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quinta-feira, 28 de dezembro de 2023

Expansionismo alemão, Liberalismo imperial e os Estados Unidos, 1776–1945

Alemanha e o Imperialismo "Laissez-Faire" dos Estados Unidos

Ligado ao aumento da capacidade industrial doméstica e a ascensão de uma clsse política instruída, comercialmente com mentalidade liberal e desejosa de expandir oportunidades econômicas, a penetração global da Alemanha durante o longo século XIX foi predicada na convicção de que a expansão ultramarina traria tanto benefícios mercantis e mudanças políticas internas. Ao longo da última década, este período de mudança interna e da atividade internacional foi um campo frutífero para pesquisadores estudarem o desenvolvimento histórico da Alemanha. Os historiadores têm uma variação ao enquadrarem esta penetração através do conceito superordenado da "globalização"; ou alternativamente, de imperialismo, que é uma das principais formas históricas primárias de "globalização".

Quer sejam vistas como esforços imperiais ou globalizantes, as tentativas alemãs de penetração ultramarina durante o século XIX não ocorreram num vácuo histórico, com numerosos impérios europeus preexistentes praticamente expulsando a Alemanha das fileiras dos impérios globais. Enquanto os antiquados impérios ibéricos ofereciam um contra-exemplo aos liberais alemães, os impérios de águas azuis dos britânicos, dos franceses e dos holandeses eram vistos pelos liberais alemães como exemplos de empreendimentos imperialistas liberais europeus bem-sucedidos. Com grande entusiasmo e clareza, Jens-Uwe Guettel defende que falta neste quadro o papel fundamental dos Estados Unidos, que ele argumenta ser central para a compreensão alemã do império liberal e, em alguns aspectos, oferece um modelo para as abordagens alemãs ao expansionismo. Guettel traça o imperialismo liberal da Alemanha, ou como ele o chama, “liberalismo imperial”, desde o final do século XVIII até meados do século XX, mostrando os numerosos pontos de sobreposição transatlântica.

Começando pelas respectivas meditações sobre a escravidão de Immanuel Kant, Alexander von Humboldt e Christoph Meiners, cujo conteúdo deriva de modelos anglo-americanos, ele ilustra como a tensão entre a experiência negativa da condição de escravidão para o escravo, e a utilidade da escravidão enquanto instituição que permite um maior desenvolvimento económico europeu, foi decidida a favor desta última. A partir daqui, o relato de Guettel avança para uma refutação da noção de qualquer afinidade ou empatia alemã especial pela situação dos nativos americanos. Ele faz isso demonstrando a recepção favorável na Alemanha das narrativas norte-americanas sobre os ameríndios “desaparecidos”, que apresentavam as extraordinárias taxas de mortalidade excessivas associadas à expansão imperial como ocorrências "naturais" inexplicáveis ou, muitas vezes, como um processo alinhado com os desenvolvimentos históricos mundiais que ditaram que as formas de vida “superiores” devem substituir as formas “inferiores”.

Astutamente, Guettel salienta que este discurso racializante era multidirecional, com Friedrich Ratzel não apenas transmitindo o pensamento atual dos EUA sobre a política indígena, mas também contribuindo para a renovação do pensamento imperialista liberal nos Estados Unidos, influenciando figuras como Frederick Jackson Turner. Neste ponto, poderia ter sido interessante ver Guettel ir ainda mais longe e tentar avaliar o impacto e a ação dos colonos alemães comuns nos Estados Unidos neste intercâmbio transcontinental. Uma tarefa reconhecidamente difícil, mas que poderia ter sido possível por utilizar o material descoberto por Stefan von Senger und Etterlin na sua obra de 1991 "Neu-Deutschland in Nordamerika: Massenauswanderung, nationale Gruppenansiedlungen und liberale Kolonialbewegung, 1815 – 1860".

Um dos principais elementos do imperialismo norte-americano que Guettel vê como uma boa tradução para o contexto alemão foi a ênfase no que ele conceitua de "estilo americano" de abordagem do laissez-faire para o Império, que ele argumenta que particularmente formou as visões não apenas de Ratzel mas também do secretário colonial da "esquerda liberal" Bernhard Dernburg. No centro deste modelo norte-americano estavam a liberdade política, autossuficiência econômica, uma abordagem descentralizada dos padrões de colonização e uma abordagem localizada, "racional", de questões de hierarquia colonial racial. Enquanto os três primeiros, certamente o laissez-faire e os aspectos descentralizados da política racial dos EUA que a Alemanha adotou não eram, pelo menos até o final do período imperial, nem sempre aparentes, como Guettel admite. Uma tensão entre impulsos localizados e centralizadores eram aparente e acentuadamente pronunciados sob o secretário colonial da esquerda liberal Wilhelm Solf, que em 1912 saiu de uma posição de que decretos específicos da colônia proibindo miscigenação e casamentos mistos para uma demanda de que tais medidas fossem promulgadas em Berlim e consagradas na legislação nacional. Como o apelo de Solf por uma lei contra os casamentos mistos foi derrotado por uma combinação de forças do "Partido Centrista Católico" (Zentrum) e pelos Social-democratas no Reichstag, Guettel explica como Solf uma vez mais recorreu ao exemplo dos Estados Unidos; desta vez para estudar como as leis do segregacionista Jim Crow de alguns estados coexistiam com as Emendas 14 e 15, que pareciam contradizê-las em nível federal.

Guettel quite correctly reveals just how much changed for Germany after World War One. Germany lost a significant portion of its territory, including all of its overseas colonies, while also enduring a period of partial occupation, including occupation by African troops brought in under French auspices. This inversion of the hitherto-prevailing colonial socio-racial order was decried in the German press. In addition, as a result of the American entry into the war, Germany’s relationship with the United States suffered greatly, to the extent that favorable allusions to U.S. racial conditions in post-1918 German debates fell off markedly. Even more obvious, Guettel reveals, was the Nazi Party’s disdain for the state of racial law in the United States. Rejecting the prewar enthusiasm for a decentralized approach to racial law, the Nazis instead argued that the United States was in fact a racially degenerating counterexample which should follow the new, highly centralized German approach. “Unlike in 1912,” Guettel argues, “in 1935 America was not allowed to be exemplary” (p. 200). The previously admired liberal mode of U.S. imperialism was necessarily criticized on the same grounds--it lacked centralization and was too heavily bound up in notions such as individualism and political liberty which, the Nazis claimed, they had superseded. In this way, Guettel convincingly disrupts accounts of Nazi imperialism that stress its continuity with prewar forms of liberal imperialism, suggesting instead that “the pre-1914 imperialism and post-1918 visions of living space in the East existed as perceived opposites within a framework of dialectical tension” (p. 223).

Um campo natural de investigação adicional, tanto para o autor como para outros futuros pesquisadores, são as representações liberais da Europa Central na Alemanha do século XIX. Abordada brevemente no primeiro capítulo, é uma área que pode precisar de uma análise mais aprofundada. Talvez em deferência à distinção seminal de Lebensraum/Weltpolitik de Woodruff Smith, Guettel parece sublinhar a distinção entre império ultramarino e império europeu contíguo nos círculos liberais.[1] Embora ele aponte corretamente as diferenças marcantes entre o imperialismo liberal e o imperialismo Nazista em termos de modalidade política, política racial e modo de execução, vale a pena lembrar que liberais alemães como Friedrich List, Friedrich Naumann e Max Weber também tiveram seus próprios sentidos de uma Mitteleuropa (Europa Central) dominada pela Alemanha que complementava as exigências liberais de um império ultramarino, como reconhece Guettel (p. 63). A sobreposição parcial na topografia imperial dos alemães liberais e dos alemães nazistas não significa que existissem continuidades estruturais ou políticas exclusivamente alemãs que determinaram a mudança do imperialismo liberal para o imperialismo nazi. Dado também que o imperialismo liberal dos EUA assumiu, em grande parte (mas não exclusivamente), a forma de uma expansão territorial contígua, Guettel poderia avaliar com proveito como a Europa Central olhava não apenas para os nazis, mas também para os alemães liberais do século XIX, com traços de familiaridade com o expansionismo dos EUA. Isto poderia potencialmente fortalecer a sua já detalhada e convincente refutação das linhas abrangentes e idiossincráticas de continuidade política e imperial na história alemã.

O livro de Guettel é admirável por várias razões. Disseca de forma hábil os mitos "gêmios" de que o expansionismo norte-americano era unicamente desprovido de violência, características imperialistas e que a história do imperialismo alemão é de alguma forma reduzido à violência proto-nazista. Citando a miríade de afirmações de intentos violentos contra populações indígenas feitas pelos liberais dos EUA e destacando a transferência dessas afirmações pro discurso público alemão, Guettel expõe com precisão como estratégias para a consolidação imperial não ficaram restritas a Estados-nações em particular mas foram repassados, translocados. O livro também contextualiza o pré-guerra do imperialismo alemão dentro de um meio liberal que compartilhava uma série de suposições com seu homólogo norte-americano acerca das formas corretas de penetração imperialista e dos meios necessários para lidar com as populações indígenas relutantes ou incpazes de se submeterem aos "rigores" da dominação político-militar europeia e do trabalho disciplinado. Como Guettel mostra, o imperialismo e as formas de conhecimento sócio-racial que ele gerou foram uma parte integral do liberalismo de ambos os lados do Atlântico.

Notas:

[1]. Woodruff D. Smith; The Ideological Origins of Nazi Imperialism (Nova Iórque: Oxford University Press, 1986).

Jens-Uwe Guettel. German Expansionism, Imperial Liberalism and the United States, 1776–1945. Cambridge: Cambridge University Press, 2012. 292 S. $90.00 (cloth), ISBN 978-1-107-02469-4.

Revisado por Matthew P. Fitzpatrick (Universidade de Flinders)
Publicado em H-Diplo (Abril de 2013)
Encomendado por Seth Offenbach

Fonte: H-Net
https://www.h-net.org/reviews/showrev.php?id=38209
Tradução: Roberto Lucena

domingo, 18 de outubro de 2015

Candidata a prefeita na Alemanha é esfaqueada por receber refugiados

Foto: Bild.de/Reprodução.A candidata foi esfaqueada
quando fazia campanha em um mercado
A chanceler Angela Merkel expressou o seu "choque" neste sábado com o ataque contra a candidata à prefeitura de Colônia

Uma política alemã foi esfaqueada neste sábado por motivos aparentemente "racistas", vinculados à política de recepção de refugiados, no momento em que migrantes entram na União Europeia (UE) pela Eslovênia, depois que a Hungria fechou a fronteira com a Croácia.

