Figura histórica da Polônia agora também é a sua voz diplomática
Ele não parece um sobrevivente de Auschwitz ou ou combatente no levante de Varsóvia.
Wladyslaw Bartoszewski, ex-chanceler e hoje consultor do premiê, é isso e ainda mais.
NICOLAS KULISH
Do New York Times, em Gdansk
Uma presença inteligente e espirituosa, o cavalheiro alto e mais velho usando bengala não parece logo de cara um sobrevivente de Auschwitz, ou combatente no levante de Varsóvia, ou dissidente prisioneiro sob o comunismo.
Na verdade, Wladyslaw Bartoszewski é tudo isso e ainda mais. Ele ainda é o tipo de homem que, mesmo num dia atarefado, pára para conversar com as empregadas do hotel e certifica-se de fazê-las rir antes de retomar seu rumo.
*Wladyslaw Bartoszewski em Berlim em 19 de junho de 2008 (Foto: The New York Times)
O mundo não tem muitas probabilidades de produzir mais Wladyslaw Bartoszewski, e isso é provavelmente uma coisa boa, dados os eventos que ele atravessou e testemunhou desde muito novo. Mas enquanto sua vida parece ter sido forjada sob intenso sofrimento, isso nunca chegou a definir sua visão de mundo.
“Os otimistas e pessimistas têm vidas igualmente longas, mas os otimistas são consideravelmente mais felizes”, diz ele quando questionado sobre seu famoso bom humor.
Bartoszewski, 86, sustenta uma história pesadíssima com um toque de leveza. É um presente que permitiu a ele, numa idade em que sua geração já se aposentou ou morreu há tempos, ser um diplomata de sucesso pela Polônia, assim como uma fonte de autoridade moral.
“Não sei por quanto tempo mais viverei”, diz ele, bastante sincero numa entrevista. “Ninguém sabe. Posso dizer que meu plano é ajudar o governo pelo tanto que eu possa dizer que é necessário. Minha idéia é morrer em serviço, e não pela esclerose.”
Ele foi por duas vezes o ministro do Exterior de seu país e está trabalhando de novo como consultor do premiê, Donald Tusk.
Sua responsabilidade especial é por duas das mais complicadas relações de seu país, com a Alemanha e com Israel. Ele foi elogiado pelos dois países repetidamente por seu trabalho para melhorar os laços.
Mesmo assim ele permanece elegante e acessível em um grau impressionante. Ele usa sua história pessoal não como um bastão, mas como uma oportunidade para demonstrar seu carisma e compreensão.
“Estou mais ao lado das pessoas no meio do que dos extremistas,” diz ele. “A humanidade sofreu enormemente devido a ideologias extremistas, na Europa e por todo o mundo.”
E ele fez essa observação do alto de sua – infeliz - experiência. Nascido em Varsóvia em 1922, ele tinha apenas 17 anos quando participou na fracassada defesa de sua cidade natal quando os nazistas conquistaram a Polônia em 1939. Um ano depois, Bartoszewski estava entre muitos jovens católicos cercados e enviados a Auschwitz, e entre os poucos sortudos o suficiente para sobreviverem.
Libertado em 1941, foi trabalhar com a resistência. Ajudou a fundar a clandestina Zegota, ou Conselho de Apoio a Judeus, que oferecia dinheiro, esconderijos e identidades falsas para judeus poloneses tentando fugir do Holocausto. Tal assistência era punível com a morte sob a ocupação nazista. Em 1965, Bartoszewski foi nomeado um dos Justos Entre as Nações pelo Yad Vashem, o museu e memorial oficial de Israel sobre o Holocausto.
Depois da Guerra, a Polônia caiu na esfera soviética. Bartoszewski foi recompensado por seu trabalho para libertar seu país e impedir que outros cidadãos judeus fossem jogados novamente em prisões.
“Com 32 anos, eu havia passado oito em prisões e campos,” diz Bartoszewski.
Depois de sua libertação em 1954 – e no próximo ano reabilitado pelo regime – ele se tornou um jornalista de um jornal católico em Cracóvia, e posteriormente um professor na Universidade Católica e Lublin.
Ele novamente se viu envolvido em um movimento subversivo, desta vez uma rede de ensino chamada Universidade Voadora operando fora do sistema educacional sancionado oficialmente.
Quando o último líder comunista da Polônia, o Ggneral Wojciech Jaruzelski, declarou lei marcial em dezembro de 1981 como parte de um esforço para suprimir o movimento Solidariedade, Bartoszewski foi mais uma vez para a prisão, até sua soltura em abril seguinte.
Na época das eleições em 1989, que foram apenas parcialmente livres mas mesmo assim vistas como uma vitória do Solidariedade, Bartoszewski tinha 67, já passado da idade de se aposentar. Mas ele estava apenas começando, embarcando em sua nova carreira como diplomata — primeiro como embaixador na Áustria e depois como o ministro do exterior sob dois diferentes governos poloneses, em 1995 e novamente de 2000 a 2001.
Ele havia conseguido uma aposentadoria bem movimentada, escrevendo livros e participando de comissões, como o Conselho Internacional de Auschwitz, do qual é presidente. Mas o governo nacionalista do premiê Jaroslaw Kaczynski, e de seu irmão gêmeo, o atual presidente, Lech Kaczynski, o trouxe de volta à briga.
Ele se tornou um violento crítico e expressou-se contra eles antes das eleições em outubro passado. Mais tarde, o novo primeiro ministro ofereceu tornar Bartoszewski ministro do exterior novamente. Ele recusou em favor de seu ex-representante, Radek Sikorski, mas concordou em assumir um papel especial de consultoria.
“Decidi voltar apesar de minha idade por estar convencido de que algo poderia ser feito”, diz ele.
Fale com especialistas e observadores nas relações Polônia-Alemanha, e seu nome é invariavelmente o primeiro a aparecer nas discussões sobre o degelo no relacionamento surgido desde que o novo governo assumiu o posto no ano passado.
“É uma política pessoal completamente nova”, diz Gesine Schwan, seu colega e coordenador de relações alemãs-polonesas pelo governo alemão, e agora candidato à presidência pelos social-democratas.
Bartoszewski não mostra sinais de desacelerar, dizendo que planeja publicar cinco livros nos próximos anos, um dos quais contendo 100 biografias curtas de pessoas famosas que ele conheceu. Ele diz que seus muitos projetos o motivam a continuar trabalhando enquanto pode.
“O que mais alguém poderia pedir?” diz ele, antes de pegar sua bengala e se dirigir a uma reunião com o embaixador polonês na Alemanha e, depois nesta mesma tarde, com o chanceler da Alemanha, a própria Angela Merkel.
Fonte: New York Times/G1
http://g1.globo.com/Noticias/Mundo/0,,MUL634368-5602,00-FIGURA+HISTORICA+DA+POLONIA+AGORA+TAMBEM+E+A+SUA+VOZ+DIPLOMATICA.html
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