Especiais: História de sobreviventes
30/10/2009
Por Alex Sander Alcântara
Arquivo Virtual sobre Holocausto e Antissemitismo, disponível na internet, reconstitui saga de judeus expulsos da Alemanha nazista e dos países colaboracionistas e reúne documentos que revelam a postura do Brasil diante do genocídio (Interior de Pobres II/Lasar Segall)
Agência FAPESP – Ao analisar documentos emitidos pelas missões diplomáticas sediadas no exterior entre 1933 e 1950 percebe-se a postura do governo brasileiro diante do antissemitismo e da perseguição aos judeus na Alemanha nazista e nos países colaboracionistas. Ofícios e relatórios secretos dão uma dimensão dos bastidores da política brasileira no período, como aponta pesquisa coordenada pela historiadora Maria Luiza Tucci Carneiro, professora do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP).
Milhares desses documentos estão disponíveis na internet desde 17 de outubro, no portal Arquivo Virtual sobre Holocausto e Antissemitismo (Arqshoah), projeto do Laboratório de Estudos de Etnicidade, Racismo e Discriminação (LEER) do Departamento de História da FFLCH.
Na base de dados, documentos oficiais podem ser cruzados com passaportes, fotografias, passagens e relatos de sobreviventes, permitindo reconstituir o cotidiano de algumas cidades europeias, como Berlim, Viena e Varsóvia, em um momento em que os judeus eram expulsos, presos ou exterminados. Todo esse acervo documental pode ser consultado livremente por pesquisadores, professores e pelo público em geral.
O projeto, intitulado “Arquivo virtual sobre Holocausto e antissemitismo: o Brasil diante do Holocausto e dos judeus refugiados do nazifascismo em 1933-1945”, tem apoio da FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular. Tucci Carneiro também coordena o Projeto Temático “Arquivos da repressão e da resistência. História e memória. Mapeamento e análise da documentação do Deops/SP e Deip/SP”, apoiado pela Fundação.
De acordo com a coordenadora, cerca de 10 mil cópias dos documentos originais foram reunidas durante sua pesquisa de doutorado sobre o antissemitismo na Era Vargas (1930 a 1945), concluída em 1987 e publicada pela Editora Perspectiva. A coleta dessa documentação teve continuidade na investigação para sua tese de livre-docência, defendida em 2001 – “Cidadão do mundo – O Brasil diante da questão dos judeus refugiados do nazifascismo (1933-1950)”.
“Grande parte são documentos secretos confidenciais produzidos durante a época de Getúlio Vargas e o período do pós-guerra. Tendo em vista o volume e a riqueza dessas fontes, muitas das quais ainda inéditas, resolvi disponibilizá-las da melhor forma possível por meio de um arquivo virtual. Dessa forma, novos projetos de pesquisa podem ser elaborados ,contribuindo para a construção de novos conhecimentos sobre a história do Holocausto e do Brasil contemporâneo”, disse à Agência FAPESP.
Foram necessários dois anos para selecionar, classificar e digitalizar uma parte significativa do acervo da historiadora, que, somente sobre esse tema, reúne 10 mil documentos que estão sendo identificados pela equipe técnica.
“A maioria dos documentos foi reproduzida do Arquivo Histórico do Itamaraty, que nos autorizou a publicar na internet. Importante ressaltar que esses documentos estão disponíveis para consulta pública no Rio de Janeiro desde 1995. Devemos levar mais dois anos para digitalizar o restante, sem contar com novos documentos cedidos por sobreviventes e de outras bases, como o Arquivo Nacional do Rio de Janeiro”, explicou.
Os documentos fornecidos pelo Itamaraty revelam, segundo Tucci Carneiro, as “decisões diplomáticas articuladas nos bastidores, a postura do governo brasileiro diante do genocídio praticado pela Alemanha nazista e os desdobramentos políticos na Europa durante a Segunda Guerra Mundial”.
“O governo brasileiro se tornou, indiretamente, colaboracionista. Fechou as portas, negando vistos de entrada aos judeus que procuravam fugir da Alemanha e dos países invadidos por Adolf Hitler”, apontou. Apesar de a política emigratória no país estar identificada com a postura intolerante da Alemanha, a posição pública do governo brasileiro era ambígua em relação ao Holocausto e à Segunda Guerra Mundial, disse a cientista.
“O governo se posicionava como solidário à política de salvamento aos judeus refugiados articulada pelos países líderes na Liga das Nações, dentre os quais estavam os Estados Unidos e a Grã-Bretanha. Em vários momentos, o Brasil comprometeu-se a fornecer, por mês, 3 mil vistos de entrada para esses refugiados, mas, na prática, o que se via era o oposto”, disse.
Segundo ela, essa postura foi mais sistemática de 1937 a 1945, endossada primeiro pelo Itamaraty e, depois, pelo Ministério da Justiça. “É como uma orquestra em que se somam ações intolerantes por parte de vários ministérios, que apregoavam o cumprimento das regras impostas por circulares secretas. Circulares que obstruíam o salvamento de milhares de judeus, centenas de ciganos e dissidentes políticos do nacional-socialismo. Essa é uma dívida que o Brasil tem para com o povo judeu e outras minorias tratadas como ‘raças indesejáveis’”, afirmou.
Esse é o conteúdo de grande parte dos documentos disponíveis no site, como, por exemplo, ofícios e circulares secretas antissemitas classificados na época como secretos pelo Ministério das Relações Exteriores e pelo Ministério da Justiça e Negócios Interiores. Nesses registros – muitos dos quais são assinados por importante ministros, como Oswaldo Aranha, Gustavo Capanema, Francisco Campos e Raul Fernandes, e por diplomatas brasileiros em missão na Europa – fica evidente a recomendação de dificultar a entrada de judeus no país.
De acordo com a historiadora, ajudar judeus era visto como “um ato contra a nação”. Mas, durante a guerra, alguns raros nomes se sobressaíram como sinônimo de indignação e coragem.
“Foi o caso do embaixador brasileiro em Paris, Luiz Martins Souza Dantas, e de uma funcionária do consulado em Hamburgo, Aracy Moebius de Carvalho, mais tarde esposa do escritor Guimarães Rosa. Tanto Aracy, conhecida como ‘o anjo de Hamburgo’, como Souza Dantas desobedeceram às ordens do governo Vargas e liberaram centenas de vistos de judeus para o Brasil”, contou.
Ferramenta pedagógica
No portal, além de documentos oficiais, os usuários podem consultar um inventário de judeus refugiados no Brasil com dados e correspondências pessoais, fotografias, passagens de navio e bibliografia sobre o tema. Essas informações encontram-se distribuídas em vários links: “Arquivo”, “Justos & Salvadores”, “Periódicos”, “Artistas & Intelectuais”, “Rotas de fuga”, “Testemunhos” e uma “Biblioteca Virtual” com livros de memórias. O site também será alimentado com novos relatos, a partir do link “Indique um sobrevivente”.
O objetivo é disponibilizar histórias e memórias dos sobreviventes de campos de concentração e refugiados do nazifascismo radicados no Brasil até 1960, considerando o árduo e longo processo daqueles que procuraram naturalizar-se brasileiros.
Segundo Tucci Carneiro, a partir de 1950 o Itamaraty adotou uma postura mais liberal, após a divugação das atrocidades praticadas pelos nazistas e da resolução da Organização das Nações Unidas que definiu genocídio como crime contra a Humanidade.
A diplomacia deixou de, por exemplo, usar o termo “raça semita” e as circulares secretas antissemitas caíram no limbo da história. “Houve um esvaziamento da política antissemita enquanto instrumento do Estado, mas nem por isso o antissemitismo deixou de existir alimentado por grupos da extrema direita e da esquerda. Daí a importância do Arqshoah neste momento em que diferentes vozes negam o Holocausto”, disse.