Poucas horas depois de dois novos naufrágios que mataram pelo menos 16 migrantes mortos nas costas da Grécia e Turquia, a chanceler Angela Merkel expressou o seu "choque" neste sábado com o ataque contra a candidata à prefeitura de Colônia (oeste) Henriette Reker, em um clima de grande tensão provocada pela política migratória do governo.

"A chanceler expressou seu choque e condenou o ato", disse à AFP uma porta-voz do governo.

A Alemanha deve receber em 2015 até um milhão de refugiados, um recorde sem precedentes.

A candidata foi esfaqueada quando fazia campanha em um mercado, anunciou a polícia regional.

Reker, gravemente ferida no pescoço, era a responsável pela recepção dos refugiados na prefeitura de Colonia, explicou Wolfgang Albers, chefe de polícia da Renânia do Norte-Vestfália.

"Neste contexto, privilegiamos uma ação política" disse.

O agressor, um alemão desempregado há muito tempo e detido depois do crime, "disse que cometeu o ato com uma motivação racista", indicou o chefe de polícia de Colônia, Norbert Wagner.

Reker, candidata sem partido, mas apoiada pelos conservadores (CDU) de Angela Merkel, é uma das candidatas favoritas à prefeitura de Colônia, a quarta maior cidade da Alemanha, com 980.000 habitantes.

Ela sofreu "ferimentos graves", mas o quadro é "estável", afirmou Albers.

Ao mesmo tempo, os migrantes que tentam chegar ao norte da Europa pelos Bálcãs começaram a entrar na Eslovênia neste sábado, depois que a Hungria fechou a fronteira com a Croácia.

A Eslovênia recebeu durante a manhã os primeiros ônibus de migrantes procedentes da Croácia. Poucas horas depois, os primeiros refugiados chegaram à fronteira com a Áustria, confirmando que o "corredor" para o oeste prometido pela Eslovênia está operacional.

O Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (Acnur) expressou satisfação e destacou que as autoridades eslovenas asseguram o fluxo de refugiados, principalmente da Síria, Iraque e Afeganistão.

O governo esloveno informou conversações com a Croácia (em Zagreb) para criar "um ou dois" pontos de atendimento aos migrantes.

A Hungria fechou na sexta-feira os principais pontos de passagem de migrantes na fronteira com a Croácia, bloqueada agora em vários trechos por uma grande cerca de alambrados.

Mais de 170.000 migrantes entraram na Hungria pela fronteira com a Croácia desde 15 de setembro. Os dois países estabeleceram uma colaboração para assegurar o trânsito diário.

Novos naufrágios fatais

Os milhares de migrantes que tentam entrar na Europa pela Grécia, Macedônia e Sérvia prosseguem com as viagens extremamente arriscadas.

Doze migrantes morreram afogados neste sábado quando a embarcação em que viajavam naufragou na costa da Turquia, informou agência de notícias turca Anatólia.

A Guarda Costeira do país conseguiu recuperar os corpos que estavam em um bote de madeira que partiu da estação balneária de Ayvalik (noroeste) com destino à ilha grega de Lesbos, segundo a agência.

As equipes de emergência também resgataram 25 passageiros da embarcação, que pediram ajuda com seus telefones celulares.

Mais cedo, a Guarda Costeira da Grécia anunciou a morte de quatro migrantes, três crianças e uma mulher, no naufrágio de uma embarcação no mar Egeu.

Onze pessoas que estavam no mesmo bote foram resgatadas e as equipes de emergência procuram uma criança que está desaparecida.

Quase 300 migrantes morreram no mar Egeu em 2015, durante tentativas de fugir dos conflitos e da pobreza em seus países, informou a Organização Internacional para as Migrações (OIM).

Mais de 600.000 migrantes atravessaram o Mediterrâneo desde janeiro, segundo a OIM, sendo que mais de 466.000 desembarcaram na Grécia. Mais de 3.000 pessoas morreram na travessia.

Fonte: Diário de Canoas
http://www.diariodecanoas.com.br/_conteudo/2015/10/noticias/mundo/230218-candidata-a-prefeita-na-alemanha-e-esfaqueada-por-receber-refugiados.html

Ver mais:
Polícia alemã suspeita de xenofobia em ataque a Reker (Terra/DW)

sábado, 17 de outubro de 2015

Reinhold Quaatz e o "Partido do Povo Alemão" (DVP). A direita radical liberal-conservadora alemã, pavimento do Nazismo

Reinhold Quaatz
Reinhold Quaatz (nasceu em 08 de maio de 1876 em Berlim - morreu em 15 agosto de 1953 em Berlim Ocidental) foi um político conservador alemão ativo durante a República de Weimar. Embora associado com a extrema-direita e tendências völkisch (A), Quaatz era meio-judeu em ascendência. [1]

Quaatz foi membro do Reichstag, sendo eleito pela primeira vez em 1920 pelo Partido do Povo Alemão (DVP) (B) antes deste se converter em Partido Nacional do Povo Alemão (DNVP) e mantendo seu assento até o estabelecimento do regime nazista. [2] Ele fora um membro da Nationalliberale Vereinigung (C), um grupo de proprietários de terras que era filiado à DVP, e que também incluía as preferências de Johann Becker, Moritz Klönne, Albert Vogler e Alfred Gildemeister, mas então colidiram com a liderança do partido e mudaram para o DNVP (D) no início de 1924. Como resultado disso, Quaatz concorreu pela sigla do DNVP na eleição de maio 1924 a partir de então. [3] Como membro do DNVP, Quaatz foi pessoalmente próximo ao líder do partido, Alfred Hugenberg. O industrial frequentemente foi confidente de seu amigo, fato demonstrado quando os diários de Quaatz foram publicados em 1989. [4] Apesar de sua mãe ser judia, Quaatz endossou as políticas antissemitas durante seu tempo como político do DNVP e até mesmo encorajou Hugenburg a trabalhar estreitamente com Adolf Hitler porque ele temia tanto o socialismo como o catolicismo político do Partido Centrista. [5]

Longe da política, ele era industrial e financista, e no início de 1933 ele foi nomeado para a diretoria do Banco Dresdner. [6] Ele foi removido dessa posição em fevereiro de 1936 devido às leis nazistas que barravam os Mischling (E) de tais posições. [7] Ele foi brevemente interrogado pela Gestapo logo após o atentado em 1944 contra a vida de Hitler, mas geralmente seus contactos de alto nível significavam que ele merecia pouca atenção do Estado. [7] Ele foi membro fundador da União Democrata-Cristã em Berlim (F), após a guerra.

Referências:

[1] Hermann Beck, The Fateful Alliance: German Conservatives and Nazis in 1933: The Machtergreifung in a New Light, Berghahn Books, 2009, pág. 199
[2] Datenbank der deutschen Parlamentsabgeordneten
[3] Beck, The Fateful Alliance, pág. 24
[4] Beck, The Fateful Alliance, pág. 91
[5] Hermann Weiss und Paul Hoser (eds), Die Deutschnationalen und die Zerstörung der Weimarer Republik. Aus dem Tagebuch von Reinhold Quaatz 1928-1933 (Schriftenreihe der Vierteljahrshefte für Zeitgeschichte 59), Oldenbourg: Munich 1989, págs. 19-21
[6] Gerald D. Feldman, Wolfgang Seibel, Networks of Nazi Persecution: Bureaucracy, Business, and the Organization of the Holocaust, Berghahn Books, 2006, pág. 48
[7] Hermann Weiss und Paul Hoser (eds), Die Deutschnationalen und die Zerstörung der Weimarer Republik. Aus dem Tagebuch von Reinhold Quaatz 1928-1933 (Schriftenreihe der Vierteljahrshefte für Zeitgeschichte 59), Oldenbourg: Munich 1989, pág. 17

Meus acréscimos:
(coloquei os destaques como letras entre parênteses no texto)

A) Do Movimento Völkisch, da palavra "Volk" (povo), referente a um movimento cultural-político reacionário que exaltava ou ressaltava a cultura e folclore dos povos germânicos e de unificação dos mesmos, serviu de base a todos os grupos de extrema-direita na Alemanha, notadamente o Partido Nazista que foi o grupo mais bem sucedido entre os grupos de extrema-direita e fundador do Terceiro Reich.

B) DVP (Deutsche Volkspartei), Partido do Povo Alemão, ou em inglês German People's Party. Partido de linha ideológica nacional-liberal ou liberal-conservador, de extrema-direita, sucessor do Partido Nacional Liberal National Liberal que acabou em 1918. Depois mudou o nome para Partido Nacional do Povo Alemão (tradução livre do nome em inglês German National People's Party). Todas foram formações de extrema-direita, liberais e conservadoras.

C) Nationalliberale Vereinigung, tradução Associação Nacional Liberal (do inglês National Liberal Association). Era um grupo de extrema-direita liberal, reacionário, anti-marxista, dentro do próprio DVNP. Um círculo de industrialistas que não se sentiam ideologicamente separados dos nacionalistas. Para mais informações, confiram os links: The Rise and Fall of Weimar Democracy; Recasting Bourgeois Europe: Stabilization in France, Germany, and Italy in the Decade after World War I

D) DNVP (Deutschnationale Volkspartei), Partido Nacional do Povo Alemão (explicação acima).

E) Sobre Mischling, ler Os "Mischlinge" (ou clique no marcador/tag). Era como eram chamados os "mestiços", gente com alguma ascendência judaica segundo a classificação racista das Leis de Nuremberg.

F) União Democrata-Cristã (em alemão Christlich Demokratische Union Deutschlands, sigla CDU), partido da atual chanceler da Alemanha, Angela Merkel. O Reinhold Quaatz, segundo o registro, foi membro fundador da CDU. Mas no Brasil uma trupe de petulantes pernósticos ignorantes toda vez vêm encher o saco com a lenga-lenga do "nazismo de esquerda" tentando se dissociar do termo extrema-direita. Não estou afirmando que a CDU atual tenha a ver com o Partido Nazi (alguns conseguiriam interpretar isto pois não querem que se comente nada sobre nazismo e direita, mas não estou numa ditadura de direita liberal ainda, então vão com calma), mas quando se fala em espectro político de direita, isso engloba todos os grupos de direita e é curioso que o Quaatz e vários outros radicais de direita não tinha objeção a Hitler (ou tanta objeção), além de nacionalistas, e no Brasil os grupos organizados liberais tentam à força reescrever a História da segunda guerra e da Alemanha negando fatos e conexões. Eu detalharei isto no comentário do post que será colocado em um post à parte depois pois o post ficaria muito extenso.

