sábado, 5 de abril de 2008

EUA: Papa visita sinagoga de rabino sobrevivente Holocausto

O Papa Bento XVI, que visitará este mês, pela primeira vez, os Estados Unidos da América, vai deslocar-se, com carácter pessoal, a uma sinagoga liderada por um rabino sobrevivente do Holocausto.

O rabino Arthur Schneier, 78 anos, que viveu sob a ocupação nazi em Budapeste e emigrou para os Estados Unidos da América em 1947, é o responsável desde 1962 pela sinagoga, em Nova Iorque, que irá receber a visita do pontífice a 18 de Abril.

Bento XVI, 80 anos e de origem alemã, foi em adolescente, aos 14 anos, membro da juventude nazi, tendo participado mais tarde na II Guerra Mundial, da qual desertou em 1944 sob risco de pena de morte.

Esta será a segunda visita do pontífice a uma sinagoga.

Na primeira visita papal ao estrangeiro, em 2005, Bento XVI visitou uma sinagoga em Colónia, Alemanha, que foi reconstruída após ter sido destruída durante o regime nazi.

«Com esta visita pessoal e informal, que não faz parte do programa oficial, Sua Santidade deseja expressar a sua boa vontade perante a comunidade judaica, no momento de preparação da Páscoa Judaica», afirmou David Monsenhor Malloy, secretário-geral da Conferência norte-americana dos Bispos Católicos.

Durante a viagem, o pontífice irá reunir-se com outros dirigentes judaicos e representantes de outras religiões.

Ainda em Nova Iorque, a agenda papal incluirá uma visita e discurso na sede das Nações Unidas e uma deslocação ao Ground Zero, o local dos atentados do 11 de Setembro.

No programa de Bento XVI, que estará nos EUA de 15 e 20 de Abril, estão agendados também encontros com cardeais, bispos e representantes de associações de caridade norte-americanas, estando ainda prevista a celebração de uma missa no Estádio Nacional.

No dia da chegada, em Washington, Bento XVI será recebido pelo presidente norte-americano, George W. Bush.

Fonte: Diário Digital/Lusa(03.04.2008)

O Holocausto: verdade e preconceito - parte 4

Os comunistas, por exemplo: historicamente, desde os primeiros teóricos do socialismo da metade do século XIX, tiveram problemas conceituais com os judeus (inclusive muitos comunistas judeus). Não é preciso recorrer ao anti-semitismo da era stalinista para chegar a essa conclusão. Ser de esquerda e ser anti-semita não são propriedades incompatíveis, desde Proudhon. Não foi Marx que, em seu período de juventude, escreveu "A Questão Judaica", no qual sustentou uma teoria de afinidade entre o judaísmo e o capitalismo?

De modo geral, a "questão judaica" foi utilizada tanto pela esquerda como pela direita: foi álibi no último período do czarismo russo, dividiu a França no Caso Dreyfus (final do século XIX), foi o centro do anti-semitismo de massas na Áustria e na Alemanha (ligado ao pangermanismo) e até incidiu no fraudulento Plano Cohen, utilizado como um dos pretextos para a implantação do Estado Novo no Brasil.

Atualmente, nos países da Europa Oriental, ex-comunistas, o anti-semitismo se reproduz como mutação da antiga tradição antijudaica clerical, como demonstrou Paul Hockenos (1988). No mundo ocidental do pós-guerra, rearticulou-se o preconceito hostil, amoldando-se a populismos e sistemas de crenças que pretendem explicar problemas complexos, como o conflito entre israelenses e palestinos, por meio de esquematismos irracionais. Em certos casos, quando acentuadamente rígidos e associados a uma causa determinada, tais sistemas acorrem à paranóia da conspiração judaica.

Das novas racionalizações anti-semitas, a mais difundida é o anti-sionismo, agasalhado oficialmente pela esquerda comunista ocidental. No Brasil, introduziu-se em um estrato esquerdista-fundamentalista, ativo no PSTU e no PCO, assim como em tendências ultra-radicais do PT e do MST, onde uma esquerda monástica cumpre papel importante na conformação ideológica de uma revolução campesina e na hostilidade a tudo que representa (estou falando de estereótipo) o capitalismo que escraviza o Terceiro Mundo.

O anti-sionismo é uma fórmula excêntrica, presente nesses meios esquerdistas, como nos setores direitistas e integristas; e - é claro - um motivo preferencial, exaustivamente difundido pelos negacionistas. A fórmula é excêntrica pelas razões expostas com clareza e simplicidade por Yehuda Bauer[7], numa conferência feita nos EUA:
O conflito árabe-israelense, e agora a confrontação entre israelenses e palestinos, fornece amplo material para o anti-semitismo que se vê como anti-sionista e não antijudaico. Certamente, alguém pode ser anti-sionista sem ser anti-semita, mas somente se disser que todos os movimentos nacionais são malignos, e todos os estados nacionais devem ser abolidos. Mas, se alguém diz que o povo das Ilhas Fiji têm o direito de independência, e da mesma forma os malaios ou os bolivianos, mas os judeus não possuem tal direito, então esse alguém é anti-semita e na medida em que exclui os judeus por razões nacionalistas, é anti-semita e sobre ele recai uma forte suspeição de ser racista (Bauer, 2003:2).
A crença na ilegitimidade do Estado de Israel atualiza, no campo do discurso político radical, uma retórica agressiva e mistificatória quando se expressa por meio de seus representantes mais descontrolados. Nesses casos, reúne seu habitual panfletarismo com clichês que busca no negacionismo. Da fusão resultam acusações perturbadas, tais como as que financistas judeus levaram Hitler ao poder, que os sionistas foram aliados do nazismo ou que Göering era judeu.