Além de “arquivo-testemunho”, o Arqshoah pretende também ser uma ferramenta pedagógica importante para professores e alunos do ensino fundamental, médio e universitário. Segundo a professora da USP, tanto o Holocausto como o antissemitismo raramente são analisados nos livros didáticos e, quando aparecem, entram como adendo da Segunda Guerra Mundial.
“Normalmente, quando os professores falam sobre a guerra ou sobre a Alemanha nazista têm poucas informações sobre esse contexto. A ideia é romper o silêncio e promover o debate sobre o Holocausto enquanto genocídio singular e crime contra a humanidade”, disse a pioneira nos estudos sobre o antissemitismo na Era Vargas, título do seu livro publicado em 1988.
Memória oral
Além do acervo digitalizado, o portal Arqshoah terá arquivos de áudio e vídeo. Até o momento foram gravados mais de 30 depoimentos com sobreviventes ou seus filhos.
“Alguns dos entrevistados haviam gravado depoimentos para a Survivors of the Shoah Visual History Foundation (Fundação dos Sobreviventes da História Visual do Shoah), fundada em 1994 pelo cineasta norte-americano Steven Spielberg, cujas cópias procuramos recuperar. Novos registros estão sendo gravados sob um outro olhar, sendo esse mais um segmento coordenado pelo professor Pedro Ortiz e pela historiadora Rachel Mizrahi, ambos pesquisadores do LEER”, disse Tucci Carneiro.
“Vamos também tornar públicos os processos de naturalização dos judeus que entraram no Brasil de 1933 a 1950, documentos sob a guarda do Arquivo Nacional e que vão inaugurar a segunda fase do projeto, em 2010. Segundo a legislação brasileira, somente após dez anos os estrangeiros poderiam se naturalizar brasileiros. A partir do passaporte anexado ao processo é possível identificar o diplomata que emitiu o visto e a estratégia de entrada no Brasil, burlando as circulares antissemitas. Além disso, a naturalização exige atestados de trabalhos e, no caso dos intelectuais, eles anexavam também artigos e livros para mostrar sua produção, como ocorreu com o crítico e historiador de arte Otto Maria Carpeaux”, contou.
A difícil trajetória daqueles que conseguiram entrar no Brasil (com documentos falsos ou como católicos) pode ser conhecida através de alguns links, dentre os quais o do “Inventário de Sobreviventes” e “Artistas & Intelectuais”. “Pode também ser vislumbrado um conjunto de obras do pintor Lasar Segall, que entre 1936 e 1947 denunciou a a brutalidade praticada pelos nazistas contra os judeus”, disse Tucci Carneiro.
Mais informações: http://www.arqshoah.com.br/ ou arqshoah@usp.br.
Fonte: Agência FAPESP
http://www.agencia.fapesp.br/materia/11287/especiais/historia-de-sobreviventes.htm
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sábado, 31 de outubro de 2009
Arqshoah - Arquivo Virtual sobre Holocausto e Antissemitismo
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quarta-feira, 19 de novembro de 2008
Brasil foi o país com mais filiados ao Partido Nazista fora da Alemanha
Com base em documentos de arquivos alemães, pesquisadora identifica atuação do Partido em 83 países. O grupo brasileiro tinha o maior número de integrantes
A historiadora Ana Maria Dietrich analisou, em seu mestrado, documentos do Deops-SP que revelaram a atuação do Partido Nazista alemão (NSDAP) no Estado de São Paulo, entre 1928 e 1938. Algumas dessas descobertas incentivaram a historiadora a ir para a Alemanha, onde atualmente pesquisa o tema para o doutorado. O objetivo é compreender a atuação do NSDAP em território brasileiro sob a perspectiva do III Reich.
O doutorado é feito pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, em parceria com o Centro de Estudos de Anti-Semitismo da Universidade Técnica de Berlim, onde Ana Maria atua como pesquisadora convidada. A historiadora utiliza como fontes as atas do Arquivo Federal Alemão e o Arquivo político do Ministério das Relações Exteriores, em Berlim.
A pesquisadora pretende analisar, também, revistas e jornais da linha nacional-socialista publicados no Brasil em alemão, disponíveis no Instituto de Relações Exteriores, em Stuttgart, e verificar arquivos de outras cidades alemãs. As fontes orais - entrevistas com ex-partidários ou familiares - também estão entre as suas prioridades.
"Além de revelar um capítulo da história do Brasil, minha pesquisa está fundamentada no fortalecimento dos valores democráticos no Brasil e em outros países da América Latina", conta.
Nacional-socialismo no Brasil
Entre os primeiros resultados, Ana Maria identificou que o Landesgruppe Brasilien (o grupo do país Brasil) integrava uma espécie de rede mundial com outras filiais do partido. Esta "rede" estava presente em 83 países, em todos os continentes, com 29 mil integrantes.
As filiais estavam ligadas à Organização do Partido Nazista no Exterior (AO), um departamento do governo do Reich. Todas as diretrizes, ordens e controles partiam desta central. "A estruturação como uma espécie de 'rede de aranha' me chamou a atenção, pois mostra a força mundial do movimento."
O Landesgruppe Brasilien tinha o maior número de filiados do Partido Nazista fora da Alemanha, com 2.903 integrantes, superior à Holanda (1.925), Áustria (1.678) e Polônia (1.379). Dos filiados no Brasil, 92,7% eram alemães natos e apenas 2,45% eram brasileiros. "Para o governo Vargas, o NSDAP era um pequeno partido voltado para uma minoria estrangeira (alemães). Mas para o governo de Hitler, a história era outra."
"Uma grande surpresa foi localizar documentos sobre o norte do Brasil e saber que o Partido também desempenhou um importante papel nos estados de Pernambuco, Bahia e Pará." Ana Maria pretende comparar a história do NSDAP nos diferentes estados brasileiros, principalmente na relação norte / sul do País.
"Inferno" tropical
Se nos panfletos de propaganda para imigração que circulavam na Alemanha entre 1920 e 1930 o Brasil foi descrito como paraíso tropical, Ana Maria constatou que nos relatórios da Organização do Partido Nazista no Exterior e nos artigos de alguns jornais alemães, o País era visto pelos nazistas como "inferno" tropical.
"Isso não aconteceu pelas diferenças climáticas, nem pelas doenças que os imigrados tinham de enfrentar, mas pelo fato de os "arianos puros" conviverem com negros e outras etnias na lavoura e nas cidades. A miscigenação característica da formação do povo brasileiro era absolutamente inaceitável para o III Reich."
Durante o mestrado, Ana Maria identificou Hans Henning von Cossel como chefe do Partido Nazista no Brasil e também como editor do jornal semanal Deutscher Morgen, que circulou livremente no País entre 1932 e 1940. Na Alemanha, a pesquisadora conseguiu entrevistar duas filhas de Cossel. "Elas relataram que o pai tinha uma boa relação com os estadistas da época, como Getúlio Vargas e Adolf Hitler, sendo que este último ele encontrou pessoalmente."
Segundo Ana Maria, Cossel fazia viagens pelo Brasil para divulgar o nacional-socialismo e também para a Alemanha, onde encontrou o chefe da Organização do Partido Nazista no Exterior, Ernst Wilhelm Bohle. "Cossel era, para o Partido, o "Fuhrer" no Brasil. Exercia as funções de "Vertrauensmann" (homem de confiança) do III Reich e adido cultural da Embaixada Alemã no Rio de Janeiro, além de manter o status de correspondente do III Reich, transmitindo informações importantes sobre o Brasil para a Alemanha.
Aspectos sociais
"O viés 'social' também é uma das novidades do meu trabalho, em complemento a importantes estudos de historiadores alemães e brasileiros sobre a chamada 'história política' do Partido Nazista no exterior e no Brasil."