Fonte: Wikipedia (verbetes da versão inglesa e foto da versão alemã)
https://en.wikipedia.org/wiki/Reinhold_Quaatz
https://de.wikipedia.org/wiki/Reinhold_Quaatz
Título original: Reinhold Quaatz (verbete, Wikipedia versão inglesa)
Tradução: Roberto Lucena
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Observação 1: sobre o conteúdo do post, será colocada em um post à parte.

Observação 2: em caso de cópia de texto do post, por ser o texto original (em inglês) um verbete da Wikipedia, caso alguém queira colocar na Wikipedia em português, cite a fonte, ou mesmo em qualquer canto. É a postura padrão, correta, de se usar um texto, porque a tradução do verbete é do blog. Eu até colocaria na Wikipedia o texto, mas já tive texto ou trecho cortado de lá e link do blog removido (na versão em português), quando isto não ocorre nos verbetes em inglês porque se um texto consta de um site, o site tem que ser citado, ou então que arrume outra fonte pra copiar. Parece tolice a observação, mas é grotesca a postura de preconceito com blogs, sites etc na versão em português da Wikipedia, fora a cultura disseminada de que a Wikipedia não "presta". A Wikipedia presta, a versão em inglês é muito boa (melhor que muita enciclopédia conhecida), o problema dela são as versões de país com cultura mesquinha, cabeça pequena que criam esse tipo de problema (não me refiro só ao Brasil, o problema abrange todo mundo "lusófono"). Já tá na hora de mudar de postura e deixarem esse pedantismo (culto à burrice) de lado.

Os maiores prejudicados com este tipo de postura mesquinha são: 1. o povo. 2. a visão negativa que se cria em torno desse elitismo burro e pedantismo de gente com preconceito tosco com blogs e sites (quem geralmente corta é algum afetado metido a "sabido") com conteúdo quando ao mesmo tempo este pessoal pouca acrescenta ou repassa pro povo algum conhecimento. Não acrescentam mas cortam, atrapalham, enchem o saco.

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Sobre comentários xenófobos na DW Brasil

Estou transcrevendo pra cá o comentário extra que fiz no post sobre o chute da repórter húngara do Jobbik. Sobre comentários xenófobos na DW Brasil proferidos principalmente por brasileiros, alguns inclusive vivendo na Alemanha. Há que separar o joio do trigo pois há vários brasileiros vivendo na Alemanha que não têm nada a ver com a postura dessa minoria de imbecis, justamente por isso serve o alerta já que na versão em inglês dessa publicação ela costuma fazer uma limpa dos comentários desse tipo ou chamar atenção, fora que há órgãos alemães monitorando as verões dessas publicações em inglês e alemão, resta saber se verificam também as em português.

Os ataques xenófobos são variados. Quando há publicação sobre nazismo e Holocausto aparecem os germanófilos pró-nazi com antissemitismo e afins. Quando há publicação sobre refugiados da Síria, a xenofobia é direcionada a muçulmanos e tudo o que se possa imaginar, coisa pesada mesmo, fora os comentários dos que sofrem complexo de vira-lata agudo atacando tudo do país com uma idealização (de Cinderela) que beira o ridículo de outros países, algo sem propósito que torna a convivência com essas pessoas insuportável (impossível), fora que, é desagradável ler uma publicação e já estar entupida de porcaria xenófoba de cima abaixo. A revista não está tratando como deve o país. E por favor (a quem queira vir chiar), eu não sofro de "vira-latice", comigo esse papo de "Brasil é uma merda" não causa comoção alguma a não ser desprezo profundo. Sim, eu sei que o país tem problemas, todos os países do mundo têm, mas não é com lamúrias que vocês irão mudar isso, não é torrando a paciência alheia atacando e menosprezando o país que irão mudar coisa alguma, se é que querem pois o vira-lata convicto quer mesmo a piedade alheia e isso eu jamais darei porque é falta de vergonha na cara. Sempre houve uma diferença entre críticas (sérias) ao país e choradeira de gente com complexo de vira-lata comentando idiotice, não são coisas iguais.

Como disse acima, espero que os órgãos alemães que leem estas publicações verifiquem o conteúdo xenófobo dessa brasileirada sem noção, pois sem noção ou não, estão incitando ódio de outro país e isso é crime na Alemanha, e no Brasil, mas aqui o Ministro Soneca (o Ministro da Justiça, Eduardo Cardozo) nunca fez nada, nem os ministros anteriores a ele sobre esse tipo de problema, tratam o problema com descaso até acontecer algo mais sério e serem cobrados por isso.

Sem mais delongas, transcrevo o comentário que fiz no outro post abaixo, pois acho melhor colocar comentários longos como posts à parte, facilita de ler o post original. Publicado originalmente aqui:
O ataque da repórter do Jobbik (extrema-direita) na Hungria aos refugiados
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2. Vou fazer outro relato de problema referente à xenofobia, agora vindo de brasileiros, mas se for melhor colocar num post à parte depois eu transfiro, que é sobre a presença de comentários xenófobos e racistas na edição da DW (Deutsche Welle) em português ou DW Brasil, comentários de brasileiros que fariam o cabo Adolfo (Hitler) corar de inveja com o conteúdo dos comentários. Eu acho que este segundo relato será removido depois e ficará em um post só pra retratar a DW, mas o antecipo aqui.

Não vou nem ressaltar a ignorância e estupidez da maioria dos que proferem os ataques, embora isso não "limpe a barra" deles (a intenção é a que conta), pois são muito, mas muito ignorantes. Não sabem absolutamente nada sobre o que se passa e se metem e emitir opinião cheia de preconceito pra querer "mostrar que existe". Que forma de inclusão esdrúxula esse pessoal "pratica", a pior possível, são orgulhosos da própria ignorância e falam com uma petulância fora do comum quando antes gente estúpida costumavhttps://draft.blogger.com/blogger.g?blogID=936216226993954018#allpostsa ter medo de dizer algo pra não passar por burro em público.

É uma enxurrada de comentários agressivos (xenófobos, preconceituosos etc), não são poucos. Alguns estão na Alemanha inclusive e poderiam (e deveriam) ser enquadrados em leis antirracismo naquele país, pra tomarem no mínimo vergonha na cara e não acharem que podem defecar imundície por alguma brecha que dão pois na frente dos outros devem posar de "anjinhos". Eles atacam longe dos olhos do pessoal daquele país se valendo da arena "vale-tudo" de extremismo que virou o país (Brasil) com esse Ministro da Justiça omisso (pra não usar outro termo), o Zé Cardozo ou Zé da "Justiça", o "petista" querido da mídia oligopolizada e seu "republicanismo" seletivo, uma nova "noção" de "justiça" (entre aspas).

Caso algum órgão alemão que trate dessas questões leia o blog, a DW precisa tomar uma chamada pois adota dois pesos e duas medidas no tratamento do problema. Na edição em inglês ela é cheia de dedos e corta os ataques aparentemente ou chama atenção, pra parecer zelosa, na versão do Brasil ela deixa a selvageria (racismo e xenofobia) rolar solta. Estão de "brincadeira", mas isso tem que ter fim.

Como já frisei, boa parte dos ataques xenófobos, racistas e sectários (tem ataque religioso no meio vindo de fanáticos) são feitos por brasileiros, ataques com viés de extrema-direita (o conteúdo), mas não é de gente ligada a agremiações fascistas, aparentemente (fascista no sentido literal do termo, tema tratado no blog), esse pessoal aparenta ser gente "comum", fazendo ataques e todo tipo de cretinice possíveis por estarem longe dos olhos do pessoal na Alemanha, teoricamente. Alguns residem na Alemanha o que permite o Estado alemão processá-los por crimes de ódio já que estão usando território alheio pra praticar patifaria e sujar a imagem do país, embora achem que estão "abafando", má educação e canalhice (preconceito) agora virou sinônimo de "status" pra esse pessoal.

Segue a tradução da matéria abaixo da jornalista fascista húngara pois evito, quando dá, colocar links de jornal do país justamente pela questão do oligopólio de mídia. Restou poucas mídias no Brasil pra se usar.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Alemanha tem série de protestos contra suposta "islamização" do país

Em Dresden, 10 mil pessoas participam de caminhada organizada por autodenominados "europeus patriotas". Manifestação contrária reúne cerca de 9 mil pessoas.
Manifestação convocada pelo grupo Pegida em Dresden, no leste da Alemanha
Uma série de protestos contra uma suposta "islamização" da Alemanha atingiu seu ápice até o momento nesta segunda-feira (08/12), quando um ato organizado pelo grupo Pegida reuniu cerca de 10 mil pessoas em Dresden, no leste do país, segundo cálculos da polícia.

Na mesma cidade, em torno de 9 mil pessoas protestaram contra o movimento, no qual veem sinais de xenofobia, nacionalismo e intolerância religiosa. Pegida é uma sigla em alemão para "Europeus patriotas contra a islamização do Ocidente". Entre outras bandeiras, defende o endurecimento das leis para asilo.

Manifestações semelhantes aconteceram em Düsseldorf, no oeste, reunindo cerca de 500 pessoas do lado do grupo Pegida e em torno de 750 do outro, segundo cálculos da polícia. Apesar de os integrantes do Pegida negarem que extremistas de direita façam parte do grupo, ao menos em Düsseldorf alguns manifestantes eram oriundos da cena neonazista.

Em Dresden, a manifestação contra o grupo Pegida foi organizada pelas igrejas cristãs, por organizações judaicas e islâmicas, por estudantes e pela universidade local.

Apesar de alguns pequenos conflitos entre os dois lados em Dresden, todas as manifestações desta segunda transcorreram sem o registro de incidentes graves pela polícia.

Os protestos contra a "islamização" começaram em Dresden, há oito semanas, e são realizados sempre às segundas-feiras. Chama a atenção que o estado da Saxônia, do qual Dresden é a capital, praticamente não tem muçulmanos. Eles representam 0,1% da população local, segundo o último censo. Quase todos os muçulmanos que vivem na Alemanha estão no lado ocidental.