Melanie Philips, em outro artigo, desta feita publicado no Daily Mail de Londres, em 22 de março de 2003, procurou penetrar mais fundo na caracterização do novo anti-semitismo que se vê legitimado por ser anti-sionista. Para ela, tal fenômeno tem relação com a mentalidade política européia com respeito a Israel:
A Europa estava aguardando, por mais de meio século, um modo de culpar os judeus por sua própria destruição. Assim, ao invés de soar o alarme devido ao ódio genocida islâmico contra os judeus, os europeus têm avidamente adotado a nazificação dos judeus, um processo que de fato teve início com a desastrosa invasão israelense do Líbano, em 1982. Esse fato marcou o início de uma sistemática inversão que faz da autodefesa de Israel uma agressão, juntamente com critérios duplos e fabricações maliciosas que nada têm a ver com a legítima (e necessária) crítica à Israel e tudo a ver com a deslegitimação do estado judeu, juntamente com a disposição pelos seu desmantelamento (Philips, 2003).
Nada, no caso desse anti-semitismo de rejeição à existência de Israel pode ser confundido, como salientaram Bauer e Philips com algum tipo de crítica às políticas israelenses. Essa é outra confusão maliciosa, constantemente reiterada por anti-semitas. A malícia chega a ser grosseira porque uma rápida observação revela que a idéia de anti-sionismo não tem equivalente histórico, especialmente depois da era colonial. Ele não expressa um sentimento contra determinadas práticas ou políticas ou mesmo quanto à hegemonia de um país. Ele em nada é semelhante ao sentimento anti-americano, por exemplo. Você pode ser anti-americano por alguma razão, mas você não pensa que a existência dos EUA é ilegítima. Pessoas podem ter idéias contrárias, fundamentadas ou não, sobre as políticas de qualquer país. Mas não são idéias sobre a legitimidade da existência desse país, seja lá qual for. Ninguém jamais lançou dúvidas sobre a legitimidade da existência da Alemanha ou de Bengaladesh ou de qualquer outra nação.

A exceção é o anti-sionismo, que é permeado pelo preconceito anti-semita. Como tal, suas críticas a Israel são sempre existencialmente comprometidas, ou seja, sempre estão agregadas à agenda da ilegitimidade sionista. Idéia que combina traços de psicopolítica do ódio e conspiranóia, expressões que se aplicam ao anti-semitismo concentrado na rejeição a um estado judeu. Por ser uma deformação ideológica, explica-se porque, entre os disparates já citados e outros, os praticantes desse anti-semitismo de Estado, chegam a acusar os judeus de anti-semitas, de nazistas e a propor comparações paranóides entre a situação atual dos palestinos e a situação dos judeus europeus durante a 2ª Guerra.

Uma característica comum ao negacionismo e ao anti-semitismo de Estado é o uso da malícia semântica. Os judeus são acusados de semitas anti-semitas (sic) porque os palestinos também são semitas (sic) e os territórios palestinos estão ocupados militarmente por judeus. A imagem produzida não poderia ser mais repugnante: judeus oprimindo semitas, como os nazistas faziam.

O sofisma é duplamente pervertido, por causa da sua premissa (pois não há semitas) e da sua desconexa conclusão, segundo a qual os sionistas agem, com relação aos palestinos, como os nazistas. Quando nos defrontamos com esse tipo de insanidade, lembro que fazer ou falar uma bobagem é muito mais fácil do que desfazê-la ou desmenti-la. Assim, tentemos desmontar essa confusão elaborada por propagandistas profissionais.

Os territórios palestinos realmente estão ocupados desde 1967, mas isto não faz dos israelenses anti-semitas e, muito menos, permite que sejam comparados a nazistas, ou pior, ligados a nazistas. A ocupação tem uma história, está inserida num contexto de disputa e não será definitiva; mais ainda: os direitos nacionais do povo palestino à autodeterminação são reconhecidos por todos, inclusive por Israel. O problema é, no entanto, gravíssimo. Ele diz respeito aos israelenses e aos palestinos, além de regionalmente envolver jordanianos, egípcios, sírios e libaneses, assim como as potências internacionais.

De todo modo, só quem não sabe o que foi o nazismo ou o que foi o Holocausto é capaz de comparar a ocupação israelense às ocupações da Alemanha nazista dos territórios que dominou. Para se ter a medida desta comparação, basta constatar que se trata, mais uma vez, de uma comparação em isolamento. Ninguém chama os chineses de nazistas por terem anexado o Tibet, ou os ingleses por ocuparem a Irlanda do Norte, ou os russos porque ocupam a Chechênia, ou os espanhóis porque não concedem autodeterminação aos bascos, ou os turcos por abafarem as pretensões nacionalistas dos curdos, ou os sírios, por ocuparem militarmente parte do território libanês.

Da mesma forma, é absurda a alegação de que judeus sionistas oprimem um povo semita (os palestinos). Do ponto de vista social, cultural ou político, o termo semita não tem sentido, pois não há semitas, a não ser que se deseje discutir lingüística, porque a língua árabe e a língua hebraica (próximas entre si como o francês e o português), pertencem ao mesmo tronco. Nesse sentido - o único coerente-, ser semita é como ser falante de uma língua que pertence a um mesmo tronco lingüístico. Seria o mesmo que ser anti-latinista ou anti-swaili.

O anti-semitismo é um preconceito e o que define o termo o é o seu uso social, político e cultural. "'Anti-semitismo' representa o ressentimento contra os judeus.e refere-se à concepção dos judeus como um grupo estranho, hostil e indesejável e às práticas que derivam dessa concepção e a sustentam" (Bauman, 1988:54).

Anti-semitismo é sinônimo de antijudaísmo. Utilizá-lo em qualquer outro sentido é fazer o jogo de palavras dos anti-semitas, que acusam os judeus enquanto povo ou os sionistas (isoladamente há obviamente indivíduos judeus anti-semitas e anti-sionistas) de anti-semitismo. Na época em que foi concebido, o termo "anti-semita" foi circunscrito pela especificidade anti-judaica, como Bauer elucida:
O termo "anti-semitismo" é, como muitos de nós percebemos, o termo errado para aquilo que tentamos descrever e analisar. Ele foi cunhado, paradoxalmente, por um anti-semita, Wilhelm Marr, em 1879, porque ele necessitava de um novo termo para [designar] o ódio aos judeus. O antigo, Judenhass, era identificado como um termo de apelo cristão, basicamente teológico, e Marr era anticristão, porque o cristianismo fora, e nisso ele estava correto, uma invenção judaica. O novo termo soava científico, não mencionava judeus, mas todos sabiam o que ele significava e a quem era dirigido: ele descrevia um fenômeno recentemente desenvolvido, de abordagem nacionalista e bio-racial. Anti-semitismo, especialmente tal como pronunciado, é um absurdo vazio, porque não existe semitismo contra o qual você possa ser. Existem linguagens semíticas e dificilmente você pode ser contra linguagens semíticas. Passamos a usar "anti-semitismo" para descrever a aversão aos judeus desde os dias de Manetho, o sacerdote egípcio de cerca de 300 A.C., cujos comentários sobre os judeus formavam uma combinação de desprezo e ódio, provavelmente motivado pelo assentamento dos judeus em Alexandria. Não há diferenciação no [uso do] termo anti-semitismo, entre um ódio leve, moderado ou radical contra os judeus, ou um fenômeno que pode ser facilmente explicado por uma aversão geral a estrangeiros ou ainda um ódio ou aversão concentrados nos judeus.

