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domingo, 31 de dezembro de 2017

Hitler e as "raças asiáticas"

Em dezembro de 1942, Hitler realizou uma reunião sobre os Países Baixos com Mussert, Seyss-Inquart, Himmler, Lammers, Schmidt e Bormann. As notas da reunião, escritas por Bormann, foram publicadas em 1976 na coleção "De SS en Nederland Documenten uit de SS-archieven 1935-1945", que recentemente foi disponibilizada através da NIOD e Wikimedia Commons aqui em dois arquivos "pdf". O primeiro arquivo, das páginas 893-899, reproduz o registro da reunião de Bormann.

Em uma de suas principais passagens, Hitler retrata a guerra no Oriente como uma luta de vida ou morte, porque os bolcheviques exterminariam todos os estratos europeus (pág. 895). Hitler também deixa claro que sua oposição aos bolcheviques é racial, não política ou ideológica: a Alemanha está contra as raças asiáticas que pretendam destruir a civilização europeia e impor mistura racial (pág. 894).

Essas observações podem ser comparadas com outras fontes. Hitler foi, em parte, ecoando a formulação de Diewerge "Quem deveria morrer - alemães ou judeus?". No mesmo dia em que Bormann produziu suas anotações, Goebbels escreveu em seu diário: "O judeu deve pagar por seu crime, assim como nosso Führer profetizou em seu discurso no Reichstag; a saber, pela extinção da raça judaica na Europa e possivelmente no mundo inteiro." Crucialmente, no entanto, os comentários de Hitler não eram apenas antissemitas, mas apontavam a vontade de exterminar toda a vida "asiática" em seu caminho, pois era incompatível com sua visão da civilização europeia. Eles, portanto, convergem com os objetivos de fome de maio de 1941, nos quais os nazistas estavam dispostos a condenar à morte trinta milhões de pessoas (ver, por exemplo, Kay, pág. 689), e o plano de destruir totalmente as principais cidades soviéticas e tornas as áreas inabitáveis (veja aqui).

Fonte: Holocaust Controversies
http://holocaustcontroversies.blogspot.com/2017/12/hitler-and-asiatic-races.html
Texto: Jonathan Harrison
Título original: Hitler and the "Asiatic Races""
Tradução: Roberto Lucena

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Observações do post "Sobre a Ordem dos Comissários: instruções da guerra de aniquilação nazista na União Soviética"

Antes de repassar as observações do post que também dá título parcial a este post (separarei o texto original com um traço), irei transcrever, quando for possível, algumas observações de outros posts pra não alongar os posts originais, já que algumas observações acabam saindo do tema do post e citando questões políticas atuais no país ou no mundo.

Mas por quê, às vezes (ou muitas vezes), estas observações "saem pela tangente" do tema original do post? (a quem quiser pular esta observação extra, as observações originais do post estão após o traço abaixo e tem informação sobre segunda guerra)

Porque não é possível, por mais esforço que se faça, ignorar a realidade ao redor (do que se passa no país e no mundo) num ambiente de polarização política extrema.

Desde o "Vem pra rua" de 2013 (a "revolução colorida" que não se concretizou, mas faz estrago até hoje) a radicalização política no Brasil, que já era grande, degringolou de vez com grupos reacionários (que se autodenominam como "liberais" ou "liberais-conservadores", e alguns usam o termo "libertários", mas são todos uma coisa só: autoritários, vira-latas, estúpidos e anacrônicos) atacando tudo que consideram "inimigo". E se querem radicalizar, vão ter obviamente um contraponto ou resposta.

Essa polarização política pesada (radicalização) não ocorre só no Brasil, em praticamente quase todo mundo está ocorrendo radicalização política, alguns mais outros menos, mas ocorre em todo mundo.

Só que a polarização no Brasil é agravada ainda mais pela atuação partidarizada da "grande mídia" (o oligopólio de mídia, com destaque pra Rede Globo ou Organizações Globo) e principalmente pelo fato da vulnerabilidade da maior parte da população por aceitar passivamente o que esta grande mídia (que ascendeu na ditadura de 21 anos do país) repassa como "verdade" em questões atuais do país.

Esse não é um "problema" pequeno, é algo extremamente sério e não dá pra ignorar ou deixar de lado.

Evitei ao extremo não sair do tema segunda guerra, mas... uma vez que muita gente não mantém distância dos temas atuais (tentam misturá-los) e uma outra parte fica "calada" (quieta) pra não tomar posição, por covardia (mesmo quando deve), então não sou obrigado a respeitar qualquer um desses lados (não levarei em conta qualquer um desses dois lados pra tomar posições).

Quando pessoas começam a "cercar", enchendo a paciência com temas atuais porque querem usar A, B ou C como "escudos" pra algum fim político (no Orkut isso ocorreu), a tentativa de distanciamento de questões atuais (pra evitar trazer gente tosca, fanática e ignorante panfletando besteira pra junto) vai literalmente pro ralo.

E ninguém se iluda, eu não faço questão alguma de agradar A, B ou C porque alguém aparenta ser "educado" ao mesmo tempo que defende extremismo, ou porque comunidade A ou B tem posição "x" em relação ao Oriente Médio e coisas afins.

Sou humano (porque questões nacionais não devem ficar acima da condição humana), mas sou cidadão brasileiro, e minha visão política de mundo é de cidadão brasileiro (carregada do nativismo de minha terra natal, nativismo que também ocorre em todos os estados do país, uns mais outros menos), mesmo que eu saiba qual é o ponto de vista de outros países.

Não abro mão disso em hipótese alguma discutindo com outros brasileiros. Porque há brasileiros com crise de identidade nacional aguda (tanto brasileiros fora do Brasil como dentro do país), mas isso é problema dessas pessoas, não meu. Não sou "clínica de autoajuda" pra gente com esse tipo de problema.

Que fique claro que quando faço as observações acima, estou me referindo estritamente a discussões em português, principalmente com brasileiros, porque eu não percebo esse tipo de crise de identidade ou "grilo" (de grilado) que sempre remete a um complexo, ou mesmo preconceito agudo porque "fulano" é de tal país, estado, região, cidade (tirando o antissemitismo característico dos "revis") nas discussões em inglês como no blog Holocaust Controversies, no Rodoh etc.

Observações do post "Sobre a Ordem dos Comissários: instruções da guerra de aniquilação nazista na União Soviética" logo abaixo.
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Observação 1: quem quiser ler mais sobre a diretiva de Hitler, conferir o link do blog Avidanofront:
Ordem do führer sobre a administração das regiões do leste novamente ocupadas
Quem quiser ver o documento em inglês:
Himmler’s Memorandum on the Treatment of Alien Peoples in the East, 25 May 1940

E se alguém achar que isso é o texto mais pesado sobre a questão, tem coisas piores, que envolvem o nazi Erhard Wetzel (figura pouco citada e conhecida) sobre o Generalplan Ost. É curioso o cinismo dos ditos "revis" com a dimensão da guerra de extermínio praticada pelos nazistas, eles praticamente evitar citar essa questão do extermínio no leste europeu.

Cinismo e muitas vezes ignorância e estupidez também já que o conhecimento de boa parte deles do evento é precário ou totalmente distorcido, o que não apaga a ideia asquerosa por detrás desse apego desmedido deles com o que eles visualizam ou identificam como 'nazismo'.

Antes de ser algo caricato como a gente costuma ironizar a cretinice de alguns deles, no fundo esse pessoal é adepto do darwinismo social, como também o é alguns grupos que se denominam "liberais", mas que evitam a citação do termo "darwinismo" explicitamente por motivos óbvios (seriam facilmente rotulados de racistas), embora tenham uma aversão cínica e profunda com a questão do combate ao preconceito e racismo no Brasil e um ódio de classe profundo contra pobres (é essa uma das raízes do darwinismo social).

Ao contrário do que muita gente pensa, esse tipo de ideia de exclusão e racista é bem difundida em algumas cidades brasileiras. A "aparição" de grupos denominados "neonazis" no Brasil, ao contrário do que a mídia propaga como sendo "algo absurdo", infelizmente não é. O que ocorre é que esta mesma mídia e governos não têm interesse de esclarecer nada do assunto e nem de se aprofundar no problema da origem do racismo moderno no Brasil (que tem ligação direta com o evento da imigração pro Brasil no século XIX e começo do século XX), assunto que nem sequer é citado em colégios quando deveria ser obrigatório a discussão disso. E um adendo, refiro-me tanto à mídia de direita e de esquerda. Só vi uma vez citarem algo relativo a isso no site Viomundo, mas era só sobre São Paulo. Ou seja, o assunto sobre branqueamento no Brasil (que é o que dá base a esse racismo atual no país, as crenças racistas, além da herança racista colonial) sequer é discutido por conveniência, pra manter esses preconceitos regionais (preconceitos com conotação racista) inalterados.

Mas como dizia, a aparição desses bandos ditos "neonazis" no Brasil não é algo tão "absurdo" assim, apesar da adoção de símbolos do fascismo alemão por eles sempre soar ridículo pois o Brasil é um país com predominância da cultura portuguesa, indígena e negra, não excluindo as contribuições dos outros povos que pra cá migraram, mas essa também é a base étnica da maior parte do país, inclusive em regiões que a mídia propagam como "brancas" ou sem ligação com essas três culturas e povos (apesar de falarem português o tempo todo... vejam só...) porque há um sentimento de aversão dessas cidades com Portugal, negros e indígenas.

A mídia brasileira, de uns tempos pra cá, andar querendo "escandinavizar" o Brasil, talvez pra suprir seus complexos e sentimentos obscuros (que não tem coragem de externar), embora mantenha pro público externo a imagem do Brasil "tropical" formulada no Estado Novo do país (com contribuição da Disney) que perdura até hoje.

Como já deu pra notar, minha opinião sobre a mídia brasileira não é lá muito boa (e também de boa parte da mídia estrangeira). Digamos que, fizeram por onde ter essa imagem negativa, a "birra" não surgiu do nada. Em geral, a imagem da mídia hoje no mundo não é muito boa, pra não dizer que é terrível.
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Observação 2: Quem quiser baixar o livro (PDF), vá ao link do site do Centro de História Militar do Exército dos EUA.

Fiz questão de frisar a fonte pra servir como uma amostra pros fanáticos de direita do Brasil, com uma obsessão em repetir discurso da guerra fria.

A quem assistiu a abertura da Copa e leu o texto que coloquei aqui sobre ela (eu não profetizei...), viram uma demonstração desse fanatismo e radicalização imbecil nos xingamentos que esses fanáticos bitolados (e sem qualquer pingo de educação), na parte mais cara do estádio (com ingressos mais caros, setor "VIP" da baixaria e da elite Zé Povinho, o populacho medonho, a gentalha abastada brasileira), proferiram contra a presidente do país, quando não caberia numa cerimônia de abertura se comportarem tão grotescamente daquela forma achando que estavam "abafando", independente de divergência política.

Seria igualmente errado se o fato ocorresse com um presidente com outro retrospecto ideológico, eleito democraticamente. Há que se saber separar divergências de fanatismo e sectarismo, que é o que esse pessoal está fazendo há bastante tempo insuflados por certa mídia irresponsável, inconsequente e corporativa do país. Queimaram-se lindamente pro mundo inteiro ver.

