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quinta-feira, 7 de julho de 2016

Nota sobre o envolvimento do OSS (ASE) na localização dos documentos PS-501 das vans de gaseamento

A seguinte informação foi obtida das páginas 179-182 do livro de Michael Salter a respeito de quatro documentos que pertencem ao PS-501 exibido em Nuremberg, discutidas nesta série por Hans. A primeira participação da OSS (ASE)* era de localizar os documentos entre os detidos pela inteligência britânica em Londres. Um cabo de Donovan para Jackson, datado de 01 de junho de 1945, detalhou o papel do Coronel Amen na obtenção de "documentos (originais) que contêm detalhes do gás pela "van da morte" equipada por esse propósito [Salter pág.180, citando cabo 18124 , 6/1/45, Jackson Papers, Box 101, Reel 7, grifo meu].

Estes foram colocados em um dossiê preparado pelo bando X-2 da OSS (ASE) e, eventualmente, pego por Whitney Harris, que discute aqui (págs. 198-199) como ele os usou no interrogatório de Ohlendorf enquanto preparava-se para o caso contra Kaltenbrunner. Os documentos também foram autenticados por Rauff (link2) em Ancona, como Hans mostra aqui. Embora o documento Becker-Rauff tenha se tornado parte do PS-501, ele foi inicialmente apresentado pela OSS (ASE) como Feldpostnummer S2704/ SECRETO. Rauff deu uma confirmação ainda muito mais detalhada do documento no Chile, em 1972, mostrada aqui.

Na lamentação de Weckert e outros sobre as origens desses documentos, remeto os leitores à citação de Zimmerman no post do Roberto (Muehlenkamp) aqui.

*OSS (ASE): Office of Strategic Services, abreviação "OSS" (Agência de Serviços Estratégicos), precursora da CIA.

Fonte: Holocaust Controversies
http://holocaustcontroversies.blogspot.com/2016/05/note-on-involvement-of-oss-in-locating.html
Texto: Jonathan Harrison
Título original: Note on Involvement of OSS in Locating Gas Van Documents PS-501
Tradução: Roberto Lucena

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Depoimento de August Becker, Ph.D, inspetor das vans de gaseamento

Até cerca de 1941 eu estava envolvido com o programa de eutanásia em Oberdienstleiter no departamento de Viktor Brack na Chancelaria do Führer. Eu estive trabalhando como um especialista em processos de gaseamento para extermínio de gente mentalmente doente nos asilos e sanatórios. Desde que esta ação foi suspensa por um curto tempo - não sei porque - antes que eu fosse transferido para a RSHA em Berlim como resultado de uma conversa privada entre o Reichsführer SS Himmler e o Oberdienstleiter Brack.*

Himmler queria empregar pessoas que fossem habilitadas, como resultado da suspensão do programa de eutanásia e que, como eu, fossem especialistas em extermínio por gaseamento para operações de gaseamento em larga escala no Leste da Europa, onde isto estava tendo início. A razão para esta decisão é que os homens encarregados dos Einsatzgruppen no Leste europeu estavam reclamando cada vez mais que os pelotões de fuzilamento não poderiam lidar com o estresse psicológico e moral do assassínio em massa indefinidamente. Eu sei que um número de membros desses esquadrões foram enviados a asilos de doentes mentais e por esta razão um novo e melhor método de extermínio teria que ser encontrado. Então em dezembro de 1941 eu comecei a trabalhar na RSHA, Amt H, no departamento de Rauff… o vice de Rauff na época era então Hauptmann Pradel, que mais tarde se tornou major. Embora Pradel também tivesse uma qualificação equivalente na SS que ele mesmo chamava de major. Eu não tive inicialmente qualquer contato pessoal com Rauff.

Quando em Dezembro de 1941 fui transferido para o departamento de Rauff, ele me explicou a situação dizendo que o estresse psicológico e moral sobre os pelotões de fuzilamento não era mais suportável e que, portanto, o programa de gaseamento tinha que ser iniciado. Ele disse que as vans de gás com motoristas já estavam a caminho ou de fato já tinham alcançado dos Einsatzgruppen. Minha breve profissional era inspecionar o trabalho dos indivíduos do Einsatzgruppen no Leste europeu em conexão com as vans de gás. Isso queria dizer que eu tinha de garantir que os assassinatos em massa realizados nos caminhões procediam corretamente. Eu tinha de prestar atenção especial ao funcionamento mecânico dessas vans. Eu gostaria de mencionar que havia dois tipos de furgões de gás em operação: a Blitz Opel, pesando 3-5 toneladas, e a grande Saurerwagen, que, tanto quanto sei pesava 7 toneladas. No meio de dezembro de 1941, por instruções de Rauff, eu parti para o Leste europeu para pegar o Einsatzgruppe A (Riga) .. para inspecionar seus Einsatzwagen [veículos especiais] ou vans de gás.