O termo é apropriado apenas ao ódio aos judeus לאשי תאנש, desde aproximadamente a metade do século XIX. Mesmo então, a mistura da oposição cristã e muçulmana aos judeus, da inveja econômica e à competitividade tradicional e dos motivos bio-raciais e nacionalistas ideológicos, torna difícil incluir tudo isso nesse termo essencialmente errôneo. Ele traz confusão a programas de pesquisa, assim como interfere com objetivos de diferenciação. De qualquer modo, todos o usamos, simplesmente porque não elaboramos uma terminologia apropriada. Assim, mesmo sabendo que estamos falando de um absurdo quando usamos o termo, que o usemos, faute de mieux. (Bauer, 2003:1).
O anti-semitismo é um fenômeno da modernidade e tal como é hoje praticado, expressa confusa e cumulativamente tanto o antigo ódio ou desprezo aos judeus como o preconceito que deixou de ser motivado por uma apologética religiosa e entrou para a política por meio de uma modalidade "científica". O jargão negacionista e anti-semita reproduz intencionalmente atavismos discriminatórios e faz uso de simulações semânticas esdrúxulas, que servem a extremistas, de direita e de esquerda. Como propaganda continua alimentando uma retórica que se mostra especialmente exacerbada e fantasiosa junto aos grupos radicais e fundamentalistas, desde o Irã até os conhecidos Hamas, Hezbolá e Jihad Islâmica[8].

O anti-sionismo é uma heterofobia de Estado, movido pela crença na ilegitimidade de Israel, que assim personifica um judeu coletivo. Esse desvio de compreensão política se faz ouvir por vozes de intelectuais de uma esquerda supersticiosa e por seu chamado jornalismo de tendência – o melhor exemplo, no Brasil é a revista Caros Amigos; e quando não é insinuado, é defendido abertamente por uma intelectualidade orgânica ligada a esta esquerda emburrada (nos dois sentidos), que se imagina fortalecida, quando, em verdade, mostra apenas que está empanturrada do velho e pernicioso anti-semitismo.
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[1] Bartov refere-se ao testemunho de David Wodowinski, no julgamento de Adolf Eichmann, registrado na página 1117 da coletânea The Attorney General against Adolf Eichmann:Testimonies, vol. 2 (Jerusalem, 1974- hebraico), citado no livro de D. Michman, The Holocaust and Holocaust Research: Conceptualization, Terminology and Basic Issues, Tel Aviv, 1998, p. 232. Kadish é o nome da prece dedicada aos mortos, na religião judaica.

[2] Sobre os mischlinge, Ver Raul Hilberg, The Destruction of the Eurupean Jews, New-York – London, Holmes and Meyer, 1985 e mais detalhadamente, Bryan Mark Rigg, Os soldados judeus de Hitler, Imago, Rio de Janeiro, 2003.

[3] Foram mortos cerca de 18 milhões de civis europeus durante a guerra. Um em cada três era judeu.Para detalhes sobre o número de vítimas e sobre como se processou o Holocausto desde o início da guerra, cf. Raul Hilberg, op. cit. e Yehuda Bauer, A History of the Holocaust, New York, Franklin Wats, 1982.

[4] A documentação da hecatombe é vasta, bem como o testemunho de sobreviventes e de agentes do extermínio. Algumas das obras mais importantes da histografia crítica sobre o assunto estão referidas na bibliografia que acompanha os ensaios dessa coletânea.

[5] Para maiores detalhes da reunião, ver Mark Roseman, Os Nazistas e a Solução Final. A conspiração de Wanssee: do assassinato em massa ao genocídio, RJ, Jorge Zahar, 2002.

[6] Cf. Zygmunt Bauman, A Modernidade e o Holocausto, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editores, 1998. pp. 57-82.

[7] Autor de uma vasta obra sobre o Holocausto e o anti-semitismo, Yehuda Bauer escreveu, entre outros, Antisemitism today: Myth and Reality. Jerusalem: Hebrew University. Institute of Contemporary Jewry, 1985; A history of the Holocaust. New York: Franklin Watts, 1982; Jews for sale?: Nazi-Jewish negotiations, 1933-1945. New Haven: Yale University Press, 1994 e Rethinking the Holocaust,New Haven, Yale University. 2001.

[8] Deve-se registrar que há intelectuais árabes e palestinos que sempre denunciaram o anti-semitismo e o negacionismo. Um dos mais conhecidos, Edward Said, faleceu em 2003. Quanto à incorporação ideológica do anti-semitismo no mundo árabe, cito dois exemplos: o primeiro em nível programático e o segundo em nível de mídia de massa. Em 19 de agosto de 2003, um dos líderes principais do Hamas, Abdal Aziz Al Rantizi, publicou o artigo "Qual é o pior - O Sionismo ou o Nazismo?", no seu site (www.rantisi.net ) no qual cita os negacionistas Roger Garaudy e David Irving para sustentar que o Holocausto não ocorreu e que os sionistas colaboraram com os nazistas. Segundo ele, financistas judeus e bancos sionistas ajudaram os nazistas a chegar ao poder com grandes contribuições em dinheiro. O objetivo dos sionistas era, segundo Rantizi, aterrorizar os judeus a ponto de fazê-los migrar para a Palestina. No segundo caso, Em 2002, uma série em 41 capítulos foi exibida na televisão egípcia, que apresentava como verdadeiros os Protocolos dos Sábios de Sião. A imprensa egípcia registrou protestos de alguns intelectuais egípcios contra a série, que alertavam para o uso político de uma fraude e de métodos de propaganda racista, ao mesmo tempo em que configurava um erro tático, pois o Egito mantêm relações com Israel, que embora congeladas, em virtude dos últimos dois anos de sangrento conflito entre israelenses e palestinos, esse país não rompeu nem pretende romper.

