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domingo, 25 de outubro de 2009

As raízes do mal: Haneke explica “A Fita Branca”

O austríaco Michael Haneke é um dos mais importantes cineastas em atividade. Seus filmes costumam provocar perplexidade e mal-estar, por abordarem a violência, física ou psicológica, inclusive contra crianças, de forma muito direta, sem rodeios. Seus filmes mais famosos são “A Professora de Piano”, com Isabelle Hupert, e “Caché”, com Juliette Binoche, ambos exibidos no circuito comercial brasileiro. Também dirigiu “Violência Gratuita” e “Código Desconhecido”.

Com o assustador, mas imperdível, “A Fita Branca”, que venceu o Festival de Cannes este ano, Haneke volta a provocar incômodo. Filmado em preto-e-branco, conta a história de uma comunidade rural na Alemanha, entre 1913 e 1914, onde estranhos e violentos incidentes começam a ocorrer.

Somos apresentados a um conjunto de personagens fortes: o barão dono das terras e seus empregados submissos, o médico autoritário, a parteira e seu filho com problemas mentais, o pastor protestante rigoroso, o professor tímido, um enxame de crianças reprimidas e entediadas.

Impossível não sair do cinema pensando que Haneke procurou, com “A Fita Branca”, explicar as origens das raízes culturais da geração que abraçou o nazismo, 20 anos depois dos fatos que narra no filme. Mas essa é uma leitura rasa, diz o próprio cineasta, numa excelente entrevista a Anthony Lane, na revista “New Yorker” (5 de outubro de 2009, infelizmente não disponível online).

Transcrevo a seguir, numa tradução livre, a longa resposta que Haneke dá à tentativa de rotular seu filme como uma parábola sobre o nazismo:
“Não ficaria feliz se esse filme fosse visto como um filme sobre um problema alemão, sobre o nazismo. Este é um exemplo, mas significa mais que isso. É um filme sobre as raízes do mal. É sobre um grupo de crianças, que são doutrinadas com alguns ideais e se tornam juízes dos outros – justamente daqueles que empurraram aquela ideologia goela abaixo deles. Se você constrói uma idéia de uma forma absoluta, ela vira uma ideologia. E isso ajuda àqueles que não têm possibilidade alguma de se defender de seguir essa ideologia como uma forma de escapar da própria miséria. E este não é um problema só do fascismo da direita. Também vale para o fascismo da esquerda e para o fascismo religioso. Você poderia fazer o mesmo filme – de uma forma totalmente diferente, é claro – sobre os islâmicos de hoje. Sempre há alguém em uma situação de grande aflição que vê a oportunidade, através da ideologia, para se vingar, se livrar do sofrimento e consertar a vida. Em nome de uma idéia bonita você pode virar um assassino.”
Este é Michael Haneke.

“A Fita Branca” terá mais três exibições na Mostra. Domingo (25), às 16h40, no Reserva Cultural, dia 31, às 18h20, nos HSBC Belas Artes, e dia 1º de novembro, às 20h30, no Cine Bombril. Mais informações, e um trailer, no site da Mostra.

Fonte: IG
http://colunistas.ig.com.br/mauriciostycer/2009/10/24/as-raizes-do-mal-haneke-explica-%E2%80%9Ca-fita-branca%E2%80%9D/

domingo, 28 de junho de 2009

"Os Falsários" expõe dilemas

Crítica. Filme austríaco mostra personagem real às voltas com o nazismo, mas não se arrisca em controvérsias

"Os Falsários" expõe dilemas
Carlos Quintão
Especial para O Tempo

Não chega a ser realmente um caso de revisionismo histórico, mas é fato que a produção cinematográfica contemporânea começou a delinear de forma mais complexa e com maior gama de nuances um dos maiores traumas da 2ª Guerra, o Holocausto. Uma safra recente de filmes ousaram, se não justificar os atos criminosos nazistas, o que seria igualmente criminoso, pelo menos apresentar camadas de cinza nesse terrível e conturbado episódio. A palavra de ordem parece ser: nem todos os judeus são vítimas inocentes e nem todos os nazistas são assassinos cruéis.

(Foto)Prêmio, Cena do drama "Os Falsários", que ganhou o Oscar de filme estrangeiro em 2008

É nessa linha que "Os Falsários", do austríaco Stefan Ruzowitzky, em cartaz na cidade, insere-se. É a história real de Sally Sorowitsch (Karl Markovics), um gângster judeu de origem russa, especializado em falsificação, que, ao ser preso às vésperas da guerra, é enviado para um campo de concentração "especial", onde os prisioneiros têm benefícios e confortos em troca de serviços aos nazistas.

No caso, os de falsificação de moedas estrangeiras, como a libra esterlina e o dólar. O objetivo é inundar o mercado dos países aliados com dinheiro falso, de modo a dinamitar por dentro a economia dos inimigos. Para Sally, este é apenas mais um serviço como qualquer outro que já fez visando tão somente sua sobrevivência.

Mas nem todos os prisioneiros aceitam tal condição, como é o caso do idealista Adolf Burger (August Diehl), que sabota as tentativas de se reproduzir a moeda norte-americana. Mesmo com objetivos e ideais opostos, Burger e Sally se respeitam mutuamente, o que impede que o último denuncie o colega, mesmo sob pena de morte.

Esse é o dilema por trás de "Os Falsários": o sacrifício individual é justificado em nome de um ideal e do bem maior? Ou mais vale a sobrevivência? O roteiro não deixa dúvidas sobre qual lado se insere, ao mostrar Sally cada vez mais contagiado pela consciência de Burger. A questão não se coloca de forma tão sutil, mas não deixa de alinhar "Os Falsários" com as demais produções atuais que apresentam tal dubiedade.

Revisões. Filmes como "O Leitor", de Stephen Daldry, e "Um Homem Bom", de Vicente Amorim, contextualizam a noção de que as forças externas, como o próprio Estado, muitas vezes sobrepõem-se à moral e às vontades individuais.

"Amém", de Costa-Gavras, e "Operação Valquíria", de Bryan Singer, por sua vez, introduzem o conceito de bom nazista, aquele que acredita numa causa e repudia o extermínio dos judeus. Já "O Pianista", de Roman Polanski, e "A Espiã", de Paul Verhoeven, vão um passo além, mostrando que entre os judeus existiam aqueles que trairiam o próprio povo em benefício próprio.

Stefan Ruzowitzky, diretor oriundo do videoclipe e do sucesso "Anatomia" (com Franka Potente), não se aprofunda nessa dicotomia. O maniqueísmo se faz presente aqui e ali. Permanece o medo de desagradar, o que o filme certamente não faz. Pelo menos não à Academia de Hollywood, que lhe concedeu o Oscar de filme estrangeiro no ano passado.

Fonte: O Tempo Online
http://www.otempo.com.br/otempo/noticias/?IdNoticia=112295

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