Segundo a historiadora, ao se estudar as consequências do fenômeno do nazismo para o Brasil e para a humanidade, evita-se a proliferação da ideologia e de movimentos de extrema-direita. "Só através do debate deste período histórico poderemos informar às futuras gerações sobre a importância da democracia, contra qualquer tipo de discriminação em relação às minorias."
Ana Maria faz doutorado-sanduíche com bolsa do CNPq / DAAD (Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico). A orientação no Brasil é da professora Maria Luíza Tucci Carneiro, da FFLCH, e na Alemanha é do professor Wolfgang Benz, da Universidade Técnica de Berlim. A previsão é que, em 2006, seus estudos estejam concluídos. Segundo a pesquisadora, o mestrado será publicado no segundo semestre deste ano pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo.
[imagens: arquivo Ana Maria Dietrich]
Valéria Dias / Agência USP
Fonte: USP Online
http://www2.usp.br/index.php/sociedade/442
A historiadora Ana Maria Dietrich analisou, em seu mestrado, documentos do Deops-SP que revelaram a atuação do Partido Nazista alemão (NSDAP) no Estado de São Paulo, entre 1928 e 1938. Algumas dessas descobertas incentivaram a historiadora a ir para a Alemanha, onde atualmente pesquisa o tema para o doutorado. O objetivo é compreender a atuação do NSDAP em território brasileiro sob a perspectiva do III Reich.
O doutorado é feito pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, em parceria com o Centro de Estudos de Anti-Semitismo da Universidade Técnica de Berlim, onde Ana Maria atua como pesquisadora convidada. A historiadora utiliza como fontes as atas do Arquivo Federal Alemão e o Arquivo político do Ministério das Relações Exteriores, em Berlim.
A pesquisadora pretende analisar, também, revistas e jornais da linha nacional-socialista publicados no Brasil em alemão, disponíveis no Instituto de Relações Exteriores, em Stuttgart, e verificar arquivos de outras cidades alemãs. As fontes orais - entrevistas com ex-partidários ou familiares - também estão entre as suas prioridades.
"Além de revelar um capítulo da história do Brasil, minha pesquisa está fundamentada no fortalecimento dos valores democráticos no Brasil e em outros países da América Latina", conta.
Nacional-socialismo no Brasil
Entre os primeiros resultados, Ana Maria identificou que o Landesgruppe Brasilien (o grupo do país Brasil) integrava uma espécie de rede mundial com outras filiais do partido. Esta "rede" estava presente em 83 países, em todos os continentes, com 29 mil integrantes.
As filiais estavam ligadas à Organização do Partido Nazista no Exterior (AO), um departamento do governo do Reich. Todas as diretrizes, ordens e controles partiam desta central. "A estruturação como uma espécie de 'rede de aranha' me chamou a atenção, pois mostra a força mundial do movimento."
O Landesgruppe Brasilien tinha o maior número de filiados do Partido Nazista fora da Alemanha, com 2.903 integrantes, superior à Holanda (1.925), Áustria (1.678) e Polônia (1.379). Dos filiados no Brasil, 92,7% eram alemães natos e apenas 2,45% eram brasileiros. "Para o governo Vargas, o NSDAP era um pequeno partido voltado para uma minoria estrangeira (alemães). Mas para o governo de Hitler, a história era outra."
"Uma grande surpresa foi localizar documentos sobre o norte do Brasil e saber que o Partido também desempenhou um importante papel nos estados de Pernambuco, Bahia e Pará." Ana Maria pretende comparar a história do NSDAP nos diferentes estados brasileiros, principalmente na relação norte / sul do País.
"Inferno" tropical
Se nos panfletos de propaganda para imigração que circulavam na Alemanha entre 1920 e 1930 o Brasil foi descrito como paraíso tropical, Ana Maria constatou que nos relatórios da Organização do Partido Nazista no Exterior e nos artigos de alguns jornais alemães, o País era visto pelos nazistas como "inferno" tropical.
"Isso não aconteceu pelas diferenças climáticas, nem pelas doenças que os imigrados tinham de enfrentar, mas pelo fato de os "arianos puros" conviverem com negros e outras etnias na lavoura e nas cidades. A miscigenação característica da formação do povo brasileiro era absolutamente inaceitável para o III Reich."
Durante o mestrado, Ana Maria identificou Hans Henning von Cossel como chefe do Partido Nazista no Brasil e também como editor do jornal semanal Deutscher Morgen, que circulou livremente no País entre 1932 e 1940. Na Alemanha, a pesquisadora conseguiu entrevistar duas filhas de Cossel. "Elas relataram que o pai tinha uma boa relação com os estadistas da época, como Getúlio Vargas e Adolf Hitler, sendo que este último ele encontrou pessoalmente."
Segundo Ana Maria, Cossel fazia viagens pelo Brasil para divulgar o nacional-socialismo e também para a Alemanha, onde encontrou o chefe da Organização do Partido Nazista no Exterior, Ernst Wilhelm Bohle. "Cossel era, para o Partido, o "Fuhrer" no Brasil. Exercia as funções de "Vertrauensmann" (homem de confiança) do III Reich e adido cultural da Embaixada Alemã no Rio de Janeiro, além de manter o status de correspondente do III Reich, transmitindo informações importantes sobre o Brasil para a Alemanha.
Aspectos sociais
"O viés 'social' também é uma das novidades do meu trabalho, em complemento a importantes estudos de historiadores alemães e brasileiros sobre a chamada 'história política' do Partido Nazista no exterior e no Brasil."
Segundo a historiadora, ao se estudar as consequências do fenômeno do nazismo para o Brasil e para a humanidade, evita-se a proliferação da ideologia e de movimentos de extrema-direita. "Só através do debate deste período histórico poderemos informar às futuras gerações sobre a importância da democracia, contra qualquer tipo de discriminação em relação às minorias."
Ana Maria faz doutorado-sanduíche com bolsa do CNPq / DAAD (Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico). A orientação no Brasil é da professora Maria Luíza Tucci Carneiro, da FFLCH, e na Alemanha é do professor Wolfgang Benz, da Universidade Técnica de Berlim. A previsão é que, em 2006, seus estudos estejam concluídos. Segundo a pesquisadora, o mestrado será publicado no segundo semestre deste ano pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo.
[imagens: arquivo Ana Maria Dietrich]
Valéria Dias / Agência USP
Fonte: USP Online
http://www2.usp.br/index.php/sociedade/442
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sexta-feira, 31 de outubro de 2008
Resenha do livro "A Indústria do Holocausto"
Por Maria Luiza Tucci Carneiro*, especial para o iG Ler (igler@ig.com)
O livro "A Indústria do Holocausto", do norte-americano Norman Finkelstein, é um verdadeiro convite ao anti-semitismo, além de ser (ele mesmo) uma indústria captadora de recursos: a primeira tiragem é de 50 mil exemplares. Se para o autor o Holocausto "provou ser uma indispensável bomba ideológica", para nós ele continua a ser um fenômeno humanamente inexplicável.
A obra - que vem causando polêmica em todos os países onde foi publicada - abre trincheiras para os grupos revisionistas, representantes do pensamento da extrema-direita e que negam as câmaras de gás.
O texto se apresenta como uma faca de dois gumes, possibilitando uma leitura dúbia: de um lado, por tratar a questão judaica sobre um viés acusatório, anti-sionista e recuperar (sob nova maquiagem) o mito da conspiração judaica. Tais maquinações anti-semitas causam ainda maior estranheza por expressarem o pensamento de alguém cujos pais sobreviveram ao Gueto de Varsóvia e aos campos de concentração nazista.
Segundo o próprio autor, com exceção de seus pais, todos os membros de ambas as famílias foram exterminados pelos nazistas. Este é, por assim dizer, o outro lado da faca: o que atribui aos sobreviventes do Holocausto um "status de vítima". Mas é como vítima (sem status) que o autor faz jus à tradição americana da denúncia moral.