Fonte: Revista Espaço Acadêmico, Nº43, Dezembro de 2004, Mensal, ISSN 1519.6186
Autor: Luis Milman(Doutor em Filosofia, professor da UFRGS)

O Holocausto: verdade e preconceito - parte 3

Patologia reatualizada

Negar o Holocausto é impossível, embora os esforços da indústria negacionista que opera há 30 anos, metódica e regularmente, nos principais países do mundo. Mas não é apenas no negacionismo que se percebe o renascimento do anti-semitismo. O investimento simultâneo na humanização de Hitler (e de seu regime) e na satanização dos judeus são os extremos da heterofobia anti-semita. Entre tais extremos, há sentimentos mais ou menos intensos, que podem ir da antipatia à aversão, do embaraçado pré-conceito ao preconceito aberto, que não se restringem a fanáticos. Por isto a indústria da mentira gera frutos e não são poucas as pessoas que continuam acreditando que, de alguma forma, os judeus estão no centro causal dos problemas do mundo.

Também por isto, mais fortalecida fica a idéia anti-semita a ponto de ser integrada em programas políticos radicais, de direita, esquerda ou fundamentalistas religiosos, como de fato tem ocorrido na Europa, EUA, Argentina e Brasil, assim como na maior parte dos países do Leste Europeu e nas nações muçulmanas. Os negacionistas repetem que, na década de 40, a Alemanha foi levada à guerra pelos judeus; os campos de extermínio não existiram e o regime hitlerista jamais cometeu as atrocidades que lhe são atribuídas.

Para alguém razoavelmente esclarecido, tais argumentos não passam de chicana repulsiva, mas convém lembrar do alerta de Hannah Arendt: não é a estupidez da idéia ou a desfaçatez dos argumentos, mas sua existência política e o fato dela ser acreditada por muitos que deve nos preocupar. O anti-semitismo, em si mesmo, é um tipo de reducionismo persecutório e racista, mas isso não impediu que se estabilizasse como modalidade amplamente difundida de preconceito ou se materializasse na política, mesmo antes que qualquer coisa parecida com o Holocausto fosse sequer imaginada.

O anti-semita extrovertido e ideologicamente ativo crê na força persuasiva de uma aparição projetiva de sua ideologia. Aparição que usa para tentar convencer ou persuadir pela repetição. Nos anos 50, Hannah Arendt escreveu que o anti-semitismo era uma ofensa ao bom senso, devido à sua condição paradoxal de motivo mistificador insignificante em meio a tantas questões políticas vitais (Arendt: 1998:23). A constatação, sem dúvida válida também hoje, diz respeito a uma ideologia que depende exclusivamente da aparência que seus propagadores produzem, sejam eles demagogos simplesmente ou demagogos fanatizados, que crêem nas mentiras que divulgam. Os anti-semitas autênticos cristalizam a fraude como verdade e fazem dela um "pensamento estereotipado", que dá início à heterofobia ou antagonismo irracional, a que se referiram Marie Jahoda e Nathan W. Ackerman. (1969:26-7).

Por essas discrepâncias que existem na sociedade, muito se sabe e muito ainda se descobre sobre o Holocausto, ao nível da pesquisa sociológica, historiográfica e da reflexão filosófica. O assunto é muito investigado nas universidades e centros de pesquisa da Europa, EUA e Israel. Entretanto, as pessoas em geral são ignorantes sobre o tema, inclusive no meio universitário.

A indiferença intelectual e acadêmica quanto ao negacionismo e, pior, uma certa complacência desses meios com respeito a formas de anti-semitismo que freqüentam meios políticos mais à esquerda é sintomática. Há exceções, mas a regra é esta. Como conseqüência ainda que indireta desse desprezo e dessa complacência, atualmente não se estranha mais que, dependendo da situação e do lugar, não seja difícil dizer que os judeus desejam se apropriar da condição de vítimas do morticínio ou que o número de judeus assassinados é comparativamente exagerado quando confrontado com o número de vítimas das atrocidades cometidas pelos nazistas. Esse tipo de falsidade não é raro e, atualmente, tem sido requisitado por um cada vez mais aceitável anti-sionismo.
Assim, a singularidade do negacionismo reprisa a singularidade do anti-semitismo e se configura como um dogmatismo sociológico. Em vista da ignorância média das pessoas sobre o Holocausto, esse dogmatismo ocupa as margens da institucionalidade acadêmico-científica, como pretensa versão da História, reveladora de "questionamentos e fatos novos" e, desse modo, chega a ser vista como plausível por muitos, como demonstram o crescimento de uma direita radical na Europa e, obviamente, a sua recepção por setores ideologicamente extremistas de esquerda.

Melanie Philips, colunista do Daily Mail, em artigo publicado em 1988 no The Jewish Quarterly (citado por Zygmunt Bauman)[6], expressou o sentimento que recai sobre indivíduos que afirmam seu judaísmo nos meios políticos da esquerda atual, menos instruídos no que diz respeito à condição judaica e seus traços culturais ou nacionais: "Tenho grande prazer em dizer aos meus amigos e conhecidos socialistas" – afirmou ela – "que 'sou de uma minoria étnica' e vê-los se enrolando, histéricos. Como pode ser? Sou poderosa. E a impressão dos socialistas é de que os judeus estão em posição de poder. Eles estão no governo, não estão? Eles dirigem coisas, comandam a indústria, são proprietários de terras" (Phiilips, apud Bauman, 1998: 256, n. 12).

