quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Clarinada: uma porta-voz anti-semita na Argentina

Tópico: http://www.orkut.com/CommMsgs.aspx?cmm=295037&tid=2541344265148107335
Uma porta-voz anti-semita em Buenos Aires: a revista Clarinada (1937 -1945)
Prof. Daniel Lvovich

"Embora o anti-semitismo fosse comum nas publicações nacionalistas que apareceram em Buenos Aires na década de 1930 e primeira metade da de 1940, a revista Clarinada se destacou entre todas elas pela radicalidade de seu ódio aos judeus.

A Clarinada publicou seu primeiro número em maio de 1937, e continuou aparecendo até fevereiro de 1945. Tratava-se de uma revista de tiragem mensal, prolixamente editada, com umas oitenta páginas e capas em cores. Desde seu início, Clarinada levou como subtítulo 'Revista Mensal de propaganda argentina e contra propaganda vermelha', que a partir de 1940 se modificaria por outro que refletiria de maneira mais exata seus conteúdos: o de Revista anti-comunista e anti-semita.

Efetivamente, desde o primeiro número da revista deixou claro que por trás do anti-comunismo de seu diretor, Carlos M. Silveyra - a quem anteriormente havia se destacado por suas iniciativas destinadas a combater o suposto perigo vermelho, como a publicação do livro 'O Comunismo na Argentina' ou a partida da Comissão Popular Argentina contra o Comunismo - desenhava-se um anti-semitismo obsessivo, que encontrava nas teses da conspiração universal judaica um argumento que se repetiria até a saturação. De tal modo, que a partir de sua declaração de princípios, a revista se apresentava como uma ferramenta de luta contra uma série de inimigos que, em que pese as suas diferenças, haviam atuado de acordo com as ordens dos israelitas, com o propósito de destruir a civilização cristã:

“Programa de luta sem quartel contra esse exército de animálias, integrados por forças aparentemente heterogéneas : materialismo, liberalismo, marxismo, comunismo, socialismo, anarquismo, ateísmo, massonaria, etc., mas que estão unidas na mesma finalidade: a destruição da civilização cristã e que obedecem ao mesmo comando que as dirige desde as trevas: o judaísmo.”(1)

O anti-semitismo da Clarinada combinava uns tópicos e uma virulência que a aproximavam do nazismo, com uma apelação constante a uma identidade católica que a distanciava deste, sem advertir nisto contradição alguma. De tal modo, a revista podia apelar a autoridade de alguns padres da Igreja para respaldar seu anti-judaísmo, sem que isso lhe impedisse recorrer a metáforas de tipo biologicista de clara inspiração nacional-socialista, entre elas uma recorrente: “No inverno tem que se precaver da gripe, mas em toda estação tem que se precaver da pior peste: o judaísmo.”

Em que pese ela se identificar de maneira completa com o regime de Hitler, a quem auguravam “…o triunfo da nova Alemanha, porque será o triunfo da justiça social e o aniquilamento do judaísmo”(2) , Clarinada afirmava não compartilhar da ideologia racista. Em cada número se repetia, a manera de afirmação de sua pertença nos âmbitos católicos, uma explicação sobre os motivos que animavam a publicação:

“Clarinada não combate os judeus porque são judeus, nem pretende agitar lutas religiosas ou raciais. Clarinada combate os judeus, porque eles são os inventores, organizadores, diretores e apoiadores do comunismo em todo o mundo. Clarinada combate os judeus, porque os judeus, cumprindo as diretivas dos ‘Sábios de Sião’ corrompem a moral cristã, estimulam os vícios e os defeitos humanos, para aniquilar a conquista espiritual da humanidade feita por Jesus, primeira vítima dos Judeus deicidas”

A dupla identificação da Clarinada lhe permitia receber respaldos provenientes tanto do campo católico quanto do nacional-socialista. De tal modo, o porta-voz oficioso do Arcebispado de Buenos Aires cumprimentou a aparição da Clarinada assinalando que merecia “… o apoio mais decidido de quantos abrigam a preocupação cristã e patriótica de defender-se do inimigo implacável que é o comunismo”(3) e o Bispo de Santiago del Estero, Monseñor Rodriguez Olmos, enviou sua bênção aos leitores católicos da revista.(4) Paralelamente, o exacerbado anti-semitismo da revista lhe valeu em 1938 os elogios da publicação nazi Der Stürmer, que lamentava “… que se está enterrando vivos a todos os judeus sem distinção, de modo que por fim possa reinar a paz entre a grande família argentina”.(5)