Em 14 de dezembro de 1941, no entando, sofri um acidente de carro em Deutsch-Eylau. Como consequência deste acidente, fui enviado para Hospital Católico em Deutsch-Eylau e em virtude minha recuperação recebi alta hospitalar em 23 ou 24 de dezembro de 1941. Tenho certeza disso porque passei o Natal com minha família em Berlim.

Em 4 ou 5 de janeiro de 1942, recebi uma mensagem de Rauff me pedindo para me dirigir a ele. Ao me dirigir a ele fui instruído a partir imediatamente. Desta vez eu viajava diretamente para o Einsatzgruppe D no sul (Otto Ohlendorf) em Simferopol. Inicialmente era para eu ter viajado de avião, mas isso não deu certo por causa das condições climáticas de frio. Eu, portanto, parti de trem em 5 ou 6 de janeiro viajando através de Cracóvia e Fastov para Nikolayev. De lá eu voei no avisão do Reichsführer para Simferopol na Criméia. A viagem durou cerca de três semanas e eu relatei ao chefe do Einsatzgruppe D, Otto Ohlendorf, em algum dia de janeiro. Fiquei com este grupo até o início de abril de 1942 e, em seguida, visitei cada Einsatzgruppe até chegar ao Grupo A, em Riga.

Em Riga eu aprendi com o Standartenführer Potzelt, vice-comandante da Polícia de Segurança e SD em Riga, que a operação Einsatzkommando em Minsk precisava de algumas vans de gás adicionais já que não consegui operar as três vans existentes que tinha. Ao mesmo tempo, eu também aprendi com Potzelt que havia um campo de extermínio judeu em Minsk. Eu voei para Minsk de helicóptero, correção, num Storch Fieseler pertencente ao Einsatzgruppe. Viajando comigo estava o Hauptsturmführer Rühl, o chefe do campo de extermínio em Minsk, com quem eu tinha discutido negócios em Riga. Durante a viagem, Rühl me propôs que eu fornecesse vans adicionais, uma vez que não poderia prosseguir com os extermínios. Como eu não era responsável pela ordenação de vans de gás, sugeri a Rühl que se dirigisse ao escritório de Rauff.

Quando vi o que estava acontecendo em Minsk - que as pessoas de ambos os sexos estavam sendo exterminados em massa - eu não agüentava mais ver isso e três dias depois, talvez em setembro de 1942, viajei de volta por caminhão via Varsóvia à Berlim.

Eu tinha a intenção de informar a Rauff em seu escritório em Berlim. No entanto, ele não estava lá. Em vez disso, fui recebido por seu vice, Pradel, que tinha sido neste período promovido a Major. ... Em uma conversa privada com duração de cerca de uma hora na qual eu descrevi para Pradel o método de trabalho das vans de gás e críticas sobre o fato de que os criminosos não tinham sido gaseados, mas haviam sido sufocados porque os operadores tinham ajustado o motor de forma incorreta. Eu disse a ele que as pessoas tinham vomitado e defecavam. Pradel me escutou sem dizer uma palavra. No final da entrevista ele simplesmente me disse para escrever um relatório detalhado sobre o assunto. Por fim, ele me disse para ir ao escritório do caixa para liquidar as despesas que haviam incorridas durante minha viagem.

Fonte: Ernst Klee, Willi Dressen e Volker Riess (editores), The Good Old Days, tradução (para o inglês) de Deborah Burnstone, 1991 Konecky & Konecky, Old Saybrook, CT, pág. 68-71, da afirmação de Becker em 26.3.60 (9 AR Z 220/59, vol. I, pág. 194 ff.)

Fonte: Holocaust Controversies
http://holocaustcontroversies.yuku.com/topic/1646/Statement-by-August-Becker-Ph-D-Gas-Van-Inspector
Material de: Roberto Muehlenkamp
Tradução: Roberto Lucena

*Observação: no texto em inglês os primeiros três parágrafos deste texto são um só parágrafo. Dividi o parágrafo em três no intuito de tornar a leitura mais fácil.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Walter Rauff - Criador das câmaras de gás móveis era triplo espião

O Arquivo Federal alemão irá divulgar na próxima semana em Koblenz um vasto conjunto de documentos que, segundo foi anunciado, confirmam as suspeitas de recrutamento do criminoso de guerra Walter Rauff pelos serviços sercretos da Alemanha Federal (BND), já nos anos 50. Procurando desfazer-se do lastro de um passado demasiado presente, o presidente do BND, Ernst Uhrlau, admite agora a vergonha que esse recrutamento representa. Mas Rauff trabalhou também para os serviços secretos da Síria e de Israel.

