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sexta-feira, 1 de junho de 2012

William Shirer - Ascensão e Queda do III Reich (livro)

Ascensão e Queda do Terceiro Reich de William L. Shirer

Esta leitura é uma experiência rica e gratificante para todos os que tenham perguntado como foi possível que alguma vez chegasse a existir esta ameaça à civilização, e o que é pior, como durou tanto tempo. A resposta, lamentavelmente, é que a maior parte da Alemanha, por inúmeros motivos, apoiou o nazismo e o fanatismo que Hitler gerou.

Ascensão e Queda do Terceiro Reich, de William L. Shirer, é um estudo monumental dos momentos mais espantosos do século XX. Agora, 63 anos depois do fim da segunda guerra mundial, pode parecer incrível que nossas instituições mais valiosas e nossa forma de vida estiveram em perigo pela ameaça que Hitler e o Terceiro Reich representaram. A descrição que Shirer faz dos acontecimentos e do elenco de personagens que tiveram papeis fundamentais no que viria a acontecer na Europa é inesquecível.

Nos longos anos em que foi repórter e, por isso, como agudo observador do auge do nazismo, junto com toneladas de documentos do Ministério de Assuntos Externos alemão, incontáveis diários, transcrições de conversas telefônicas, e outros escritos meticulosamente guardados pelos alemães de todos os níveis, contribuíram para que Shirer pudesse escrever esta historia, brutalmente objetiva, de como Hitler conseguiu o controle político da Alemanha e levou a cabo seu plano de dominar o mundo em seis anos, para finalmente ver a Alemanha perecer em chamas.

A combinação das recordações pessoais e a quantidade ingente de documentos históricos, diferencia este livro de todos os demais e o converte em um dos grandes trabalhos históricos de todas as épocas. Por exemplo, conta que do seu apartamento em Plosslgasse, em Viena, ele foi testemunha direta de como a metade, aproximadamente, dos 180.000 judeus de Viena negociou seu caminho até a liberdade em 1938.

Shirer explica que Hitler acreditava que a França e a Inglaterra eram por demais débeis para supôr uma verdadeira ameaça as suas ambições de submeter a Tchecoslováquia primeiro e depois a Polônia. O alívio momentâneo ao ver que a Rússia tampouco ameaçava seus planos como consequência da furiosa atividade diplomática que teve lugar depois de sua invasão da Polônia é fascinante. Mas ao longo desta narração não há um momento de alívio ante a brutalidade de Hitler e dos inúmeros alemães que aparecerem aqui.

Ainda que 1.500 páginas sejam muitas, esta leitura é uma experiência rica e gratificante para todos os que tenham se perguntado como foi possível que o nazismo existisse e sobrevivesse.

Livro: Ascensão e queda do Terceiro Reich (III Reich)
Autor: William L. Shirer
Editora: Planeta
Ano de publicação: 2010 (1960)

Fonte: Resenha do site Lecturalia
http://www.lecturalia.com/libro/45599/auge-y-caida-del-tercer-reich
Tradução: Roberto Lucena

Aos que quiserem checar a edição em inglês do livro, confiram na parte de Ebooks. No link anteriormente remetia para uma página que abria diretamente o livro em html em várias páginas, só que a Universidade que hospeda o livro agora pede para se cadastrar pra checar o livro (reflexo da repressão à divulgação de material de conteúdo histórico na internet).

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Os nazistas e os untermenschen (subhumanos) - Parte 1

(trechos do Capítulo “A Nova Ordem” do livro Ascensão e Queda do Terceiro Reich – O começo do fim – 1939 a 1945, William Shirer, Editora Agir, 2008, págs.: 431 a 438)

Não se traçara um plano compreensível para a Nova Ordem, mas, pelos documentos apreendidos e pelo que aconteceu, é claro que Hitler sabia bem o que desejava que ela fosse: uma Europa governada pelos nazistas, com seus recursos explorados em benefício da Alemanha e com o povo transformado em escravo da raça superior alemã, cujos “elementos indesejáveis” – principalmente os judeus e muitos eslavos no leste, especialmente a classe culta que havia entre eles – seriam exterminados.

Os judeus e os povos eslavos eram os Untermenschen, isto é, subhumanos. Para Hitler, não tinham o direito de viver, salvo aqueles, entre os eslavos, que pudessem ser necessários para trabalhar nos campos e nas minas como escravos de seus senhores alemães. Não só nas grandes cidades do leste – Moscou, Leningrado e Varsóvia – deviam ser eliminadas para sempre, como também seria reprimida a cultura dos russos, poloneses e outros povos eslavos, aos quais seria negada uma educação formal. As prósperas indústrias seriam desmontadas e enviadas para a Alemanha, e o próprio povo confinado aos labores da agricultura para produzir alimentos aos alemães, sendo-lhe permitido para si apenas o suficiente à subsistência. A própria Europa, segundo as palavras dos chefes nazistas, devia ficar “livre dos judeus”.

