os nacionalistas da Alemanha explodiram de raiva e humilhação. A perda de legitimidade da república foi incalculável; o governo tinha que ser visto fazendo algo para se opor à ocupação. Uma campanha disseminada de desobediência civil, encorajada pelo governo alemão, levou a represálias adicionais por parte dos franceses, com detenções, prisões e expulsões. Entre muitos exemplos de repressão francesa, os nacionalistas lembravam como um veterano de guerra e ferroviário foi posto na rua e deportado com a família por proferir um discurso pró-alemão em um memorial de guerra; outro homem, um professor, sofreu a mesma sina após fazer seus alunos darem as costas quando tropas francesas passaram marchando.57

Gangues de estudantes raspavam a cabeça de mulheres que se acreditava que estivessem “vergonhosamente mantendo relações com os franceses”, ao passo que outros, de forma menos dramática, demonstravam seu patriotismo caminhando quilômetros até a escola em vez de viajar no trem operado pelos franceses. Alguns poucos trabalhadores tentaram de modo ativo sabotar a ocupação; um deles, Albert Leo Schlageter, um ex-soldado das Brigadas Livres, foi executado por suas atividades, e a direita nacionalista, guiada pelos nazistas, rapidamente agarrou o incidente como exemplo da brutalidade dos franceses e da fraqueza do governo de Berlim, transformando Schlageter em mártir nacionalista muito propagandeado nesse processo. A indústria foi paralisada, exacerbando ainda mais os já calamitosos problemas financeiros do país.58

Os nacionalistas tinham uma potente arma de propaganda na presença de tropas francesas coloniais negras entre as forças de ocupação. O racismo era endêmico em todas as sociedades europeias nos anos entreguerras, como também o era nos Estados Unidos e em outras partes do mundo. De modo geral, os europeus supunham que pessoas de pele escura eram seres humanos inferiores, selvagens a quem o homem branco tinha a missão de domar. 59 O uso de tropas coloniais por britânicos e franceses durante a Primeira Guerra Mundial havia estimulado um certo volume de comentários desfavoráveis na Alemanha; mas foi a presença delas no território alemão em si, primeiro na parte ocupada da Renânia, e a seguir em 1923, durante a breve marcha francesa para o Ruhr, que realmente abriu as comportas para uma vívida propaganda racista. Muitos alemães que viviam na Renânia e no Sarre sentiram-se humilhados, conforme um deles mais tarde explicou, por “siameses, senegaleses e árabes se terem feito de donos de nossa terra natal”.60 Dentro em pouco, os cartunistas estavam atiçando emoções racistas e nacionalistas ao produzir desenhos grosseiros, semipornográficos, de soldados negros bestiais levando embora mulheres alemãs brancas e inocentes para um destino pior que a morte. Na direita, isso tornou-se um potente símbolo da humilhação nacional da Alemanha durante os anos de Weimar, e o mito do estupro em massa de mulheres alemãs por tropas coloniais francesas tornou-se tão poderoso que as poucas centenas de crianças de raça mista que se encontravam na Alemanha no início da década de 1930 eram quase universalmente consideradas fruto de tais incidentes. Na verdade, a esmagadora maioria delas na verdade parecia resultar de uniões consensuais, frequentemente entre colonizadores alemães e nativos africanos das colônias alemãs antes ou durante a guerra.61
pág. 408
Um golpe militar, como muitos temiam, poderia ter levado à resistência violenta dos nazistas, bem como dos comunistas. Restaurar a ordem teria causado um tremendo banho de sangue, levando talvez à guerra civil. O Exército estava tão ansioso quanto os nazistas para evitar isso. Ambos os lados sabiam que suas perspectivas de sucesso se tentassem agarrar o poder sozinhos eram dúbias, para dizer o mínimo. A lógica da cooperação era, portanto, virtualmente inevitável; a única questão era qual forma essa cooperação assumiria. Por toda a Europa, elites conservadoras, exércitos e movimentos de massa radicais fascistas ou populistas encaravam o mesmo dilema. Eles o resolveram de várias maneiras, dando vantagem para a força militar em alguns países, como Espanha, e para movimentos fascistas em outros, como Itália. Em muitos países, as democracias foram substituídas por ditaduras nas décadas de 1920 e 1930. O que aconteceu na Alemanha em 1933 não parece tão excepcional à luz do que já havia acontecido em países como Itália, Polônia, Letônia, Estônia, Lituânia, Hungria, Romênia, Bulgária, Portugal, Iugoslávia ou, na verdade de forma bastante diferente, na União Soviética. A democracia em breve também seria destruída em outros países, como Áustria e Espanha.

Em tais países, violência política, tumultos e assassinatos haviam sido comuns em vários períodos desde o fim da Primeira Guerra Mundial; na Áustria, por exemplo, graves distúrbios em Viena haviam culminado no incêndio do Palácio da Justiça em 1927; na Iugoslávia, esquadrões da morte macedônios causavam devastação no mundo político; na Polônia, uma grande guerra com a União Soviética que nascia havia mutilado o sistema político e a economia e aberto caminho para a ditadura militar do general Pilsudski. Por toda parte, a direita autoritária também compartilhava da maioria das – se não de todas – crenças antissemitas e teorias conspiratórias que animavam os nazistas. O governo húngaro do marechal Miklós Horthy pouco devia à extrema direita alemã no ódio aos judeus, alimentado pela experiência do breve regime revolucionário liderado pelo judeu comunista Béla Kun em 1919. O regime militar polonês da década de 1930 viria a impor severas restrições à grande população judaica do país. Vistos no contexto da época, nem a violência política da década de 1920 e início da década de 1930, nem o colapso da democracia parlamentar, nem a destruição das liberdades civis teriam parecido particularmente incomuns a um observador desapaixonado. Tampouco tudo que aconteceu na sequência da história do Terceiro Reich tornou-se inevitável pela nomeação de Hitler como chanceler. Oportunidade e acaso viriam a desempenhar sua parte nisso também, como haviam desempenhado antes.121
Série: Nazismo de esquerda? Parte 2

