quarta-feira, 6 de junho de 2012

O Holocausto tcheco chega ao leitor espanhol pela mão de Arnošt Lustig

05-06-2012 14:17 | Daniel Ordóñez

Arnošt Lustig (Arnost Lustig) refletiu em 'Uma Oração por Kateřina Horovitzová’ a ânsia de sobrevivência do ser humano ante uma situação extrema como os campos de concentração nazis, que o próprio autor sofreu. O livro, recém publicado em espanhol, também mostra os sentimentos de culpa que acompanharam àqueles que viveram para contá-lo, além de como transcorreu na Tchecoslováquia o extermínio da população judaica.

Download da mp3 (podcast) (em espanhol)

Arnošt Lustig
Durante o recente festival fechado Nueve Puertas, das culturas tcheca, alemã e judaica, que este ano pela primeira vez foi celebrado além de Praga também em cidades espanholas, foi apresentada em Madrid uma das obras mais conhecidas de Arnošt Lustig, falecido em 2011.

‘Una Oración por Kateřina Horovitzová’ é lançada em espanhol quase 50 anos depois de ser lançada em tcheco. A tradutora para o espanhol do livro, Patricia Gonzalo de Jesús, nos apresenta a trama.

Num grupo de homens de negócios judeus-americanos que estavam na Itália a negócios, o chefe deles, em troca de dinheiro, salva a vida de uma das judias que estavam nas estações dos trens que iam para os campos de concentração, aquela que se chama Kateřina Horovitzová. Aqui surge um dilema moral porque Kateřina obviamente não quer morrer e decide aceitar esta oferta de ser resgatada, mas por sua vez pesa em sua consciência o fato de ter deixado pra trás sua família. Ela tenta justificar esta decisão mas adiante como mera questão de sobrevivência, como uma forma de ter mais possibilidades de resgatar sua família mais pra frente”.

Arnošt Lustig assegurava que esboçou todo o livro em uma só noite a luz de vela. A complexidade da realidade dos personagens está presente em uma obra que não permite visões simplistas com as quais se retrata com frequência capítulos trágicos da Segunda Guerra Mundial.

Ao longo de todo o livro há uma ambiguidade moral. Nunca sabemosse o que fazem os personagens, e sobretudo a protagonista, é correto ou incorreto, branco no preto. Sempre ao longo do livro nos movemos melhor pelas grises, e só ao final podemos fazer nosso juízo. Planta um dilema moral interesante, ou seja, o que um considera que é correto ou incorreto desde a ética individual de cada um, e o que se vê obrigado fazer para sobreviver em uma circunstância determinada que um consegue superá-la".

Patricia Gonzalo de Jesús

Patricia Gonzalo
de Jesús
Patricia Gonzalo de Jesús destaca também o que levou a Lustig escrever o livro. Uma história que contou e o próprio autor em uma de suas últimas viagens, a que ele fez à Madrid para falar com seus leitores, meses antes de morrer.

Eu creio que o mais interessante do livro, à parte do livro em si, é como ele surgiu. É uma história que Arnost Lustig nos contou em sua visita à Madrid, tanto ao editor Enrique Redel como para mim, e creio que foi um pouco o que motivou a Enrique publicar o livro. Quando lhe perguntavam como pode alguém seguir vivendo depois de uma experiência nos campos de concentração, ele sempre dizia que para continuar vivendo com certa normalidade tinha várias motivações. Uma era que ao contrário de seus companheiros, sua mãe também havia regressado dos campos de concentração”.

‘Una Oración por Kateřina Horovitzová’ foi uma espécie de regalo a sua mãe, prossegue a tradutora.

O filme ‘Una Oración por Kateřina Horovitzová’

Em relação a sua mãe precisamente surge o livro. Ao que parece, uma vez estabelicido o regime da Alemanha do pós-guerra começaram a levar a cabo questões para devolver aos judeus parte de seus objetos pessoais, tanto os confiscados em geral, mas também os requisados nos campos de concentração. Uma das coisas que se pretendia devolver eram as alianças de matrimônio. O caso é que para que isso fosse devolvido havia que apresentar não só a certidão de casamento, como também o cerificado de defunción ou a garantia de que essa pessoa havia morrido nesse campo de concentração e esse objeto lhe pertencia, algo que pelo sistema que havia nos nos campos de concentração era absolutamente impossível demonstrar."

Depois da alegria inicial de pensar que ia recuperar estes objetos de tanto valor sentimental, sua mãe estava desconsoloda, contava Lustig.

Arnošt Lustig llhe disse que aquilo era o que esperava por parte das pessoas que haviam sido capazes de fazer o que haviam feito. Mas por respeito a sua mãe e a outras mulheres fortes que haviam sobrevivido aos campos de concentração, e que com seu comportamento haviam sido um exemplo para os demais, decidiu escrever um livro no qual a protagonista era uma mulher, uma mulher justa".

Retornando à obra, Patricia Gonzalo de Jesús acrescenta também seu valor histórico, ao abordar uma nova visão sobre o Holocausto. Um termo, por certo, que o próprio Lustig detestava para se referir à Solução Final nazi, já que considerava que isso havia sido sencillamente um genocídio, em contraposição ao sacrifício religioso que aparece na Bíblia como 'holocausto'.

Talvez o tema do Holocausto de outros países seja mais conhecido, mas o que aconteceu na Tchecoslováquia não é um tema de algo que tenha sido traduzido muito para o castelhano, no que é bom que comecem a serem lançados autores na Espanha sobre a questão judaica da República Tcheca."

Outro atrativo do livro é a estrutura não cronológica da história, assim como os múltiplos personagens nos quais sucessivamente se vai centrando a novela. Um prazer para o leitor, e mais que um quebra-cabeças para a tradutora, conta Patricia Gonzalo.

O livro tem um estilo muito complicado, porque há contínuos flashforward e flashback (avanços e retornos ao passado). Ou seja, continuamente nos movimentos de frente para trás e de trás para frente. Ainda que siga uma estrutura de narração linear, de certo modo estamos recordando coisas que ocorreram antes e também se adiantam algumas coisas que ocorrerão depois. Com o qual encontrar uma forma de unir tudo isso e que o leitor não se perca resulta em algo um pouco complicado. Também porque essas recordações e impressões que adiantamos que acontecerão depois, não são adiantadas pelo narrador senão a partir das recordações dos personagens individuais, da forma que é como se fôssemos saltando da mente de um personagem até a mente de outro continuamente, tanto dos prisioneiros, como dos soldados e os oficiais da SS. E bem, o estilo do próprio Lustig em si é muito elaborado, com o qual se requer tempo."

‘Una Oración por Kateřina Horovitzová’, lançada pela Editora Impedimenta, é a terceira obra publicada em espanhol de Arnošt Lustig, depois de ‘Ojos Verdes’(Olhos Verdes) e ‘Sueños Impúdicos’(Sonhos Impúdicos).

Fonte: Radio Praha
http://www.radio.cz/es/rubrica/cultura/el-holocausto-checo-llega-al-lector-espanol-de-la-mano-de-arnost-lustig
Tradução: Roberto Lucena

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