Walter Rauff, ao ser detido pela
polícia chilena, em dezembro de 1962




O volumoso acervo documental cuja divulgação está prometida para os próximos dias totaliza 900 páginas e confirma que o ex-agente dos serviços de segurança das SS trabalhou no pós guerra para o BND, da democrática Alemanha Federal. Rauff já em tempos revelara esse "emprego" a jornalistas, mas tudo então tomado como mera fanfarronada de um veterano da repressão nazi, a procurar fazer-se interessante na monotonia do pós-guerra.




O criador das "câmaras de gás móveis"

Walter Rauff era em 1933, quando o partido nazi ascendeu ao poder, um oficial da Marinha de Guerra, com o posto de tenente e a idade de 27 anos. Aí conhecera anteriormente o famigerado Reinhard Heydrich, também oficial da Marinha. Quando este passou a chefiar o RSHA (Serviço Central de Segurança do Reich, que reunia várias polícias) chamou Rauff para o seu lado e fez dele um dos seus braços direitos.

Depois de um breve interregno em que regressara à Marinha, Rauff retomou as funções policiais e continuou a sua ascensão meteórica, mesmo depois de a resistência checa ter liquidado o seu protector Heydrich. Em 1945, no final da guerra, com 39 anos, atingira a patente de coronel.

Entre as façanhas que lhe permitiram essa ascensão conta-se o desenvolvimento das câmaras de gás móveis, utilizadas para matar prisioneiros judeus e deficientes físicos ou mentais. As vítimas eram mortas por sufocação em camiões fechados, em que se lançava gases tóxicos. O equipamento foi usado primeiro no campo de concentração de Sachsenhausen, e depois também na capital lituana, Riga, e em campos de extermínio em Chelmno (Polónia) e Poltava (Ucrânia). Até serem substituídas pelas grandes instalações destinadas ao extermínio, as câmaras de gás móveis custaram a vida a um número de pessoas que é calculado entre 97.000 e 200.000.

Do Norte de África a Itália

Nessa fase, Rauff fora destacado para o Norte de África, à cabeça de um Einsatzkommando, que era suposto proceder ao extermínio dos judeus à medida que o Afrikakorps de Rommel fosse avançando no terreno. Na Tunísia, Rauff levou ainda a cabo verdadeiros massacres contra a comunidade judaica local.

Na fase final da guerra, esteve no norte de Itália e participou activamente na repressão contra a resistência em Milão, Turim e Génova. Aquando da insurreição de Milão, esteve a ponto de ser linchado por uma multidão e escapou por pouco. Foi depois capturado pelas tropas norte-americanas, que o deixaram fugir do campo de prisioneiros de Rimini. Segundo a sua ficha na CIA, ele pôde então esconder-se em conventos locais graças ao apoio do bispo católico Alois Hudal.

Espião duplo para a Síria e para Israel

Depois da fuga, Rauff foi recrutado para os serviços secretos sírios por um certo capitão Akram Tabara e partiu para Damasco, onde ficou, a partir de 1948, ao serviço do presidente sírio Hosni Zaim. Foi temporariamente detido na sequência de um golpe de Estado que derrubou Zaim, mas acabou por ser libertado e deixar o país.

A arregimentação de Rauff para os serviços secretos sírios, numa fase em que este e outros regimes árabes se encontravam em pé de guerra com o recém-nascido Estado de Israel, surgia, entretanto, ao senso comum como prova de uma convergência entre esses regimes e os restos do nazismo contra um inimigo comum.

As revelações de Elam e Whitehead

Mas o jornalista judeu Shraga Elam e o seu colega norte-americano Dennis Whitehead desenterraram há três anos documentos que lançavam uma nova luz sobre a história. Segundo esses documentos, então divulgados no diário israelita Haaretz, Rauff terá estado simultaneamente sob as ordens dos serviços secretos israelitas. Essa ligação era já conhecida da CIA em 1950.

Segundo o historiador residente do Haaretz, Tom Segev, Rauff já terá ido para a Síria sob ordens israelitas. Era precisamente o seu passado de criminoso do Holocausto que o tornava, aos olhos dos sírios, insuspeito de alguma simpatia pelo Estado de Israel.

Ainda segundo Elam e Whitehead, Rauff foi depois para o Egito sob ordens israelitas, com o plano de organizar o assassínio de diversas figuras políticas inquietantes para Israel. Mas o plano não chegou a concretizar-se e Rauff partiu então para a América Latina, com a ajuda dos serviços secretos israelitas.

No Chile, ao serviço da espionagem alemã

Na América Latina, Rauff estabelceu-se no Chile, como comerciante de gado. Foi aí que o BND o recrutou, com o intuito de obter informações provenientes da Cuba revolucionária. Aparentemente, a actividade de Rauff saldou-se num fracasso e decepcionou o seu novo patrão - os serviços secretos alemães. Por isso chegou a ser-lhe cortado o vencimento, segundo Klaus Wiegrefe em Der Spiegel.