Em alguns momentos, o autor dá um tom de revolta à sua voz protestando contra a elite judaica americana que "explora" economicamente o Holocausto: daí a dubiedade da narrativa. Para Finkelstein existem duas fases distintas:
1) desde a Segunda Guerra Mundial até 1967: fase delineada por atitudes de menosprezo pelo tema. Nesta época, a elite judaica teria se alinhado à política americana priorizando a Guerra Fria, fazendo vistas grossas à entrada de nazistas no país, além de apoiar o rearmamento de uma Alemanha mal desnazificada.
2) após a guerra de 1967: quando o Holocausto tornou-se uma fixação na vida dos judeus americanos. Diante do "isolamento e vulnerabilidade de Israel" (p.28), a elite judaica teria começado a explorar o Holocausto visando lucros.
O raciocínio de Finkelstein baseia-se na existência de dois grupos distintos de judeus norte-americanos: os que foram "apenas" vítimas do Holocausto e aqueles que conquistaram status explorando a idéia de terem sido vítimas.
Estes seriam os responsáveis pela grosseira exploração do martírio judeu e pela transformação do Holocausto em O Holocausto, definido como uma verdadeira indústria da corrupção.
A idéia é de que esta catástrofe teve desdobramentos possibilitando ao Estado de Israel (definido pelo autor como "um dos maiores poderes militares do mundo, com uma horrenda reputação em direitos humanos") projetar-se como um Estado "vítima", além de oferecer facilidades aos judeus bem-sucedidos dos Estados Unidos, anti-comunistas, por excelência (p. 13).
A plataforma de defesa sustentada pelo autor finca-se no tom de "denúncia" atribuído à sua tese: a de que os judeus americanos estariam explorando a memória do Holocausto transformando-a em um "negócio".
Tanto a dedicatória como a epígrafe que abrem o livro - está última assinada pelo Rabino Arnold Jacob Wolf, da Universidade de Yale - reafirmam a identidade judaica do autor, ao mesmo tempo em que sintetizam a sua proposta: "A mim parece que o Holocausto está sendo vendido - não ensinado".
Tal "denúncia" é tendenciosa ao possibilitar uma "outra" leitura, perigosa no momento em que grupos neonazistas negam as câmaras de gás e os noticiários televisivos sobre a paz no Oriente Médio enfatizam uma abordagem anti-Israel.
Se a idéia de Finkelstein foi de retratar o legado de seus pais, certamente ele não foi feliz. Ademais, não é preciso ter sobrevivido a uma catástrofe (Shoah) para alcançar o grau de tirania praticado pelos nazistas.
"A Indústria do Holocausto" é uma obra rica em estereótipos recuperados dos mais exacerbados libelos anti-semitas, muitos dos quais se prestaram para sustentar uma outra indústria: a da "morte em série" nos campos de extermínio. No rol desta literatura panfletária está os "Protocolos dos Sábios de Sião", leitura de cabeceira de Adolf Hitler e dos neonazistas.
Como documento anti-semita, os Protocolos tentam provar que os judeus conspiram, há séculos, com o objetivo de controlar o mundo. Daí o texto (de origem russa, 1905) enfatizar os "interesses ocultos", conceito parafraseado por Finkelstein, noventa e seis anos depois. O autor (re)administra acusações anti-semitas ao afirmar que a memória do Holocausto está sendo modelada por "interesses investidos" e sendo utilizada para "extorquir dinheiro da Europa" (p.18).
Esta imagem estereotipada dos judeus enquanto "exploradores" e "aproveitadores" de situações trágicas pode ser identificada na maioria dos textos anti-semitas, alguns seculares. Aliás, por coincidência, um dos mais virulentos libelos anti-semitas produzidos no Brasil nos anos 30, leva o título "Indústria de Judeus".
Valendo-se de metáforas extraídas do mundo da industrialização, um diplomata brasileiro apela para a tese dos "agentes judeus" (comparados a força-motriz) que - através de sua astúcia, engenhosidade, destreza e criatividade - conjugavam o seu trabalho ao capital, objetivando o lucro ilícito.
Há também um livro anti-semita "Os judeus do cinema", de Oswaldo Gouvêa (Rio de Janeiro, 1935) que acusa empresas americanas de explorar a indústria cinematográfica. Valendo-se dos "capitalistas judeus da Broadway" teriam se tornado poderosas empresas, com domínio universal. Foi aí que "o Leão da Metro alvoroçou sua juba e deu o primeiro rugido de alarme entre os judeus" (p.74).
Mera coincidência ou não, o mito da conspiração foi retomado por Finkelstein e atualizado no espaço e no tempo histórico.
(*) Maria Luiza Tucci Carneiro é historiadora da Universidade de São Paulo, autora de "Holocausto. Crime contra a Humanidade" (Ática, 2000) e "O Anti-semitismo na Era Vargas" (Brasiliense, 1995, 2a. edição), entre outros.
OBS: Este texto, inédito, será ampliado pela autora para publicação em uma revista da comunidade judaica, para a qual foi originalmente concebido.
Fonte: IG
http://www.ig.com.br/paginas/igler/especiais/finkel/tucci.html
O livro "A Indústria do Holocausto", do norte-americano Norman Finkelstein, é um verdadeiro convite ao anti-semitismo, além de ser (ele mesmo) uma indústria captadora de recursos: a primeira tiragem é de 50 mil exemplares. Se para o autor o Holocausto "provou ser uma indispensável bomba ideológica", para nós ele continua a ser um fenômeno humanamente inexplicável.
A obra - que vem causando polêmica em todos os países onde foi publicada - abre trincheiras para os grupos revisionistas, representantes do pensamento da extrema-direita e que negam as câmaras de gás.
O texto se apresenta como uma faca de dois gumes, possibilitando uma leitura dúbia: de um lado, por tratar a questão judaica sobre um viés acusatório, anti-sionista e recuperar (sob nova maquiagem) o mito da conspiração judaica. Tais maquinações anti-semitas causam ainda maior estranheza por expressarem o pensamento de alguém cujos pais sobreviveram ao Gueto de Varsóvia e aos campos de concentração nazista.
Segundo o próprio autor, com exceção de seus pais, todos os membros de ambas as famílias foram exterminados pelos nazistas. Este é, por assim dizer, o outro lado da faca: o que atribui aos sobreviventes do Holocausto um "status de vítima". Mas é como vítima (sem status) que o autor faz jus à tradição americana da denúncia moral.
Em alguns momentos, o autor dá um tom de revolta à sua voz protestando contra a elite judaica americana que "explora" economicamente o Holocausto: daí a dubiedade da narrativa. Para Finkelstein existem duas fases distintas:
1) desde a Segunda Guerra Mundial até 1967: fase delineada por atitudes de menosprezo pelo tema. Nesta época, a elite judaica teria se alinhado à política americana priorizando a Guerra Fria, fazendo vistas grossas à entrada de nazistas no país, além de apoiar o rearmamento de uma Alemanha mal desnazificada.
2) após a guerra de 1967: quando o Holocausto tornou-se uma fixação na vida dos judeus americanos. Diante do "isolamento e vulnerabilidade de Israel" (p.28), a elite judaica teria começado a explorar o Holocausto visando lucros.
O raciocínio de Finkelstein baseia-se na existência de dois grupos distintos de judeus norte-americanos: os que foram "apenas" vítimas do Holocausto e aqueles que conquistaram status explorando a idéia de terem sido vítimas.
Estes seriam os responsáveis pela grosseira exploração do martírio judeu e pela transformação do Holocausto em O Holocausto, definido como uma verdadeira indústria da corrupção.
A idéia é de que esta catástrofe teve desdobramentos possibilitando ao Estado de Israel (definido pelo autor como "um dos maiores poderes militares do mundo, com uma horrenda reputação em direitos humanos") projetar-se como um Estado "vítima", além de oferecer facilidades aos judeus bem-sucedidos dos Estados Unidos, anti-comunistas, por excelência (p. 13).
