Walter Rauff, ao ser detido pela polícia chilena, em dezembro de 1962 |
O criador das "câmaras de gás móveis"
Walter Rauff era em 1933, quando o partido nazi ascendeu ao poder, um oficial da Marinha de Guerra, com o posto de tenente e a idade de 27 anos. Aí conhecera anteriormente o famigerado Reinhard Heydrich, também oficial da Marinha. Quando este passou a chefiar o RSHA (Serviço Central de Segurança do Reich, que reunia várias polícias) chamou Rauff para o seu lado e fez dele um dos seus braços direitos.
Depois de um breve interregno em que regressara à Marinha, Rauff retomou as funções policiais e continuou a sua ascensão meteórica, mesmo depois de a resistência checa ter liquidado o seu protector Heydrich. Em 1945, no final da guerra, com 39 anos, atingira a patente de coronel.
Entre as façanhas que lhe permitiram essa ascensão conta-se o desenvolvimento das câmaras de gás móveis, utilizadas para matar prisioneiros judeus e deficientes físicos ou mentais. As vítimas eram mortas por sufocação em camiões fechados, em que se lançava gases tóxicos. O equipamento foi usado primeiro no campo de concentração de Sachsenhausen, e depois também na capital lituana, Riga, e em campos de extermínio em Chelmno (Polónia) e Poltava (Ucrânia). Até serem substituídas pelas grandes instalações destinadas ao extermínio, as câmaras de gás móveis custaram a vida a um número de pessoas que é calculado entre 97.000 e 200.000.
Do Norte de África a Itália
Nessa fase, Rauff fora destacado para o Norte de África, à cabeça de um Einsatzkommando, que era suposto proceder ao extermínio dos judeus à medida que o Afrikakorps de Rommel fosse avançando no terreno. Na Tunísia, Rauff levou ainda a cabo verdadeiros massacres contra a comunidade judaica local.
Na fase final da guerra, esteve no norte de Itália e participou activamente na repressão contra a resistência em Milão, Turim e Génova. Aquando da insurreição de Milão, esteve a ponto de ser linchado por uma multidão e escapou por pouco. Foi depois capturado pelas tropas norte-americanas, que o deixaram fugir do campo de prisioneiros de Rimini. Segundo a sua ficha na CIA, ele pôde então esconder-se em conventos locais graças ao apoio do bispo católico Alois Hudal.
Espião duplo para a Síria e para Israel
Depois da fuga, Rauff foi recrutado para os serviços secretos sírios por um certo capitão Akram Tabara e partiu para Damasco, onde ficou, a partir de 1948, ao serviço do presidente sírio Hosni Zaim. Foi temporariamente detido na sequência de um golpe de Estado que derrubou Zaim, mas acabou por ser libertado e deixar o país.
A arregimentação de Rauff para os serviços secretos sírios, numa fase em que este e outros regimes árabes se encontravam em pé de guerra com o recém-nascido Estado de Israel, surgia, entretanto, ao senso comum como prova de uma convergência entre esses regimes e os restos do nazismo contra um inimigo comum.
As revelações de Elam e Whitehead
Mas o jornalista judeu Shraga Elam e o seu colega norte-americano Dennis Whitehead desenterraram há três anos documentos que lançavam uma nova luz sobre a história. Segundo esses documentos, então divulgados no diário israelita Haaretz, Rauff terá estado simultaneamente sob as ordens dos serviços secretos israelitas. Essa ligação era já conhecida da CIA em 1950.
Segundo o historiador residente do Haaretz, Tom Segev, Rauff já terá ido para a Síria sob ordens israelitas. Era precisamente o seu passado de criminoso do Holocausto que o tornava, aos olhos dos sírios, insuspeito de alguma simpatia pelo Estado de Israel.
Ainda segundo Elam e Whitehead, Rauff foi depois para o Egito sob ordens israelitas, com o plano de organizar o assassínio de diversas figuras políticas inquietantes para Israel. Mas o plano não chegou a concretizar-se e Rauff partiu então para a América Latina, com a ajuda dos serviços secretos israelitas.
No Chile, ao serviço da espionagem alemã
Na América Latina, Rauff estabelceu-se no Chile, como comerciante de gado. Foi aí que o BND o recrutou, com o intuito de obter informações provenientes da Cuba revolucionária. Aparentemente, a actividade de Rauff saldou-se num fracasso e decepcionou o seu novo patrão - os serviços secretos alemães. Por isso chegou a ser-lhe cortado o vencimento, segundo Klaus Wiegrefe em Der Spiegel.
Em 1962, a política falou mais alto que a polícia e o Governo da Alemanha Federal pediu ao Chile a extradição de Rauff. O refugiado foi temporariamente detido, mas o Supremo Tribunal chileno recusou o pedido de extradição, a pretexto de os crimes em causa já terem prescrito segundo a lei chilena, e mesmo a chegada ao poder de Salvador Allende não mudou a segurança que o país oferecia ao criminoso nazi.
Com o golpe de Estado de Pinochet circularam rumores sobre uma activa participação de Rauff no aparelho repressivo da ditadura. Novos pedidos de extradição foram, em todo o caso, rejeitados por Pinochet. Um provinha de Israel, em 1984, outro de uma especial amiga do ditador, Margareth Thatcher. Mas foi também em 1984 que Rauff morreu - enterrado com honras e rituais nazis pela comunidade germânica refugiada no Chile.
Fonte: RTP(Portugal)
http://www.rtp.pt/noticias/?t=Criador-das-camaras-de-gas-moveis-era-triplo-espiao.rtp&article=482924&visual=3&layout=10&tm=7
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