A impressão a que Melanie Philips se referia não é apenas de certos tipos de socialistas, ou de quem têm a tendência histórica de ver os judeus como estamento econômico. O sentimento possui características de um fenômeno multicausal, é socialmente espalhado e, em certa medida, chega a ser até "aceitável". Aqueles que sustentam a negação do Holocausto inegavelmente contam com a eficácia deste preconceito, ainda que subjacente e de difícil detecção, quando não estimulado por alguma ideologia específica.

Essa multicausalidade é própria da condição judaica na modernidade, que se revestiu de relevância política despropositada e assumiu contornos de estereótipo persistente, de uma nova tipologia de discriminação intelectual, ideológica e racial, ativa tanto à direita como à esquerda do espectro político, desde o século XIX.

Fonte: Revista Espaço Acadêmico, Nº43, Dezembro de 2004, Mensal, ISSN 1519.6186
Autor: Luis Milman(Doutor em Filosofia, professor da UFRGS)

sexta-feira, 4 de abril de 2008

O Holocausto: verdade e preconceito - parte 2

O crime e a barbárie

No Julgamento de Nuremberg, (20 de novembro de 1945 a 01 de outubro de 1946), foi usado pela primeira vez, pela acusação, e consolidado pelas sentenças impostas aos hierarcas nazistas condenados, o termo "genocídio", cunhado pelo jurista polonês Raphael Lemkin, que morreu em 1959. Lemkin, judeu, na faixa dos 30 anos, fugiu da Polônia quando seu país foi ocupado, após combater na resistência polonesa durante seis meses.

Ferido, escapou para a Suécia, onde afirmou uma carreira universitária na área de direito e relações internacionais, iniciada ainda na Polônia. Em 1941, foi convidado a lecionar nos Estados Unidos, onde continuou a trabalhar em estudos sobre a tipificação jurídica e a responsabilização criminal de assassinatos em massa perpetrados por estados contra populações civis. Lemkin decidira, nos anos 30, estudar o assunto devido ao genocídio armênio. Por suas pesquisas, e então um respeitado jurista e professor da Duke University e da Yale University, foi designado conselheiro legal de Robert Jackson, Promotor-Chefe dos Estados Unidos, na Direção Para Persecução Criminal do Tribunal Militar de Nuremberg. Lemkin também teve participação destacada na redação da Convenção sobre Genocídio, aprovada pela Assembléia Geral da ONU, em 8 de dezembro de 1948, dois antes da aprovação da Declaração Universal dos Direitos do Homem. Lemkin cunhou o termo "genocídio", num estudo realizado em 1943 e publicado como livro em 1944:
Novas concepções solicitam novos termos. Por "genocídio" queremos significar a destruição de uma nação ou de um grupo étnico. Essa nova palavra, cunhada pelo autor para denotar uma antiga prática em seu moderno desenvolvimento, é formada pela antiga palavra grega genos (raça, tribo) e a palavra latina cide (assassinato), assim correspondendo, em sua formação a palavras tais como tiranicídio, homicídio, infanticídio, etc. Falando genericamente, o genocídio não significa necessariamente a destruição imediata de uma nação, exceto quando acompanhada de assassinatos em massa de todos os membros de uma nação. Ela pretende antes significar um plano coordenado, com distintas ações, que possui a intenção de destruir as fundações essenciais da vida de grupos nacionais, com o propósito de aniquilação desses grupos. Os objetivos de um plano desse tipo seria a desintegração das instituições políticas e sociais, da cultura, da linguagem, dos sentimentos nacionais, da religião e da existência econômica de grupos nacionais, e a destruição a segurança pessoal, da liberdade, da saúde, da dignidade e mesmo da vida dos indivíduos que pertencem a tais grupos. O genocídio é direcionado contra o grupo nacional como entidade, e as ações envolvidas são dirigidas contra indivíduos, não em sua capacidade individual, mas enquanto membros de um grupo nacional (Lemkin, 1944:79).
O tribunal determinou que "os acusados conduziram um genocídio sistemático e deliberado – o extermínio de grupos raciais e nacionais - contra poloneses, populações civis de certos territórios ocupados, com o propósito da destruição de raças particulares e classes de pessoas e grupos nacionais, raciais ou religiosos, particularmente judeus, poloneses, ciganos e outros".

O termo cunhado por Lemkin foi, pela primeira vez, usado nessa sentença. Mas o que deve ser compreendido, para além dessa tipificação, são as características singulares do genocídio praticado contra os judeus. Para tanto, é fundamental fazer uma observação: o Holocausto não diz respeito apenas aos judeus. Ele é parte da história humana e seu incidência na história demanda uma capacidade de análise crítica sobre os alicerces da própria civilização moderna e seus valores.

O termo Holocausto traduz, por tradição, embora erroneamente, a palavra hebraica Shoah, (literalmente catástrofe ou hecatombe). Perceber as características singulares da Shoah e de suas conseqüências para a própria existência dos judeus como povo é uma coisa. Afirmar que os judeus foram as únicas vítimas de genocídio cometido pela Alemanha nazista não passa de uma infeliz fabulação e não sei de ninguém que tenha sustentado tamanho disparate. Não esqueçamos: houve genocídios anteriores, no século XX, praticados pelos curdos, persas e turcos contra os assírios (entre 1914 e 1918), pelos turcos contra os armênios (entre 1915 e 1923) e pelos belgas no Congo (entre 1885 e 1920), assim como matanças de ocupação, como a praticada por Mussolini na Etiópia.

Os nazistas tiveram predecessores, sem dúvida. Mas se especializaram nessa atrocidade, porque a tornaram essencial para sua geopolítica racial, fundamentada na agressão militar, numa obstinada determinação de eliminar um povo inteiro e na conquista e "arianização" territorial. Dizimaram massivamente, além de judeus, pessoas de "raças" que consideravam inferiores.

Quanto aos ciganos, a outra raça a ser eliminada da Europa, muito se tem estudado e pesquisado. Em Auschwitz-Birkenau havia três crematórios funcionando diariamente, capazes de incinerar 10 mil seres humanos por dia. Parte das vítimas entre os ciganos foi assassinada nesse campo de morte, outra parte em fuzilamentos, enforcamentos, e atrocidades, como as cometidas contra pessoas (crianças, sobretudo) transformadas em cobaias do staff da ciência médica do 3º Reich, em suas "pesquisas e experiências". Cerca de 250 a 500 mil ciganos foram mortos na Europa ocupada pelos nazistas.