Em 1962, a política falou mais alto que a polícia e o Governo da Alemanha Federal pediu ao Chile a extradição de Rauff. O refugiado foi temporariamente detido, mas o Supremo Tribunal chileno recusou o pedido de extradição, a pretexto de os crimes em causa já terem prescrito segundo a lei chilena, e mesmo a chegada ao poder de Salvador Allende não mudou a segurança que o país oferecia ao criminoso nazi.

Com o golpe de Estado de Pinochet circularam rumores sobre uma activa participação de Rauff no aparelho repressivo da ditadura. Novos pedidos de extradição foram, em todo o caso, rejeitados por Pinochet. Um provinha de Israel, em 1984, outro de uma especial amiga do ditador, Margareth Thatcher. Mas foi também em 1984 que Rauff morreu - enterrado com honras e rituais nazis pela comunidade germânica refugiada no Chile.

Fonte: RTP(Portugal)
http://www.rtp.pt/noticias/?t=Criador-das-camaras-de-gas-moveis-era-triplo-espiao.rtp&article=482924&visual=3&layout=10&tm=7

sábado, 26 de fevereiro de 2011

A Ustasha e o silêncio do Vaticano - parte 3

In English: The Ustasha and Vatican's Silence - Part 3
Ler antes o texto observação, sobre os erros desta série:
A Ustasha e o silêncio do Vaticano - parte 4 (Observação)

Os crimes dos ustashi croatas (NDH)

RATOS EM FUGA. O VATICANO AO FINAL DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL

Soldado da Ustasha exibe orgulhoso
seu macabro troféu, a cabeça
decapitada de um chetnik sérvio.
Longe de ser um mistério histórico, a fuga de milhares de proscritos nazis à América do Sul e outras partes do mundo é um fato fartamente documentado no que se sabe que a Santa Sé tomou parte ativa. Personagens tão sinistros como Pavelic, Klaus Barbie ou Joseph Mengele partiram para o exílio fazendo escala prévia no Vaticano. Enquanto isso, na Croácia, os últimos ustashi esperavam que uma oportuna intervenção da diplomacia vaticana propiciasse a criação de um Estado croata independente da Iugoslávia.

Quando ficou claro que Zagreb ia ser libertada pelas tropas aliadas, os ustashi tentaron salvar tudo o que puderam. Em fins de abril de 1945, Pavelic, com plena autorização de seu amigo Stepinac, ordenou que fossem levados ao Monastério franciscano de Zagreb trinta e seis cofres com a macabra pilhagem (jóias e dentes de ouro, principalmente) confiscada das vítimas da matança de sérvios, judeus e ciganos.1 Contudo, Pavelic reteve consigo outros treze cofres para assegurar sua fuga e um cômodo retiro.2

Os monjes esconderam o tesouro primeiro na cripta debaixo do altar maior e, mais tarde, num buraco escavado debaixo dos confessionários, onde permaneceu até que fosse recuperado pelas tropas do marechal Tito. Depois de enterrar sua pilhagem, Pavelic partiu sob comando de mil e quinhentos leais em direção à Áustria,3 esperando contar com o amparo dos britânicos e do Vaticano. Mas não contava com o fato de ser feito prisioneiro pelos estadunidenses, que lhe vinham seguindo a pista desde sua chegada à Áustria. Conseguiram prendê-lo próximo de Saizburgo.

Contudo, quando já se estavam ultimando os preparativos para o julgamento por crimes de guerra, Stepinac e o acerbispo de Saizburgo intercederam para que Pavelic fosse posto em liberdade. Finalmente, o criminoso de guerra encontrou abrigo entre os mesmíssimos muros do Vaticano, ainda que sua estada tenha sido curta. Para evitar o escândalo, Pio XII, consciente de que a vitória aliada havia dado um virada à política mundial, convidou Pavelic a ir embada da Santa Sé disfarçado de sacerdote num automóvel com placa diplomática. Pavelic manteve a identidade falsa durante um tempo sob a alcunha de padre Benares ou padre Gómez.4

1. Manhattan, Avro, The Vatican tíolocaust, op. cit.

2. Goñi, Uki, La auténtica Odessa. La fuga nazi a la Argentina de Perón, Paidós, Barcelona, 2002.

3. «Supreme Allied HQ to 6th and 12th Army Groups. Apprehension oí Croat Quislings», 5 de junio de 1945. Documento desclassificado do Exército estadunidense.