Clarinada reproduzia de maneira persistente alguns dos mais importantes textos anti-semitas, como os Protocolos dos Sábios de Sião e as obras de Hugo Wast, Julio Menvielle ou Virgilio Filippo, além disso os discursos de Hitler e outros hierarcas do nazismo. Na revista se identificava de maneira permanente o judaísmo com o comunismo, sustentava-se que os republicanos espanhóis não eram outra coisa senão títeres dos judeus, afirmava-se - em consonância com os postulados do nazismo - que os israelitas eram os responsáveis pelo estouro da Segunda Guerra Mundial e se manifestava de maneira repetida o desejo de que o fim da disputa significaria seu total extermínio.

Enquanto isso uma secção permanente entitulada “Atividades do Gueto” se dedicava a injuriar de modo permanente as pessoas e instituições israelitas da Argentina, as representações do judeu que - tanto na capa quanto nas caricaturas assinadas com o pseudônimo de Matajacós(Matajacoibos) - reproduziam-se de modo contínuo, participavam dos rasgos que os estereótipos do anti-semitismo alemão atribuíam aos israelitas.

Em cada número, a revista demandavam ao governo nacional uma série de medidas: o fechamento de diários como Crítica ou o La Vanguardia, a declaração da ilegalidade do comunismo e a expulsão ou encarceiramento de seus dirigentes, a proibição do uso do ídisch(yiddish)em diários, revistas e audições de rádio e a expulsão do país de todos os judeus, sem exceção.

Contudo, em reiteradas ocasiões a revista manifestava propósitos ainda mais sinistros ante os judeus da Argentina, para quem previa a aniquilação(6) , posição que não abandonou mesmo sequer quando as notícias sobre o extermínio dos judeus europeus começaram a ter uma ampla circulação na Argentina.

A identificação da Clarinada com o regime e os propósitos do nacional-socialismo não se derivava somente de uma solidariedade de tipo ideológico, já que a revista era subsidiada de maneira encoberta pelas agências de propaganda do governo alemão.(7) Contudo, a principal fonte de financiamento da revista se encontrava na publicidade de agências e empresas do Estado, como a Y.P.F., o Censo Nacional Agro-pecuário, a Caja de Ahorro Postal(Casa de Poupança)e os Bancos da Nação Argentina, Municipal, da Província de Buenos Aires e o Hipotecário Nacional. Que pese as reiteradas chamadas que as organizações que combatiam o anti-semitismo levaram aos sucessivos governos da Nación, e mesmo assim a propaganda oficial continuou aparecendo nas páginas de Clarinada até que, quando a derrota alemã era iminente, a revista deixou de publicar."

1 Clarinada, año I, N°1, mayo de 1937, p.3, «Nuestros propósitos»
2 Clarinada, año III, N°45, enero de 1941, p.27
3 El Pueblo, 8 de mayo de 1937, p.8.
4 Clarinada, año II, N°24, 31 de marzo de 1939, p.5
5 Citado en: Norman Cohn, El mito de la conspiración judía mundial, Buenos Aires, Milá-Editor,1988, pp. 266.
6 Clarinada, año III, N°44, 31 de diciembre de 1940; año III, N°45, enero de 1941, p.29; año VI, N°83, marzo de 1944, pp 14.
7 Ronald Newton, El cuarto lado del triángulo. La “amenaza nazi” en la Argentina (1931 - 1947), Buenos Aires, Sudamericana, 1995, pp. 158.

O Prof. Daniel Lvovich, da Universidad Nacional de General Sarmiento, integrou o grupo de 11 acadêmicos participantes do Seminário em Yad Vashem - Janeiro de 2000, patrocinado pela FMH, com o auspício de Claims Conference
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Texto(espanhol): Prof. Daniel Lvovich
Tradução: Roberto Lucena

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