Notas:

Do prefácio

18. Daí o catálogo de questões colocadas no início do clássico de Karl Dietrich Bracher Stufen der Machtergreifung, volume I de Karl Dietrich Bracher et al., Die nationalsozialistische Machtergreifung: Studien zur Errichtung des totalitären Herrschaftssystems in Deutschland 1933/34 (Frankfurt am Main, 1974 [1960]), p. 17-8.

19. Entre discussões muito boas da historiografia do nazismo e do Terceiro Reich, ver em especial o breve exame de Jane Caplan, “The Historiography of National Socialism”, em Michael Bentley (ed.), Companion to Historiography (Londres, 1997), p. 545-90; e o estudo mais longo de Ian Kershaw, The Nazi Dictatorship: Problems and Perspectives of
Interpretation (4ª ed., Londres, 2000 [1985]).

Parte 3 - A Ascensão do Nazismo

8. Large, Where Ghosts Walked, p. 70.

23. Hitler para Adolf Gemlich, 16 de setembro de 1919, em Eberhard Jäckel e Axel Kuhn (eds.), Hitler: Sämtliche Aufzeichnungen 1905-1924 (Stuttgart, 1980), p. 88-90; Ernst Deuerlein, “Hitlers Eintritt in die Politik und die Reichswehr”, VfZ 7 (1959), p. 203-5.

33. Ernst Nolte, Three Faces of Fascism: Action Française, Italian Fascism, National Socialism (Nova York, 1969 [1963]), e depois, de forma diferente e mais controversa, Der europäische Bürgerkrieg 1917-1945: Nationalsozialismus und Bolschewismus (Frankfurt am Main, 1987), argumentaram em favor da primazia do antibolchevismo.

34. Hitler, Mein Kampf, p. 289.

35. Tudo citado em Longerich, Der ungeschriebene Befehl, p. 32-4.

42. Citando Deuerlein (ed.), Der Aufstieg, p. 108-12.

43. Dietrich Orlow, The History of the Nazi Party, I: 1919-1933 (Newton Abbot, 1971 [1969]), p. 11-37.

57. AT 567, 199, em Merkl, Political Violence, p. 196-7.

58. AT 206, 379, ibid.; para um ângulo incomum do caso Schlageter, ver Karl Radek, “Leo Schlageter: The Wanderer in the Void”, em Kaes et al. (eds.), The Weimar Republic Sourcebook, p. 312-4 (originalmente “Leo Schlageter: Der Wanderer ins Nichts”, Die Rote Fahne, p. 144, 26 de junho de 1923). Para um relato detalhado da “resistência passiva”,
sublinhando suas raízes populares, ver Fischer, The Ruhr Crisis, p. 84-181; para o passado de Schlageter nas Brigadas Livres, Waite, Vanguard, p. 235-8; para o movimento de sabotagem organizado nos bastidores pelo Exército alemão, Gerd Krüger, “‘Ein Fanal des Widerstandes im Ruhrgebiet’: Das ‘Unternehmen Wesel’ in der Osternacht des Jahres 1923. Hingergründe eines angeblichen ‘Husarenstreiches’”, Mitteilungsblatt des Instituts für soziale Bewegungen, 4 (2000), p. 95-140.

59. Sander L. Gilman, On Blackness without Blacks: Essays on the Image of the Black in Germany (Boston, 1982).

60. AT 183, em Merkl, Political Violence, p. 193.

61. Gisela Lebeltzer, “Der ‘Schwarze Schmach’: Vorurteile – Propaganda – Mythos”, Geschichte und Gesellschaft, 11 (1985), p. 37-58; Keith Nelson, “‘The Black Horror on the Rhine’: Race as a Factor in Post-World War I Diplomacy”, Journal of Modern History, 42 (1970), p. 606-27; Sally Marks, “Black Watch on the Rhine: A Study in Propaganda,
Prejudice and Prurience”, European Studies Review, 13 (1983), p. 297-334. Para seu eventual destino, ver Reiner Pommerin, “Sterilisierung der Rheinlandbastarde”: Das Schicksal einer farbigen deutschen Minderheit 1918-1937 (Düsseldorf, 1979).

Parte 6 – A REVOLUÇÃO CULTURAL DE HITLER

121. Volker Rittberger (ed.), 1933: Wie die Republik der Diktatur erlag (Stuttgart, 1983), esp. p. 217-21; Martin Blinkhorn, Fascists and Conservatives: The Radical Right and the Establishment in Twentieth-Century Europe (Londres, 1990); idem, Fascism and the Right in Europe 1919-1945 (Londres, 2000); Payne, A History of Fascism, p. 14-9.

|***| Nazismo de esquerda? (Richard J. Evans) O que os Historiadores nos dizem sobre o Nazismo SER de (extrema) Direita - Parte 02

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