A plataforma de defesa sustentada pelo autor finca-se no tom de "denúncia" atribuído à sua tese: a de que os judeus americanos estariam explorando a memória do Holocausto transformando-a em um "negócio".
Tanto a dedicatória como a epígrafe que abrem o livro - está última assinada pelo Rabino Arnold Jacob Wolf, da Universidade de Yale - reafirmam a identidade judaica do autor, ao mesmo tempo em que sintetizam a sua proposta: "A mim parece que o Holocausto está sendo vendido - não ensinado".
Tal "denúncia" é tendenciosa ao possibilitar uma "outra" leitura, perigosa no momento em que grupos neonazistas negam as câmaras de gás e os noticiários televisivos sobre a paz no Oriente Médio enfatizam uma abordagem anti-Israel.
Se a idéia de Finkelstein foi de retratar o legado de seus pais, certamente ele não foi feliz. Ademais, não é preciso ter sobrevivido a uma catástrofe (Shoah) para alcançar o grau de tirania praticado pelos nazistas.
"A Indústria do Holocausto" é uma obra rica em estereótipos recuperados dos mais exacerbados libelos anti-semitas, muitos dos quais se prestaram para sustentar uma outra indústria: a da "morte em série" nos campos de extermínio. No rol desta literatura panfletária está os "Protocolos dos Sábios de Sião", leitura de cabeceira de Adolf Hitler e dos neonazistas.
Como documento anti-semita, os Protocolos tentam provar que os judeus conspiram, há séculos, com o objetivo de controlar o mundo. Daí o texto (de origem russa, 1905) enfatizar os "interesses ocultos", conceito parafraseado por Finkelstein, noventa e seis anos depois. O autor (re)administra acusações anti-semitas ao afirmar que a memória do Holocausto está sendo modelada por "interesses investidos" e sendo utilizada para "extorquir dinheiro da Europa" (p.18).
Esta imagem estereotipada dos judeus enquanto "exploradores" e "aproveitadores" de situações trágicas pode ser identificada na maioria dos textos anti-semitas, alguns seculares. Aliás, por coincidência, um dos mais virulentos libelos anti-semitas produzidos no Brasil nos anos 30, leva o título "Indústria de Judeus".
Valendo-se de metáforas extraídas do mundo da industrialização, um diplomata brasileiro apela para a tese dos "agentes judeus" (comparados a força-motriz) que - através de sua astúcia, engenhosidade, destreza e criatividade - conjugavam o seu trabalho ao capital, objetivando o lucro ilícito.
Há também um livro anti-semita "Os judeus do cinema", de Oswaldo Gouvêa (Rio de Janeiro, 1935) que acusa empresas americanas de explorar a indústria cinematográfica. Valendo-se dos "capitalistas judeus da Broadway" teriam se tornado poderosas empresas, com domínio universal. Foi aí que "o Leão da Metro alvoroçou sua juba e deu o primeiro rugido de alarme entre os judeus" (p.74).
Mera coincidência ou não, o mito da conspiração foi retomado por Finkelstein e atualizado no espaço e no tempo histórico.
(*) Maria Luiza Tucci Carneiro é historiadora da Universidade de São Paulo, autora de "Holocausto. Crime contra a Humanidade" (Ática, 2000) e "O Anti-semitismo na Era Vargas" (Brasiliense, 1995, 2a. edição), entre outros.
OBS: Este texto, inédito, será ampliado pela autora para publicação em uma revista da comunidade judaica, para a qual foi originalmente concebido.
Fonte: IG
http://www.ig.com.br/paginas/igler/especiais/finkel/tucci.html
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Tucci Carneiro
sábado, 18 de outubro de 2008
As Doenças e os Medos Sociais - Palestra
Repassando, foi enviado um anúncio de palestras que se realizará no Anfiteatro do Dept.º de História/FFLCH/USP nos próximos dia 21 e 22 de Outubro sobre as doenças e os medos sociais e serão abordadas questões como o racismo, a eugenia, o extermínio e o nazismo. A quem interessar, segue abaixo informações de como entrar em contato e o cartaz dos eventos.
Site(1): http://agenda.universia.com.br/usp/2008/10/16/doencas-e-medos-sociais
LEER/USP - Laboratório de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Disciminação
Local: Anfiteatro do Dept.º de História, Av. Lineu Prestes, 338. Cidade Universitária, São Paulo.
Os interessados devem preecher a ficha de inscrição e enviá-la para o endereço eletrônico.
Telefone: 11 3091-8598
E-mail: leer@usp.br
URL: http://www.obore.com.br/cms-arquivo/fcha%20de%20inscrição%20AS%20DOENÇAS%20E%20OS%20MEDOS%20SOCIAIS.doc
Cartaz: http://www.mrmail.com.br/campanhas/2008/ler.jpg
Descrição: USP Online
O seminário Doenças e os Medos Sociais, organizado pelo Departamento de História da Faculdade de FIlosofia, Letras e Ciências Sociais (FFLCH) da USP, vai discutir temas como "Os medos na formação da sociedade brasileira", "Fontes para a história das doenças" e "O imaginário sobre a doença e o doente".
Entre os palestrantes estão renomados professores da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), da Universidade Federal do Paraná (UFPR), da FFLCH, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), entre outras intituições.
O evento acontece terça (21) e quarta-feira (22), no anfiteatro do Departamento de História da FFLCH (Av. Lineu Prestes, 338, Cidade Universitária, São Paulo). Para se inscrever, os interessados devem preencher a ficha de inscrição e enviar por para email leer@usp.br Este endereço de e-mail está protegido contra SpamBots. Você precisa ter o JavaScript habilitado para vê-lo.
Site(2): http://www2.usp.br/index.php/noticias/38-sociedade/15528-seminario-discute-a-relacao-entre-as-doencas-e-os-medos-sociais
Site(1): http://agenda.universia.com.br/usp/2008/10/16/doencas-e-medos-sociais
LEER/USP - Laboratório de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Disciminação
Local: Anfiteatro do Dept.º de História, Av. Lineu Prestes, 338. Cidade Universitária, São Paulo.
Os interessados devem preecher a ficha de inscrição e enviá-la para o endereço eletrônico.
Telefone: 11 3091-8598
E-mail: leer@usp.br
URL: http://www.obore.com.br/cms-arquivo/fcha%20de%20inscrição%20AS%20DOENÇAS%20E%20OS%20MEDOS%20SOCIAIS.doc
Cartaz: http://www.mrmail.com.br/campanhas/2008/ler.jpg
Descrição: USP Online
O seminário Doenças e os Medos Sociais, organizado pelo Departamento de História da Faculdade de FIlosofia, Letras e Ciências Sociais (FFLCH) da USP, vai discutir temas como "Os medos na formação da sociedade brasileira", "Fontes para a história das doenças" e "O imaginário sobre a doença e o doente".
Entre os palestrantes estão renomados professores da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), da Universidade Federal do Paraná (UFPR), da FFLCH, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), entre outras intituições.
O evento acontece terça (21) e quarta-feira (22), no anfiteatro do Departamento de História da FFLCH (Av. Lineu Prestes, 338, Cidade Universitária, São Paulo). Para se inscrever, os interessados devem preencher a ficha de inscrição e enviar por para email leer@usp.br Este endereço de e-mail está protegido contra SpamBots. Você precisa ter o JavaScript habilitado para vê-lo.
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sábado, 16 de agosto de 2008
Jornada leva o Holocausto para a sala de aula
Valéria Dias / Agência USP
O professor “José” se dirige até a “mesa de imigração” para a retirada de seu “Passaport Card” que vai permitir que ele possa “imigrar”. Quando ele abre o documento, não encontra a própria foto, mas sim a de uma criança que foge do nazismo em plena Segunda Guerra Mundial. A cena não se refere a um filme sobre o Holocausto, mas sim ao ambiente inicial que os professores da rede municipal de ensino irão encontrar no próximo dia 16 na abertura da VII Jornada Interdisciplinar sobre o Ensino do Holocausto, que acontece das 8 às 17h30 no Anfiteatro da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP. O tema deste encontro será “Por um milhão de crianças”.