“Não me interessa, absolutamente, o que acontece a um russo ou a um tcheco”, declarou Heinrich Himmler em 4 de outubro de 1943, num discurso aos oficiais de suas SS, em Posen.(...)

“O que as nações [continuou Himmler] puderem oferecer em matéria de sangue bom, de nosso tipo, nós acolheremos, seqüestrando, se necessário, suas crianças e educando-as aqui, conosco. Se as nações vivem em prosperidade ou morrem de fome, como gado, apenas me interessa na medida em que delas necessitamos como escravas de nossa <>, fora disso, nenhum outro interesse tenho por elas. Se dez mil mulheres russas caem exaustas ao cavarem fossos contra tanques, interessa-me apenas que esses fossos sejam terminados para a Alemanha(...)[1]

(...)

Em 15 de outubro de 1940, Hitler decidiu sobre o futuro dos tchecos, o primeiro povo eslavo a ser conquistado. Metade devia ser assimilada; seria, aliás, despachada para a Alemanha, onde trabalharia como escrava. A outra metade, especialmente os intelectuais, seria simplesmente nas palavras constantes de um relatório secreto sobre o assunto, eliminada.[2]

Os poloneses [acentuou Hitler] nasceram especialmente para o trabalho pesado(...) Não é preciso pensar em melhorias para eles. Cumpre manter, na Polônia, um padrão de vida baixo, não se permitindo que suba(...) Os poloneses são preguiçosos e é necessário usar a força para obrigá-los a trabalhar(...) Devemos utilizar-nos do governo geral (da Polônia) simplesmente como fonte de mão-de-obra não especializada(...) Poder-se-ia conseguir ali, todos os anos, os trabalhadores de que o Reich possa necessitar.

Duas semanas antes o Führer esclareceu suas idéias sobre o destino dos poloneses, o segundo dos povos eslavos a ser conquistado. Seu fiel secretário, Martin Bormann, deixou um longo memorando sobre os planos nazistas que Hitler encaminhou a Hans Frank, o governador-geral da parte remanescente da Polônia, e a outros funcionários.[3]

Quanto aos sacerdotes poloneses,
(...)eles pregarão o que mandarmos. Se qualquer sacerdote agir diferentemente, daremos cabo dele. Sua tarefa é manter os poloneses tranqüilos, broncos e fracos de espírito.

Havia duas outras classes de poloneses a serem tratadas, e o ditador nazista não se esqueceu de mencioná-las:

Indispensável ter em mente que a pequena nobreza polonesa deve cessar de existir; por mais cruel que isso possa ser, ela deve ser exterminada onde quer que se encontre(...) Deve haves apenas um senhor para os poloneses: o alemão. Dois senhores, lado a lado, não podem e não devem existir. Todos os representantes da classe culta polonesa, portanto, têm de ser exterminados. Isso parece crueldade, mas é a lei da vida.

A obsessão dos alemães pela idéia de que eram uma raça superior, e que os povos eslavos deviam ser seus escravos, era especialmente violenta no tocante à Rússia. Erich Koch, o rude comissário do Reich na Ucrânia, exprimiu isso num discurso proferido em Kiev no dia 5 de março de 1943:

Somos uma raça superior e devemos governar com dureza, mas com justiça(...) Arrancarei deste país, entretanto, tudo que puder. Não vim para espalhar bem-aventuranças(...) A população deve trabalhar, trabalhar sempre(...) Não viemos para distribuir o maná. Viemos para criar as bases da vitória. Somos uma raça superior que precisa lembrar que o mais humilde operário alemão é, racial e biologicamente, mais valioso que a população daqui.[4]

Quase um ano antes, em 23 de julho de 1942, quando os exércitos alemães aproximavam-se, na Rússia, dos campos petrolíferos do Cáucaso, Martin Bormann, secretário do Partido de Hitler e, já então, seu braço direito, escreveu uma longa carta a Rosenberg reiterando a opinião do Führer sobre o assunto. Um funcionário do Ministério de Rosenberg fez o resumo dessa carta:

Os eslavos terão que trabalhar para nós. Se não precisarmos deles, poderão morrer. Tornam-se supérfluos, por conseguinte, os serviços de saúde alemães e a vacinação compulsória. A fertilidade dos eslavos é indesejável; o ensino, perigoso. Basta que contem até cem(...) Toda pessoa instruída é um futuro inimigo. Deixaremos a religião, para eles, como meio de diversão. Quanto à alimentação, não receberão mais do que o absolutamente necessário. Somos os senhores. Primeiro nós.[5]

Quando as tropas alemãs entraram na Rússia, foram acolhidas em muitos lugares como libertadoras por uma população que hà muito vivia oprimida e dominada pelo terror da tirania de Stálin. Houve, no começo, deserções em massa de soldados russos. Especialmente no Báltico, que, fazia pouco tempo, havia estado sob ocupação soviética, e na Ucrânia, onde um movimento incipiente de independência não pudera ser completamente eliminado, muitos sentiram-se felizes de verem libertados do jugo soviético(...), mesmo pelos alemães.