Nem a principal potência rival da URSS (que não existe mais) possui um sectarismo e fanatismo tão estreitos com esses assuntos como o que se verifica na direita brasileira e latinoamericana (e ibérica), ou na maior parte dela. Sectarismo que mistura uma dose de paranoia, idiotice, má educação, prepotência e fanatismo religioso (obscurantismo).
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Observação 3: tem uma parte do texto (nas notas 45 e 46) que diz o seguinte:
"A ocupação era para ser permanente. Este era o objetivo final do que Hitler queria fazer, e nada nem ninguém estava autorizado a interferir com a realização deste empreendimento.45 Esta foi uma luta de ideologias, não de nações."
Pois bem, essa era também minha opinião anterior sobre o evento, mas analisando a coisa hoje eu discordo da minha opinião anterior. Esta foi uma guerra ideológica sim, entre o fascismo (nazismo) e o socialismo da URSS, mas também uma guerra entre nações e de aniquilação.

A própria ideia racista de ocupação e aniquilação de povos no leste (por estes serem inferiores ou descartáveis por ideias racistas, na concepção nazista) não é propriamente algo original da guerra anticomunista da segunda guerra, esta guerra também foi uma guerra de colonização, uma guerra "racial" (étnica) de aniquilação, só que dessa vez na Europa, como as ocorridas nas colonizações feitas na África e nas Américas.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

O Hitler "marxista". As falsificações de Hermann Rauschning - Parte 1

Já circulavam no Orkut "frases soltas" de um suposto livro de um alemão (que só não digo que alegaram que ele era historiador porque não salvei print disso e, como o Orkut rodou, o Google tirou do ar como a maioria já sabe, não dá pra recuperar as discussões) "provando" o marxismo de Hitler e consequentemente a falácia da extrema-direita liberal (que se denomina "libertária") de que o "nazismo é de esquerda".

O livro em questão é do Hermann Rauschning. Abaixo segue a explicação sobre o "status" do livro, vale a pena ler até o fim.

Mas irei mostrar mais uma vez porque não discuto esse tipo de idiotice com quem prega esse tipo de distorção. É uma discussão pueril, muitas vezes pior do que as que ocorriam com os "revisionistas" (ao menos esses leem o que pregam, ou têm uma ideia do que discutem, mesmo que façam distorções também).

Quem prega essas mentiras, com veemência (fanatismo tem disso), está assinando atestado de imbecilidade e desonestidade em último grau, ou está afirmando claramente (mesmo sem querer) que não tem ideia do que propaga e só repete bobagem que leu na internet pra defender seu extremismo político.

Só lembro remotamente de uma pessoa querendo discutir essa questão do "nazismo de esquerda" a sério, a pessoa tinha dúvidas e não "certezas", o que propicia um debate. Mas a maioria que repete esse mantra só sabe repetir clichê e defender a distorção, mesmo que mostrem que não tem valor algum.

Não lembro mais exatamente do teor exato das discussões mas lembro das citações desses trechos do Rauschning razoavelmente, era algo bem "bombástico" (entre aspas). Tão "bombástico" que nenhum Historiador de peso sobre nazismo "levou a sério" antes (essa é a parte hilária da coisa). O termo "bombástico" aqui é uma ironia, pois é absurdo alguém crer/achar que algum historiador de segunda guerra/nazismo não tenha ideia de que nazismo é de extrema-direita ou do que se trata o livro de Rauschning, e eles explicam o porquê do nazismo ser de direita/extrema-direita em livros sérios do tema. Há vários títulos nos posts de bibliografia e ranking, basta procurar. Só lê porcaria, hoje, quem quer. Informação não falta, é só procurar.

Sem mais delongas, o livro em questão é do Hermann Rauschning, conservador revolucionário alemão (pois é, existe "revolução conservadora", ao contrário do que certo astrólogo, guru de uma patota barulhenta espalhou dogmaticamente anos a fio na rede como sendo a "verdade das verdades"), que diz ter sido feito de conversações com Hitler. A quem quiser ler mais sobre esse movimento revolucionário conservador alemão, confira o post:
O Movimento Revolucionário Conservador alemão, precursor do nazismo
E a tag (marcador): Conservadorismo

Só há um "pequeno problema" com o livro do Rauschning: o livro é fraudulento, falso, tem crédito zero com historiadores de peso (como o Ian Kershaw, dentre outros nomes, ficarei devendo o trecho) que alegam que Rauschning inventou diversas partes do livro e que o livro é descartável. Só isso basta pra não discutir qualquer trecho reproduzido do livro por fanatismo político e panfletagem.

Podem ler a parte do verbete que comenta o caso e os que contestam, entre o Ian Kershaw (como já citei acima), autor britânico da que é considerada a melhor biografia de Hitler (a mais completa):

Clique em Authenticity of Hitler Speaks pra ler a contestação do livro. (A autenticidade de "Voice of Destruction", é como foi traduzido o título do livro pro inglês, ou uma das traduções). Ficarei devendo a tradução. Pode ficar pruma parte 2 deste post.

Em francês a parte onde comenta que o livro é fraudulento: Hitler m'a dit, une source discréditée

O verbete em português da Wikipedia sobre Rauschning é simplesmente deprimente, não menciona essa questão de que o livro não tem crédito e relata as "conversas" como se fossem sérias. Confirmando o que eu já disse sobre a Wikipedia, o problema dela é a versão em português, onde um bando de cabeças de bagre cortam o que é acrescentado, mesmo se correto, e deixam essa porcaria no lugar por sectarismo ideológico e desonestidade, a versão da Wikipedia em inglês é muito boa e completa. Se o dono do site observar esse problema (a polarização política, fanática, desonesta e sectária que há no Brasil principalmente), melhorará a versão em português.

A quem "chiar" (der piti) porque a Wikipedia foi usada, o conteúdo que consta dela (verbete em inglês) está correto, é isso que importa e não o fato de estar na Wikipedia, há as notas para verificar de onde foram tiradas as informações. Digo isso porque tem uma massa de pedantes (e ignóbeis) neste país que tentam desqualificar a informação/conteúdo só por o mesmo estar na Wikipedia, mesmo se você apontar o livro original (colocar links, trechos etc, como consta aqui e que constará no post da sequência). Repito isso, 'n' vezes se for preciso, porque chega dessa desqualificação ridícula como arma retórica. As citações nos verbetes em inglês contam com as informações nas notas, se o povo não verifica as notas é outra discussão, mas já desqualificam a Wikipedia sem fundamento (refiro-me à versão em inglês, a em português é de fato problemática). Este é um preconceito que perdura mais no Brasil (como vários outros preconceitos).

Voltando ao tema que interessa, a disseminação dessas frases do "Hitler marxista" ou "executor do marxismo" prosseguiram pela web, além do Orkut, obviamente.

Se as pessoas ao menos verificassem esses trechos sensacionalistas, de onde saem, verificariam a falsificação facilmente. Infelizmente a maioria não verifica trechos controvertidos demais (que não são aceitos por nenhuma correta historiográfica), preferem crer em qualquer bobagem que leem na rede.

O mais curioso é que a extrema-esquerda "esperta", que "sabe tudo" (que geralmente tem ranço com este blog por conta do nome), porque quando a gente comenta ou corrige algo deles alguns já ficam irritados porque "não pode estar errado", não souberam rebater/localizar uma bobagem dessas e evitavam participar das comunidades de segunda guerra do Orkut. Vivem num mundo à parte. Toda vez que aparecia uma olavete panfletando besteira sobre segunda guerra (como essa do post), esse pessoal da extrema-esquerda sectária costumava ficar perdido (embora nunca admitissem) por não entenderem que não basta fazer escárnio com esse tipo de extremismo, tem que mostrar seriamente que a panfletagem pregada por esse pessoal é uma distorção, uma mentira. Mostrar de onde foi tirada, o que é aceito como sério etc, indicar alguma fonte séria pro povo ler e não ficar fazendo "gracinha" gratuita por escárnio.

Há um desinteresse nesse pessoal (da extrema-esquerda e esquerda em geral) por temática de segunda guerra, guerra fria etc, mas acham que conseguem rebater o arsenal de distorções da direita radical (que adquiriu certa "tara" por segunda guerra) sem ler esses temas, com sectarismo, ficando em guetos.

Deixando essa questão de lado, irei transcrever uma citação do livro como ela costuma ser repetida a exaustão (inclusive com o nome do autor do livro escrito errado, pra vocês verem, nem um erro desses, banal, a turma da panfletagem corrigiu ou verificou), pois foi por esse trecho que localizei o livro. Inclusive o trecho tem antissemitismo escancarado.

Depois eu "passo" por "chato" (dizer a verdade num país onde grupos radicais inflados pela mídia querem falar mais alto que o Papa está virando um ato de resistência política) por afirmar que esses grupos radicais liberais do Brasil não veem muito problema em endossar esse tipo de panfletagem, embora quando são apertados começam a negar. Essa é a primeira:
"Eu não sou apenas o vencedor do marxismo. Se se despoja desta doutrina seu dogmatismo judeu-talmúdico, para guardar dela apenas seu objetivo final, aquilo o que ela contém de vistas corretas e justas eu sou o realizador do marxismo". (Adolf Hitler, apud Hermann Rauschinning, Hitler m'a dit, Coopération, Paris 1939, pp 211)
Outro erro, o termo "pp" em português é usado como sigla pra "páginas" (plural). Também não corrigiram. A transcrição acima (e as demais) deve ter sido coletada em algum site de extrema-direita francês (traduzidas pro português, mas vai que venham do espanhol), pois cita a edição em francês e o título do livro em francês também.

Quem quiser ver o livro original (em francês), confira neste link abaixo (em PDF):
"Hitler M'a dit" de Hermann Rauschning

E aqui a versão em inglês do livro (em PDF):
THE VOICE OF DESTRUCTION - Hermann Rauschning

Em espanhol (não localizei o PDF):
Hitler me dijo: Entrevista de Hermann Rauschning a Adolfo Hitler

O nome do Rauschning acima (no link dos PDFs do livro) está correto, ao contrário da tradução com erro do nome que está em destaque mais acima, com trecho do livro.

Curioso que num dos sites ou página que colocam essa panfletagem com os trechos do livro, diz que o "livro é raro". O livro é tão raro que tem logo dois PDFs dele acima com cópias, em francês e inglês, pra todo gosto, hahahaha. Se não me engano eu acho até que encontrei isso em espanhol. O livro se encontra a um clique e não o localizaram. Mas pra reproduzir besteira, são rápidos.

Sobre os sites que reproduzem a panfletagem como correta, podem achar pela web, eu não colocarei isto aqui pois não quero esse tipo de fanático enchendo o saco, chorando, achando que vou ceder e concordar com a mentira deles pra não ficarem "chateados". Essa gente olavete, ou neocon brasileiro, é muito, mas muito insuportável/chato, com um nível de discussão ridículo. Foi por isso que evitei ao extremo citar esse povo aqui, nunca os quis por perto, o nível baixa (quando falo em baixar, é no sentido literal: partem pra agressão, xingamento, grosserias e coisas do tipo) e sou chato nesse ponto.

Deixando isso de lado, como entendo melhor o inglês (eu não falo francês, apenas entendo porcamente alguma coisa, por enquanto, dá só pro gasto com ajuda do tradutor), usarei a versão do livro em inglês em vez daquela em francês.

O trecho que destaquei acima segue abaixo da edição em inglês (PDF, pág. 115), com tradução minha na sequência. E como dá pra ver, a tradução que fizeram antes está distorcida (pra variar...):
"I am not only the conqueror, but also the executor of Marxism—of that part of it that is essential and justified, stripped of its Jewish-Talmudic dogma."

