A Negação do Holocausto não é piada
12 de Dezembro, 2006
A conferência iraniana do Holocausto é sórdida e cínica, mas nós devemos levar isto a sério.
Por Anne Applebaum
"Na segunda-feira, o Ministro do Exterior iraniano promoveu uma conferência internacional. Nada de estranho nisso. Ministros do Exterior promovem conferências, na maior parte chatas, o tempo todo. Mas esta era diferente. Primeiro, porque a Conferência Internacional para Rever a Visão Global do Holocausto era sobre história, e não sobre políticas atuais. Ao invés dos 'suspeitos' habituais — assistentes de ministérios e similares — os convidados pareciam incluir David Duke, um ex-líder da Ku Klux Klan; Georges Thiel, um francês que chamou o Holocausto de "uma enorme mentira"; e Fredrick Töben, um alemão naturalizado australiano cuja especialidade é negar a existência das câmaras de gás nazistas. A lista de convidados era seletiva: nenhuma eminência acadêmica, ou certamente com qualquer credencial acadêmica, foi convidada. Um acadêmico palestino, Khaled Ksab Mahamid, foi convidado a ir e posteriormente impedido porque possui um passaporte israelense — e talvez também porque ele, ao contrário dos outros convidados, acredita que o Holocausto realmente ocorreu.
Em resposta, os Estados Unidos, Europa, e Israel expressaram ultrage oficial. O governo alemão, que seu mérito seja reconhecido, organizou uma contra-conferência. Ainda assim, muitos se mantiveram distantes, negando-se a ficarem chocados ou mesmo particulamente interessados. Afinal, o Holocausto acabou há mais de seis décadas. Desde então, as vítimas do Holocausto escreveram centenas de livros, e a literatura acadêmica sobre o Holocausto é expressa em bilhões de palavras. Existem filmes, fotografias, documentos, de fato arquivos inteiros dedicados à história do regime Nazista: todos nós sabemos o que aconteceu. Evidente que a negação do Irã não pode ser algo a sério.
Infelizmente, o Irã leva isto a sério — ou mais precisamente o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, leva isto muito a sério. A negação do Holocausto é sua paixão pessoal, não é apenas uma maneira de provocar Israel , e é baseada em sua interpretação pessoal da história. No início deste ano, numa carta aberta particularmente estranha à Chanceler alemã Angela Merkel, ele elogiou os grandes feitos da cultura alemã e atacou "a máquina de propaganda pós Segunda Guerra Mundial, tão colossal que [isso] fez com que algumas pessoas acreditassem que eles eram a parte culpada." Aquelas visões nos remetem de volta aos anos 1930s, quando o então Xá do Irã era um admirador da noção de Hitler da "superioridade da raça ariana," à qual os persas deveriam pertencer. O próprio Ahmadinejad teve como mentor um antigo revolucionário que foi fortemente influenciado pela propaganda de guerra Nazista. Nota-se.
É claro, a negação do Holocausto também tem raízes mais profundas que isto e muitos outros partidários além de Ahmadinejad no Oriente Médio, o que podem ser parte da problema: questionar a realidade do Holocausto tem sido há muito uma das formas de questionar a legitimidade do Estado de Israel, que foi de fato criado pelas Nações Unidas em resposta ao Holocausto, e que defato incorporou a História do Holocausto na sua identidade nacional. Se os Xiitas iranianos estão a procura de amigos, particularmente entre os árabes sunitas, a negação do Holocausto não é um má idéia para encontrá-los.
E ainda assim — o evento desta semana tem alguns novos elementos, também. Isto é, afinal, uma conferência internacional, com participantes estrangeiros, temas 'formais' (" Como os sionistas colaboraram com Hitler?" por exemplo), e com um objetivo que vai muito além de uma mera denúncia contra Israel.
Porque alguns países que tiveram regimes Nazi(fascistas) têm no pós-guerra leis proibindo a negação do Holocausto, o Irã declarou que esta é "uma oportunidade para pensadores que não podem expressar seus pontos de vista livremente na Europa a respeito do Holocausto." Se o Ocidente vai dar abrigo a dissidentes iranianos, então o Irã também abrigará David Duke. Se o Ocidente vai fingir que apóia liberdade de expressão, então o Irã fará o mesmo. Vaiado pela primeira vez em muitos meses por ativistas numa passeata, Ahmadinejad respondeu chamando os críticos de agentes americanos pagos: "Hoje, o pior tipo de ditadura no mundo é a ditadura americana , disfarçada em defensora de direitos humanos." A ditadura americana , disfarçada em defensora de direitos humanos distribuindo história falsificada: é o tipo de argumento que você pode ouvir regularmente hoje em dia, no Irã assim como na Rússia e na Venezuela , para não falar nos Estados Unidos mesmo.
Tudo isto é uma forma enviesada de dizer que este tipo de revisionismo histórico não é piada, e que não deveríamos ficar tentados a tratá-lo dessa maneira. Sim, nós achamos que já conhecemos esta história; nós achamos que já institucionalizamos esta memória; nós achamos que este terror europeu em particular já está dominado, e que é tempo de seguir em frente. Eu mesma às vezes penso assim. Há tantas outras histórias para se aprender, afinal. O que não falta no século XX é tragédia.
E ainda assim — a quase-destruição dos judeus europeus num breve espaço de tempo por uma sofisticada nação européia usando a melhor tecnologia disponível era, ao que parece, um evento que exige uma constante re-explanação, não somento porque isso realmente modelou a subseqüente história do mundo e da Europa de formas incontáveis. Só por esta razão, os arquivos, as fotografias, e as infindáveis refutações continuarão sendo necessárias, muito depois que o último sobrevivente tiver morrido."
Anne Applebaum, colunista do Washington Post e do Slate, é atualmente membro da Academia Americana em Berlim. Seu mais recente livro é "Gulag: Uma História"(Gulag: A History).
Nas fotos:
1ª - David Duke(ex-líder da Ku-Klux-Klan e "revisionista") e o Presidente do Irã, M. Ahmadinejad
2ª - Anne Applebaum
Fonte: Slate
http://www.slate.com/id/2155328/
Tradução: Roberto Lucena
Artigo trazido por Lise Sedrez
Mostrando postagens com marcador Khaled Ksab Mahamid. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Khaled Ksab Mahamid. Mostrar todas as postagens
sábado, 29 de setembro de 2007
A Negação do Holocausto não é piada
Marcadores:
"Revisionismo",
Ahmadinejad,
Anne Applebaum,
David Duke,
Estado de Israel,
Fredrick Töben,
Gulag,
Holocausto,
Irã,
Khaled Ksab Mahamid,
Ku-Klux-Klan,
Nazismo,
Negação do Holocausto,
Sionismo
Assinar:
Postagens (Atom)