sábado, 30 de agosto de 2008

Porque ("revisionismo") não é Revisionismo

Um ensaio de Gordon McFee

Introdução

Este ensaio descreve, de uma perspectiva metodológica, alguns dos erros inerentes da abordagem "revisionista"(01) para a história do Holocausto. Não se tem intenção em ser uma polêmica, tampouco intenta atribuir motivos. Ao invés disto, busca explicar o erro fundamental na abordagem "revisionista", como também o porquê desta abordagem necessitar em não dar nenhuma escolha.

Conclui-se que o "revisionismo" é um termo equivocado devido aos fatos de não concordarem com a posição que apresentam e, em grande medida, sua metodologia inverte a abordagem apropriada para a investigação histórica.

O que é método histórico?

História é a narrativa registrada de eventos do passado, especialmente aqueles que acerca de um período particular, nação, indivíduo, etc. Reconta eventos com cuidadosa atenção a sua importância, suas relações em comum, suas causas e consequências, selecionando e agrupando eventos sobre o terreno de seus interesses ou importância.(2) Pode ser visualizado disto que a história reconhece a existência de eventos e fatos e busca entender como eles acontecem, no que eles resultam, como eles são interconectados e o que eles significam.

As distinções precisam ser feitas entre fatos, análise e interpretação. Fatos são comprovadamente eventos demonstrados de forma empírica cuja ocorrência pode pode ser provada usando métodos evidenciais. Análise é o método de determinar ou descrever a natureza de uma coisa por determinando-se dentro de suas partes. Interpretação é o intento de dar o significado de alguma coisa. Segue-se que aos fatos conduzem à análise que conduz à interpretação. E se segue que cada etapa no processo é mais subjetiva que a etapa anterior.

Neste contexto, a história é indutiva em sua metodologia, naquilo que acumula os fatos, tenta determinar sua natureza e suas conectividades e então intenta tecê-los dentro de um mosaico compreensível e com significado.

O que é revisionismo histórico legítimo?

Em seu nível mais básico, revisionismo não é nada mais que o apoio à revisão, o qual em si é o ato de revisar, ou modificar algo que já existe. Aplicado à história, isto significa que historiadores questionam a versão aceita das causas ou as consequências de eventos históricos. Como tal, é uma parte importante e aceita do esforço histórico que serve ao redobrado propósito da constante reexaminação do passado enquanto também aumenta nosso entendimento dele. Certamente, se alguém aceita que a história intenta nos ajudar a melhor entender o presente por uma melhor compreensão de como chegamos aqui, o revisionismo é essencial.

Três exemplos de revisionismo histórico legítimo devem bastar para ilustrar isto:

1. A.J.P. Taylor aplicou uma nova interpretação aos eventos que conduziram à segunda guerra mundial. Ele minimiza o papel de Hitler naqueles eventos - the Anschluß (Anschluss, anexação) com a Áustria, a anexação dos Sudetos, a crise de Danzig, o papel dos Aliados, o apaziguamento - comparados ao padrão de interpretação, enquanto retratou a Alemanha nazista como muito menos centralizada e monolítica que a regra. (3)

2. Daniel Jonah Goldhagen questionou virtualmente todas as interpretações habituais das razões para a cumplicidade de muitos alemães na perpetração do Holocausto, e assinalou aquele desejo próprio comum aos alemães que os envolvia devido a existência de um profundo e enraizado antissemitismo eliminacionista nos alemães daquela era. Ele minimiza, ou senão indiscutivelmente rechaça, a influência de Hitler e do Partido Nazista. (4)

3. O historiador alemão Christian Gerlach interpretou um diário de anotações de Joseph Goebbels e um recém descoberto diário de Heinrich Himmler para demonstrar que a data da decisão de Hitler para exterminar judeus foi em dezembro de 1941 ao invés do final do inverno ou início do verão como muitos até então acreditavam. (5)

O que fazem os "Revisionistas"?