"Eu não sou apenas o conquistador, mas também o executor do marxismo-daquela parte dele que é essencial e justificada, tirando dele seu dogma judaico-talmúdico."
E tem mais abaixo, só que sem indicar as páginas e não são traduções minhas, é como são encontradas pela web (eu as localizei na edição em inglês por páginas, num segundo post coloco o texto original com a nova tradução, se for necessária):
"Não é a Alemanha que será bolchevisada, é o bolchevismo que se tornará uma espécie de nacional socialismo. Aliás, existem entre nós nazistas e os bolchevistas mais pontos comuns do que há divergências, e, antes de tudo,o verdadeiro espírito revolucionário, que se encontra na Rússia como entre nós, por toda a parte onde os marxistas judeus não controlam o jogo. Eu sempre levei em conta esta verdade e é por isso que eu dei ordem de aceitar imediatamente no partido todos os ex comunistas"

"Eu aprendi muito do marxismo, e eu não sonho esconder isso. O que me interessou e me instruiu nos marxistas foram os seus métodos. Todo o Nacional Socialismo está contido lá dentro. O nacional socialismo é aquilo que o marxismo poderia ter sido se ele fosse libertado dos entraves estúpidos e artificiais de uma pretensa ordem democrática"

"Que significa ainda a propriedade e que significam as rendas? Para que precisamos nós socializar os bancos e as fábricas? Nós socializamos os homens"
Eu farei uma segunda parte deste post e nela coloco os trechos mencionados acima no livro original em inglês, citando a página do trecho, onde tentarei colocar os comentários do Kershaw (traduzidos, foi por isso que cabe um segundo post, mas tem o link sobre isso em inglês, acima) e outros autores sobre a credibilidade desse livro do Rauschning, já que só tem comentário sobre a fraude desse livro em sites "revisionistas", confiram o texto em inglês e francês (ambos os sites são negacionistas, fica o aviso):
Rauschning's Phony 'Conversations With Hitler': An Update. Mark Weber
Les fausses «Conversations avec Hitler» de Rauschning : une mise au point. Mark Weber

Os "revis" também afirmam que o livro é uma falsificação.

Vejam só a que ponto chegamos, o fanatismo dessa extrema-direita liberal (libertária) é tão grande que até "revis" conseguem demonstrar que algo está errado de tanta cretinice que esses "libertários" (ultraliberais) panfletam sobre nazismo e segunda guerra. Fiz o post na pressa senão acabaria deixando de lado.

Como acho que já mencionei acima (se for redundância depois eu corto, ou corrijo), esta panfletagem é também espalhada em círculos "conservadores neocons", que são reacionários que em tese "odeiam" o nazismo (mas nem tanto assim...). O "ódio" é porque hoje em dia "pega mal" eles declararem amor aos nazis com o sentimento anti-esquerda deles (com a retórica da guerra fria, quem for de esquerda é "comunista"), mas eles não sentem uma aversão "profunda", daí preferem manter "certa distância" desse tipo de denominação (taticamente) até que estoure algum regime fascista de novo na Europa e o Fascismo fique "fashion" (na moda) de novo, pra valer. Já vi vários declararem amor à Marine Le Pen em páginas de Portugal, amor à "verdadeira direita" (rs). Como disse em outros posts, esses "libertários" (ultraliberais) do Brasil são o PSTU da direita. Eles, o Bolsonaro e cia.

Com os últimos posts sobre fanatismo político no país, 3 perfis saíram do blog (da parte "seguir"), só pra mostrar a quanto anda o extremismo político no país.

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Hitler (A biografia). De Joachim Fest (resenha)

Hitler, de Joachim Fest,
tradução de Analúcia
Teixeira Ribeiro, Editora
Nova Fronteira, 2 volumes,
935 páginas.
Em novembro de 1923, há exatos 83 anos, aconteceu o lendário Putsch de Munique, quando pela primeira vez Hitler tentou tomar o poder na Alemanha. A república de Weimar assistiu pasma ao golpe do recém-fundado Partido Nacional-Socialista, que só naquele ano teve 35 mil novas adesões. Hitler contou com o apoio de 15 mil homens da S. A., a tropa de assalto do partido nazi. Resultado: golpe frustrado e os líderes presos – mas o prestígio de Hitler e de seu partido só fez aumentar.

Esse e outros episódios estão descritos na colossal biografia de Adolf Hitler escrita por Joachim Fest, publicada primeiramente na Alemanha, em 1973, e cuja segunda edição em português, revisada e ilustrada, foi lançada neste ano no Brasil pela Editora Nova Fronteira, em dois grandes volumes que somam 935 páginas. Joachim Fest, que morreu em setembro deste ano, foi um jornalista de grande nome na Alemanha e professor honorário da Universidade de Heidelberg. Ele mesmo chegou a lutar na 2a Guerra Mundial e acabou como prisioneiro da França. Além de Hitler, Fest escreveu No bunker de Hitler, livro que inspirou o filme A queda – As últimas horas de Hitler, dirigido por Oliver Hirschbiegel.

Considerada uma das mais completas biografias sobre o estadista alemão que permaneceu no poder entre 1933 e 1945, Hitler é caracterizada pela riqueza de detalhes pessoais e “históricos”, que dão a sensação ao leitor de estar vendo os acontecimentos in loco. Sobre o Putsch de 1923, escreveu Fest: “Trajado com uma longa casaca negra, a cruz-de-ferro pregada ao peito, Hitler tomou lugar na Mercedes vermelha comprada havia pouco. (...) Com aquele gosto peculiar por cenas exageradas e teatrais, brandiu um copo de cerveja e, enquanto uma pesada metralhadora era posta em bateria ao seu lado, engoliu dramaticamente um último gole, arremessando em seguida com estrondo o copo aos pés”.

O Putsch da cervejaria poderia ser considerado, então, um momento essencial na vida do futuro Führer do governo alemão: quando ele entraria definitivamente no caminho político. Hitler passaria, nesse momento, a controlar seus instintos artísticos e se transformaria em um “tecnocrata do poder”. Foi um grande passo para sua chegada ao poder como chanceler do Reich, em 1933.

E se ele tivesse chegado ao Brasil?– Frustrado o golpe, rotulado por muitos como “carnaval político”, “putsch de escada de serviço” e “farsa de faroeste”, Hitler, mesmo preso, continuou sua escalada megalomaníaca ao poder. Na prisão em Landsberg, aproveitou para continuar se articulando politicamente: compartilhava a cela com seus comparsas de partido, que chegavam, inclusive, a cuidar da limpeza de seus aposentos. Sentado em uma bandeira da suástica, costumava presidir o horário das refeições.

Dentro da prisão, sua fama aumentou na Alemanha. O futuro Führer recebeu muitas cartas e flores de seus fãs e aproveitou os anos de reclusão para escrever o livro Minha luta, considerado uma bíblia do nacional-socialismo, permeada por ataques aos judeus e caracterizada por um estilo duvidoso, que se pretendia erudito, mas confundia figuras de linguagem e teorias. Os 25 pontos do programa do partido tinham sido promulgados em 1920, mas é com Minha luta que Hitler desenvolveu sua teoria racista que teria como ápice o extermínio em massa dos judeus em plena 2a Guerra. A idéia inicial era escrever uma biografia dos seus então 30 anos de vida, da pobreza de sua infância e das suas tentativas no universo artístico.

Os 10 milhões de exemplares publicados não fizeram o sucesso esperado. Segundo Fest, faltava a presença de Hitler como orador que fazia a diferença para suas idéias cheias de fracas obsessões e fantasias. Até mesmo a teoria nacional-socialista não é convincente: carente de qualquer idéia original, mostrou-se um “caldo de tendências”. Rauschning, autor da obra Conversa com Hitler, afirmou que tudo nela já havia sido dito, falado, escrito: nacionalismo, anticapitalismo, culto à tradição, concepções de política exterior, racismo e anti-semitismo. Nada era novidade. Mas a falta do novo não afetou o sucesso estrondoso da teoria entre as massas.

A abordagem do nazismo de Joachim Fest prima por dois pontos essenciais. O principal deles é a construção de um mito. Hitler não é descrito como uma pessoa normal, mas sim como um líder carismático capaz de acionar multidões que estavam amorfas antes de seu chamado. Para Fest, não seria possível o nacional-socialismo sem essa figura emblemática. Para provar sua teoria, ele enche o leitor de detalhes pessoais da vida de Hitler, desde criança dotado de pensamentos de conquista do mundo. Interessante é a fileira de adjetivos utilizados pelo autor para descrever as faces dessa múltipla e esquizofrênica personalidade, ora caracterizada como “impessoa”, ora como uma figura extremamente sedutora, capaz de exterminar qualquer resistência diante dele. Com um quê de exagero, Fest chega a afirmar que Hitler seria um guardião de todas as angústias de seu tempo. Vai mais longe, dizendo que, além de ser o denominador comum, “imprimiu aos acontecimentos seu rumo, sua extensão e seu dinamismo”.

Da mesma maneira, pontua sua biografia, organizada de maneira cronológica, por títulos significativos dessa mesma abordagem de “louco e gênio” de Hitler. A infância e a participação na 1a Guerra são classificadas no tópico “vida sem objetivo”; a fundação do partido e o Putsch de Munique se encontram no tópico “O caminho da política”. Em seguida são pontuados “os anos de espera”, “o tempo de luta” e finalmente “a tomada do poder”, seguida da “Guerra errada” e terminando com “A queda”, com o fim do regime hitlerista. Nesse momento, Fest não poupa suas tintas para mostrar um Hitler manco, que se arrastava com seu cachorro, isolado dentro de seu bunker. Sua desgraça pessoal atingiu também os seus amores: a sua companheira Eva Braun teria tentado suicídio logo aos 23 anos.

Moderno – O segundo ponto essencial do Hitler de Fest é desmontar as outras tantas teses que afirmam que o nacional-socialismo foi produto de condições históricas específicas, pontuadas principalmente pela Alemanha derrotada na 1ª Guerra Mundial, vítima de um cruel Tratado de Versalhes – assinado pelas nações vitoriosas –, que provocou a perda de valiosos territórios alemães, ocasionando então uma crise no governo que se formava no pós-guerra, a República de Weimar. Fest, em lugar disso, tenta refletir sobre todos os acontecimentos da Europa nessa época pela ótica pessoal da história de Hitler. O resultado é um exercício, no mínimo, interessante. Mostra um outro viés do nacional-socialismo, que traz algo diferente da historiografia em vigência, que prima por considerar as forças históricas evidentes no período como determinantes do processo.

Além disso, a pesquisa de pano de fundo é monumental. Como se para todos os acontecimentos dessas décadas (principalmente de 1930 e 1940) houvesse um comentário especial ou frases de Hitler. Para provar a importância especial de Hitler na história, Fest argumenta que o nazismo morreu no momento em que Hitler se envenenou, em 1945, pouco antes da capitulação da Alemanha. “Com a morte de Hitler e a capitulação”, afirma, “o nacional-socialismo desapareceu de cena quase sem transição, de um momento para o outro, como se fosse apenas o movimento, a embriaguez e a catástrofe provocados por Hitler.” Mesmo no Tribunal de Nuremberg, montado pelos aliados entre 1945 e 1949 para julgar os criminosos de guerra, os acusados se mostravam ideologicamente alienados, de maneira que se levasse a crer que o único culpado por toda a catástrofe da guerra e do assassinato em massa fosse mesmo o ditador alemão.

Mesmo assim, Fest não deixou de mostrar que Hitler foi extremamente moderno para seu tempo, trazendo novas realizações técnicas, como a propaganda em massa, cujos vestígios se encontram em diversos políticos populistas da atualidade. Fazendo “política para os apolíticos”, para a imensa massa mobilizada pelos festejos coletivos que mais pareciam shows, Hitler construiu o seu poder na esfera da sedução, criando duas faces para o mesmo nazismo: uma marcada pela prisão em massa e posterior extermínio dos excluídos, e outra, dentro dessa aura de magia, dos grandes comícios voltados para os eleitos, dos quais se tornaram mais famosas as festas do Dia do Partido, realizadas em Nuremberg.