Apesar de os membros do Pegida fazerem questão de ressaltar que não possuem relações com a extrema direita, o partido extremista NPD já declarou ter simpatia pelos protestos. O partido eurocético Alternativa para a Alemanha (AfD) afirmou entender os motivos dos manifestantes.

Cartazes pedem fim da "islamização da Europa"
AS/dpa/afp/ots

Fonte: Deutsche Welle (Alemanha)
http://www.dw.de/alemanha-tem-s%C3%A9rie-de-protestos-contra-suposta-islamiza%C3%A7%C3%A3o-do-pa%C3%ADs/a-18117431

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Svenja Leiber: “Culturalmente, a Alemanha ainda não se recuperou do Holocausto”

A escritora alemã publica 'Los tres violines de Ruven Preuk' (Malpaso) (Os três violinos de Ruven Preuk, tradução livre).

Svenja Leiber
Literatura como seguimento, literatura que se toma o garoto e deixa o homem, e levanta ata de sua formação: é assim que funciona 'Los tres violines de Ruven Preuk' (Malpaso) [Os três violinos de Ruven Preuk, tradução livre], a segunda novela da escritora alemã Svenja Leiber (Hamburgo, 1975), que conta a peripécia de um músico alemão através do campo minado do século vinte. O jovem Preuk, um superdotado do violino, não só assiste - primeiro como espectador, e como soldado depois - a duas guerras mundiais e seus seguintes pós-guerras, como emigra do campo para a cidade, converte-se em músico, namora e se casa, triunfa e fracassa, e presencia, por fim, o vago despertar do fim do século.

O estilo de Leiber, um presente deliberadamente frio, elíptico nas zonas de sombra, se abraça ao fato visto por uma lupa. Com detalhe. Sua intenção é contar a outra guerra: o pós-guerra, o grande através do pequeno, o que ocorreu não só na retaguarda, senão no lar, ainda mais ao fundo de quem se livrou do front, mas que ao invés teve que esperar, entre ruínas e entulhos, a vitória ou a devastação. Por isso Hitler não é citado nominalmente - se faz referência ao Führer só uma vez - e não se mencionam fatos, nem batalhas, nem campos de concentração. "A política não se pode ficcionar - disse Leiber, uma alemã considerável, alta e elegante -, mas ao mesmo tempo toda novela é política, pois a política começa na vida dos homens e disso se ocupa a literatura. Eludir a cita direta não é difícil: cada coisa que ocorreu teve sua consequência direta na gente".

-De onde vem a história de Ruven e seus três violinos?

-Eu cresci em um povoado próximo de Hamburgo, e ali um dos granjeiros tinha três violinos, um dos quais, tinha um valor incalculável. O problema é que nunca soube qual de todos eles era o violino valioso. Partindo daí quis fazer uma analogia com a história de Orfeu a partir da relação do mito com a morte. Era essa, em resumo, a história que eu queria contar, uma história que, devido às andanças dos violinos, tinha que estar atravessada pelo século XX alemão. Alegro-me de ter escrito um livro que fala da história de meu país justo num momento em que percebo certa saturação dos alemães com respeito a isso.

-A que se credita este cansaço?

-É como se muitos alemãs tivessem chegado a uma espécie de limite. Não desejam seguir escutando o que ocorreu. Por outro lado, hoje há certa tendência a dizer: "Bem, fizemos o que fizemos, nosso país fez o que fez, mas eu estou orgulhoso de ser alemão. Já sei: nós alemães somos os melhores". Mas, no meu modo de ver, isso é incompatível com uma visão crítica da história. Continuamente, os meios nos dizem que somos melhores jogando o futebol, que a nível político lideramos a Europa e que somos uma potência econômica. Muito bem, mas vamos aonde nos levou a retórica dos vencedores? A vitória gera derrotados e Alemanha, tendo em conta seu passado, não se pode permitir essa mentalidade.

-Disse que os alemães estão cansados de sua história, mas no ano assado uma série de televisão, Filhos do Terceiro Reich (Unsere Mütter, unsere Väter), foi o maior sucesso de audiência na Alemanha nos últimos anos.

-É interessante que menciones essa série, porque para muitos foi a última gota que encheu o vaso. Minha opinião é que ela é horrível. É uma série cheia de clichês, tópica, sentimental no pior sentido, com essa música que que te falam quando tens que rir, quando tens que se emocionar etc. É uma visão romântica, e portanto, adulterada, do período mais duro do século XX. Por aí não pode ir nossa forma de afrontar o passado.

-Você também se refere, ao final do livro, ao chamado milagre alemão depois da devastação da Segunda Guerra Mundial. Ao lê-lo dá a sensação de que se fez de algum modo a luz.

-A verdade é que não estou muito convencida de que se fez a luz. Na realidade, o milagre alemão não foi tal. É certo que em pouco tempo se levantou um país novo, e no plano econômico pode parecer que as coisas vão bem, mas isso não quer dizer que se levantara um país melhor.

-Por onde há margem de melhorar a Alemanha? A que se refere quando diz que não é um país melhor?

-Refiro-me ao que ficou da guerra. Desde então, há um vazio gigantesco na Alemanha que no dia de hoje se chegou: não nos recuperamos em absoluto a nível cultural. O extermínio de toda a elite judaica foi trágico para a história cultural da Alemanha. é certo que se melhorou, mas ainda se te muito caminho. É curioso, porque hoje são precisamente emigrantes do leste, de procedência em sua maioria judaica, quem está fazendo a Alemanha se recuperar, pouco a pouco, parte do brilho do passado.

Fonte: El Cultural (Espanha)
http://www.elcultural.es/noticias/letras/Svenja-Leiber-Culturalmente-Alemania-aun-no-se-ha-recuperado-del-holocausto/6868
Título original: Svenja Leiber: “Culturalmente, Alemania aún no se ha recuperado del holocausto”
Tradução: Roberto Lucena

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

'Merkel abre velhas feridas'

Desde 'O jovem Törless' (1966) a 'Diplomacia', que estreia na próxima sexta-feira, poucas filmografias no continente que pisamos (o velho) vivem tão perenemente torturadas pela memória. A História Contemporânea está nas mãos de Volker Schlöndorff (Wiesbaden, 1939) uma ferramenta para fazer perguntas, para abrir cabeças. E assim até chegar a sua obra mais conhecida, mais premiada e mais dolorosa: 'O tambor', sobre a novela de Günter Grass; um filme que lhe valeu tanto o Oscar como a Palma de Ouro. "A única saída é Europa", comenta este alemão criado e formado na França em um inglês polido. E o diz em Valhadolid onde há algumas semanas apresentava seu último trabalho, um regresso ao ponto zero do que somos. Acaba a Segunda Guerra Mundial e o regime nazi claudicante sonha com a possibilidade de arrasar tudo desde as bases. A primeira coisa: Paris inteira.

Pe: Não lhe parece que ao reivindicar no estado atual das coisas a diplomacia sonha com o passado, em coisas de um século atrás?

Re: Não tenho isso claro. Talvez o mundo dos diplomatas da Primeira Guerra Mundial já não exista, mas a diplomacia necessária sim. Agora mesmo estava lendo sobre a Ucrânia, e me perguntava: como resolver o conflito se não através da diplomacia? Não há outra opção. O papel diplomático é prevenir uma guerra antes de que ela comece ou ajudar a acabar com alguma que já tenha começado. Porque os militares podem começar uma guerra mas não são capazes de acabá-la, limitam-se a lançar bombas.

Pe: Falamos então de política...

Re: Não, de diplomacia. A diplomacia é um trabalho muito nobre que lamentavelmente se perdeu. Os políticos se empenham em desempenhar trabalhos diplomáticos, mas não os podem fazer bem porque têm que se preocupar com as próximas eleições. Por outro lado, os diplomatas são empregados do Estado durante 30 anos, e eles sim podem entender as dinâmicas sociopolíticas melhor que ninguém. Aqui está o problema.

Pe: De novo um filme sobre a Segunda Guerra Mundial. A pergunta é talvez muito simples: Por que?

Re: Porque segue sendo necessário. Não temos memória suficiente. Creio sinceramente que dentro de 100 anos ainda seguiremos falando da Segunda Guerra Mundial. E a razão é que segue sendo a última grande guerra na Europa. E sempre falamos da última. Quando era criança, acompanhava meu pai, que era médico rural na ribeira do Reno. As pessoas da época então ainda seguiam falando de Napoleão como se tudo houvesse acontecido ontem. A memória tem seus próprios mecanismos: quando mais nos distanciamos de alguns fatos, mas se convertem esses em mito. Quando contemplamos as pinturas de Goya não pensamos em sua época, senão nele aqui e agora.

Pe: Mas, não se cansa de tanto insistir?

Re: o que me cansa é ver que às vezes insistir não serve para nada. Cada vez mais a Segunda Guerra Mundial é reduzida ao Holocausto. O que é uma estupidez. Se hoje em dia você pergunta a um norte-americano sobre a guerra, tudo o que diz é que os alemães trataram de aniquilar os judeus e que os norte-americanos entraram nela para acabá-la e salvar os judeus. Isso é a guerra graças a determinado cinema.

Pe: Seu esforço é quase messiânico...

Re: Minha filha de 22 anos me pergunta às vezes: por que você fala uma vez ou outra da Segunda Guerra Mundial? A razão é simples: nasci em 1939. E o mesmo pode se dizer para explicar meu interesse pelos estados totalitários. Sou um produto de Hitler e Stalin. A Europa nasceu do medo aos estados totalitários.

Pe: Já que você mencionou. Para que serve a Europa hoje?

Re: Para nos proteger da possibilidade do totalitarismo e para nos proteger de nós mesmos. Quando existia a ameaça de um estado totalitário, durante a Guerra Fria, juntar-nos era algo mais fácil. É quando essa ameaça desaparece que tudo se fez mais difícil. Suponho que se não fosse por minhas origens eu estaria mais interessado na democracia e como fazê-la funcionar.

Pe: Seu filme fala da França e da Alemanha, os lugares nos quais cresceu e os dois países que formam o núcleo da Europa...

Re: eu sou o filho da guerra e em particular das relações entre França e Alemanha; de sua reconciliação. Cheguei a Paris pela primeira vez em 1955, dez anos depois da guerra. Foi a primeira cidade que conheci na minha vida que não havia sido destruída pela guerra. Surpreendeu-me muitíssimo. Perguntava-me: era esse o aspecto que Berlim e Frankfurt tinham no passado?