Também os poloneses foram vítimas diferenciadas de extermínio. 4 milhões deles foram dizimados, a imensa maioria de civis. A intelectualidade polonesa foi exterminada, em assassinatos que se seguiram à ocupação do país, em campos de concentração e, depois, nos campos de morte, que começaram a operar na no final de 1941. Centenas de milhares morreram ao serem deslocados, quando seu país foi conquistado e dividido em duas partes - a ocidental, incorporada ao Reich, e a oriental, rebatizada como Governo Geral. A parte ocidental foi despolonizada, e destinada à colonização ariana. Poloneses do território incorporado ao Reich foram progressivamente transferidos para o Governo Geral, onde morreram aos milhares em condições sub-humanas.

Outros grupos humanos foram alvos dessas matanças de proporções inimagináveis. Milhares de Testemunhas de Jeová, por convicção ideológica, homossexuais, prisioneiros políticos e opositores do nazismo, doentes mentais. membros da resistência dos países ocupados; milhões de civis russos e ucranianos – afora os soldados em confrontos militares -, prisioneiros de guerra, em campos de trabalho e de extermínio, além de dezenas de milhares de sérvios, após a invasão da Iugoslávia.
Na Europa Ocidental, onde a ocupação alemã tinha características distintas, a política de extermínio foi praticada apenas contra os judeus e membros da resistência. A hecatombe provocada pelo nazismo - cujo único instrumento de ação política eram o terror e a matança -, sem dúvida, abalou os alicerces da humanidade. Na guerra do Pacífico, o expansionismo japonês foi marcado pela insanidade assassina, causando a morte de 15 milhões de chineses.

Singularidade

O que torna, afinal, o Holocausto, uma catástrofe singular. Responder a essa questão não é tarefa difícil, à primeira vista. No entanto, é preciso fixar limites para a compreensão da categoria da singularidade, quando aplicada a matanças em larga escala, dos quais os judeus, no século XX, não foram as únicas vítimas. Logo, singularidade se distingue de unicidade ou exclusividade. Armênios e assírios foram exterminados no início do século. Bósnios foram alvos de matança coletiva na década de 90. Tutsis de Ruanda e cristãos e animistas do Sudão, da mesma forma, foram exterminados aos milhões pela elite muçulmana sudanesa. O extermínio de chineses na era de Mao e de russos, ucranianos, georgeanos na era de Stalin são hoje suficientemente conhecidos.

É justamente nesse contexto que o genocídio judeu se singulariza. Primeiro, porque contra os judeus foram aplicados os métodos jamais imaginados de extermínio; segundo, porque os judeus foram destinados a desaparecer completamente como povo[4]; terceiro; porque contra os judeus, os nazistas travaram uma guerra racial, sem qualquer outro objetivo que não fosse o de exterminá-los completamente; quarto, porque nunca se configurou uma burocracia e uma indústria voltada para a matança de seres humanos tal como a construída pelos nazistas; quinto: não havia salvação dessa matança, que ocorreu em fases distintas e foi sendo paradoxalmente incrementada na medida em que os alemães percebiam que não tinham mais qualquer chance de vencer a guerra.

Em menos de quatro anos, quase 6 de cerca de 12 milhões de pessoas pertencentes a um grupo étnico-cultural simplesmente foram assassinadas em massa. 4.110 por dia, em média, sem distinção entre homens, mulheres, jovens crianças e velhos. Discute-se, entre historiadores, quando a eliminação total da população judaica foi decidida e tudo indica que Hitler e seus hierarcas tomaram essa decisão logo após a ocupação da Polônia. O genocídio foi iniciado na segunda metade de 1941 e sua implementação foi tema de deliberação específica, como demonstra o documento classificado como Geheime Reichssache (assunto secreto do Reich), descoberto por assistentes da Promotoria dos EUA, em março de 1947, e utilizado como prova nos julgamentos de criminosos de guerra que se seguiram ao Julgamento de Nuremberg, inclusive no julgamento de Adolf Eichmann.

O documento ficou conhecido como o "Protocolo de Wanssee" e integrava um conjunto de 18 atas (as demais 17 jamais foram recuperadas) lavradas durante uma reunião de 15 altos funcionários do Reich - entre eles Adolf Eichmann, que o secretariou - com Reinhard Heydrich, então o segundo em comando no Sicherheitspiolizei (RSHA - Serviço de Segurança Nacional) e também encarregado dos territórios tchecos ocupados. Heydrich só era subordinado a Heinrich Himmler, Chefe das SS (a Schutztaffel), que se reportava apenas a Hitler.

A reunião foi realizada em 20 de janeiro de 1942, num castelo às margens de um lago Wanssee, a sudoeste de Berlim[5]. O assunto: operacionalizar, em todos os níveis administrativos e logísticos, a solução final para a questão judaica, que já havia iniciado com a construção dos campos de extermínio em Chelmno e Belzec. Em Chelmno, em dezembro de 1941 foram mortos por gás os primeiros judeus. O genocídio tomaria as proporções que hoje conhecemos quando os alemães invadiram a União Soviética, com o propósito de varrer do mundo o bolchevismo e o judaísmo, que eles tinham como irmãos políticos.

Fonte: Revista Espaço Acadêmico, Nº43, Dezembro de 2004, Mensal, ISSN 1519.6186
Autor: Luis Milman(Doutor em Filosofia, professor da UFRGS)

quarta-feira, 2 de abril de 2008

O Holocausto: verdade e preconceito - parte 1

Desde 15 de setembro de 1935, quando foram decretadas a Lei de Cidadania do Reich, a Lei de Proteção do Sangue e da Honra Alemãs e o Primeiro Regulamento para a Lei de Cidadania do Reich - este em 14 de novembro de 1935 (o conjunto dos três ficou conhecido como as Leis de Nuremberg)-, a condição judaica foi transformada numa sub-condição humana na Alemanha e os judeus foram desprovidos de qualquer vestígio de direitos civis. A definição de "judeu" consta do Primeiro Regulamento, Artigo V:

1. Um judeu é um indivíduo que descende de pelo menos três avós que eram judeus racialmente puros. O Artigo II, parágrafo, alínea linha 2 será aplicado. (Art. II, alínea 2: um indivíduo de sangue misto judeu é aquele que descende de um ou dois avós que eram judeus racialmente puros, mesmo que não seja um judeu de acordo com a seção 2 do Artigo V. Avós com 100 por cento de sangue judeu são aqueles que pertenciam a comunidade religiosa judaica).