O personagem de Hitler retratado por Fest não deixa de ser marcante, mesmo que para o lado do mal, visto como a encarnação do que de pior pôde acontecer para a humanidade. O autor provoca o leitor quando – através de uma bela metáfora – afirma que Hitler nada mais foi do que um espelho de sua época, uma época cruel, sem esperanças e permeada de angústias. Tempos sombrios, diria Hannah Arendt.

Ana Maria Dietrich, historiadora e jornalista, faz doutorado na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP sobre o tema “Nazismo tropical? O Partido Nazista no Brasil”. É co-autora de Alemanha (Imesp, 1997).

Fonte: Site da USP (Jornal da USP)
http://www.usp.br/jorusp/arquivo/2006/jusp783/pag1213.htm

Observação: a edição antiga desse livro tinha apenas 1 volume. Essa capa é da edição mais recente, dividida em dois volumes. A quem quiser compreender melhor a segunda guerra e o nazismo, este livro é essencial.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

A histeria da imprensa, que mais divulga o Mein Kampf (Minha Luta) de Hitler em vez de esclarecer (sem pânico)

Como já foi publicado posts no blog sobre isto (clique aqui pra ver os textos), no fim do ano passado expirou os direitos autorais do Estado da Baviera (Alemanha) sobre o livro autobiográfico de Hitler, o "Mein Kampf" ("Minha Luta", em português).

Já saiu também notícia há algum tempo (agora que vi que o post é de 2008, quase 8 anos...) que um Instituto de História Contemporânea (IFZ) na Alemanha queria lançar (e já lançou) uma edição comentada do livro, que tem quase 2000 páginas. Edição comentada do livro completo, pois ele foi lançado em dois volumes, além de ter uma "continuação". Geralmente o povo só "conhece" os dois primeiros volumes. Ambas cópias se encontram facilmente em inglês.

Pra quem não conhece a sequência do Mein Kampf (Minha Luta), que irei chamar de "a continuação", ela foi lançada em inglês e se encontra fácil em sites online de venda dos EUA e Reino Unido, não há restrição nesses países sobre a venda desses livros:
Hitler's Second Book: The Unpublished Sequel to Mein Kampf
Zweites Buch

Não colocarei link de site online (tem um bem conhecido) pra não fazer propaganda gratuita de site de vendas, a menos que fosse algo extremamente necessário.

Prosseguindo... aqui temos a matéria no site do Instituto sobre a edição comentada, texto em inglês. Como não fiz post comentando a existência deste outro blog abaixo, eu criei um blog pra postar textos em outros idiomas que poderiam ser traduzidos praqui, mas que acabaram não sendo. É muito mais fácil publicar isso nos idiomas originais que a tradução. Caso alguém tenha interesse em ver:
Hitler, Mein Kampf. A critical edition (IFZ, Alemanha)

O que chama atenção pro caso da publicação do livro é a histeria da imprensa alemã com o fato, ou estão querendo ter audiência porque o tema "chama atenção", como por exemplo a DW (Deutsche Welle) que tem versão em português (Brasil) e que age como se o livro não estivesse acessível na internet há mais de década, em vários idiomas, formatos etc ou estão querendo promover mesmo o livro.

Basta colocar na busca de qualquer navegador o nome do livro, acrescido do formato PDF (o formato fica a critério de cada um) que aparecem cópias e mais cópias do livro.

Vou dar um exemplo de como é fácil achar isso. Colocarei a busca pra versão em inglês pra não facilitar os "curiosos" que ficam "fascinados" com isso. Caso algum site retire o arquivo que consta dos links, paciência, isto é só pra ilustrar como é fácil de achá-lo e baixar:
mein kampf pdf english

Aqui uma versão em português (apareceu também na busca acima), mas acho que não é a versão completa (em PDF):
Link
Na própria Wikipedia há cópias disso, no verbete em inglês:
https://en.wikipedia.org/wiki/Mein_Kampf#External_links

Um adendo: o verbete da Wikipedia em português pro livro tem várias distorções ou é bem precário, colocaram o termo "racialista" em vez de "racista" pro livro (alguma viúva chorosa do III Reich deve ter feito a alteração), e o próprio verbete "racialista" em português é um verdadeiro lixo. O pior é que até pra alterar é complicado, a fiscalização do site com a versão em português é muito ruim e o número de pessoas que contribui muito baixo, fora o sectarismo político e distorções que rola na direita brasileira com esses temas.

Ou seja: qual a razão da histeria? Nunca viram essas coisas citadas acima?

Agora toda vez que se falar em nazismo será essa histeria, por pura ignorância? Pensei que a postura do povo tivesse amadurecido, mas pelo visto (vou me restringir ao Brasil) o brasileiro (generalizando) continua imaturo pra qualquer tipo de discussão política, isso quando não descambam pro sectarismo e agressão aberta.

Pra que tanto alarde só por conta de uma publicação em papel? Eles acham mesmo que é o único meio de propagação de ódio na face da terra ou o principal? cheio de tablets e mídia eletrônica em todo canto?

A pseudo-polêmica em torno do livro irrita, pois parece mais material de divulgação e propaganda as matérias que qualquer coisa que esclareça algo, por exemplo, poucos citam esses fatos narrados acima. Fora que vários textos de nazistas (Diários de Rosenberg, Goebbels etc) se encontram disponíveis à venda, principalmente nas versões em inglês.

Não existe restrição à venda disso no Reino Unido e nem nos Estados Unidos.

Mais um motivo pra eu ficar perplexo com a reação histérica da mídia em torno disso. Começou com a mídia alemã, mas as outras mídias dos outros países, por mimetismo (já que ninguém lê nada), saíram repetindo o "comportamento" só copiando a discussão original, sem refletir.

Pois bem, minha opinião sobre o fim dos direitos autorais desse livro e publicação livre em vários países, e eu já devo ter dito isso antes mais de uma vez, é de que uma edição comentada é muito bem-vinda.

Ela vale muito mais que o livro original, pois é um livro novo, com acréscimos que devem valer à pena. Só que só será lançada em alemão até agora, essa edição crítica, e em número limitado. O que é um erro.

Não há previsão de lançamento (se é que vão lançar) de tradução desta edição comentada alemã em outros países, principalmente nos de língua inglesa e espanhola, já que o grosso do mercado dos livros em português se resume quase que praticamente ao Brasil, e a tiragem de uma edição dessas no país seria pouco provável, pois seria cara (até pelo tamanho) e o conhecimento político e de História da população não é dos melhores. É só ver os comentários negando o caráter nocivo dos mais de três séculos de escravidão no país e das manifestações racistas no mesmo na última década.

um lançamento programado na Espanha, pro dia 19 de janeiro próximo, de uma edição espanhola desse livro, comentada (se eu localizar a matéria eu coloco o link), só que não é a edição do IZF (Inst. de História alemão). O livro será lançado também em Portugal, só que na versão normal, não a comentada (que é a que eu destaco e valeria a pena).

O piti de grupos tentando barrar a publicação desta edição comentada é burrice explícita (não tem outro termo pra se chamar), ignora todos os fatos apontados acima (que não são novidade) e trata o livro apenas pelo aspecto simbólico ignorando que o livro é uma chatice e não é o principal livro pra se entender o nazismo ou mesmo fazer "propaganda".

O mecanismo de propagação de ódio na internet tem outra dinâmica, a maioria dessas viúvas do III Reich são muito toscas, tem uma interpretação deturpada disso (quando leem), seguem mais uma estética e discurso fácil de ódio. Quem quiser entender algo sobre nazismo e segunda guerra, comece pela biografia de Hitler de Joachim Fest (saiu em dois volumes a última edição) ou a do Ian Kershaw (ambas lançadas em português).

Esse "fetiche" em torno do Mein Kampf (Minha Luta) não passa de exibicionismo, idiotice e coisa de momento, quando deixar de ser novidade, cairá no limbo.

A histeria ou falácia (já vi matéria com essa baboseira, pra variar) de que esse livro aumentará o "xenofobismo" na Europa, é coisa de gente paranoica ou querendo criar alarmismo sobre o assunto porque sabe que o grosso da população no Brasil tem uma ideia genérica (quando tem) sobre nazismo, fascismo e segunda guerra. Ainda bem que existe a internet como espaço democrático onde não precisamos mais ficar reféns dessas "inteligências raras", além de termos acesso ao que é publicado em outros países, publicações de ponta e não bobagens.

Só pra esclarecer: o comentário acima não se trata de uma provocação, eu já tinha em mente fazer um post sobre essa histeria da mídia acerca desse livro, desde dezembro, mas é que como tive o desprazer de ler mais uma besteira sobre o assunto, e acabei citando a coisa. Só que não posso restringir o que penso pra não desagradar a A, B ou C que dizem o que quer e não gostam de críticas, resquício de um comportamento cultural autoritário do país, que eu não tolero. A reação padrão, em geral, é fingir que não leram a crítica. Continuem assim (rs).

Resta aos leitores lusófonos torcer pra que lancem isso na Espanha (principal mercado editorial em espanhol), só que deverá custar caro. Cito a Espanha pela proximidade dos dois idiomas, português e espanhol. "Ah, mas não sei ler espanhol", tente aprender e pare de reclamar de tudo, será bom pra você e pra todos no seu entorno. Digo isso porque muita gente reclama que tem dificuldade com o inglês, mas com o espanhol não existe essa desculpa de "ah, eu não sei, é difícil", papo furado, isso é preguiça.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Crítica publicará "Minha Luta" de Hitler em 19 de janeiro a cargo de Sven Felix Kellerhoff


Um exemplar da primeira edição
de "Mein Kampf"- EFE
O selo editorial Crítica publicará em 19 de janeiro "Mi lucha. La historia del libro que marcó el siglo XX" (Minha Luta. A história do livro que marcou o século XX), sob responsabilidade do historiador e jornalista Sven Felix Kellerhoff, com um "estudo amplamente documentado".

Segundo informou a editora num comunicado, em 31 de dezembro de 2015 expiram os direitos de "Mein Kampf", escrito por Adolf Hitler, já que 70 anos depois da morte do ditador o Estado da Baviera perde os direitos autorais.

Nesta versão, Kellerhoff conta como se escreveu a obra na cadeia de Landsberg; revela como Hitler falsificou nela sua vida; analisa as ideias que expõe, e desvela sua procedência.

Segue depois o processo pelo qual o livro, que foi um fracasso de vendas nos primeiros anos, converteu-se num negócio (até 1945 foram impressos uns doze milhões de exemplares) que fez o Führer milionário, às custas de evasão de impostos, e na forma na qual suas ideias se aplicaram na política do regime nazi.

Kellerhoff nasceu em 1971 em Stuttgart; estudou história e jornalismo e, depois de uma longa carreira em diferentes meios de comunicação, atualmente é chefe de redação do "Die Welt".

EFE Barcelona - 14/12/2015 às 19:34:51h. - At. às 12:08:55h.

Fonte: ABC (Espanha)
http://www.abc.es/cultura/libros/abci-critica-publicara-lucha-hitler-19-enero-cargo-sven-felix-kellerhoff-201512141934_noticia.html
Tradução: Roberto Lucena

terça-feira, 29 de dezembro de 2015

França autoriza acesso a alguns arquivos policiais e jurídicos de Vichy

Cidadãos e investigadores podem, a partir de hoje, conhecer melhor o regime de Vichy, colaboracionista da Alemanha nazi durante a ocupação de França, na Segunda Guerra Mundial, após a abertura de arquivos policiais e judiciais da época.