"Revisionistas" partem de uma conclusão de que o Holocausto não ocorreu e trabalhar a reversão através de adaptar os fatos para que pré-ordenem a conclusão. Posto de outra forma, eles invertem a própria metodologia descrita acima, e deste modo voltando o próprio método histórico de investigação e análise nesta direção. Isto não quer dizer que historiadores nunca partam de um resultado preconcebido ou desejado; Eles frequentemente o fazem. Mas observando rigorosamente a metodologia correta, aceitam que o resultado de sua investigação pode não ser o que eles previram no início. Eles estão preparados para adaptar suas teorias àquela realidade. Certamente, eles são frequentemente requeridos a revisar suas conclusões baseadas em fatos. Para pôr isto trivialmente, "revisionistas" invertem os fatos baseados em sua conclusão.

Desde que os "revisionistas" partem da conclusão de que o Holocausto não ocorreu, i.e., eles negam sua existência e são frequentemente chamados de "negadores". Em vez de analisarem eventos históricos, fatos, suas causas e consequências e suas interações com outros eventos, eles defendem uma conclusão, independente dos fatos se sustentarem ou não.

O porquê deles fazerem isto não é objeto deste texto, mas pequenos exemplos das distorções, evasivas e negações forçam-nos a ilustrarem como intelectualmente desonesto isto é. E isto deveria ser relembrado, de que eles os forçam a isto, ao fato de que os "revisionistas" negarem uma ocorrência histórica distorcendo os fatos de acordo com aquela negação.

A Teoria de Conspiração

Desde que os fatos não estejam de acordo com a conclusão "revisionista", eles podem encontrar um ponto de vista mais abrangente ou uma forma de rechaça-los. Isto não é uma simples tarefa, desde que os fatos convirjam ao resultado de que os nazis tinham de fato um plano para exterminar o povo judeu europeu, alcançado em grande parte pela sua execução, e deixam pra trás numerosas evidências deste intento. (6)

Portanto, os "revisionistas" tem que alegar que há uma conspiração para fabricar todas aquelas evidências - uma conspiração que deu início a seu trabalho antes do final da guerra - e uma que continua até o presente. "Judiaria Organizada" ou muitas das variantes dos "Sionistas" estão na raiz desta conspiração. A teoria de conspiração manifesta os seguintes posições artificiosas:

. testemunhas sobreviventes mentiram, até onde sua evidência era corroborada por documentos ou outras fontes;

. evidência do perpetrador foi obtida através de tortura, medo por seus familiares ou falsificada de várias formas;

. documentos deixados pra trás pelos nazis foram falsificados, não querem dizer o que eles aparentam dizer, ou são forjados;

. fotografias foram falsificadas;

. filmes foram falsificados;

. palavras não querem dizer o que aparentam dizerem. Quando Himmler usou a palavra "ausrotten" (exterminar) em relação aos judeus, ele não quis dizer realmente "exterminar". Quando Hitler usou a palavra "vernichten" (aniquilar) em relação aos judeus, ele não quis realmente dizer "aniquilar". Quando os Einsatzgruppen falaram das mulheres e crianças judias assassinadas, eles realmente queriam dizer partisans, mesmo que partisans tivessem listas separadas nos muitos relatórios que eles deixaram pra trás;

. discursos gravados foram falsificados. O discurso de 1943 de Himmler em Posen, que foi gravado, não era realmente sua voz, ou partes foram adicionadas mais tarde, ou a tecnologia para gravar não existia em 1943 (ou existia), ou discordava das notas de Himmler para o discurso(ou não);

as vítimas eram responsáveis por aquilo que ocorreu a elas. As mulheres e crianças judias eram partisans ou eram culpados de cometerem crimes atrozes, ou ambos;

Judeus mereceram o tratamento duro de qualquer forma. Mesmo que o Holocausto tivesse ocorrido, e isto seria contudo justificado porque os judeus são alienígenas, raça parasita, determinados em destruir o nobre ariano, e/ou profanarem seu sangue, etc.;

. se nenhuma ordem escrita por Hitler para o Holocausto pode ser encontrada, não houve nenhuma ordem para isto;

. nenhuma câmara de gás está funcionando atualmente. portanto, nunca houve câmaras de gás. Mas mesmo que tivessem existido câmaras de gás, elas foram usadas apenas para fumigar roupas, mesmo que elas estivessem num depósito de cadáveres.