Em Berlim, havia pessoas que acreditavam que se conquistaria a adesão do povo russo para a sua causa, se Hitler tivesse agido habilmente, tratando a população com consideração e prometendo libertá-la do sistema bolchevique (concedendo-lhe liberdade religiosa e econômica e transformando em cooperativas as fazendas coletivas), e dando-lhe, eventualmente, um autogoverno. Poderiam eles então cooperar com os alemães, não só nas regiões ocupadas como, também, nas não ocupadas, para se libertarem do cruel domínio de Stálin. Se tivessem feito – argumentaram -, cairia o próprio regime bolchevique e se desintegraria o Exército Vermelho, da mesma maneira que se dera com os exércitos czaristas em 1917.

Mas a selvageria da ocupação nazista e os óbvios objetivos dos conquistadores alemães, muitas vezes proclamados publicamente, saquear terras, escravizar as populações e colonizar o leste com alemães, logo destruíram qualquer possibilidade de êxito.

Ninguém resumiu melhor essa desastrosa política e todas as oportunidades que ela desdenhou e destruiu do que um alemão, o Dr. Otto Bräutigam, diplomata de carreira e representante-chefe do Departamento Político do Ministério que Rosenberg criara, fazia pouco tempo: o Ministério para os Territórios Ocupados do Leste. Num acrimonioso relatório confidencial dirigido a seus superiores em 25 de outubro de 1942, Bräutigam ousou apontar os erros cometidos pelos nazistas na Rússia.

Encontramos, à nossa chegada na União Soviética, uma população cansada do bolchevismo que aguardava, ansiosamente, novos slogan que oferecessem perspectivas de melhor fututo. Era dever da Alemanha fornecer tais slogans, mas manteve silêncio sobre eles. A população saudou-nos alegremente como libertadores e colocou-se à nossa disposição.

Houve, na verdade, um slogan; mas o povo russo logo percebeu seu significado.

Com o inerente instinto dos povos orientais [continuou Bräutigam], esses homens primitivos logo descobriram que para a Alemanha o slogan “Libertação do Bolchevismo” não passava de um pretexto para escravizar os povos orientais segundo seus próprios métodos(...) O operário e o camponês logo perceberam que a Alemanha não os considerava companheiros com direitos iguais, mas apenas objetivo de suas pretensões políticas e econômicas(...) Com uma presunção sem precedente, pomos de lado todo o conhecimento político e(...) tratamos os povos dos territórios do leste como “brancos de segunda classe”, aos quais a providência apenas atribui a tarefa de servir à Alemanha como escravos(...)

Havia dois outros processos, declarou Bräutigam, que lançaram os russos contra os alemães: o bárbaro tratamento infligido aos prisioneiros de guerra e o embarque forçado de mulheres e homens para a Alemanha, a fim de trabalharem como escravos.

Já não constitui segredo de amigos e adversários que centenas de milhares de prisioneiros de guerra russos têm morrido de fome ou de frio em nossos acampamentos(...) Presenciamos agora a grotesca situação de termos que recrutar milhões de operários nos territórios ocupados no leste, depois que os prisioneiros de guerra morreram de fome como moscas(...) Nos desmandos ilimitados para com o povo eslavo, que ainda prevalecem, empregaram-se métodos de recrutamento que, provavelmente, têm sua origem nos períodos mais negros do tráfico de escravos. Inaugurou-se uma constante caçada ao homem. Sem consideração à saúde ou à idade, embarcaram-se pessoas para a Alemanha(...)(*)

(*) Nem a exterminação de prisioneiros soviéticos em massa nem a exploração do russo no trabalho constituíram segredo para o Kremlin. Já em novembro de 1941, Molotov fez um protesto diplomático formal contra o extermínio dos prisioneiros de guerra russos, e, em abril do ano seguinte, outro mais, contra o programa de trabalho escravo na Alemanha.


A política e os métodos empregados pela Alemanha na Rússia “provocaram a resistência dos povos orientais”, concluiu Bräutigam.

Nossa política forçou os bolcheviques e os nacionalistas russos a formarem uma frente comum contra nós. Os russos estão hoje lutando com excepcional bravura e com espírito de renúncia, nada mais visando que o reconhecimento da dignidade humana.

Fechando o memorando de 13 páginas com uma obervação positiva, o Dr. Bräutigam pediu que se modificasse completamente a política adotada. “Deve-se dizer aos russos algo de concreto sobre seu futuro”, argumentou ele.[6]

Notas desta parte:

[1] NCA, IV, p.559 (ND 1919-PS)
[2] Ibid., III, p.618-9 (ND 862-PS) relatório do general Gotthard Heinrici, representante geral da Wehrmacht no Protetorado.
[3] Memorando de Bormann. Citado em TMWC, VII, p.224-6 (ND URSS-172).
[4] NCA, III, p.798-9 (ND 1130-PS)
[5] Ibid., VIII, p.53 (NDR-CF)
[6] Memorando do Dr. Bräutigam de 25 de outubro de 1942. Texto em NCA, III, p.242-51; original alemão em TMWC, XXV, 331-42 (ND 294-PS)

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