Pétain e Hitler
Entre os documentos até agora abrangidos pelo segredo de defesa nacional que poderão ser "livremente consultados, sob reserva de desclassificação prévia", figuram os relativos às atividades da polícia judiciária francesa entre setembro de 1939 e maio de 1945, precisa um decreto publicado no "Journal Officiel" (Diário Oficial).

Os pedidos de desclassificação de documentos deverão ser formulados pelos serviços públicos de arquivos e o Diário Oficial precisa que serão "altos funcionários de defesa e segurança" os encarregados de dar seguimento a tais pedidos, pelo que determinados documentos continuarão a ser confidenciais.

Assinado pelo primeiro-ministro francês, Manuel Valls, e pelos ministros dos Negócios Estrangeiros, Justiça, Defesa, Interior e Cultura, o decreto diz também respeito às investigações e atividades da polícia judiciária do Governo provisório formado após a libertação da Alemanha nazi, em 1945.

Poderão igualmente ser consultados os casos levados a tribunais de exceção instaurados por Vichy, os crimes julgados logo pelos tribunais de exceção criados após a libertação e os arquivos sobre a perseguição e julgamento de criminosos de guerra nas zonas de ocupação francesa na Alemanha e na Áustria.

Historiadores como Gilles Morin esperam que estes ficheiros, consultáveis quase cinco anos antes de expirar o prazo de 75 anos previsto para o efeito no Código do Património, revelem dados inéditos sobre líderes da Resistência como Jean Moulin, detido, torturado e assassinado em 1943, disse ao canal privado TF1.

O escritor, advogado e caçador de nazis Serge Klasferld que, como outros especialistas, já trabalhou com esses documentos graças a derrogações individuais obtidas desde princípios dos anos 1980, adiantou à emissora France Info que "não se esperam revelações" destes arquivos que, sublinhou, "são sumamente precisos".

Considerou igualmente que, apesar de qualquer derrogação geral "ser um avanço da liberdade de informação", a que hoje começa "é algo quase simbólico".

Segundo o Memorial da Shoah (Holocausto) de Paris, durante o Governo do general Pétain foram assassinados cerca de 80.000 judeus franceses, 76.000 dos quais depois de serem deportados para os campos de concentração nazis.

Os historiadores estimam que, também vítimas do nazismo, além de milhares de comunistas, ciganos, homossexuais e resistentes perderam a vida em França entre 1941 e 1945 cerca de 40.000 a 50.000 doentes mentais, principalmente de fome e esgotamento.

Lusa

Fonte: SIC (Portugal)
http://sicnoticias.sapo.pt/cultura/2015-12-28-Franca-autoriza-acesso-a-alguns-arquivos-policiais-e-juridicos-de-Vichy

domingo, 20 de dezembro de 2015

Planos para judeus franceses e "outros inimigos", de dezembro de 1942 a março de 1943

Esta excelente análise de Peter Longerich merece ser citada inteira:
19.6(5) Num relatório para Hitler em 10 de dezembro de 1942, Himmler preparou uma lista escrita à mão dos pontos que ele queria apresentar. Sobre o "II SD e assuntos policiais", Himmler especificou como ponto 4 a seguinte palavra-chave:
  • Judeus na França
  • 6-700.000
  • outros inimigos.
19.7 Próximo a essas palavras-chaves pode ser encontrado um crédito e no próprio manuscrito de Himmler a palavra "abolir" (abschaffen): Himmler tinha então trazido esses a Hitler e recebeu sua permissão para "abolir", ou seja, para liquidar os estimados 600.000-700.000 judeus na França, bem como "outros inimigos".179 Após a reunião, Himmler enviou uma nota para Müller, chefe da Gestapo, na qual afirmou:
O Führer deu ordens para que os judeus e outros inimigos na França devam ser presos e deportados. Isso deveria ter ocorrido, mesmo que ele tenha falado com Laval sobre isso apenas uma vez. É um problema de 6-700.000 Jews.180
19.8 Dois meses depois, em fevereiro de 1943, Eichmann, em uma breve visita a Paris apresentou um programa máximo para a deportação de todos os judeus que viviam na França, incluindo aqueles com cidadania francesa.181

19.9 Na reunião de 10 de dezembro de 1942, Himmler apresentou a Hitler uma proposta de criação de um campo de trabalho para judeus mantidos na França, Hungria e Romênia, para um total de 10.000 pessoas. De acordo com uma nota escrita à mão por Himmler, Hitler aceitou a proposta. 182 Após a reunião, Himmler enviou uma ordem para Müller para concentrar essas 10.000 pessoas num "campo especial" (Sonderlager). Ele afirmou: "Certamente eles devem trabalhar lá, mas sob condições em que permaneçam saudáveis e vivos." 183

19.10 As notas manuscritas de Himmler deste encontro com Hitler e as ordens enviadas para Müller confirmam que foi desejo de Hitler que aqueles judeus franceses que não se enquadrassem nessa regra não fossem "mantidos vivos" (am Leben bleiben), mas que fossem "abolidos", ou seja, assassinados.
Observe também esta análise interessante de Edith Shaked. Embora os nazistas tenham sido incapazes de terminar esses planos de extermínio, a intenção é clara.

Fonte: Holocaust Controversies
http://holocaustcontroversies.blogspot.com/2015/08/plans-for-french-jews-and-other-enemies.html
Texto: Jonathan Harrison
Título original: Plans for French Jews and "other enemies", December 1942 to March 1943
Tradução: Roberto Lucena

domingo, 6 de dezembro de 2015

"Mein Kampf" (Minha Luta) regressa às bancas alemãs

Instituto histórico de Munique quer fazer edição pedagógica da obra que inspirou o regime nazi.


Numa altura em que o fluxo de refugiados a entrar na Alemanha está a gerar uma onda de descontentamento e a reacender os fantasmas da xenofobia , uma instituição universitária germânica vai lançar, em Janeiro do próximo ano, o manifesto ‘Mein Kampf’, de Adolf Hitler.

O livro, que explica a ideologia racista e antissemita que inspirou o regime nazi, foi publicado pela primeira vez em 1925, oito anos antes de Hitler chegar ao poder em Berlim. Na altura passou razoavelmente despercebido. Hitler era um ilustre desconhecido e livros de temática antijudaica eram muito abundantes na Europa de então – tinham passado apenas 30 anos sobre o caso de alta traição de Alfred Dreyfuss, que abalou todo o continente e afundou França num momento de vergonha nacional.

O Instituto de História Contemporânea, sediado em Munique, vai imprimir uma edição da obra de quatro mil exemplares, onde o texto original será acompanhado de mais de 3.500 notas, que pretendem assumir um cariz pedagógico oposto às propostas incendiárias do responsável direto pela morte de mais de seis milhões de judeus durante o conflito mundial de 1939/45.

Andreas Wirsching, diretor do instituto, já disse que o texto com comentários de especialistas irá “quebrar o mito” em torno do manifesto: trata-se de "um trabalho acadêmico" que, afirmou, pretende ir mais longe que as publicações “irresponsáveis” que estão amplamente disponíveis nas livrarias de segunda mão. Também Thomas Krüger, presidente do Centro para a Educação Política, uma organização estatal, veio defender a publicação, dizendo que é importante “quebrar o tabu ‘Mein Kampf’”.

A publicação da obra foi proibida logo a seguir à derrota dos nazis em 1945 e os seus direitos atribuídos pelas potências ocupantes ao Estado da Baviera. Segundo a lei germânica, estes direitos cessam ao cabo de 70 anos, em Janeiro de 2016, pelo que ‘Mein Kampf’ passa a ser de acesso livre no mercado. E para que ninguém faça uso abusivo da obra de Hitler – que foi um ‘best-seller’ com mais de 12 milhões de cópias –, as autoridades judiciais alemãs decidiram no passado que não deveria existir uma edição acrítica do livro. Mas, para já, não se livram das críticas de diversas instituições e grupos ligados à diáspora judaica – que alegam que a obra nunca mais deveria ver a luz do dia. Temem que a ‘bondade’ da nova edição se perca no meio da situação explosiva que se vive na Alemanha por estes dias.

03 Dez 2015 António Freitas de Sousa
antonio.sousa@economico.pt

Fonte: Económico (Portugal)
http://economico.sapo.pt/noticias/mein-kampf-regressa-as-bancas-alemas_236493.html

Ver mais:
“Mein Kampf”. O livro proibido de Hitler volta a ser publicado na Alemanha 70 anos depois (Observador, Portugal)

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Hitler era astuto, não tanto hipnótico, diz nova biografia alemã (Peter Longerich)

BERLIM (Reuters) - Uma nova biografia de Hitler escrita por um proeminente historiador alemão deve gerar controvérsias com seu argumento de que a perspicácia política do líder nazista foi subestimada e de que a crença de seu domínio hipnótico sobre os alemães é inflado.

O livro "Hitler", de Peter Longerich, que será publicado na segunda-feira é um tomo de 1.295 páginas que inclui material sobre os diários do chefe de propaganda nazista Joseph Goebbels e os primeiros discursos de Hitler.

"De modo geral, você tem uma imagem de um ditador que controlou muito mais, que era mais envolvido de perto em decisões individuais do que se pensava anteriormente. Eu quis colocar Hitler como uma pessoa de volta ao centro", disse Longerich em entrevista à Reuters.

Trabalhos recentes sobre o Terceiro Reich têm colocado mais ênfase nos climas social e político que levaram à ascensão do nazismo após a derrota na Primeira Guerra Mundial e as demandas de reparação incapacitantes.

Logo após a Segunda Guerra Mundial, os alemães agarraram-se na crença de que eles foram mantidos reféns de uma gangue criminosa liderada pelo carismático Hitler, empenhada em conquistar a Europa e exterminar judeus.

Longerich, professor da Universidade de Londres, argumenta que enquanto todas as políticas de Hitler e os resultados foram catastróficos, ele agiu de maneira inteligente em situações específicas.

"A questão de porquê ele conseguiu chegar tão longe precisa ser abordada: Obviamente ele tinha habilidade para explorar situações individuais em seu interesse próprio e para seus objetivos próprios", disse ele.

Mesmo suas políticas raciais foram em grande parte devido a um oportunismo político, disse Longerich, que não acha que Hitler era radicalmente anti-semita na sua juventude.

"Nos anos de 1919-1920 ele percebeu que poderia ser bem sucedido em política ao abraçar e incitar o antissemitismo", disse, acrescentando que isso virou elemento central apenas em 1930.

A habilidade de Hitler de tomar o poder é ainda mais impressionante dado que o estudante de arte nascido na Áustria era um "ninguém" sem ideologia até seus 30 anos. Apenas então, recusando-se a aceitar a derrota da Alemanha, ele foi levado ao recém-criado Partido Nazista.

Longerich também busca desmascarar a teoria de que Hitler tinha um carisma irresistível que cativou os alemães, argumentando que ela foi em grande parte construída artificialmente pela máquina de propaganda nazista, que bombardeou imagens de fãs extasiados em comícios.

O autor não exonera os alemães, dizendo que grande parte da população apoiou Hitler enquanto outros foram oportunistas em segui-lo, mas argumenta que havia uma tensão social e um descontentamento, por exemplo dentro da Igreja.

"Não seria lógico pensar que um país profundamente dividido como a Alemanha de repente se uniu por trás de uma pessoa e compartilhava de uma única visão política", disse Longerich.

