segunda-feira, 21 de março de 2016

Planejando o extermínio e a necessidade do trabalho forçado

Nos territórios orientais ocupados, a Wehrmacht, a SS e a administração civil tiveram complexas relações de cooperação e tensão. Eles cooperaram em ações de matar, mas também tiveram conflitos acerca do quanto do trabalho judaico seria preservado em cada fase do genocídio. Abaixo estão duas citações contemporâneos de figuras alemãs de destaque na região da Bielorrússia que fornecem insights sobre esses processos.

O primeiro extrato vem do KdS de Minsk, Strauch, que já fora discutido nesses posts. Em abril, entre 08-10 de 1943, Strauch participou de uma reunião do conselho gebiedscommissies (comitê de área) em Minsk em que ele fez a seguinte declaração:
Quando a administração civil chegou já encontrou empreendimentos econômicos operados pela Wehrmacht, auxiliados por judeus. Numa altura em que os bielorrussos queriam matar os judeus, a Wehrmacht os explorava e preservava. Dessa forma os judeus chegaram a posições-chave e é difícil hoje removê-los completamente, porque as empresas são susceptíveis de ser destruídas, algo que não podemos nos permitir. Eu sou da opinião de que podemos dizer com confiança que dos 150.000, 130.000 já desapareceram. 22.000 ainda estão vivos na área da Gebietskommissariat [fonte: YV TR-10/808, citado por Cholawsky, pág.64].
Strauch sugeriu que a metade (11,000) poderia ser removida sem causar dificuldades indevidas:
Por isso, quero solicitar de você que, ao menos, o judeu desapareça a partir do lugar onde ele seja supérfluo. Não podemos concordar com mulheres judias polindo sapatos ... Vamos cortar o número pela metade sem causar dificuldades econômicas.
Strauch ficou frustrado pelo fato de que os judeus não poderiam ser removidos completamente mas ele ainda se sentiu confiante o suficiente para solicitar uma redução de 50% numa população que já tinha sido reduzida de 150.000 para 22.000.

Esta vontade de superar as restrições de trabalho forçado (escravo) foi também compartilhada por alguns líderes civis, que estavam sob pressão para reduzir as pressões sobre a oferta de alimentos. Houve um equilíbrio delicado entre ver os judeus como trabalhadores essenciais e os ver como comedores inúteis; e os administradores que eram mais alinhados fanaticamente ao dogma antissemita nazista estavam inclinados para finalmente chegar à última perspectiva. Isso é mais evidente no relatório escrito pelo Gebeitskommissar para Slonim, Gerhard Erren, em 25 de janeiro de 1942, onde declarou que:
[...] Após a minha chegada aqui, havia cerca de 25.000 judeus na área de Slonim, 16.000 na própria cidade, tornando-se mais de dois terços da população do total da cidade. Não foi possível a criação de um gueto, como nem arame farpado ou guardas de mão de obra estavam disponíveis. Então, imediatamente, comentei os preparativos para uma ação em larga escala. Primeiramente toda propriedade foi expropriada e todos os edifícios oficiais alemães, incluindo os bairros da Wehrmacht, foram equipados com o mobiliário e equipamentos que haviam sido disponibilizados ... os judeus foram então registrado com precisão de acordo com número, idade e profissão e todos os artesãos e trabalhadores com qualificações foram escolhidos e foram dados passes e alojamento separados para distingui-los dos outros judeus. A ação realizada pelo SD em 13 de Novembro livrou-me das bocas desnecessárias para alimentar. Os cerca de 7.000 judeus agora presentes na cidade de Slonim foram todos alocados em postos de trabalho. Eles estão trabalhando voluntariamente por causa do medo constante da morte. No início do próximo ano, eles serão rigorosamente verificados e classificados para uma redução adicional [...]

[...] O melhor dos trabalhadores qualificados entre os judeus serão obrigados a repassar suas habilidades para aprendizes inteligentes em minhas faculdades de artesanato, então os judeus finalmente serão dispensáveis no setor setor de comércio e ofícios especializados e poderão ser eliminados.
Erren não só viu a necessidade do trabalho judaico como temporária, ele tomou medidas proativas para assegurar que não-judeus seriam treinados no artesanato atualmente ocupados por judeus, "de modo que os judeus finalmente serão dispensáveis nos ofícios especializados e setor de comércio e poderão ser eliminados."

No caso de Slonim, portanto, o momento dos atos genocidas foi cuidadosamente planejado, e poderia ser implementado sem a resistência, porque a administração civil e a SS estavam de acordo. No caso de Minsk, pelo contrário, a SS (Strauch) teve de negociar com a administração civil (Kube), e a Wehrmacht, que era o principal empregador da comunidade judaica na região, e assim o ritmo da matança foi mais lento.

Fonte: Holocaust Controversies
http://holocaustcontroversies.blogspot.com.br/2009/04/extermination-planning-and-forced.html
Texto: Jonathan Harrison
Título original: Extermination Planning and Forced Labour Needs
Tradução: Roberto Lucena

4 comentários:

João P. Santos disse...

caros, chegaram a assistir este programa da Globo sobre neonazismo no Brasil?
https://www.youtube.com/watch?v=YWSCdCZ6W74

gostaria de saber o que teriam a dizer do conteúdo do programa.