Falsus in Uno, Falsus in Omnibus(Falso em um ponto, falso em todos)

Desde que, como esta lista mostra, uma quantidade de evidências empíricas para o Holocausto são tão claras e devastadoras, os "revisionistas" tem que se lançar em outro truque para desqualificação. Isto tem sido chamado de condição "falsus in uno, falsus in omnibus" (uma prova errada equivale a todas as provas estarem erradas). Isto quer dizer, por exemplo, que se qualquer singular pedaço de evidência de sobrevivente puder ser apresentada como errada, todas as evidências dos sobreviventes estarão erradas e isto pode ser rechaçado. Se qualquer oficial nazista mentiu sobre um aspecto do Holocausto(dentro da questão ou não), todos os oficiais nazistas mentiram, e qualquer coisa que os nazistas disseram depois da guerra é rechaçado. Se qualquer nazista puder ser mostrado por ter sido torturado ou maltratado, todos eles foram e qualquer coisa que disseram é inválida.

Conclusão

O "revisionismo" é obrigado a se desviar do padrão metodologia histórico perseguido, porque busca moldar fatos para se adequar a um resultado preconcebido, nega eventos que foram objetivamente e empiricamente provados que ocorreram, e porque funciona ao reverso, da conclusão para os fatos, de modo a necessitar da distorção e manipulação daqueles fatos onde eles diferem da conclusão preordenada (algo que eles quase sempre fazem). Em poucas palavras, o "revisionismo" nega alguma coisa que de forma demonstrável aconteceu, através de desonestidade metodológica.

Sua desonestidade ética e motivação antissemita são questões que ficam para outro dia.

Notas

01. As menções sobre os "revisionistas" não são apenas citações. Elas indicam que metodologicamente os "revisionistas" não são o que eles afirmam ser. Isto é explicado em detalhe ao longo do ensaio.

02. Funk & Wagnall's Standard Dictionary of the English Language, Volume 1, New York, 1973, p. 599.

03. A.J.P. Taylor, The Origins of the Second World War, Penguin Books, Middlesex, 1964.

04. Daniel Jonah Goldhagen, Hitler's Willing Executioners: Ordinary Germans and the Holocaust(Carrascos Voluntários de Hitler), Alfred A. Knopf, New York, 1996.

05. Die Zeit, edition of January 9, 1998. Seus achados são reportados em Zeitschrift Werkstatt Geschichte, Heft 18/1997.

06. Ver a propósito "Hilberg, The Destruction of the European Jews; Gilbert, The Holocaust; Yahil, The Holocaust; Dawidowicz, The War Against the European Jews 1933-1945; Breitman, The Architect of Genocide; Less, Eichmann Interrogated; Fleming, Hitler and the Final Solution; Broszat et al., Anatomie des SS-Staates;" e muito mais.
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Leitura sugerida: de Pierre Vidal-Naquet, A Paper Eichmann: Anatomy of a Lie(Um artigo para Eichmann: Anatomia de uma Mentira), em particular a parte 4, On the Revisionist Method(Sobre o método "revisionista").

Gordon McFee concluiu seu mestrado em 1973, na Universidade de New Brunswick, Canadá, e na Universidade de Albert Ludwigs, Freiburg im Breisgau, Alemanha (estudos separados), em história e alemão.

Última modificação: 15 de maio de 1999
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Fonte: The Holocaust History Project
http://www.holocaust-history.org/revisionism-isnt/
Tradução: Roberto Lucena

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