Pe: Eu tentava lhe perguntar antes se acredita que agora vivemos o que se forjou então?

Re: Sem dúvida. Pertencemos a esse momento que conta o filme ao final da guerra. Não é mais necessário ver Merkel para se dar conta disso. Comporta-se como se fora o general no comando da Europa dizendo a todo mundo o que tem que fazer. Está abrindo velhas feridas e, na verdade, eu a fiz saber disso em pessoa. Mas pra ela é indiferente. Quando estava preparando o filme, cada dia ao abrir o jornal lia sobre o programa de austeridade de Merkel. No ato seguinte vinha Sarkozy dizendo que era necessário seguir o modelo alemão. Tenho a sensibilidade de que quando um francês fala em seguir o modelo alemão instintivamente lhe dá por exclamar: Heil Hitler!

Pe: Não lhe parece algo exagerado comparar aquela época com esta?

Re: De forma alguma. Os nazis sempre tiveram em mente a construção de uma nova Europa liderada pela Alemanha. Justo como agora. Göring era um grande europeísta.

Pe: E você, considera-se europeísta?

Re: sou um europeísta apaixonado e estou muito preocupado. O que parece não se entender é que as mentalidades são mais importantes que as leis. O modelo alemão não se pode exportar. Se um alemão deve cinco euros a um amigo, não poderá dormir por noites até que lhe tenham devolvido o dinheiro. Se lhes baixam os impostos para que tenham mais dinheiro para consumir, em lugar de fazer isso, eles meterão todas as suas economias no banco. É uma atitude protestante. O problema é que os economistas que dirigem a Europa não entendem de mentalidades.

Pe: Já que se anima a falar de alta política, como de longe ou perto vê a saída para a crise?

Re: a crise colocou sobre a mesa tudo o que estava escondido debaixo do tapete. Creio que inventar o euro e o impor da noite para o dia foi uma verdadeira ousadia. A princípio para todo mundo pareceu que não estava tão mal, mas agora nos damos conta de que os fundamentos da Europa não eram tão sólidos depois de tudo isso. Agora compreendemos que há que levar a cabo um debate mais sério, e que todo mundo deve ser incluído neste debate, ainda que sejam da extrema-esquerda ou da extrema-direita. Afinal, os europeus é que decidirão o que a Europa têm que ser, não os políticos nem nós os artistas. Billy Wilder dizia do público que separados todos são idiotas, mas juntos são um gênio. E dos europeus se pode dizer o mesmo.

LUIS MARTÍNEZ
Atualizado: 08/11/2014 05:39 horas

Fonte: El Mundo (Espanha)
http://www.elmundo.es/cultura/2014/11/08/545d0240ca474168668b456d.html
Título original: 'Merkel abre viejas heridas'
Tradução: Roberto Lucena

sábado, 13 de setembro de 2014

Propaganda antissemita culpou judeus por derrota na Primeira Guerra Mundial

Sempre discriminados, judeus alemães viram na Primeira Guerra a chance de finalmente provar seu patriotismo. Mas a propaganda antissemita fez deles bodes expiatórios para a derrota, preparando caminho para o Holocausto.


O soldado está sozinho na trincheira, de feição séria e rifle em punho, mirando o horizonte longínquo, lá onde o inimigo aguarda. Contudo, de acordo com esse cartão postal antissemita da Áustria, de 1919, o suposto "perigo verdadeiro" se encontra às suas costas. Uma figura vestida de branco se aproxima por trás, empunhando uma faca. Sorridente, ela se prepara para apunhalar o soldado, "traiçoeiramente, pelas costas".

Lenda da "punhalada pelas costas"

Mesmo sem a estrela de Davi no chapéu ou sem peiot (cachos laterais característicos dos ortodoxos), para os alemães e austríacos da época estava mais do que evidente que o suposto assassino traiçoeiro, nesse cartão-postal difamador, era um judeu. Repletos de ódio e preconceitos, os antissemitas divulgavam em seus panfletos e desenhos sempre os mesmos estereótipos desumanizadores: com os supostamente típicos lábios carnudos e nariz grande "de judeu".

Além disso, o desenhista do cartão-postal retrata a figura, evidentemente masculina, com vestido e seios de mulher. Isso porque, para a propaganda antissemita, os judeus eram covardes, traidores e – justamente – "afeminados". Contudo é o gesto anunciado neste cartão-postal que representa o maior – e completamente falso – mito surgido após o fim da Primeira Guerra Mundial, em 1918: a "lenda da punhalada pelas costas".

Segundo a versão do herói de guerra e futuro presidente da Alemanha (1925 a 1934) Paul von Hindenburg, o Exército alemão permanecera invicto no campo de batalha, mas teria sido "apunhalado nas costas por oposicionistas apátridas". O fato é que durante anos a propaganda alemã prometera vitória à população, mas quando despontou a ameaça da derrota, militares e políticos responsáveis quiseram se eximir de culpa. E logo se encontrou um bode expiatório: os judeus.

Cartão postal antissemita de 1919
Patriotismo e judaísmo

Ao eclodir a Primeira Guerra Mundial, em agosto de 1914, o então imperador Guilherme 2º declarara: "Para mim, são todos alemães!". Muitos judeus torceram para que a afirmação se provasse verdadeira. Até então, apesar da igualdade atestada por lei, os judeus da Alemanha costumavam ser tratados como cidadãos de segunda classe. Por toda parte, esbarravam em discriminação e rejeição.

Caricatura "Traição de Judas" ilustra
mito da "punhalada pelas costas"
Era praticamente nula, por exemplo, a presença judaica no alto escalão do Exército. Assim, com a eclosão da guerra, muitos acreditaram que teriam a chance de provar seu patriotismo e refutar os odiosos preconceitos antissemitas.

"Aos judeus alemães! Nesta hora decisiva para seu destino, a pátria convoca todos os seus filhos a se alistarem!", conclamava, por exemplo, a Associação Central dos Cidadãos Alemães de Fé Judaica a seus membros, ao início da guerra. "Camaradas de fé! Nós os convocamos para dedicar vossas forças à pátria, para além do limite do dever cívico", prosseguia o texto.

De fato, cerca de 100 mil judeus alemães lutaram na Primeira Guerra Mundial. E, como esperado, a perseguição antissemita diminuiu com o início dos combates – reprimida pela censura do Estado, o qual, em sua política de paz civil (Burgfriedenpolitik), recolhia os panfletos de incitação popular.

Contagem falsificada

Com o decorrer da guerra, no entanto, organizações antissemitas, como o Reichshammerbund (Liga do Martelo do Reich), voltaram a reforçar a instigação contra os judeus. Inúmeras petições alcançaram, por exemplo, o Ministério prussiano da Guerra: supostamente constatou-se um nível de abstenção do serviço militar desproporcionalmente alto entre os judeus, os quais, portanto, estariam se esquivando do "serviço à pátria".

A propaganda antissemita vingou: em outubro de 1916, o ministro da Guerra ordenou um recenseamento dos judeus conscritos presentes no Exército, que entrou para a história como Judenzählung (contagem dos judeus). A medida causou indignação entre os muitos soldados judeus. "Deus nos livre! Então é para isso que a gente arrisca a cabeça pelo nosso país", protestou, por exemplo, o soldado judeu alemão Julius Marx.

O resultado da "contagem" nunca foi divulgado. Na realidade, as 30 mil condecorações de bravura concedidas a judeus comprovam o quanto a propaganda antissemita era falsa. Mas o estrago estava feito: panfletos antissemitas difundiam frases como "A cara sorridente deles está por toda parte, menos nas trincheiras". Ao mesmo tempo, os judeus eram acusados de ter lucrado com a guerra.

Associação de judeus tentou corrigir propaganda mentirosa, apelando "às mães alemãs"
Bodes expiatórios

"Às mães alemãs" dirigiu-se, por sua vez, a Federação do Reich dos Soldados Judeus no Front, em 1920. No cartaz, uma mãe de luto está sentada ao pé de um túmulo ornamentado com a Cruz de Ferro, de mérito militar: "Mães alemãs, não tolerem que as mães judias sejam escarnecidas em sua dor." "Doze mil soldados judeus tombaram nos campos de batalha pela honra da pátria", diz a lápide.

De origem judaica, ministro do
Exterior Walther Rathenau foi
assassinado em 1922
A mensagem é que soldados judeus e não judeus haviam lutado juntos e sido enterrados em "terras estrangeiras". Por fim, o cartaz se dirige contra a perseguição antissemita: "O ódio partidário cego não se detém diante dos túmulos dos mortos." A referência é, em grande parte, à "lenda da punhalada pelas costas", que a essa altura já era amplamente conhecida na população. Judeus, socialistas e democratas serviam como bode expiatório pela derrota na guerra.

Após o colapso do Reich Alemão, fundou-se a democrática República de Weimar, rejeitada por muitos alemães. O jovem Estado foi escarnecido como "República dos Judeus" e seus representantes tornaram-se vítimas de violência e atentados.

O ministro do Exterior Walther Rathenau morreu num ataque de extrema direita, em 1922. Antes, porém, as tendências homicidas contra o político de origem judaica haviam sido encorajadas por palavras de ordem do gênero "Porco judeu, o Rathenau, matem ele a golpes de pau".

Na propaganda nazista, por fim, o clichê do judeu se tornou símbolo para tudo que os populistas de extrema direita rejeitavam: derrota na guerra, revolução, socialismo, democracia. Após a tomada do poder pelos nazistas, começou uma perseguição aos judeus sem precedentes na história, que culminou no Holocausto. E neste, a desumana propaganda antissemita, difundida há tanto tempo, desempenharia um papel fundamental.

Fonte: Deutsche Welle Brasil (Alemanha)
http://www.dw.de/propaganda-antissemita-culpou-judeus-por-derrota-na-primeira-guerra-mundial/a-17833503

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Alemanha endurece legislação contra crimes racistas

Beate Zschäpe, única sobrevivente do NSU, é julgada
pelo Tribunal de Munique desde maio de 2013.
REUTERS/Michael Dalder
RFI
O governo alemão aprovou nesta quarta-feira (27) um projeto de lei que pretende endurecer as leis contra crimes racistas. A decisão acontece durante o julgamento da única sobrevivente do grupo neonazista Clandestinidade Nacional-Socialista (NSU), acusado de dez mortes e dois atentados.