4. Aarons, Mark, op. cit.


Os estadunidenses seguiram ao escorregadio Pavelic, mas decidiram não agir por deferência da Santa Sé. Os agentes da contrainteligência militar encarregados do assunto assim esclareciam num relatório:
«Os atuais contatos de Pavelic são a tão alto nível, e sua presente situação tão comprometedora para o Vaticano, que sua extradição poderia supôr-se um problema para a Igreja católica».5
Mais ou menos por aqueles fechas, o padre Krunoslav Draganovic, secretário da Confraternidad croata de São Girolamo, que formava parte da Pontifícia Obra de Assistência criada por Pio XII, uma instituição do Vaticano em Roma, recibia da Croácia mais de quatrocentos quilos de ouro6 que deviam ser empregados «na obra de assistência e cuidado pastoral dos prófugos da Croácia». (Quer dizer, para ajudar os antigos ustashi a escapar da Croácia autoridades aliadas em geral e dos partisanos de Tito en particular.) Em honra pela verdade, há que reconhecer que este ouro não era parte da pilhagem das vítimas sérvias e judias, como precisa monsenhor Simcic, atualmente especialista permanente da Comissão Pontifícia Ecciesia Dei, e então colaborador de Draganovic:

Para esta operação beneficente teve a sua disposição dois cajas de lingotes de ouro sacadas pelo Exército em retidada do fronte, ante o avanço dos partisans de Tito. Eram cajas do banco nacional croata, enquanto que os bens sequestrados dos judeus eram administrados pela Divisão do Ministério de Segurança Pública. Eram duas administrações bem distintas.7

5. U.S. Army Counter Intelligence Corps. Destacamento em Roma. 12 de setembro de 1947. Caso número 5650-A.

6. Dorril, Stephen, MI6; Inside the Covert Worid of Her Majesty's Secret Intelligence Service, Touchstone, Nueva York, 2000.

7. «Aonde foi parar o ouro dos croatas? Fontes vaticanas acusam os Estados Unidos de superficialidade histórica». Agência Zenit, 5 de junho de 1998.


A OPERAÇÃO BENEFICENTE

Em 31 de julho de 1942. Os Ustashas matam na
igreja ortodoxa em Sadilovac, Kordun, 314 adultos
sérvios e 149 crianças sérvias abaixo dos 14 anos.
Mataram as crianças em frente da parede da igreja.
Parte da «operação beneficente» de Draganovic — a quem, por certo, era subordinado do subsecretário de Estado Giovanni Battista Montini, que mais tarde se converteria em Paulo VI — consistiu em arreglar, pessoalmente, a saída até a Argentina de um bom número de criminosos de guerra alemães e croatas.8 O croata franciscano Draganovic não tinha por aqueles dias um expediente demasiado limpo, já que havia sido oficial ustashi e havia realizado conversões a força de sérvios.9 Em 1943 Draganovic deixou pra trás sua agitada vida como ustashi e se incorporou ao Vaticano.10 Assim que não é de se estranhar que mostrasse certo interesse em salvar a seus antigos camaradas.

Houve um momento em que não menos de trinta antigos ustashi, incluindo o próprio Draganovic, congregaram-se no seminário de São Jerônimo (San Girolamo degli Illirici), cinco dos quais, incluindo um sacerdote, estavam na lista dos criminosos de guerra mais procurados." Outros se encontravam refugiados em diferentes instituições católicas, como o Instituto Oriental. Existem, de fato, relatórios confidenciais dos serviços de inteligência estadunidenses da época em que eles, sem rodeios, qualificava o seminário de São Jerônimo como quartel general do que restava dos ustashi.12 Os serviços secretos aliados não podiam fazer nada, já que San Girolamo, apesar de encontrar-se fora das muralhas do Vaticano, tinha status de território da Santa Sé.

8. Loftus, John e Aarons, Mark, The Secret War against the Jews: How Western Espionage Betrayed the jewish People, St. Martin's Griffin, Nova York, 1997.

9. Headden, Susan, Hawkins, Daña e Rest, Jason, «A vow oí silence», U. S. News and Worid Report, 30 de março de 1998.

10. Cockburn, Alexander e St. Clair, Jeffrey, Whiteout: The CIA, Drugs and the Press, Verso, Londres, 1998.

11. Phayer, John Michael, The Catholic Church and the Holocaust, 1930-1965, Indiana University Press, Bloomington, 2000.

12. «Rome Área Allied Command to the CIC», 8 de agosto de 1945. Documento desclassificado do Exército estadunidense.