“A idéia é oferecer subsídios para os educadores trabalharem em sala de aula o tema Holocausto de maneira interdisciplinar”, conta a coordenadora da iniciativa, a professora Maria Luiza Tucci Carneiro, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP. “O objetivo principal da Jornada é a educação para a cidadania: oferecer recursos ao educador para ele criar um espírito de solidariedade entre os alunos, visando combater o racismo e o anti-semitismo”, aponta.
A professora conta que a ambientação de um setor de imigração no início da Jornada é baseada em um recurso já usado no exterior em museus interativos que possibilitam ao visitante se identificar com personagens retratados nesses lugares. As “crianças” identificadas no “passaporte” que os educadores vão receber no início das atividades do dia 16 estarão presentes na Jornada. Anita Leocádia Prestes, Ruth Sprung Tarasanschy, Sabina Kustin, Jorge Legmann, Esther Cohen Ahaaroni, Maika Milner e Inge Rosental eram crianças durante a Segunda Guerra e vão participar apresentando seus depoimentos como sobreviventes do Holocausto. “Em cada um desses depoimentos, os professores e educadores identificados no "Passaport Card" como cada uma dessas “crianças” serão convidados a se levantarem da platéia.”
Maria Luiza conta que a palestrante Inge Rosenthal, por exemplo, foi uma das crianças do Kindertranport, o “trem das crianças”. “Em 1939, na Alemanha, vários pais judeus colocaram seus filhos em um trem com destino à Inglaterra como uma maneira de salvá-los da perseguição nazista. A Inge vai para Londres e depois para os Estados Unidos. Lá ela conhece um fazendeiro brasileiro, casa-se com ele e vem para o Brasil. Atualmente ela mora em Rolândia, interior de São Paulo”, explica.
Teatro
A Jornada também vai oferecer o recurso do uso do teatro em sala de aula. A peça “Uma carta, uma dor”, conta a história de uma menina que está escondida na Polônia junto com a mãe e dois irmãos. A garota escreve uma carta para um cônsul brasileiro pedindo que ele salve a família dela da perseguição nazista e conceda um visto para a família. De acordo com Maria Luiza, “O material oferecido na Jornada é multidisciplinar, pois permite ao educador trabalhar o tema levando o teatro para a sala de aula abordando outras disciplinas além de História, como Literatura, Língua Portuguesa e Geografia, por exemplo”.
Entre os outros temas que serão abordados durante a Jornada, estão: As crianças do Holocausto: medo e silêncio; As crianças de Terezin: arte e criatividade em tempos de intolerância; Anne Frank: uma vida, um registro; Literatura e História: travessia para o Brasil; e O cinema e as crianças do Holocausto: a infância perdida. Os depoimentos dos sobreviventes estão previstos para acontecerem a partir das 14 horas. Encerrando o encontro, a partir das 16h40, a diretora de teatro e pesquisadora do Laboratório de Estudos de Etnicidade, Racismo e Discriminação (LEER) da USP, Leslie Marko, apresenta aos participantes uma cena da peça “Uma carta, uma dor” e mostrará como o teatro pode ser usado em sala de aula.
Neste ano, a Jornada já aconteceu em Curitiba e no Rio de Janeiro. Para2009, estão previstas jornadas em Porto Alegre, Recife, Curitiba, Rio de Janeiro e São Paulo. De acordo com Maria Luiza, a idéia é, posteriormente, disponibilizar todo material usado nesses encontros por meio do link “Ação Educativa” do portal Arquivo Virtual sobre Holocausto e Anti-Semitismo (Arqshoah) que está sendo produzido pelo LEER, e que deverá ser inaugurado em janeiro de 2009.
As inscrições, gratuitas, estão abertas até segunda-feira (11) e podem ser feitas por meio do endereço disponível no site da Secretaria Municipal de Educação, que traz a programação completa do evento. A Jornada é promovida pelo LEER, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação e a Associação Beneficente e Cultural B’nai B’rith.
Mais informações: (11) 3091-8598,
e-mail: malutucci@terra.com.br com a professora Maria Luiza Tucci Carneiro.
Este endereço de e-mail está protegido contra SpamBots. Você precisa ter o JavaScript habilitado para vê-lo.
Site:
http://educacao.prefeitura.sp.gov.br/
Fonte: site da USP(Universidade de São Paulo)
http://www4.usp.br/index.php/noticias/39-educacao/15009-jornada-leva-o-holocausto-para-a-sala-de-aula
O professor “José” se dirige até a “mesa de imigração” para a retirada de seu “Passaport Card” que vai permitir que ele possa “imigrar”. Quando ele abre o documento, não encontra a própria foto, mas sim a de uma criança que foge do nazismo em plena Segunda Guerra Mundial. A cena não se refere a um filme sobre o Holocausto, mas sim ao ambiente inicial que os professores da rede municipal de ensino irão encontrar no próximo dia 16 na abertura da VII Jornada Interdisciplinar sobre o Ensino do Holocausto, que acontece das 8 às 17h30 no Anfiteatro da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP. O tema deste encontro será “Por um milhão de crianças”.
“A idéia é oferecer subsídios para os educadores trabalharem em sala de aula o tema Holocausto de maneira interdisciplinar”, conta a coordenadora da iniciativa, a professora Maria Luiza Tucci Carneiro, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP. “O objetivo principal da Jornada é a educação para a cidadania: oferecer recursos ao educador para ele criar um espírito de solidariedade entre os alunos, visando combater o racismo e o anti-semitismo”, aponta.
A professora conta que a ambientação de um setor de imigração no início da Jornada é baseada em um recurso já usado no exterior em museus interativos que possibilitam ao visitante se identificar com personagens retratados nesses lugares. As “crianças” identificadas no “passaporte” que os educadores vão receber no início das atividades do dia 16 estarão presentes na Jornada. Anita Leocádia Prestes, Ruth Sprung Tarasanschy, Sabina Kustin, Jorge Legmann, Esther Cohen Ahaaroni, Maika Milner e Inge Rosental eram crianças durante a Segunda Guerra e vão participar apresentando seus depoimentos como sobreviventes do Holocausto. “Em cada um desses depoimentos, os professores e educadores identificados no "Passaport Card" como cada uma dessas “crianças” serão convidados a se levantarem da platéia.”
Maria Luiza conta que a palestrante Inge Rosenthal, por exemplo, foi uma das crianças do Kindertranport, o “trem das crianças”. “Em 1939, na Alemanha, vários pais judeus colocaram seus filhos em um trem com destino à Inglaterra como uma maneira de salvá-los da perseguição nazista. A Inge vai para Londres e depois para os Estados Unidos. Lá ela conhece um fazendeiro brasileiro, casa-se com ele e vem para o Brasil. Atualmente ela mora em Rolândia, interior de São Paulo”, explica.
Teatro
A Jornada também vai oferecer o recurso do uso do teatro em sala de aula. A peça “Uma carta, uma dor”, conta a história de uma menina que está escondida na Polônia junto com a mãe e dois irmãos. A garota escreve uma carta para um cônsul brasileiro pedindo que ele salve a família dela da perseguição nazista e conceda um visto para a família. De acordo com Maria Luiza, “O material oferecido na Jornada é multidisciplinar, pois permite ao educador trabalhar o tema levando o teatro para a sala de aula abordando outras disciplinas além de História, como Literatura, Língua Portuguesa e Geografia, por exemplo”.