Setenta anos após sua morte, as atitudes dos alemães em relação a Hitler ainda estão evoluindo, disse Longerich.

"Eu não acho que há qualquer entusiasmo por Hitler, mas estamos vendo tabus sendo quebrados", afirmou ele, citando filmes recentes sobre o ditador e um debate sobre a publicação "Minha Luta".

Com um crescimento de temores sobre o radicalismo de direita na Alemanha, por conta da crise dos refugiados, ele alerta que com uma atmosfera política "mais dura", "o potencial de uma figura política singular é um fator que não deve ser subestimado".

(Por Madeline Chambers)
sábado, 7 de novembro de 2015 11:01 BRST

Fonte: Reuters Brasil
http://br.reuters.com/article/entertainmentNews/idBRKCN0SW0GH20151107
Hitler was shrewd, not so hypnotic, new German biography says (Reuters, EUA)

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Sai Ahmadinejad, entra Netanyahu. "Revisionistas" ganham um "apoiador" inusitado

Por negacionismo ou "revisionismo" se enquadra não só a negação do fato em si (todo ou parcial), como a distorção do episódio e trivialização. Então o Netanyahu se enquadraria fácil no rótulo negacionista ou "revisionista" (caso alguém queira pegar mais leve usando o termo "revisionista" em vez de negacionista, por não suportar a crítica à postura cretina dele) pelas asneiras que disse hoje, embora ele sempre diz asneiras.

A quem não entendeu o que se passou pelo título do post, leiam a matéria da RTP abaixo que foi feita em cima da matéria do Haaretz (jornal de Israel). O título do Haaretz é até mais pesado:
"Netanyahu: Hitler Didn't Want to Exterminate the Jews"

Traduzindo:

"Netanyahu: Hitler não queria exterminar os judeus"

Isso dito da boca do Primeiro-ministro de Israel, primeiro-ministro de um país que não preciso ressaltar a ligação com o genocídio da segunda guerra.

Esse é o tipo de asneira que você espera que saia de algum "revisionista" ou coisa parecida, não de um primeiro-ministro, principalmente do país mencionado. Mas saiu.

É uma cretinice por dia no mundo, em termos de notícia. No Brasil a bancada "religiosa" executa seu arsenal de idiotices ridicularizando o Congresso com coisas como essa (já podem trocar o nome da bancada pra "bancada do estupro"), projeto do "fundamentalista" presidente da Câmara, Eduardo Cunha, o do Porsche "em nome" do domínio Jesus.com, o mesmo pego com conta nos EUA na casa dos 61 milhões de reais, não foi a da Suíça.

Voltando ao assunto do post, as asneiras dele (Netanyahu) estão repercutindo pesado (mal) em Israel e entre os palestinos, houve uma rejeição total à cretinice dele naquela região do conflito.

Afirmar que Hitler foi incitado por um árabe pra executar a Solução Final e extermínio é como negar a origem do antissemitismo e genocídio da segunda guerra. Não foi uma declaração simplesmente idiota, ultrapassa a idiotice.

É impressionante o nível de ódio que ele nutre a palestinos ao ponto de chegar a fazer uma afirmação desse tipo, trivializar a culpa do maior algoz de judeus por ódio a palestinos. Esse cara não bate bem da cabeça.

Ele apresenta o mesmo tipo de mentalidade turva de gente que levou à morte o Rabin (assassinado por um fanático judeu de extrema-direita em Israel).

Incrível a neurose desse cidadão em citar genocídio da segunda guerra em todo evento envolvendo Israel. A Deborah Lipstadt (historiadora dos EUA) já havia criticado essa postura de políticos de Israel. Deborah Lipstadt é autora deste livro sobre o negacionismo, "Denying the Holocaust: The Growing Assault on Truth and Memory" (Link2), sem tradução pro português, mas que você pode ler a tradução do capítulo VI (feita pelo Leo) em três partes:
Negação [do Holocausto]: Uma ferramenta da Direita Radical (Parte 1)
Negação [do Holocausto]: Uma ferramenta da Direita Radical (Parte 2)
Negação [do Holocausto]: Uma ferramenta da Direita Radical (Parte 3)

A quem quiser ler a matéria (está em inglês, usem o tradutor do Google) sobre a declaração dela do abuso do uso do Holocausto por políticos israelenses (e dos EUA), segue abaixo o texto:
Top Holocaust Scholar Blasts 'Holocaust-abuse' by U.S., Israeli Politicians (Haaretz)

Matéria da RTP sobre as declarações de Netanyahu:
_____________________________________________________
Netanyahu inocenta Hitler e culpa um árabe pelo Holocausto


O primeiro-ministro israelita disse no Congresso Mundial Sionista ao afirmar que foi o Grande Mufti de Jerusalém o responsável pelo Holocausto, ao convencer Hitler a exterminar os judeus.

Ao discursar hoje, quarta feira, perante o Congresso Mundial Sionista, o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, relatou o que diz ter sido uma conversa entre Hitler e o Grande Mufti de Jerusalém, Haj Amin al-Husseini, numa reunião que mantiveram em Novembro de 1941.

Segundo o diário israelita Haaretz, no discurso de hoje Netanyahu reproduziu a conversa nestes termos: "Hitler na altura não queria exterminar os judeus e disse: 'Se os expulsarmos, eles virão todos para aqui [para a Palestina]'". Ainda segundo Netanyahu, Hitler pediu orientação ao Grande Mufti: "O que é que hei-de fazer com eles?". Ao que o Mufti terá replicado: "Queime-os".

Para Netanyahu, a decisão da cúpula nazi, no sentido de exterminar os judeus foi, assim, decisivamente influenciada pelas instruções que o Mufti deu a Hitler, a pedido deste.

Apesar do abalo sísmico que o discurso de Netanyahu está a causar nas redes sociais, o que ele contém não é inteiramente novo. Segundo recorda o Haaretz, o primeiro-ministro tem vindo de forma consistente a transmitir esta versão e já antes, num discurso pronunciado há três anos perante o Knesset (parlamento israelita), apresentara o Mufti de Jerusalém como "um dos principais arquitetos da Solução Final".

Na comunidade académica israelita, as palavras de Netanyahu estão, aliás, a ser tão ou mais criticadas do que noutros pontos do mundo. Segundo o diário britânico The Guardian, o mais conhecido investigador israelita vivo sobre o tema do Holocausto, Dan Michman, disse que, embora a reunião entre Hitler e Husseini tenha efectivamente sucedido, sucedeu num momento em que o Holocausto já estava em curso.

Dina Porat, do Instituto de Yad Vashem, afirmou, segundo citação do diário israelita Yeditoh Aaronot: "Não se pode dizer que o Mufti deu a Hitler a ideia de matar ou queimar os judeus. Não é verdade. A reunião deles teve lugar depois de uma série de fatos que apontam para isto [a decisão já tomada de exterminar os judeus]".

Meir Litvak, professor na Universidade de Tel Aviv, foi mais específico, explicando que a ideia nazi do extermínio dos judeus data já de 1939, quando se concebeu na cúpula do Terceiro Reich o plano de deportá-los para lá dos Montes Urais, após invasão e derrota da URSS, para que morressem de doença.

Ainda segundo Litvak, o plano alternativo, das câmaras de gás, surgiu quando a invasão da URSS fracassou e a guerra a Leste se mostrou impossível de ganhar com os métodos da Blitzkrieg. Como o objetivo do extermínio dos judeus se mantinha, a fantasia da deportação para lá dos Urais foi substituída pela realidade de Auschwitz e de outros campos de extermínio.

A isto acrescenta Litvak: "Husseini apoiou o extermínio do judeus, ele tentou impedir que fossem salvos judeus, ele era uma pessoa abominável. Mas isto não diminui a escala da culpa de Hitler".

A OLP (Organização de Libertação da Palestina) comentou o discurso no Twitter, dizendo "Netanyahu odeia de tal modo os palestinos, que está disposto a absolver Hitler pelo assassínio de seis milhões de judeus".

O líder da oposição israelita, Isaac Herzog, classificou o discurso de Netanyahu como "uma falsificação da História". E lembrou o histórico da sua família: "Ninguém precisa de ensinar-me como o mufti odiava Israel. Ele deu ordem para assassinar o meu avô, Rabbi Herzog, e apoiou Hitler ativamente. Mas só houve um Hitler. Hitler não precisava de Husseini para ordenar o extermínio dos judeus só por serem judeus".

Mesmo o ministro da Defesa Moshe Ya'alon, considerado um dos "falcões" do Governo de Netanyahu, achou necessário demarcar-se das afirmações do primeiro-ministro: "Claro que Haj Amin al-Husseini não inventou a 'Solução Final para a questão judaica'. A História mostra claramente que foi Hitler a iniciá-la. Haj Amin al-Husseini juntou-se a ele". Ya'alon acrescentou, contudo, que "os atuais movimentos jihadistas estão a encorajar o antissemitismo e apoiam-se na conhecida herança nazi".

Fonte: RTP (Portugal)
http://www.rtp.pt/noticias/mundo/netanyahu-inocenta-hitler-e-culpa-um-arabe-pelo-holocausto_n867583

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Como converteram Hitler numa celebridade com a ajuda do New York Times (e imprensa dos EUA)

Muito se falou do poder de propaganda nazi e muito pouco de seu maior êxito: converter um homem feio, rancoroso, homicida e baixinho num carismático sedutor de massas.
Marta Peirano

Adolf Hitler nos abre as portas de sua casa nos Alpes
Capa do livro
"Hitler at Home"
Quem nos conta é Despina Stratigakos, historiadora da Universidade de Buffalo, em seu recente livro Hitler at Home, (Yale University Press), a devastadora história como converteram um sociopata gafotas de pelo raro e ambições artísticas num irresistível homem de Estado que deslumbrou metade das belas irmãs Mitford e a uma geração de Miss Brodires, antes de desencadear o capítulo mais negro de nossa história moderna.

"Os anos 30 marcam o princípio da cultura das celebridades (celebrities), quando chega o cinema com som, o rádio e as revistas aspiracionais" (de "Novos Ricos"), explica a acadêmica. E o gabinete de propaganda nazi aproveitou a oportunidade para transformá-lo no que não era, um homem interessante e refinado com uma grande categoria moral e gosto pela arquitetura. "Conseguiram isto enfatizando sua vida privada, mostrando-lhe como um homem que brinca com seus cachorros e o qual as crianças gostam, fazendo coisas domésticas em entorno desenhados para evocar uma sensação de calidez. Em fins dos anos 30, a mídia de todo o mundo descrevia-o como um indivíduo delicado e carinhoso, com bom gosto para a decoração de interiores".

Adolf Hitler nos abre as portas de sua casa

"Depois de ler aquelas histórias - continua Stratigakos - a gente começou a pensar que conhecia o 'verdadeiro' Hitler, o homem por trás da máscara do Führer, e que esta pessoa pudesse não ser tão diabólica como as notícias que vinham da Europa pareciam sugerir".

Em 20 de agosto de 1939, o New York Times sacava um fotogênico reportagem em seu bonito chalé de madeira nos Alpes Bávaros próximo à Berchtesgaden que foi comprado em 1927 com fundos do partido e que o chamavam de Haus Wachenfeld. Hitler, seu próprio arquiteto, dizia o titular. As fotos lhe mostram desfrutando de momentos de intimidade, lendo o jornal numa mesa adornada com flores, 12 dias antes de invadir a Polônia.