2. Um judeu é também um indivíduo que descende de dois avós puramente judeus:

(a) se era membro de uma comunidade religiosa judaica quando esta lei foi editada, ou se integrou a uma, após a edição desta;

(b) quando a lei foi editada, era casado com uma pessoa judia ou foi subseqüentemente casada com um indivíduo judeu;

(c) é descendente de um casamento no qual um dos cônjuges é judeu, no sentido da seção 1, contraído após a entrada em vigor da Lei para Proteção do Sangue e da Honra Alemã, de 15 de setembro de 1935;

(d) é descendente de uma relação extraconjugal que envolveu um judeu, de acordo com a Seção 1, e nasceu ou é filho ilegítimo nascido depois de 31 de julho de 1936.
Não era possível a qualquer pessoa tipificada pelo regulamento, abdicar da sua condição judaica; por conseqüência, conversos ao cristianismo, que se enquadrassem na categoria regulamentar eram considerados judeus. Assim definidos pelos nazistas, inicialmente banidos da vida social e civil da Alemanha e depois dos territórios que caíram sob seu domínio ou influência, depois confinados e exterminados, não importava, se entre eles, houvesse quem se considerava ateu, agnóstico, protestante, católico, comunista, anarquista ou qualquer outra coisa. No livro Mirrors of destruction. War, Genocide and Modern Identity, o historiador Omer Bartov refere um dos inúmeros casos vividos por pessoas que retornaram, por imposição das Leis de Nuremberg, a uma condição judaica que lhes era estranha e distante antes da chegada de Hitler ao poder:

Bauchwitz, um prisioneiro do campo de trabalho de Stettin, fora batizado quando criança. Quando o comandante do campo decidiu enforcá-lo, ele exigiu ser executado por um pelotão de fuzilamento, em reconhecimento à sua condição de oficial alemão durante a 1ª Guerra, na qual recebeu a Cruz de Ferro de Primeira Classe. O comandante respondeu. "Para mim você é um judeu fedorento e será enforcado como tal". Ao ser colocado no patíbulo, Bauchwitz, pediu aos demais prisioneiros, "Se vou morrer como judeu, peço a vocês judeus que digam o Kadish depois de mim" (Bartov, 2000:144).[1]
Os nazistas enfrentaram problemas técnico-jurídicos com aqueles que tinham o status de "terceira-raça", os mischlinge, muitos dos quais pertenciam a uma '"primeira classe" e estavam integrados a famílias alemãs "puras", logo pretendiam ser quase arianos. Houve doze decretos posteriores editados para tratar desse assunto - objeto de discussão também em Wannsee (ver abaixo), nos quais foram introduzidas as categorias de mischlinge de ordem 1 (descendentes de um avô judeu) e 2 (descendente de dois avós judeus, não pertencente à religião judaica e não casado com um judeu até 15 de setembro de 1935). Para a quase totalidade desta terceira raça, a solução foi o isolamento civil, depois o aprisionamento em asilos e, ao fim a deportação e o extermínio. Houve milhares de mischilinge, por decretos conhecidos como normas de libertação, que foram arianizados e alguns chegaram mesmo a exercer cargos na alta burocracia nazista, além de milhares terem servido no exército e mesmo nas SS.[2]

Agora passemos aos números. Há um certo momento em que a discussão sobre o Holocausto é colocada em escala numérica. A primeira constatação a ser feita sobre esse tipo de parâmetro analítico é que não há um número exato de vítimas, e a razão para tanto é simples: o genocídio foi praticado em escala total. Jamais houve condições para estabelecer um número definitivo porque é impossível identificar individualmente todas as vítimas do Holocausto. A metodologia de escala, pode, por isso, oscilar. O número levado ao tribunal de Nuremberg foi de 6 milhões de judeus. Mas, depois de iniciado com políticas de segregação e isolamento, a matança fez, segundo as menores estimativas, com que entre 5,1 e 5,7 milhões de judeus fossem dizimados na Europa. Destes, foram exterminados em "campos de morte" entre 2,7 e 3 milhões (1 milhão em Auschwitz-Birkenau, entre 750 mil a 800 em Treblinka, 550 mil em Belzec, 200 a 300 mil em Sobibor, 150 mil em Kulmhof e 50 mil em Lublin); 150 a 200 mil em campos de trânsito ou de concentração (trabalho escravo) e 150 mil em campos na Romênia e na Croácia; cerca de 1 milhão e 300 mil, em matanças executadas por "tropas especiais" e aproximadamente 800 mil assassinados por isolamento (fome e doenças) em guetos. Em 1939, por exemplo, havia cerca de 3 milhões de judeus na Polônia. Depois de 1945, restaram alguns milhares de sobreviventes.

Em pouco menos de 4 anos, foi assassinada metade dos judeus europeus e mais de um terço de toda população judaica mundial na época[3]. Jamais houve um genocídio deliberada e calculadamente executado de um povo como o que foi praticado contra os judeus europeus. Obviamente, nessa compreensão em escala da II Guerra, é preciso acautelar-se quanto a comparações entre o número de judeus exterminados e o total das vítimas da guerra. 50 milhões de pessoas, entre civis e combatentes, forma mortos durante o conflito, número por si mesmo suficientemente estonteante. Mas apenas os judeus e os ciganos (em escala comparativamente menor) - cerca de 10 por cento deste total-, foram assassinados por uma política genocida. Por si só é trágico constar que cerca de 20 milhões de russos, bielo-russos e ucranianos foram mortos no enfrentamento e em massacres cometidos pelos nazistas. Somente uma viseira ideológica pode fazer com que alguém desconheça a proporção dessa catástrofe e as marcas que ela deixou nesses povos. Assim, é preciso estar atento para revisionismos inocentes, matizados por motivações distintas, que incidem sobre uma matéria carregada de sofrimento humano, para a qual a precisão e o senso de moralidade são, antes de qualquer coisa, impositivos.