Entre os outros temas que serão abordados durante a Jornada, estão: As crianças do Holocausto: medo e silêncio; As crianças de Terezin: arte e criatividade em tempos de intolerância; Anne Frank: uma vida, um registro; Literatura e História: travessia para o Brasil; e O cinema e as crianças do Holocausto: a infância perdida. Os depoimentos dos sobreviventes estão previstos para acontecerem a partir das 14 horas. Encerrando o encontro, a partir das 16h40, a diretora de teatro e pesquisadora do Laboratório de Estudos de Etnicidade, Racismo e Discriminação (LEER) da USP, Leslie Marko, apresenta aos participantes uma cena da peça “Uma carta, uma dor” e mostrará como o teatro pode ser usado em sala de aula.
Neste ano, a Jornada já aconteceu em Curitiba e no Rio de Janeiro. Para2009, estão previstas jornadas em Porto Alegre, Recife, Curitiba, Rio de Janeiro e São Paulo. De acordo com Maria Luiza, a idéia é, posteriormente, disponibilizar todo material usado nesses encontros por meio do link “Ação Educativa” do portal Arquivo Virtual sobre Holocausto e Anti-Semitismo (Arqshoah) que está sendo produzido pelo LEER, e que deverá ser inaugurado em janeiro de 2009.
As inscrições, gratuitas, estão abertas até segunda-feira (11) e podem ser feitas por meio do endereço disponível no site da Secretaria Municipal de Educação, que traz a programação completa do evento. A Jornada é promovida pelo LEER, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação e a Associação Beneficente e Cultural B’nai B’rith.
Mais informações: (11) 3091-8598,
e-mail: malutucci@terra.com.br com a professora Maria Luiza Tucci Carneiro.
Este endereço de e-mail está protegido contra SpamBots. Você precisa ter o JavaScript habilitado para vê-lo.
Site:
http://educacao.prefeitura.sp.gov.br/
Fonte: site da USP(Universidade de São Paulo)
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sábado, 12 de julho de 2008
Os carrascos nazistas no Brasil
Os carrascos no Brasil
Com a ajuda de autoridades, criminosos de guerra acharam refúgio no país durante o governo de Dutra
A derrota de 1945 encheu as ruas alemãs de "deslocados de guerra", pessoas que haviam perdido tudo e tentavam recomeçar a vida em outro país. O Conselho de Controle da Alemanha, criado por Estados Unidos, Inglaterra, França e URSS, decidia quem podia e quem não podia sair. Os vencedores exigiam que os candidatos a emigrar passassem pela desnazificação - investigação para determinar se haviam cooperado com o Reich. O objetivo era impedir que criminosos de guerra escapassem impunes. Apesar disso, grandes carrascos do nazismo, como Gustav Wagner, Josef Mengele e Paul Stangl, vieram parar no Brasil.
Como isso foi possível é o que a professora Maria Luiza Tucci Carneiro, da Universidade de São Paulo, está começando a desvendar. No meio dos mais de 2 mil documentos que estuda, Maria Luiza achou vários que mostram como autoridades brasileiras aconselhavam os interessados no visto de saída a falsificar endereço ou profissão para ludibriar os fiscais aliados.
Há indícios de que esses nazistas contavam com a boa vontade do Itamaraty. A professora levanta a hipótese de que o próprio presidente Eurico Gaspar Dutra sabia do que se passava. "Havia na época uma circular secreta, datada de 1947, que restringia a entrada de judeus no Brasil", lembra. "Em contrapartida, existia uma missão diplomática em Berlim que não se acanhava em ludibriar a lei para facilitar o ingresso de funcionários do III Reich no país", acusa. A hipótese é endossada por outros estudos. "Tudo indica que houve facilitação da entrada de empresários nazistas no Brasil por iniciativa pessoal de Dutra", diz Marionilde Brephol Magalhães, autora do livro Pangermanismo e Nazismo - A Trajetória Alemã Rumo ao Brasil. "Como ministro da Guerra de Getúlio Vargas, Dutra já mostrava simpatia pelo nazi-fascismo", diz.
Estima-se que 3 mil alemães tenham entrado no Brasil entre 1945 e 1950. Evidentemente, nem todos eram nazistas. Para separar o joio do trigo, Maria Luiza recorre a duas fontes: os arquivos do Itamaraty, em Brasília, e do Deops, em São Paulo. A idéia é reconstituir trajetórias individuais, como a de T.K. (a historiadora pede para que os nomes não sejam revelados), ex-agente da polícia nazista. Terminada a guerra, ele resolveu fugir da Alemanha.
Tentou primeiro a via clandestina - acabou preso em Sófia, Bulgária. Resolveu, então, seguir os meios legais. Foi à missão militar brasileira em Berlim - a embaixada não existia desde 1942, quando o Brasil declarou guerra à Alemanha - e solicitou visto. O arquivo do Itamaraty guarda a carta em que a missão militar pede instruções sobre T.K. informando que foi agente policial nazista. Embora não tenha sido achada a resposta do ministério, o nome de T.K. aparece numa lista de pessoas que obtiveram o visto brasileiro.
O coronel Aurélio de Lyra Tavares, depois membro da junta militar que governou o Brasil após a morte de Costa e Silva até a posse de Médici, era o chefe da missão militar em Berlim. Em telegrama de 1947, ele avisa o Itamaraty que oito nazistas embarcaram no navio Santarém. Lyra alega só ter sabido disso quando o navio já estava em alto-mar. Maria Luiza duvida. "Antes de deixar o porto, só poderiam embarcar no navio as pessoas que estivessem com os documentos em dia.
E só estava em dia quem não constasse das listas inglesas e americanas", diz. "Esse é mais um indício de que existia uma boa vontade do governo brasileiro para acolher essas pessoas." No mesmo ano de 1947, o general Anor Teixeira dos Santos, da missão militar brasileira, mandou telegrama ao Itamaraty sobre o alemão H.P.M., a quem a saída da Alemanha fora negada pelos aliados. O telegrama informa que H.P.M. fora incluído em lista de residentes na parte de Berlim controlada pelos ingleses e que sua liberação estava em negociação.
Um ano depois, o mesmo Teixeira dos Santos manda telegrama ao ministério brasileiro intercedendo por uma brasileira filha de alemães. O general informa que lhe pedira para falsificar o endereço para que a missão militar pleiteasse sua vinda ao Brasil.
O que ainda não se pode responder inteiramente é a razão pela qual o Brasil ajudava esses nazistas. Para o historiador argentino Leonardo Senkman, que publicou um estudo comparando Dutra e Perón, o presidente brasileiro achava que técnicos e cientistas nazistas poderiam colaborar na industrialização do país. Pela mesma porta pela qual passavam técnicos que muitas vezes não tinham colaborado diretamente com os crimes de guerra, entravam também os carrascos nazistas.
E eles só vieram depois que a tolerância dos brasileiros ficou conhecida. "Depois da guerra, o governo brasileiro não se mostrou disposto a caçar nazistas", explica Maria Luiza. "Eis por que eles nem se deram ao trabalho de mudar de nome, como faziam em outros países." Como Franz Stangl, comandante do campo de extermínio de Treblinka, na Polônia. Responsável pela morte de 900 mil judeus, Stangl chegou ao Brasil com a família na década de 50. Na maior parte dos 16 anos que viveu em São Paulo trabalhou como supervisor da linha de montagem da Volkswagen usando seu próprio nome, até ser descoberto, em 1967. Extraditado para a Alemanha, morreu na prisão um ano mais tarde.
Gustav Franz Wagner, comandante do campo de Sobibor, na Polônia, onde morreram 250 mil judeus, também nunca mudou de nome. Wagner recebeu a Cruz de Ferro por sua eficiência em matar prisioneiros. Depois de entrar no Brasil com passaporte suíço, foi morar em um pequeno sítio nos arredores de Atibaia (a 69 quilômetros de São Paulo). Condenado in absentia à prisão perpétua pelo Tribunal de Nuremberg, Wagner levava uma vida calma criando animais e cultivando hortaliças.