O hóspede mais ilustre de São Jerônimo foi Klaus Barbie, O Carniceiro de Lyón, que lhe foi entregue a Draganovic na estação de trens de Gênova por oficiais de inteligência norte-americanos, que esperavam sacar partido de Barbie no futuro. Draganovic obteve documentos da Cruz Vermelha com o apelido falso para ele e sua família. Barbie e outros nazis embarcaram de Gênova, em março de 1951, com destino a Buenos Aires, para mais tarde transladar-se à Bolívia. E é que em começo de 1948, segundo iam tensando as relações com a União Soviética, britânicos e estadunidenses começaram a olhar com melhores olhos as operações de encubrimento do Vaticano, já que alguns dos fugitivos possuiam conhecimentos técnicos, científicos, militares e de inteligência que podiam ser de grande ajuda durante a guerra fria.

De fato, os estadunidenses estabeleceram sua própria operação de contrabando de criminosos de guerra - sob o nome de Operação Paperclip —, mediante a qual fizeram com os serviços de cientistas de primeira linha, como Werner von Braun, que deveria ter sentado no banco de Nuremberg por seus experimentos com seres humanos no centro de investigação aeronáutica de Peenemunde (Alemanha), ou o general Reinhard Gehien, que acabou ocupando um posto da máxima relevância na CIA antes de tomar posto nos serviços de inteligência da República Federal da Alemanha.

Soldados Ustasha ostentam cabeça
decapitada do sérvio Jovan Blaženović.
A prática brutal de cortar cabeças e
ostentá-las como prêmio foi uma
prática marcante da Ustasha.
Outros criminosos de guerra que obteveram refúgio depois dos muros do Vaticano foram Franz Stangl, comandante do campo de extermínio de Treblinka (Polônia), Eduard Roschmann, O Carniceiro de Riga, o general das SS Walter Rauff, inventor da câmara de gás portátil, Gustav Wagner, comandante do campo de Sobibor, e, sobretudo, o doutor Joseph Mengele, o Anjo da Morte do campo de Auschwitz.

Draganovic também colaborou com o governo argentino para possibilitar a chegada nesse país dos técnicos que o diseñador alemão Kurt Tank necessitava para a fábrica de aviões de Córdoba. Estes também receberam passaportes da Cruz Vermelha e foram alojados no convento de monjas Centocelle até que tomassem um avião da Frota Aérea Mercante Argentina com destino à Buenos Aires. (A título de curiosidade, diremos que aqueles refugiados que estiveram se escondendo em conventos religiosos o fizeram, em sua maioria, disfarçados de monjas. Tanto é assim que em diversos conventos se pode comprovar um súbito aumento no número de irmãs, muitas delas com graves problemas hormonais a julgar pelo rudo de sua voz e suas ademanes, assim como por sua vello facial.) Contudo, este grupo levava consigo um regalo «surpresa»: nem mais nem menos que o criminoso de guerra Gerhard Bohne, encarregado do programa de eutanásia do Reich.

Assim, toda uma galeria de sinistros personagens, desde Pavelic a Adolf Eichmann, conseguiu suas passagens até a Argentina através da Santa Sé. No caso concreto de Pavelic, Draganovic fez uma exceção e, depois de proporciona-lhe um flamante passaporte da Cruz Vermelha, acompanhou-lhe pessoalmente até Buenos Aires junto a um nutrido grupo de antigos camaradas ustashi.

Entre os que escaparam também havia alguns - poucos - heróis de guerra genuínos que não foram perseguidos por seu extraordinário zelo no campo de batalha, como o coronel Hans Rudel, que nos comandos de seu bombardeiro Stuka destruiu mais de quinhentos tanques soviéticos e afundou vários barcos. Perdeu uma perna em combate, mas isso não foi impedimento para seguir lutando até o fim da guerra. Rudel era procurado pela União Soviética e apareceu em Bariloche, onde de imediato se fez conhecido por suas grandes qualidades como esquiador.

O MÉDICO HOMOFÓBICO

Outros não tinham um passado tão glorioso, como o doutor Kari Vaernet, famoso pelos «experimentos» que realizava com homossexuais no campo de concentração de Buchenwald, onde, entre outras coisas, dedicou-se durante uma temporada à castração de gaus para substituir seus testículos por bolas de metal. Chegando à Argentina, o homofóbico doutor passou a trabalhar para o Ministério da Saúde e manteve uma consulta na rua Uriarte em Buenos Aires. Os nazis de segundo escalão, sem os recursos nem os contatos necessários para desfrutar dos serviços da peculiar «agência de viagens» que extraoficialmente funcionava em São Jerônimo, tiveram que arreglárselas por sua conta e terminaram espalhados em países tão diversos como Espanha, Síria, Egito, Estados Unidos, Grã-Bretanha, Brasil, Canadá e Austrália. Entre uns e outros, calcula-se que não menos que trinta mil fugitivos conseguiram evitar a ação da justiça.