O Conselho de ministros adotou também as propostas de uma comissão parlamentar encarregada de esclarecer as falhas da investigação dos crimes cometidos pelo NSU. Todas elas alertam para as motivações racistas e xenófobas do grupo.

Entre 2000 e 2007, o grupo formado por Beate Zschäpe, Uwe Mundlos e Uwe Böhnhardt assassinou dez pessoas, oito deles de origem turca, cometeu dois atentados à bomba e realizou diversos assaltos a bancos. Mundlos e Böhnhardt se suicidaram em 2011. Zschäpe, de 38 anos, é julgada desde 2013 pelo Tribunal de Munique, no sul da Alemanha.

O projeto de lei, que ainda deve ser aprovado pelo Parlamento, sugere que as autoridades considerem o caráter racista de alguns crimes. O projeto de lei também repassa à Justiça federal a gestão das investigações relacionadas a grupos extremistas.

“Nós temos o dever de impedir que esses tipos de crime nunca mais se repitam”, disse hoje, em um comunicado, o ministro alemão da Justiça, Heiko Maas, referindo-se ao NSU. Para ele, o grupo pôde agir durante muito tempo sem ser punido.

O porta-voz do governo alemão, Steffen Seibert, classificou o trio como “uma célula terrorista” e lembrou o quanto chocou a Alemanha com os assassinatos de dez pessoas em sete anos.

Falhas policiais

A comissão de investigação parlamentar sobre o NSU finalizou, em agosto de 2013, um relatório de mil páginas sobre as falhas policiais que resultaram na continuação das atividades do grupo.

O documento ressalta a falta de coordenação entre as autoridades de várias regiões onde os crimes foram registrados. O documento também aponta na demora dos investigadores em oficializar a hipótese que as ações do grupo visavam principalmente a comunidade turca na Alemanha.

Fonte: RFI
http://www.portugues.rfi.fr/geral/20140827-alemanha-endurece-legislacao-contra-crimes-racistas

sábado, 31 de maio de 2014

Eurodeputado alemão já foi condenado por definir Hitler como "um grande homem"

Udo Voigt foi o único eleito pelo NPD, o partido de cariz neonazi alemão que Berlim quis banir no ano passado.

Aos 62 anos, Udo Voigt torna-se o primeiro alemão neonazi a entrar no Parlamento Europeu.

O partido NPD só teve 1% dos votos nas Europeias de domingo, mas conseguiu eleger um eurodeputado para a próxima legislatura em Estrasburgo.

Filho de um membro da divisão de assalto nazi, Voigt teve a base de formação em engenharia aeronáutica antes de decidir seguir ciência política. Entre 1996 e 2011 foi o líder do NPD, num período em que foi condenado (2004) por promover o nazismo depois de definir Hitler como um "grande homem".

Desde então é uma das vozes alemãs que exige a devolução dos territórios perdidos pela Alemanha no final da Segunda Guerra Mundial e questiona o número de vítimas do Holocausto.

Em 2011, Voigt protagonizou mais um episódio polêmico: num cartaz surgiu sentado numa moto ao lado da frase "dá-lhe gás". Muitos interpretaram o cartaz como uma alusão aos milhões de mortos nas câmaras de gás até porque foram espalhados junto ao museu judeu de Berlim.

"Antidemocrático, xenófobo, antissemita e anticonstitucional" foram palavras usadas pelo porta-voz da chanceler Angela Merkel.

A câmara alta do parlamento alemão tentou banir, pela segunda vez numa década, o partido fundado em 1964, mas sem sucesso. O Tribunal Constitucional alemão travou essa intenção política e, mais tarde, até abriu a porta aos partidos mais pequenos ao retirar a fasquia dos 3% de votos para que pudessem ser eleitos. A fasquia continua a existir, no entanto, para as legislativas e até é mais elevada : 5%.

"A Europa está a ser inundada de povos estrangeiros", avisa o NPD, que durante a campanha apostou em cartazes a defender "Dinheiro para a pátria, em vez de Sinti e Roma".

Gisa Martinho (gisa.martinho@economico.pt)
27 Mai 2014

Fonte: Económico (Portugal)
http://economico.sapo.pt/noticias/eurodeputado-alemao-ja-foi-condenado-por-definir-hitler-como-um-grande-homem_194295.html

segunda-feira, 26 de maio de 2014

O Movimento Revolucionário Conservador alemão, precursor do nazismo

Tradução do verbete da Wikipedia sobre Movimento Revolucionário Conservador (na Alemanha), já que não existe o verbete em português. Comento o assunto depois da tradução.

Movimento Revolucionário Conservador

O Movimento Revolucionário Conservador (Konservative Revolution em alemão) foi um movimento do conservadorismo nacionalista alemão nos anos que se seguiram à Primeira Guerra Mundial. A escola de pensamento revolucionário conservador advogou por um conservadorismo e nacionalismo "novo", que fosse especificamente alemão, ou, mais especificamente, prussiano. Igual a outros movimentos conservadores no mesmo período, tratavam de pôr fim à crescente maré do comunismo ou da democracia, propondo sua versão de "socialismo conservador" baseado no "cristianismo aplicado" ou "socialismo de estado" bismarckiano (ver Estado social).

Os revolucionários conservadores basearam suas ideias sobre uma concepção orgânica da sociedade, no lugar da materialista, na qualidade e não na quantidade, sobre o “Volksgemeinschaft” ("comunidade popular”- ver Völkisch) no lugar da luta de classes e da oclocracia. Os ideólogos da escola produziram uma profusão de literatura nacionalista radical que consistiu em diários e obras de ficção de guerra, jornalismo político, manifestos e tratados filosóficos esboçando suas ideias para a transformação da vida cultural e política alemã. Influenciados pelas visões de Oswald Spengler, sentiam-se indignados com o liberalismo; o igualitarismo e a cultura comercial da civilização industrial, urbana, advogando consequentemente pela destruição da democracia e da ordem liberal, pela força se fosse necessário, razão pela qual alguns membros desta escola apoiavam a criação de um Terceiro Reich Alemão - termo que foi, junto a outros da escola, posteriormente utilizado por Hitler, ver Terceiro Reich. O movimento teve grande influência entre muitos dos jovens mais talentosos da Alemanha, setores acadêmicos, da aristocracia e altos setores da classe média (basicamente a classe dos Junkers).

Os revolucionários conservadores, muitos deles nascidos na última década do século XIX, foram basicamente formados por suas experiências da Primeira Guerra Mundial. A guerra e a Revolução alemã de 1918-1919 eram pra eles uma ruptura com o passado, que os deixou muito desiludidos. Primeiramente, a experiência dos horrores da guerra de trincheiras, a suciedad, a fome, a obliteração e o reemplazo do heroísmo com o esforço para se manter com vida em um campo de batalha de mortes pelo azar. Tiveram também - depois da guerra - que se deparar com o desemprego, sentimento de derrota, acusações de atrocidades durante a mesma guerra e a Dolchstoßlegende ("lenda da punhalada pelas costas", de acordo com o qual haviam sido traídos por seus compatriotas). Chegam assim a sentir que não havia sentido nessa guerra, ou mesmo na vida, que eles eram "como uma marionete que têm que dançar para o entretenimento dos espíritos demoníacos do mal". Atraídos por ideias niilistas buscam recriar a "camaradagem de soldados de primeira linha", dando assim um sentido a suas experiências.

O termo "Revolução Conservadora" é anterior à Primeira Guerra mundial, mas a influência de escritores tais como Ernst Von Salomon e Ernst Jünger e os teóricos políticos Carl Schmitt e Edgar Julius Jung foram instrumentais em sua transformação pra um movimento político reconhecido durante a República de Weimar, expressando-se através de figuras do estabelecimento político legal tais como Ernst Forsthoff, Kurt von Schleicher e Franz von Papen.

No âmbito político administrativo, Ernst Forsthoff postula - a partir do começo da República de Weimar - dizia que a solução dos problemas alemães está em uma nova forma de organizar o Estado, no qual os indivíduos esteham subordinados ao "Estado absoluto" ou ao “Volk”, sob a direção de um "Líder" ou Führer.1

Julius Jung - a quem se inspirou no fascismo - promoveu uma versão da nação como uma entidade ecológica singular; atacando o individualismo enquanto promovia o militarismo e a guerra, propondo a "mobilização total" dos recursos humanos e industriais a fim de fomentar a capacidade produtiva da "modernidade" - conceito similar ao "futurismo" o fascismo italiano. Para Julius Jung, o objetivo dos conservadores revolucionários deve ser uma ditadura, com a intenção de "despolitizar as massas e exclui-las da direção do Estado".

Schmitt, por sua parte, chegou a ser percebido como o principal ideólogo político do conservadorismo radical, extremado ou reacionário atual, percepção baseada em uma crítica profunda da democracia, do liberalismo e de concepções igualitárias, critica que é ignorada sob o risco de permitir seu reflorescimento. Schmitt se apresenta como defensor de visões cristãs do corpo político, promovendo uma visão da função do Estado como sendo a identificação e luta contra ou pela repressão do "inimigo", seja externo ou, especialmente, o interno (e afirmando que no caso concreto da Alemanha, o inimigo interno e externo é o judeu). Schmitt e seus admiradores afirmam que ele se manteve alejado do nacional-socialismo. Mas cabe notar que foi membro do Partido Nacional-Socialista a partir de 1932, que em 1934 justificou os assassinatos da noite dos longos punhais como a "forma mais alta do direito administrativo" e que sua crítica ao nacional-socialismo não foi tanto por seu caráter antidemocrático ou imoral, senão de que este era por demais vulgar.

Depois de 1933 alguns dos proponentes do movimento revolucionário conservador foram vigiados, reprimidos e enviados para campos de concentração pelos nacional-socialistas, principalmente pela SS de Himmler, um caso representativo é o de Ernst von Salomon, perseguido por ter uma esposa de origem judia. Alguns conservadores revolucionários apoiaram a ditadura, haviam promovido e estavam contentes com a supressão da democracia, contudo criticavam e se opunham a aspectos mais "progressistas" do nacional-socialismo, outros simplesmente nunca apoiaram o regime nacional-socialista nem seus meios, por exemplo Ernst Niekisch ou Von Salomon. Assim, por exemplo, Julius Jung - a quem escrevia os discursos de von Papen - denunciava o "liberalismo e democratismo" dos nacional-socialistas, e organizou uma conspiração a fim de derrocar o regime de Hitler, pelo qual foi assassinado - junto com von Schleicher - na noite dos longos punhais.