A casa, "adornada com harmonia, segundo a melhor tradição alemã" e carregada com cortinas limpas e almofadas feitas à mão para "criar uma atmosfera de silenciosa alegria", havia sido decorada por seua desenhadora favorita, Gerdy Troosts, que lhe foi fiel até o último minuto. Literalmente: poucas semanas antes de Adolf Hitler descer ao bunker pela última vez, Troost lhe propôs refrescar o Grand Hall da chancelaria com uma capa de pintura para animar o ambiente, "um trabalho pequeno que só duraria um par de dias".

O seguimento do Times das andanças do nervoso austríaco começou uma década antes. Nos anos do auge e do estabelecimento do regime nazi, o jornal publicou notas frequentes sobre o líder nazi, incluindo entrevistas para seu barbeiro ("escreveu ao Führer sobre sua mecha rebelde e se tomaram medidas"), comparações com Jesus Cristo (ou simplesmente "um enviado divino") e outras estampas como sua assistência ao funeral da irmã de Nietszche (cujas obras completas ele presenteou a seu amigo, o Duce, por seus 60 anos), ou suas declarações contra a violência contra os judeus.

Hitler, o anfitrião encantador

Não foram os únicos nem tampouco os primeiros. O número de novembro de 1938 da edição britânica de Casa & Jardim coincidiu com a Noite dos Cristais Rotos, quando a SA queimou mil sinagogas, destruíram mais de 7.000 negócios judeus e mataram a uma centena de pessoas, além de prender outras 30.000 e as mandar para Buchenwald, Dachau e Sachsenhausen. A revista, contudo, oferecia um passeio pela casa Wachenfeld, assinado por um tal de William George Fitzgerald, pseudônimo de Ignatius Phayre. Isto é o que diz de seu cômodo mas modesto retiro:

"Originalmente uma cabana de caça, "Haus Wachenfeld" cresceu até se converter no atrativo chalé bávaro que é hoje, a 2.000 pés no Obersalzburg, rodeado de bosques de pinheiros e árvores frutíferas.

O lugar tem a melhor vista de toda a Europa. Isto é dizer, eu sei. Mas nesses Alpes bávaros há uma classe especial de suave folhagem, com cascatas de branco da neve e cumes cobertos do bosque. O efeito da luz e do ar na casa se vê intensificado pelo canto e o trino dos canários Harzer que há na maioria das habitações, pendurados em jaulas douradas.

E não vão pensar que seus convidados de fim de semana são todos, ou a maioria, de altos cargos do Estado. Para Hitler, agrada-lhe a companhia de brilhantes estrangeiros, especialmente pintores, cantores e músicos. Como anfitrião, é um divertido contador de histórias.

Um chefe bávaro, Herr Dannenberg, prepara um impressionante banquete de pratos vegetarianos, salgados e saborosos, tão agradáveis à vista como o são ao paladar, tudo de acordo com o padrão alimentício que Hitler exige. Mas na casa Wachenfeld também há uma generosa mesa para convidados de outros gostos. Aqui os 'bons viveurs' como o marechal de campo Goering e Joachim von Ribbentrop se reúnem para cear.

Menos de um ano depois, a Alemanha invadiu a Polônia. Inglaterra e França lhe declararam a guerra.

Digitalização da matéria original:



Fonte: El Diario (Espanha)
http://www.eldiario.es/cultura/historia/Hitler-asesor-imagen-genio_0_426257675.html
Título original: Cómo convirtieron a Hitler en una celebrity con ayuda del New York Times
Tradução: Roberto Lucena

quinta-feira, 30 de julho de 2015

Futebol e Fascismo: os mundiais de Mussolini e Hitler

Seus olhares se cruzavam no plasma em câmara lenta, num plano eterno digno de um Western de Sergio Leone. Casillas frente a Buffon. Sós ante o perigo, com um muro de silêncio entre eles inquebrantável ao gritaria das arquibancadas. Nas casas, o respeitável se benzia e pensava, "outra vez nas quartas não, por deus. Outra vez não" e segurava a respiração a cada lançamento.

Árbitros fazendo a saudação fascista no Mundial de 1934
Aquelas paradas de Santo, de De Rossi e Di Natale, e aquele último penal de Cesc, acabaram por desmontar um velho mito: o da maldição das quartas, que nos condenava, verão após verão, ao frango da derrota e à depressão nacional. Desde então, e até pouco tempo, só vitória.

O velho tópico de que a história são ciclos, o mesmo que se atrevem a dizer os entendidos em economia, cumpre-se neste caso. Igual a maldição que se rompia num Espanha-Itália, este havia tido uma partida similar, só que em 1934 e em circunstâncias políticas muito diferentes.

Dizem que Benito Mussolini só havia assistido a uma partida de futebol em toda sua vida, mas isto não lhe impediu de se aperceber das possibilidades políticas e propagandísticas que o jogo da bola podia lhe proporcionar. O fascismo, desde suas origens, exaltava dentro de seus valores supremos a juventude (o hino fascista italiano, Giovenezza, era todo um exemplo disto), a ação, a força e a mesma violência. Não é de estranhar, portanto, que todos os regimes fascistas potenciaram a prática desportiva como forma de educar os jovens com visando um cumprimento melhor dos deveres para com a pátria, e como fórmula para forjar o caráter e a disciplina que, supunha-se, devia ter um "bom" fascista.

Logo o esporte, que começava a se converter num entretenimento de massas, obteve para os fascistas uma nova dimensão: igual ao cinema e outros espetáculos da moda, podia ser usado como suporte propagandístico. O doutrinamento era fundamental num regime totalitário e eles sabiam perfeitamente como chegar ao povo. Bem conhecido é o caso das Olimpíadas de Berlim, em 1936, que Hitler desenhou como a apoteose da "modernidade" hitlerista, ainda que um afro-americano, Jesse Owens, acabasse por lhe roubar o protagonismo ao se alçar pela primeira vez na história com quatro medalhas de ouro no atletismo. Mais desconhecido para o público é o uso que o fascismo italiano e o nazismo tentaram fazer do futebol: durante este artigo tentaremos recolher vários exemplos do ocorrido em torno dos encontros dos mundiais de 1934 e 1938.

A batalha futebolística do "fáscio"

Mussolini se empenhou em celebrar na Itália o segundo mundial da história, depois de não conseguir para seu país o que fora celebrado no Uruguai em 1930 e que acabaria com a vitória da própria anfitriã. Para ele, não duvidou em pressionar a Suécia, a outra candidata a albergar a competição, que acabou por ceder às pressões do gabinete do Duce: uma vez conseguida a celebração do acontecimento em terras transalpinas, só restava assegurar o sucesso da azzurra. Mussolini se dirigia a Giorgio Vaccaro, presidente da Federação Italiana de Futebol e membro do Comitê Olímpico Italiano, da seguinte maneira:

—Não sei como fará, mas a Itália deve ganhar este campeonato.

—Faremos todo o possível...

—Não me compreendeu bem, general... a Itália deve ganhar este Mundial. É uma ordem.


A vitória italiana de 1934 começaria a ser gestada desde o mesmo mundial de 1930. Depois da vitória uruguaia, diversos emissários italianos convenceriam ao argentino Luis Monti para que se filiasse pela Juventus de Turim, depois de lhe oferecer 5.000 dólares mensais de soldo, uma casa e um carro. Toda uma fortuna que o argentino não pode rechaçar. A intenção da filiação era de poder nacionalizá-lo alguns anos depois, como fariam com outros futebolistas antes do mundial. Com Monti, somariam-se seus compatriotas Atilio Demaría, Enrique Guaita e Raimundo Orsi, assim como o brasileiro Guarisi, que reforçariam a seleção azzurra. Ante as críticas recebidas por "filiar" estrangeiros, nacionalizados convenientemente pelo governo fascista, o selecionador, Vittorio Pozzo, sentenciou: "Se podem morrer pela Itália, podem jogar pela Itália".

O treinador italiano Vittorio Pozzo observa uma partida. Foto: FIFA.com
Pela primeira vez a competição se desenvolveria com um formato de eliminatórias em partida única, com prorrogação de 30 minutos e repetição do encontro em caso de continuar o empate depois da prorrogação. No mundial da Itália se reuniram 16 equipes, depois de uma fase prévia de classificação desenvolvida em diferentes regiões. Inglaterra, como já ocorrera durante o mundial do Uruguai, negou-se a participar por não ter concedido a organização do campeonato.

A Itália chegou com cartazes anunciando o campeonato, no que se representavam jovens atletas saudando com o braço alto. As partidas se iniciavam ao grito de "Itália, Duce", depois do qual, e depois de fazer a saudação fascista desde o centro do campo, os azzurri saíam disparados pela vitória. Desde o palco, Mussolini, acompanhado por hierarcas do regime e cercado por milhares de camisas negras, a milícia do partido fascista, seguia com interesse as evoluções do combinado nacional. Não podiam falar. O que para eles constituía uma pressão atroz, convertia-se em medo para seus adversários. A grande vitória fascista estava em marcha.

Na partida de estreia das quartas de final as seleções da Espanha e Itália se enfrentavam no estádio Giuseppe Berta de Florença, ante uns 43.000 espectadores desejosos de ver uma vitória italiana no encontro que acabaria por se parecer mais a uma batalha que a uma partida de futebol. Até sete espanhóis caíram lesionados numa eliminatória na qual consigna dos italianos, que levaram o jogo além dos limites do regulamento, respondia ao lema fascista: "Vencer ou morrer".

A Espanha, superior em técnica e classe à Azzurra, chegava à investida liderada pelo melhor porteiro da história até o momento, Ricardo Zamora, "o Divino" e pelo goleador Lángara, no ataque. A esquadra espanhola acabava de vencer o Brasil com um resultado de três gols a um. Durante esta partida, Zamora se converteria no primeiro goleiro a pegar uma penalidade máxima na história dos mundiais, depois de pegar um pênalti da estrela carioca, Leônidas.

Foto da seleção espanhola em 1934 com Zamora segurando a bola
"Foi um encontro espetacular, dramático e jogado com uma intensidade muitas poucas vezes vista", assim resumiria Jules Rimet, o francês inventor do negócio dos mundiais, uma partida que passaria para a história do cálcio como "A batalha de Florença".

Passou à frente do placar a Espanha com um tento de Regueiro, no minuto 31, mas ao filo do descanso os italianos conseguiram empatar com uma jogada digna do pior pátio de recreio: Ferrari arremataria ao fundo das redes um chute, não muito perigoso, enquanto Schiavio agarrava Zamora para que não pudesse bloquear o esférico. O colegiado Louis Baert, de origem belga, não quis ver a clara violação do regulamento.

A segunda parte começaria com todo um massacre nas fileiras espanholas, provocado pela violência inusitada da esquadra italiana: Zamora, Ciriaco, Lafuente, Iraragorri, Gorostiza e Lángara acabariam o encontro, depois da pertinente prorrogação, com diferentes lesões que lhes impediria de jogar a partida de desempate do dia seguinte. A pior parte ocorreria com a estrela espanhola, Ricardo Zamora, que sairia da cidade italiana com duas costelas rotas depois de uma trombada com um jogador italiano, que nem sequer fora marcada como falta pelo árbitro belga.

Imagem do gol italiano
Durante a partida de desempate os italianos seguiram a mesma estratégia: a violência como forma de parar o jogo espanhol. Desta vez foram Bosh, Chacho, Regueiro e Quincoces os lesionados ante a passividade arbitral. A injustiça chegou a seu ponto máximo quando o árbitro, desta vez o suíço René Mercet, anulou gols legais de Regueiro e Quincoces, por inexistentes fueras de jogo, enquanto validava em definitivo o tento do mítico Giuseppe Meazza, o mesmo que hoje dá nome ao estádio do Milan, apesar de que o italiano Demaría estava obstaculizando a Nogués, porteiro que substituía o lesionado Zamora.