Os serviços secretos estadunidenses sempre suspeitaram que os nazis obtinham os passaportes do Vaticano que lhes permitiam instalar-se em seu retiro de ouro sulamericano previamente pago por um montante não precisamente barato.13 Por outro lado, não todo este dinheiro acabava nos cofres da Igreja. Documentos do Departamento de Estado estadunidense desclassificados em 1998 assinalam que o padre Draganovic se enriqueceu pessoalmente com sua «operação beneficente», cobrando grandes quantidades a aqueles os quais eram fornecidos a documentação falsa.

Os serviços de inteligência estadunidenses batizaram o corredor de fuga que o Vaticano facilitou a nazis e antigos ustashi de "ratline", Linha de ratos,14 um termo náutico que se refere aos ratlines, «os barbantes horizontais que, ligados às mortalhas, como a meio metro de distância entre si e em toda a extensão de exárcias maiores de gávea, servem de degraus à marinharia para subir e executar as manobras no alto dos mastros».15

13. Aarons, Mark e Loftus, John, Ratlines, William Heinemann, Londres, 1991.

14. «The Fate of the Wartime Ustashi Treasure», relatório do Departamento de Estado dos Estados Unidos. Junho de 1988.

15. Dicionário da Real Academia Espanhola.


Quer dizer, a última parte do barco que afunda quando a embarcação naufraga. O uso deste termo para designar as operações que se realizaram e as redes que se estabeleceram para o resgate de alguns dos assassinos mais sanquinários da história europeia não poderia ter sido mais apropiado.

Existem documentos argentinos que mostram que, em 1946, o monsenhor Giovanni Battista Montini entrou em contato, pelo menos duas vezes, com o embaixador da Argentina, junto à Santa Sé. Na segunda ocasião, transmitiu-lhe a preocupação do Papa por "todos os católicos, impedidos de regressar às suas casas por causa da probabilidade de serem objeto de perseguições políticas", propondo a elaboração de um plano de ação conjunta entre a Argentina e a Santa Sé. Em nenhum destes documentos existem referências específicas sobre a exclusão do dito plano dos responsáveis por crimes de guerra.

Outro dos personagens importantes desta trama foi o bispo austríaco Alois Hudal bispo, que em 1948 escreveu a Juan Domingo Perón lhe pedindo cinco mil vistos para soldados alemães e austríacos. Se conta a anedota de que durante uma c elebração de Natal em 1947, Hudal disse a um grupo de cerca de duas centenas de fugitivos nazistas escondidos sob sua proteção no Vaticano: « Podem confiar que a polícia não lhes encontrará: não é a primeira vez que pessoas se escondem nas catacumbas de Roma ».

O mecanismo para obter vistos funcionava de maneira simples: a secretaria de migração argentina outorgava uma permissão de desembarque sob um suposto nome ao solicitante, com o qual o fugitivo obtinha da Cruz Vermelha um «documento de viagem». Logo, não tinha mais que solicitar um visto no consulado argentino e se submeter a uma «certificação de identidade» ao chegar à Buenos Aires. Em 1949, Juan Domingo Perón decidiu que nem ao menos haveria porque se preocupar com as aparências e aprovou uma anistia mediante a qual aqueles que ingressaram com nome falso no país poderiam recuperar sua identidade. Graças a ele, os fugitivos mais procurados do mundo conseguiram iniciar uma nova vida livre de preocupações. Entre estes criminosos de guerra estava Erich Priebke, membro dasa SS em Roma, acusado da matança de 335 pessoas das Fosas Ardeatinas, que escapou sob um nome falso, e recuperou sua identidade em 1949 e viveu como cidadão modelo em Bariloche, até que uma equipe da televisão norteamericana o descobriu em 1995, precipitando sua extradição para a Itália.

Foi durante este processo que entrou em cena Licio Gelli, um dos personagens chave dos manejos menos confessáveis do Vaticano na segunda metade do século XX. Gelli tinha o perfil ideal para participar da operação de exportação de nazis, já que não só havia sido oficial e intermediário junto à Divisão SS Hermann Goering, senão que além disso contava com múltiplos contatos na máfia, muito úteis na hora de tirar um homem da Itália burlando a curiosidade das autoridades ou lhe fornecer toda a sorte de documentação falsa.16 Há indícios de que Gelli pode atuar nessa época como intermediário entre os elementos italianos das ratlines e a ODESSA e a Die Spinne (A aranha), as duas organizações clandestinas dos antigos nazis que administravam a fuga e recolocação de criminosos de guerra.