Outros membros e personagens próximos ao movimento revolucionário conservador se hundieron no anonimato, alguns - tais como Schmitt e Konstantin von Neurath - ingressaram no Partido Nacional-Socialista ou - como von Papen e Forsthoff - foram perseguidos por Hitler, outros como Niekisch foram enviados para campos de concentração. Alguns outros - como Junger - permaneceram ou se reintegraram ao Reichswehr e mais tarde à Wehrmacht, onde, posteriormente, conspiraram nos níveis inferiores do fracassado atentado de 20 de julho de 1944, para assassinar Hitler por meio de uma bomba.

Posteriormente, o movimento foi muito criticado por ter sido fundamental para a criação de uma cultura política ou zeitgeist que contribuiu para a difusão das ideias que facilitaram o aparecimento e aceitação das ideias políticas do nacional-socialismo. Contudo, alguns de seus membros e as percepções continuaram tendo influência, não só na Alemanha do pós-guerra,como nos desenvolvimentos políticos inclusive na atualidade em outros países.

Bibliografia:

1. Travers, Martin (2001). Critics of Modernity: The Literature of the Conservative Revolution in Germany, 1890-1933. Peter Lang Publishing. ISBN 0-8204-4927-X.
2. Herf, Jeffrey (2002). Reactionary Modernism: Technology, Culture, and Politics in Weimar and the Third Reich (reprint edition ed.). Cambridge University Press. ISBN 0-521-33833-6.
3. Stern, Fritz (1974). The Politics of Cultural Despair: A Study in the Rise of the Germanic Ideology (New Ed edition ed.). University of California Press. ISBN 0-520-02626-8.
4. Woods, Roger (1996). The Conservative Revolution in the Weimar Republic. St. Martin’s Press. p. 29. ISBN 0-333-65014-X.

Fonte: verbetes da Wikipedia em inglês e espanhol
http://es.wikipedia.org/wiki/Movimiento_Revolucionario_Conservador
http://en.wikipedia.org/wiki/Conservative_Revolutionary_movement
Tradução: Roberto Lucena

Comentário: no Brasil, acho que quem acompanha política ou esses assuntos (segunda guerra etc) já viu alguma pregação com negação de que conservadores não fazem revolução ou afirmações bizarras sobre "nazismo de esquerda", sem base histórica alguma, com discussões no mínimo pueris (infantis), pra não chamar de discussão idiota.

Os grupos que pregam e defendem essas posições também podem ser rotulados como de extrema-direita, em geral são conhecidos como "libertários" ou radicais de direita liberal, no Brasil costumam ser chamados mais popularmente de "neoliberais", um outro tipo de extrema-direita (a princípio não-fascista), mas que acaba servindo aos propósitos de grupos fascistas em virtude da forte paranoia "anticomunista" (ou do que eles entendem por isso), comportamento autoritário (intolerante com divergências), "absolutista" (só a forma como virem o mundo é correta e sempre impositiva), além de fazerem um forte macartismo e outros radicalismos do tipo, como negação da história, distorções etc.

Quando a gente mostra o porquê da classificação e de certas afirmações desses grupos não terem fundamentos, as respostas quase sempre são agressões, geralmente porque as pessoas que defendem essas bobagens (e se enquadram nestes grupos radicais) o fazem sem senso crítico algum, ou também por estarem fazendo panfletagem política, ou por possuírem um conhecimento precário sobre segunda guerra (e fé cega em textos enviesados). E costumam ficar por aí, na leitura rasa mesmo ou enviesada, não vão muito além disso (não leem outras coisas). Ou se apresentam como as três coisas juntas, daí a fúria quando são "contrariados".

A quem quiser dar uma conferida, chequem os links: Políticas da extrema-direita (economia); The Revival of Right Wing Extremism in the Nineties (sobre o grupo rotulado como "Libertários" de direita, um grupo neoliberal radical que atua fortemente na web, e bastante no espaço brasileiro). Destaque pra figura do libertário (neoliberal radical) Hans-Hermann Hoppe (link2), que anda sempre acompanhado de neonazis (como já apontado no link anterior). São esses grupos que atacam a origem do nazismo (distorcendo) negando que seja uma ideologia de direita (um dos fascismos) pra fazer panfletagem política e demonização de quem se opõem ideologicamente a esse tipo de grupo radical.

Eu sempre digo que se você quiser ver grupos fascistas/nazistas ascenderem politicamente em um país, basta deixar este radicalismo liberal atuar com toda força (Laissez-faire). Isso abrirá fatalmente caminho pros fascistas/nazistas com os efeitos colaterais que as medidas ultraliberais desses grupos provocam na economia. É só olhar pra situação política da Europa atualmente. É fruto disso.

O Brasil já sofreu com esse problema nos anos 90, década que o país atravessou uma crise profunda econômica. A própria ascensão do nazifascismo na Europa no século passado é decorrente deste tipo de política radical liberal e inconsequente desses grupos.

Queria deixar isso registrado pois já me deparei com gente defendendo esse tipo de bobagem no Orkut e até aqui mesmo no blog, mas o que mais me irrita nessas pessoas é o alto grau de desonestidade intelectual debatendo esses assuntos sobre segunda guerra, pois não conseguem deixar o tom de pregação de lado e analisar de forma correta fatos do passado pra tentar compreender o presente. Eu costumo chamá-los de PSTU de direita, pelo radicalismo e total alienação dos efeitos do que eles defendem provocam. Se uma pessoa já parte do princípio que está numa missão de "evangelizar" (doutrinar a ferro e fogo, que eu costumo chamar de "catequizar", pejorativamente), já fica por terra qualquer discussão.

Mas voltando ao assunto, não deu por exemplo pra fazer um post sobre o René Rémond, historiador francês, que teoriza sobre as três direitas na França (que serve como parâmetro pra países com o mesmo tipo de divisão política europeia), que aborda toda essa questão do fascismo e da direita. Deem uma lida neste link sobre ele, pra ter uma ideia de quem é. E neste outro La thèse des trois droites (A tese das três direitas) do que citei sobre ele. E antes que venha algum maluco mais exaltado encher o saco ("o cara era de esquerda" bla bla bla "por isso que fez essa classificação"), o René Rémond (já falecido) era de direita e conservador. Só que não era lunático e desonesto como certa direita brasileira é (ou setores, aí vai do entendimento de cada um) e que fica distorcendo história pra fazer panfletagem política.

Não seria importante citar estes fatos se eu discutisse (geralmente) com gente moderada, normal, não-fanática, não-paranoica e intelectualmente honesta, mas quem costuma se exaltar com esses esclarecimentos sobre a direita não costuma se enquadrar neste perfil "moderado". E não estou me referindo propriamente aos "revis", o problema é mais amplo (vai além deles). Há muita gente conservadora no Brasil que não é "revi" que tem uma dificuldade ou sectarismo fora do comum pra discutir qualquer assunto político e histórico sem apelar pra essa retórica panfletária ou esse tom de "pregação". Só pra constar, o Joachim Fest, historiador alemão, também era de direita e conservador e tratava esses assuntos da forma como estou citando. E vários outros.

Essas pregações que citei no começo são algo tão raso que chega a ser irritante comentar o assunto, mas a maioria das discussões que travei aqui havia um componente do que citei acima. Esse pessoal só lê bobagem na internet (e pior que ler é sair repetindo como papagaio sem querer ler algo mais sério), principalmente sobre segunda guerra e nazismo. Há muito material panfletário espalhado na web, incluindo obviamente aqueles com negação do Holocausto.

Não seria necessário esclarecer ou comentar essas coisas se o povo lesse mais livros sérios de História sobre segunda guerra, só que a maioria não lê, mas adora encher o saco e se irrita quando é contestado (não sabem discutir). Mas também cabe uma crítica ao pessoal do campo democrático e o de esquerda  nessa questão, pois se fizessem um contraponto sério a esse tipo de pregação, sem apelar praquelas provocações baratas ou discussão infantil que pipocavam principalmente no Orkut, anulariam ou atenuariam esse tipo de pregação idiota. Mas a maioria não o faz, e depois reclamam do crescimento do extremismo no país. Por falar em Orkut (uma rede social do Google), foi de lá que saiu (e/ou se proliferou) esse amontoado de porcaria negacionista de todo tipo e demais bizarrices políticas.

Noutro post veio gente discutir ou negar essas questões como se a direita (o que se entende por esse campo político) nunca tivesse defendido ditaduras, feito ditaduras, regimes autoritários, estatais etc, ignorando o fato de que o que se entende por direita ou esquerda não é um bloco sólido e sim espaços onde se concentram forças políticas de várias tendências (ideologias).

Essa informação parece banal? E é, pra gente com um mínimo de entendimento político e seriedade, mas quando fui comentar esses pontos a resposta, pra variar, foi a pior possível, isso quando não distorcem e partem pro xingamento.

Existe a direita democrática mas também existe a direita autoritária representada em geral por grupos fascistas e outros grupos autoritários profundamente reacionários e contrários, não só ao que entendem como esquerda, como também à democracia e ao liberalismo (este último uma doutrina política mais facilmente associável aos Estados Unidos e Inglaterra). Num país (o Brasil) que passou por duas ditaduras de direita (no século XX) com duração total de 36 anos (somando as duas), com uma cultura democrática frágil, há que se ter cuidado redobrado com o problema.

Só pra constar, a Revolução Iraniana de 1979 é uma revolução conservadora, de direita. O que torna essa questão bizarra quando alguns grupos de esquerda (por falta de leitura e informação) no Brasil exaltam esse tipo de regime sem levar em conta a natureza política do mesmo pois houve 'expurgos' na revolução iraniana de grupos de esquerda. A quem quiser checar deixo até alguns links pra facilitar (não vou me aprofundar no assunto, isto é só uma informação pra mostrar o grau de desconhecimento do brasileiro em geral, mesmo os ditos politizados, sobre essas questões):
Opposition groups and organizations
Tudeh Party of Iran Link2
Islamism and the left in the Iranian revolution
Iran: The Rise and Fall of the Tudeh Party

Pode haver aproximação de governos politicamente contraditórios por algum interesse externo em comum, é o que ocorre com algumas alianças do Irã, mas não confundir essas alianças externas com maquear o reacionarismo religioso do regime iraniano, que tanto a direita e esquerda brasileiras adoram deixar de lado. O termo exaltar que empreguei é diferente de, por exemplo, ser contrário a ataques militares (eu sou contra) a esse país por outras "razões", geralmente difundidas (defendidas) na mídia. Indo direto ao assunto, refiro-me ao atrito Israel-Irã no Oriente Médio.