A atuação arbitral foi tão comentada que Mercet, quando regressou a seu país, foi expulso por toda a vida da arbitragem, tanto pela FIFA como pela federação de seu país.

Em semifinais a arbitragem voltou a ser igualmente "discutida". Os italianos conseguiram com a vitória frente ao "Wunderteam" austríaco. O time maravilha, como era conhecida a excelente seleção liderada por Matthias Sindelar, nada pode fazer frente ao gol impedido que o juiz deu como válido.

A equipe austríaca, que havia extasiado meia Europa com seu jogo, voltava a seu país sem saber que Hitler se cruzaria em breve por seu caminho, rompendo a trajetória desportiva daquela legendária seleção. Mas isso contaremos mais adiante.

Em dez de junho de 1934 se celebrava em Roma a grande final do campeonato, enfrentando-se as seleções da Itália e Checoslováquia, outra seleção das que, em teoria, tinham certa superioridade sobre os transalpinos. Para a final se designou o mesmo árbitro que havia apitado as semifinais frente a Áustria, o sueco Ivan Eklind.

A seleção checoslovaca se apresentava no campeonato com uma esquadra cheia de talento, com futebolistas de grande estatura em suas fileiras como Nejedly, Planicka, "o Zamora do Leste" ou Svoboda. A Itália de Vittorio Pozzo, o inventor do sistema do catenaccio, dispôs de um sistema de jogo com posição piramidal, um 5-3-2 que os italianos denominaram "O Método".

Logo os checos mostrarem sua vontade de não ser simples convidados para a festa latina, o que fez com que se instalasse o nervosismo no palco quando, ao chegar o descanso, o marcador mostrava um empate zerado. Diz a lenda que, quando Pozzo arengava com seus pupilos no vestiário, apresentou-se um enviado do Duce com a seguinte mensagem: "Senhor Pozzo, você é o único responsável do sucesso, mas que Deus o ajude se chega a fracassar". Como contestação, 'Il vecchio maestro' se dirigiu aos jogadores com estas palavras: "Não me importa como, mas hoje devem ganhar ou destruir o adversário. Se perdemos, todos ficaremos muito mal".

No minuto 70 os checos abriram o marcador graças a um grande tento de Vladimir Puc. Três minutos depois, Svoboda acertaria a bola no travessão que pode mudar o curso da história mas Pozzo, velho zorro, fez algumas mudanças táticas que modificariam o destino do encontro. A nove minutos do final, Orsi, com um forte chute, empatou. Durante a prorrogação, Shiavio, com passe de Guaita, bateria o goleiro checoslovaco, Planicka, dando o triunfo à Itália.

A grande vitória fascista fora alcançada. Mussolini organizaria uma cerimônia para comemorar a gesta no dia seguinte, ao que os jogadores acudiram com o uniforme da partida. O Duce já tinha a vitória que aguardava com ânsia desde 1930, a vitória que permitiria exaltar, ainda mais, ante o mundo, e ante os próprios italianos sobretudo, o caráter heroico e guerreiro da "raça latina".

Depois a gesta, as benesses que o fascismo havia prometido aos jogadores se converterem, em alguns casos, em fel. Luis Monti relataria, muitos anos depois, como tudo mudou depois do mundial. Especialmente relevante foi o caso de Guaita, um dos estrangeiros filiados e nacionalizados pelo governo de Mussolini que, depois dos mimos e do sucesso, acabou sendo exilado.

Enrique Guaita jogava no Roma, mas o time favorito do fascismo era outro. A cidade de Roma se divide, ainda hoje, entre os seguidores do Roma, majoritariamente de esquerdas e do Lázio, de direitas, pelo que era lógico que a equipe escolhida pelos fascistas para encarnar seus valores fosse este último.

Vê-se que alguma mente privilegiada do fascismo, lê-se a ironia, teve uma grande ideia para desativar o Roma e que a Lazio tivesse mais fácil o caminho no campeonato. O plano era simples: mandar boa parte da equipe romana para o front, concretamente para a Abissínia, uma louca aventura imperialista com a qual o Duce pretendia reverdecer os louros do Império Romano mas que, ao contrário do que eles supunham, não estava resultando num caminho de rosas. A reação de Guiata, que queria conservar sua vida acima de tudo, foi a de fugir para a França junto com outros companheiros. Posteriormente, continuou sua carreira futebolística em seu país de origem, a Argentina.

O homem de papel que desafiou o Führer

Em 1938, o mundial seria celebrado na França, graças ao empurrão do mesmíssimo Jules Rimet. A situação política evidenciava um caminho inevitável para uma nova conflagração mundial, que em boa parte parte estava ocorrendo na Espanha seu mais imediato precedente. Por esse motivo, a seleção espanhola não pode participar do campeonato, que se viu salpicado em cada partida pelas rivalidades políticas.

Outro país que dispunha, igual com a Espanha, de um grande seleção e que não pode participar do mundial por questões políticas foi a Áustria, que havia renunciado participar estando classificada. A história do "Wunderteam" correria tragicamente paralela a de sua pequena nação.

Em 12 de março de 1938, a Alemanha de Hitler anexaria a Áustria, convertendo-a pela força em mais uma província alemã. Aquela mostra imperialista, que passaria para a história com o nome de "Anschluss", significava também a desaparição da equipe austríaca, igualmente que já havia ocorrido com todos os símbolos da independência desse país.

Matthias Sindelar durante um lance de jogo
A anexação supôs o princípio do fim da maior estrela da história do futebol austríaco, Matthias Sindelar, conhecido como "O homem de papel", pela delicadeza de seus movimentos no terreno de jogo. Sindelar gozava de uma grande fama, dentro e fora de seu país, e era o líder, tanto de sua seleção como do Áustria de Viena. Mas os nazis cruzaram seu caminho.

Restavam apenas uns poucos meses para a celebração do Mundial de 1938, quando o governo alemão pensou que, uma vez que a Áustria formava já parte da Alemanha, os melhores jogadores desse país poderiam reforçar a esquadra teutônica. O "Wunderteam", que só havia perdido quatro das últimas 50 partidas jogadas, tinha suas horas contadas. Até oito jogadores da equipe passariam a defender a camisa alemã, mas antes disso os nazis idealizaram uma parte de despedida que, por sua vez, devia se converter na grande festa da raça ariana. Evidentemente, contava com a vitória alemã.

Contudo, os de Sindelar, que em princípio jogaram aterrorizados pelo medo, decidiram não perder o único que lhes restava: o orgulho. "O homem de papel" começou a fazer das suas. Os austríacos acabariam ridicularizando com seu jogo os alemães e a partida acabariam num dois a zero para o "Wunderteam".

O momento máximo do encontro chegaria depois de um dos gols da partida, marcado pelo próprio Mathias Sindelar. Depois do tento, correria para celebrá-lo frente ao palco das autoridades, repleto de mandachuvas do partido nazi e presidido pelo próprio Führer, realizando uma dança/malabarismo que, naqueles tempos, à parte de ser algo totalmente inusual, foi tomado como uma tremenda falta de respeito e todo um desafio ao poder nazi. O atacante ficaria sentenciado por toda a vida.

Depois da partida, Sindelar se negaria a formar parte da seleção nazi no Mundial da França, para isto aludiria falsas lesões e, inclusive, chegaria a anunciar sua retirada do esporte. Desde então se converteria num indesejável para o nazismo, que não lhe permitiria nem jogar o futebol em seu país nem, muito menos, cruzar as fronteiras para competir fora.

Em 22 de janeiro de 1939 os bombeiros de Viena encontrariam seu corpo em sua casa, junto com o de sua parceira. Haviam aberto o condutor de gás para liquidar suas vidas. Ninguém sabe o que se passou ao certo, pois o caso acabou oculto. Muitos apontam a Gestapo, outros a depressão que lhe causou em não poder voltar a jogar futebol. o caso é que o totalitarismo encerrou a carreira a um dos melhores futebolistas de sua época.

Vencer ou morrer em camisa negra

Mas apesar de reforçar a seleção com os melhores jogadores da Áustria, a equipe alemã, que tantas esperanças havia dado a Hitler, não pode suceder na glória futebolística à outra potência fascista, a Itália, que seguiria reinando até depois da Segunda Guerra Mundial.

O Mundial de 1938 poderia ter sido uma oportunidade de confraternização na Europa do pré-guerra, mas foi só uma mostra a mais do frio e temível ambiente que se vivia nos países europeus durante aquele tempo: todo mundo sabia que, mais cedo ou mais tarde, a guerra acabaria por ser, outra vez, uma terrível realidade.

Assim, Mussolini, disposto a voltar a utilizar o futebol para sua política propagandística, decidiu comandar sua seleção pessoalmente. Para isto, organizou um ato no Palazzo de Venezia, no que os jogadores acudiram com o uniforme fascista, e que culminou com a vitória com um discurso ante o multidão desde a sacada.

Durante a partida de oitavas de final, contra a Noruega, os italianos realizaram a saudação fascista, também conhecida como romano, antes de começar o encontro, desatando a ira do público francês e ganhando sua animosidade para o resto do campeonato. Mas a grande contenda política teve lugar poucos dias depois, no encontro de quartas de final entre os italianos e os anfitriões do torneio, os franceses.

Mussolini não havia deixado nada ao azar assim que, para o dia no qual tinham que enfrentar seus odiados adversários, os italianos apareceriam com uns uniformes negros, em homenagem aos "camisas negras", a força paramilitar do partido fascista. O desafio, ante 61.000 espectadores franceses, e algum ou outro exilado italiano, foi total. Enfrentavam-se duas formas de ver o mundo, a fascista italiana e a República democrática francesa, num clima asfixiante que não tardaria em explodir. Quando os italianos chegaram ao centro do campo realizaram a saudação fascista, obtendo como resposta uma sonora vaia que não cessaria durante toda a partida. Apesar da pressão do público, a Itália voltaria a conseguir a vitória com um resultado de três a um.

A seleção italiana, de negro, saúda de braço erguido
Depois de vencer os brasileiros em uma das semifinais, enfrentariam na grande final a Hungria, a qual venceriam por quatro a dois, com gols duplos de Piola e Colaussi, no estádio de Colombes de Paris. Os italianos voltariam a jogar a partida com as camisas negras, símbolo de guerra do fáscio. Antes da partida, Vittorio Pozzo recebeu um telegrama pessoal por parte do Duce que rezava assim: "Vincere o morir", vencer ou morrer.

Depois de duas vitórias consecutivas na Copa do Mundo da FIFA, a Itália de Pozzo entraria para a história do futebol como uma das melhores seleções nacionais de todos os tempos. A Segunda Guerra Mundial acabaria com o reinado desta equipe, e com os mundiais durante 12 anos privando a uma grande geração de futebolistas a seguir desfrutando o que mais amavam, o futebol, e iniciando uma nova etapa na história deste esporte que, também veria como outros regimes de diversas índoles tratariam de usar a bola para seus interesses políticos. E assim, até o dia de hoje...

A seleção italiana celebra o Mundial sobre o terreno do jogo. Foto: FIFA.com
Publicado por Cristóbal Villalobos

Fonte: Jotdown site (Espanha)
http://www.jotdown.es/2013/08/futbol-y-fascismo-los-mundiales-de-mussolini-y-hitler/
Título original: Fútbol y fascismo: los mundiales de Mussolini y Hitler
Tradução: Roberto Lucena

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