16. Yailop, David, op. cit.

ESPERANDO A CAVALARIA

Enquanto isso, na Croácia, Stepinac havia convocado uma conferência de bispos em Zagreb que teve como resultado a proclamação de uma carta pastoral na qual os bispos incitavam a população a se levantar com as armas contra o novo governo do país. Os ustashi que não haviam sido executados ou que não haviam fugido do país se reuniram no campo formando uma organização terrorista com o eloquente nome de "Os Cruzados". A bandeira da organização foi consagrada na capela de Stepinac. Muitos sarcedotes e monjes formavam parte da organização, bem como militantes armados, bem desempenhando serviços de espionagem e comunicação. Muita da informação recolhida por estes clérigos espiões terminou em poder dos serviços secretos estadunidenses através do Vaticano.17

A colaboração entre os estadunidenses e os rebeldes ustashi não é de se estranhar se tivermos em conta que estes últimos esperavam uma intervenção norteamericana na Croácia. O próprio Stepinac estava convencido de que cedo ou tarde isto iria acontecer.18 Talvez Stepinac tinha motivos para pensar assim. No fim das contas, por aqueles dias, Pio XII mantinha uma relação mais fluída com a cúpula militar estadunidense estadunidense. Basta um exemplo: em um só dia de junho de 1949 o papa recibeu em audiências sucessivas a cinco generais estadunidenses de primeira linha.

17. Manhattan, Avro, The Vatican Holocaust, op. cit.

18. New Statesman & Nation. Londres, 26 de outubro de 1946.


Fonte(livro): Biografía no autorizada del Vaticano; capítulo 5
Autor(livro): Santiago Camacho
Tradução(do original em espanhol): Roberto Lucena

Fotos de atrocidades da Ustasha e de outros massacres nos Balcãs(atenção, as fotos são fortes):
http://sokolac.slavicnet.com/sokolac/sokolac_history2_forum.html
http://www.srpska-mreza.com/History/ww2/book/Lukajic/Father-Satan.html

Partes anteriores:
A Ustasha e o silêncio do Vaticano - parte 1
A Ustasha e o silêncio do Vaticano - parte 2
Sobre os erros do texto, observação:
A Ustasha e o silêncio do Vaticano - parte 4 (Observação)

Destaque: texto mais detalhado sobre a Ustasha, do historiador Dusan Batakovic
O genocídio do Estado Independente Croata 1941-1945
[Parte 1] [Parte 02] [Parte 03]

Ver também:
1. A Ustasha (no blog avidanofront.blogspot.com do Daniel)
2. Holocausto na Croácia - parte 1

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Alterações técnicas nas vans assassinas - Holocausto (Chelmno)

Tradução: Alterações técnicas nas vans assassinas.
Carta de Willy Just para o SS-Obersturmbannführer Walter Rauff, 5 de Junho 1942.

Assunto: Alterações técnicas para os veículos especiais já em operação e aqueles em produção.

Desde dezembro de 1941, por exemplo, 97 mil foram processados usando-se 3 vans sem nenhuma falha de desenvolvimento destes veículos. A bem-conhecida explosão em Kulmhof (Chelmno) deve ser tratada como caso especial. Foi causada por falha prática. Instruções especiais têm sido dadas aos escritórios competentes de forma a evitar tais acidentes. As instruções também são voltadas para assegurar um considerável aumento no grau de segurança.

Experiências operacionais indicam que as seguintes alterações técnicas são apropriadas...

2) As vans são normalmente carregadas com 9 a 10 pessoas por metro quadrado. Com as maiores vans especiais Saurer isto não é possível porque embora elas não se tornem sobrecarregadas, sua manobrabilidade é muito prejudicada. Uma redução na área de carga parece desejável. Isto pode ser alcançado pela redução do tamanho da van em cerca de 1 metro. A dificuldade referida não pode ser alcançada pela redução do tamanho da carga. Pois uma redução no número necessitaria de um período maior de operação porque o espaço livre teria que ser preenchido com CO2. Em contraste, uma área de carga menor que é completamente cheia requer um período de operação muito mais curto já que não há espaço livre...

3) A mangueira de conexão entre a exaustão e a van frequentemente enferruja porque ela é corroída internamente pelos líquidos que caem nela. Para prevenir isto a peça de conexão deve ser movida para o gás ser alimentado de cima para baixo. Isto prevenirá que líquidos caiam nela.....

4) A iluminação deve ser melhor protegida contra danos do que atualmente.... Têm sido sugerido que a iluminação deve ser dispensada porque alegadamente ela nunca é usada. Contudo a experiência mostra que quando a porta traseira é fechada e portanto se torna escura, a carga pressiona com força em direção à porta.... Isto torna difícil o fechamento da porta. Além disso, têm sido observado que o barulho sempre começa quando as portas são fechadas, presumidamente devido ao medo trazido pela escuridão. (Just)

Fonte: "Nazism: A History in Documents and EyeWitness Accounts, 191-1945", vol. 2, document 913
Colaboração e tradução: Antonio Freire

O texto em inglês também se encontra no link: Nazi Correspondence Regarding Gassing Vans (Jewish Virtual Library)

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