Por encerrar o comentário, cheguei a esse assunto do Movimento Revolucionário Conservador alemão procurando questões referentes a tal Terceira Posição (que eu chamo de "fascismo por outro nome"), Nazbol e o Dugin que ainda serão citados aqui, embora lembre vagamente do assunto relativo a esse movimento conservador alemão. São questões pouco abordadas, o período político na Alemanha que vai de 1917 até a ascensão do nazismo (quando Hitler sobe ao poder), principalmente a turbulenta e cambaleante República de Weimar.

sábado, 29 de março de 2014

A guerra que mudou o destino da Europa (Primeira Guerra Mundial)

Quase todos os países que participaram calcularam que o conflito que estourou em agosto de 1914 ia ser breve. Durou mais de quatro anos e deixou oito milhões de mortos, dos quais um terço foram civis.

Julián Casanova 2 JAN 2014 - 00:01 CET

ENRIQUE FLORES (desenho)
"A primavera e o verão de 1914 estiveram marcados na Europa por uma tranquilidade excepcional", recordava anos mais tarde Winston Churchill, alimentando essa ideia nostálgica da estabilidade europeia em tempos da Alemanha Imperial de Guilherme II ou da Inglaterra de Eduardo VII, de contraste entre os "good times" e o período das grandes convulsões políticas e sociais inaugurado pelo começo da Primeira Guerra mundial em agosto de 1914.

Quando começou essa guerra, a Europa estava dominada por vastos impérios, governados - exceto a França, onde havia surgido uma República da derrota na guerra com a Prússia em 1870 - por monarquias hereditárias. A nobreza exercia todavia um notável poder econômico e político. Na Grã-Bretanha, França ou Alemanha, para citar as nações mais poderosas, uma oligarquia de ricos e poderosos, de boas famílias, de nobres e burgueses conectados através de matrimônios e conselhos de administração de empresas e bancos, mantinham seu poder social através do acesso à educação e às instituições culturais.

Muitos cidadãos europeus tinham restringida a liberdade para falar seu idioma ou praticar sua religião e sofriam notáveis discriminações de gênero, raça ou de classe a qual pertenciam. As mulheres não votavam, com exceções como a Finlândia que lhes havia concedido o voto em 1906, e em raras ocasiões lhes era permitido possuir propriedades ou conduzir seus próprios negócios. Antes de 1914, a democracia e a presença de uma cultura popular cívica, de respeito pela lei e da defesa dos direitos civis eram bem escassas, presentes em alguns países como a França e Grã-Bretanha e ausentes na maior parte do resto da Europa.
Em 1919, só restavam os impérios britânico e francês. Todos os demais haviam desaparecido.
Foi essa ordem o que começou a se desmoronar quando a Áustria declarou guerra à Sérvia em 28 de julho de 1914, um mês depois do assassinato em Sarajevo do herdeiro do trono austríaco, o arquiduque Francisco Fernando. A partir daí, as tensões e rivalidades entre os diferentes Estados a converteram em uma guerra geral, primeiro europeia e, depois com a entrada dos Estados Unidos em 6 de outubro de 1917, mundial. E ainda que os governos das principais potências, da Rússia à Grã-Bretanha, passando pela Alemanha e Áustria-Hungria, contribuíram para pôr em risco a paz com suas mobilizações militares, nenhum deles havia feito planos militares ou econômicos para um prolongado combate.

Esperavam que a guerra fosse curta porque sabiam que se entrassem em guerra todos de uma vez, algo que possibilitava o sistema de alianças pactuado alguns anos antes, o dinheiro e as energias gastas podiam conduzir à bancarrota da indústria e do crédito na Europa. Ao declarar a guerra em agosto de 1914, argumenta a historiadora Ruth Henig, "As potências europeias contemplavam uma série de encontros militares curtos e incisivos, seguidos presumivelmente de um congresso geral dos beligerantes no que confirmariam os resultados militares mediante um arranjo político e diplomático". Guilherme, o príncipe herdeiro da coroa alemã, ansiava que a guerra fosse "radiante e prazerosa". O ministro russo da Guerra, o general V.A. Sukhomlinov, preparava-se para uma batalha de dois a seis meses e as expectativas britânicas eram de que suas forças expedicionárias estivessem em casa para o Natal.

A guerra, contudo, durou quatro anos e três meses e o entusiasmo que exibiram a favor dela a maior parte das populações dos países beligerantes, incluídas as classes trabalhadoras, evaporou-se relativamente logo, especialmente na Europa central e a do leste. A escassez de comida e de matérias primas e os numerosos conflitos que se derivaram das duras condições em que se desenvolveu a guerra formaram o pano de fundo das revoluções de 1917 na Rússia que sucessivamente derrubaram o regime czarista e levaram os bolcheviques ao poder, a mudança revolucionária mais súbita e ameaçante que conheceu a história do século XX. Em 1919, só restavam os impérios britânicos e francês. Todos os demais haviam desaparecido e com eles, um amplo exército de oficiais, soldados, burocratas e proprietários de terras que os haviam sustentado.

No século que transcorreu entre o Congresso de Viena em 1815, que pôs fim à era de Napoleão, e o estouro da Primeira Guerra Mundial, a Europa foi o cenário de duas grandes guerras que se destacaram sobre outros conflitos mais localizados: a guerra da Crimeia, de 1854-56, deixou uns 400.000 mortos; a que enfrentou a França e a Prússia, em 1870-71, causou 184.000 vítimas. Mais de oito milhões de pessoas morreram na Grande Guerra de 1914-1918, uma cifra a qual se deveria acrescentar as vítimas da pandemia de gripe de 1918-19, que golpeou com severidade uma população debilitada pelos efeitos da contenda.
Ao menos 800.000 armênios foram assassinados pelas forças armadas otomanas
Antes de 1914, os civis mortos nas guerra eram poucos comparados com quem as combatiam (militares). Na Primeira Guerra Mundial, as vítimas civis mortais já representaram um terço do total; na Segunda, superaram a dois terços. O "embrutecimento" causado pela primeira dessas guerras, com terríveis consequências, deu o passo para que populações civis se convertessem em objeto de acosso e destruição.

Com o começo da Primeira Guerra Mundial, o destino da Europa começou a ser decidido pela força das armas. Foi um conflito de uma escala sem precedentes, uma ocidental e outra oriental, com a aparição pela primeira vez na história dos bombardeios aéreos, depois que batalhas por terra e por mar houveram sido durante muito tempo as principais manifestações da guerra. Já no começo de 1915 houve ataques com bombas vindas do céu, executadas pelos britânicos e alemães. As atrocidades cometidas sobre a população civil demonstram que essa guerra inaugurou uma nova época na violência entre Estados, que alcançou seu zênite na Segunda Guerra Mundial.

Segundo a investigação de John Horme e Alan Kramer, 6.427 civis belgas e franceses foram assassinados pelas tropas alemãs invasoras de 1914, apenas começada a guerra, e a perseguição e morte de civis foi também comum no front leste, protagonizada pelos soldados alemães, austríacos e russos. Centenas de milhares de lituanos, letões, poloneses e judeus foram deportados para o interior da Rússia. Ainda que o exemplo mais claro desse "embrutecimento" alimentado pela Grande Guerra, um claro precedente do genocídio nazi, foi o assassinato a sangue frio de cerca de 800.000 armênios, entre 1915 e 1916, pelas forças armadas otomanas, uma ação deliberadamente planejada e levada a cabo pelas elites do Estado otomano.

A Primeira Guerra Mundial, que decidiu o destino da Europa pela força, depois de décadas de primazia da política e da diplomacia, é considerada por muitos autores a autêntica linha divisória da história europeia do século XX, a ruptura traumática com as políticas então dominantes. Marcou o começo da escalada da violência nessa era que se estendeu até 1945, porque apagou a linha entre o inimigo interno e o externo, a fronteira entre a população civil e militar, foi o cenário dos primeiros exemplos de extermínio em massa da história e dela saíram o comunismo e o fascismo, os movimentos paramilitares e a militarização da política.

A maioria dos dirigentes das grandes potências no momento do estouro da Primeira Guerra Mundial pertenciam a esse mundo exclusivo e elitista, estreitamente vinculado à cultura aristocrática do Antigo Regime, com escassos conhecimentos sobre a sociedade industrial e as mudanças sociais que isto estava provocando. Depois dela nada foi igual. Para intelectuais e artistas ficou quase impossível estar à margem dos grandes debates públicos. O comunismo e o fascismo converteram-se em alternativas à democracia liberal, veículos para a política de massas, viveiros de novos líderes que, subindo do nada, saltando de fora do establishment e da velha ordem monárquica e imperial, propuseram rupturas radicais com o passado. Como declarou Sir Edward Grey, ministro de Assuntos Externos da Grã-Bretanha, as luzes estavam se apagando na Europa.

Julián Casanova é autor de Europa contra Europa, 1914-1945 (Editora Crítica).

Fonte: El País (edição espanhola)
Título original: La guerra que cambió el destino de Europa
http://elpais.com/elpais/2013/12/23/opinion/1387813667_675098.html
Tradução: Roberto Lucena

Observação: só pra deixar registrado, há uma versão do El País agora em português (versão brasileira), como não saiu esse texto em português (e eu achei interessante), eu traduzi. Não sei se daqui pra frente vai ter problema pois o jornal também faz versões em português de textos sobre a segunda guerra e o texto é obviamente do jornal conforme indicado acima (no link da parte Fonte).

A parte sobre segunda guerra do El País merece elogio, é muito boa e uma alternativa a quem não quer ler o "amontoado" de textos de qualidade duvidosa que é publicado na mídia nativa por 'problemas' que não sei se cabe destacar aqui (mas que todo mundo sabe como anda a "reputação" da imprensa brasileira de anos pra cá, e pelo visto a imprensa brasileira continua querendo chegar ao fundo do poço, um dia chega, fica subentendido).

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