O homem alto e de olhos azuis, cujo hobby era pintar paisagens, traiu-se ao comparecer ao Deops de São Paulo em 1978 para desmentir notícia de que participara de uma festa em homenagem a Hitler. Na mesma hora foi detido e depois transferido para uma clínica psiquiátrica paulista. Após ser libertado, voltou ao sítio. Menos de dois anos depois, matou-se.
Josef Mengele, o Anjo da Morte, médico que fazia experiências com seres humanos nos campos de concentração, morreu tranqüilo no Brasil, no final da década de 70. Como ele, vários criminosos de guerra nazistas encontraram abrigo no Brasil. O estudo de Maria Luiza deve mostrar de que forma eles conseguiram entrar no país.
(Foto): Mengele, Hoss, Kramer, Museu do Holocausto(EUA)
Fonte: Revista Época(matéria: Ana Claudia Fonseca)
http://epoca.globo.com/edic/19980615/mundo1.htm
Com a ajuda de autoridades, criminosos de guerra acharam refúgio no país durante o governo de Dutra
A derrota de 1945 encheu as ruas alemãs de "deslocados de guerra", pessoas que haviam perdido tudo e tentavam recomeçar a vida em outro país. O Conselho de Controle da Alemanha, criado por Estados Unidos, Inglaterra, França e URSS, decidia quem podia e quem não podia sair. Os vencedores exigiam que os candidatos a emigrar passassem pela desnazificação - investigação para determinar se haviam cooperado com o Reich. O objetivo era impedir que criminosos de guerra escapassem impunes. Apesar disso, grandes carrascos do nazismo, como Gustav Wagner, Josef Mengele e Paul Stangl, vieram parar no Brasil.
Como isso foi possível é o que a professora Maria Luiza Tucci Carneiro, da Universidade de São Paulo, está começando a desvendar. No meio dos mais de 2 mil documentos que estuda, Maria Luiza achou vários que mostram como autoridades brasileiras aconselhavam os interessados no visto de saída a falsificar endereço ou profissão para ludibriar os fiscais aliados.
Há indícios de que esses nazistas contavam com a boa vontade do Itamaraty. A professora levanta a hipótese de que o próprio presidente Eurico Gaspar Dutra sabia do que se passava. "Havia na época uma circular secreta, datada de 1947, que restringia a entrada de judeus no Brasil", lembra. "Em contrapartida, existia uma missão diplomática em Berlim que não se acanhava em ludibriar a lei para facilitar o ingresso de funcionários do III Reich no país", acusa. A hipótese é endossada por outros estudos. "Tudo indica que houve facilitação da entrada de empresários nazistas no Brasil por iniciativa pessoal de Dutra", diz Marionilde Brephol Magalhães, autora do livro Pangermanismo e Nazismo - A Trajetória Alemã Rumo ao Brasil. "Como ministro da Guerra de Getúlio Vargas, Dutra já mostrava simpatia pelo nazi-fascismo", diz.
Estima-se que 3 mil alemães tenham entrado no Brasil entre 1945 e 1950. Evidentemente, nem todos eram nazistas. Para separar o joio do trigo, Maria Luiza recorre a duas fontes: os arquivos do Itamaraty, em Brasília, e do Deops, em São Paulo. A idéia é reconstituir trajetórias individuais, como a de T.K. (a historiadora pede para que os nomes não sejam revelados), ex-agente da polícia nazista. Terminada a guerra, ele resolveu fugir da Alemanha.
Tentou primeiro a via clandestina - acabou preso em Sófia, Bulgária. Resolveu, então, seguir os meios legais. Foi à missão militar brasileira em Berlim - a embaixada não existia desde 1942, quando o Brasil declarou guerra à Alemanha - e solicitou visto. O arquivo do Itamaraty guarda a carta em que a missão militar pede instruções sobre T.K. informando que foi agente policial nazista. Embora não tenha sido achada a resposta do ministério, o nome de T.K. aparece numa lista de pessoas que obtiveram o visto brasileiro.
O coronel Aurélio de Lyra Tavares, depois membro da junta militar que governou o Brasil após a morte de Costa e Silva até a posse de Médici, era o chefe da missão militar em Berlim. Em telegrama de 1947, ele avisa o Itamaraty que oito nazistas embarcaram no navio Santarém. Lyra alega só ter sabido disso quando o navio já estava em alto-mar. Maria Luiza duvida. "Antes de deixar o porto, só poderiam embarcar no navio as pessoas que estivessem com os documentos em dia.
E só estava em dia quem não constasse das listas inglesas e americanas", diz. "Esse é mais um indício de que existia uma boa vontade do governo brasileiro para acolher essas pessoas." No mesmo ano de 1947, o general Anor Teixeira dos Santos, da missão militar brasileira, mandou telegrama ao Itamaraty sobre o alemão H.P.M., a quem a saída da Alemanha fora negada pelos aliados. O telegrama informa que H.P.M. fora incluído em lista de residentes na parte de Berlim controlada pelos ingleses e que sua liberação estava em negociação.
Um ano depois, o mesmo Teixeira dos Santos manda telegrama ao ministério brasileiro intercedendo por uma brasileira filha de alemães. O general informa que lhe pedira para falsificar o endereço para que a missão militar pleiteasse sua vinda ao Brasil.
O que ainda não se pode responder inteiramente é a razão pela qual o Brasil ajudava esses nazistas. Para o historiador argentino Leonardo Senkman, que publicou um estudo comparando Dutra e Perón, o presidente brasileiro achava que técnicos e cientistas nazistas poderiam colaborar na industrialização do país. Pela mesma porta pela qual passavam técnicos que muitas vezes não tinham colaborado diretamente com os crimes de guerra, entravam também os carrascos nazistas.
E eles só vieram depois que a tolerância dos brasileiros ficou conhecida. "Depois da guerra, o governo brasileiro não se mostrou disposto a caçar nazistas", explica Maria Luiza. "Eis por que eles nem se deram ao trabalho de mudar de nome, como faziam em outros países." Como Franz Stangl, comandante do campo de extermínio de Treblinka, na Polônia. Responsável pela morte de 900 mil judeus, Stangl chegou ao Brasil com a família na década de 50. Na maior parte dos 16 anos que viveu em São Paulo trabalhou como supervisor da linha de montagem da Volkswagen usando seu próprio nome, até ser descoberto, em 1967. Extraditado para a Alemanha, morreu na prisão um ano mais tarde.
Gustav Franz Wagner, comandante do campo de Sobibor, na Polônia, onde morreram 250 mil judeus, também nunca mudou de nome. Wagner recebeu a Cruz de Ferro por sua eficiência em matar prisioneiros. Depois de entrar no Brasil com passaporte suíço, foi morar em um pequeno sítio nos arredores de Atibaia (a 69 quilômetros de São Paulo). Condenado in absentia à prisão perpétua pelo Tribunal de Nuremberg, Wagner levava uma vida calma criando animais e cultivando hortaliças.
O homem alto e de olhos azuis, cujo hobby era pintar paisagens, traiu-se ao comparecer ao Deops de São Paulo em 1978 para desmentir notícia de que participara de uma festa em homenagem a Hitler. Na mesma hora foi detido e depois transferido para uma clínica psiquiátrica paulista. Após ser libertado, voltou ao sítio. Menos de dois anos depois, matou-se.
Josef Mengele, o Anjo da Morte, médico que fazia experiências com seres humanos nos campos de concentração, morreu tranqüilo no Brasil, no final da década de 70. Como ele, vários criminosos de guerra nazistas encontraram abrigo no Brasil. O estudo de Maria Luiza deve mostrar de que forma eles conseguiram entrar no país.
(Foto): Mengele, Hoss, Kramer, Museu do Holocausto(EUA)
Fonte: Revista Época(matéria: Ana Claudia Fonseca)
http://epoca.globo.com/edic/19980615/mundo1.htm
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