Roberto disse...

João, vou tentar, mas não prometo, comentar esse arsenal de esterco feito pela Rede Goebbels, ops, Rede Globo (rs) novamente criando sensacionalismo (em vez de informação rigorosa) sobre neofascismo no país. O vídeo recai no de sempre, torna uma caricatura o problema no país e não vai à raiz do problema que é justamente a estrutura racista do país que põe abaixo essa ideia de "país da democracia racial", mito propagado no varguismo principalmente e que perdura até hoje.

Digo que vou tentar porque dá asco assistir a qualquer coisa dessa emissora golpista que está envolvida até o talo na tramoia do golpe atual em curso no país. Se a Globo quer parecer "boa" pra população com esse tipo de programa ridículo, não vai colar mais. Eu já havia visto o vídeo (pela internet) porque não assisto a Globo ou a maioria dos canais abertos do país, mas é duro assistir o vídeo de tanto sensacionalista e sem crítica à ação dessas instituições que teoricamente "cuidam" dos casos e só buscam holofotes com isso.

Mas acho que andaram lendo esse blog pois citaram coisas que eu digo por aqui ou que já rolou em discussões com esses "neobobos" na rede como o de terem cuidado de apontar o que significa o termo "neo" (novo) sobre o nazismo, e também sobre a questão de como chegaram ao número de 150 mil "neonazis" no país (no vídeo aumentam pra 180 mil) sem informar como os dados do que é baixado são fornecidos, pois isso é restrito a provedor de internet e a menos que se tenha algum mandato pra apurar isso, é obtuso saber como chegaram a esse montante, fora a bizarrice que já comentei que é o de se alegar que quem baixa um arquivo automaticamente é "neonazi" ou coisa parecida. Gostaria realmente de entender como alguém quer combater esse tipo de ideologia extremista, vai combater sem ler nada sobre nazismo e neonazismo. É uma lógica tão distorcida que chega a ser ridículo comentar algo tão banal (óbvio, lógico).

A Globo mais desinforma, com um sentimentalismo barato (apelo emocional) do que ajuda à população a compreender algo.

Roberto disse...

E só completando porque não sei se vai rolar post sobre isso, então me antecipo. Quando digo que não existe "nazismo" ou neonazismo no país é porque Nazismo é pra alemães. Esse povo que se proclama "nacional-socialista", todos eles, são alemães ou descendentes? Pelo que eu via no Orkut e fora, a resposta é um claro 'não'.

Mas então o que seriam? O nome mais adequado seria neofascismo (copiando o nazismo alemão) ou mesmo um tipo de hooliganismo (https://pt.wikipedia.org/wiki/Hooliganismo). Um bando de descerebrados que "curtem" violência, leem porcamente, veem nessa estética nazista uma forma de "intimidar" o povo ou se autoafirmar (no fundo esse pessoal sofre de complexo de inferioridade crônico e problema identitário com o país) e saem repetindo/copiando os símbolos sem nem saber o que significam de fato.

Isso explica muito melhor o fenômeno no país (espero que se algum deles, que sei que leem esse site, leiam isso aqui, dê os créditos depois em vez de saírem repetindo como se tivesse chegado à conclusão "sós") que essas explicações bizarras de "nazis brasileiros" sem sangue alemão. Por isso que é de deixar de cabelo em pé essas matérias que não conseguem explicar um troço tão banal como esse. Deixo a indicação de ler a matéria com o historiador gaúcho René Gertz sobre o problema, ele também critica a banalização desse termo "neonazista" e o uso disso sobre uma caricaturização do Rio Grande do Sul.

O maior contingente desses bandos ou de grupos de extrema-direita se situa em São Paulo, não no Rio Grande do Sul. É só ver a micareta coxinha a favor do golpe e dos corruptos tucanos da lista da Odebrecht na Av. Paulista pra saber onde é o epicentro desse extremismo de direita no país.

Roberto disse...

Desculpando-me por me alongar, mas é que pra não ficar sem comentário, é melhor fazer algum logo do que ficar sem nenhum, mas o vídeo também aborda a questão da publicação do Mein Kampf (Minha Luta). Já abordei a questão nos posts sobre o livro no blog, pode procurar pelo termo "Mein Kampf" que acha fácil.

O que eu disse é que o pessoal que está proibindo isso está numa realidade paralela ao do mundo real. A coisa mais fácil de achar na internet é esse livro, em vários idiomas. É simplesmente absurdo acharem que só há circulação do livro em formato físico (papel) ou mesmo que esse livro seja o principal ou mais perigoso sobre nazismo e racismo. Os "Protocolos dos Sábios de Sião" é muito mais perigoso que esse livro e não se vê celeuma sobre isso, ou mesmo uma grita sobre as pilhas de diários de outros nazistas já lançados.

É o tipo de posicionamento fadado ao fiasco e a proibição soa sim como censura, por uma falta de reflexão do que se passa, pois a tentação de se proibir é mais fácil do que a de combater pelo conhecimento, informação esse tipo de coisa, como fizeram/fazem nos EUA com sites como o Hdot (http://www.hdot.org/), o The Holocaust History Project e mesmo o Holocaust Controversies (blog) discutindo livremente o assunto repassando informação relevante pro povo (a quem se interessa, já que ninguém "aprende por osmose").

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