Fonte: Revista Espaço Acadêmico, Nº43, Dezembro de 2004, Mensal, ISSN 1519.6186
Autor: Luis Milman(Doutor em Filosofia, professor da UFRGS)

terça-feira, 1 de abril de 2008

Presidente da FIA Max Mosley envolvido em orgia nazista

Detalhes do escândalo sexual de Mosley. Jornal britânico publica entrevista com garota que teria participado de orgia
GLOBOESPORTE.COM Rio de Janeiro

Max Mosley: alvo de tablóide britânico

O jornal britânico "News of The World" deste domingo põe mais lenha na fogueira do escândalo sexual que envolve o presidente da Federação Internacional de Automobilismo (FIA), Max Mosley. Em entrevista, uma garota de programa conta detalhes sobre a suposta orgia com temática nazistas, revelada pelo próprio jornal na semana passada e que está botando em risco o cargo de Mosley.

- Mosley gravou tudo com uma câmera para poder desfrutar mais tarde - diz a garota.

Ela rebateu a versão de Mosley, que admite ter participado do ato, mas nega qualquer motivação nazista. Segundo a garota, o chefão da FIA pediu para que ela ficasse vestida com um uniforme militar e que lhe desse ordens. Depois, pediu para ser chicoteado até sangrar. Em outro momento, Mosley teria invertido os papéis e começou a dar ordens em alemão ou inglês, fingindo inspecionar presas em um campo de concentração.

A garota conta ainda que a orgia teria sido organizada a pedido de Mosley por uma garota de apelido "Mistress Switch", encarregada de montar a cena nazista. Os uniformes teriam sido comprados em uma loja onde são vendidos excedentes de produção do exército alemão.

- Me disseram que boa parte das conversas seria em alemão e que eu não entenderia nada. E falaram que haveria temática nazista, inspeções corporais humilhantes, brutalidade e duas garotas vestidas como prisioneiras de um campo de concentração - diz ela ao jornal.

Segundo ela, Mosley teria pago 2.500 libras pela orgia - o equivalente a R$ 8,5 mil.

O jornal informou também que enviará para a Fia o material bruto com a suposta orgia: cinco horas de vídeos com Mosley e as garotas de programa.

Fonte: Globoesporte.com
http://globoesporte.globo.com/ESP/Noticia/Motor/0,,MUL389740-1311,00-DETALHES+DO+ESCANDALO+SEXUAL+DE+MOSLEY.html

Ver mais:
Presidente da FIA admite participar de práticas sadomasoquistas há 45 anos (Globoesporte.com)
Serviço secreto britânico teria armado escândalo sexual de Max Mosley (Globoesporte.com)

Associações britânicas de judeus protestam contra 'orgia nazista' de Max Mosley

(AFP) – 31/03/2008

LONDRES (AFP) — Associações britânicas de judeus se mostraram indignadas, nesta segunda-feira, com a difusão de um vídeo que mostra o presidente da Federação Internacional de Automobilismo (FIA), Max Mosley, durante uma sessão de sexo sadomasoquista que evoca um campo de concentração nazista.

O tablóide 'News of the World' publicou no domingo fotografias de um vídeo no qual Mosley aparece em uma sessão sadomasoquista em Londres, na companhia de cinco mulheres que aparecem vestidas com uniformes de prisioneiras.

Seguno o jornal 'Times', que cita uma "orgia nazista", Mosley fala em alemão no vídeo e assume o papel de guarda de um campo de concentração.

"É um insulto a milhões de vítimas, de sobreviventes, assim como a suas famílias. Teria que pedir perdão. Teria que renunciar", afirma o Centro do Holocausto.

No 'Times', Karen Pollock, diretora geral do Holocaust Educational Trust, qualificou o assunto como "depravado".

"Se alguém tivesse me contado isto sem provas, eu custaria a acreditar", reconheceu o chefão da Fórmula 1, Bernie Ecclestone.

"É um comportamento nocivo. É incrível, especialmente quando se conhece sua história familiar", declarou à AFP Edie Friedman, diretora do Jewish Council for Racial Equality.

Max Mosley é filho de Oswald Mosley, fundador da British Union of Fascists (BUF) e líder dos 'camisas-negras' britânicos nos anos 30. Os pais do presidente da FIA se casaram em 1936 na casa do dirigente nazista Joseph Goebbels.

Segundo o jornal, Mosley estuda apresentar uma denúncia contra o 'News of the World' por violação de sua vida privada.

Fonte: AFP
http://afp.google.com/article/ALeqM5iyFTeDk_Lbz9MADqlGRHp8hZVQ6g

A História do "revisionismo" do Holocausto

Todos os links:

A História do "revisionismo" do Holocausto - parte 1
http://holocausto-doc.blogspot.com/2008/03/o-que-e-quem-est-por-trs-do.html
A História do "revisionismo" do Holocausto - parte 2
http://holocausto-doc.blogspot.com/2008/03/o-qu-e-quem-est-por-trs-do-revisionismo.html
A História do "revisionismo" do Holocausto - parte 3
http://holocausto-doc.blogspot.com/2008/03/histria-do-revsionismo-do-holocausto.html
A História do "revisionismo" do Holocausto - parte 4
http://holocausto-doc.blogspot.com/2008/03/histria-do-revisionismo-do-holocausto.html
A História do "revisionismo" do Holocausto - parte 5
http://holocausto-doc.blogspot.com/2008/03/histria-do-revisionismo-do-holocausto_28.html
A História do "revisionismo" do Holocausto - parte 6
http://holocausto-doc.blogspot.com/2008/03/histria-do-revisionismo-do-holocausto_29.html

sábado, 29 de março de 2008

A História do "revisionismo" do Holocausto - Parte 6

6. Memória histórica e Holocausto

A manutenção da memória de vítimas e sobreviventes do Holocausto é uma das maiores formas de se manter viva a história. Com o passar dos anos, grande parte dos sobreviventes do Holocausto já faleceu pelos mais variados motivos. Em alguns anos provavelmente não haverá mais testemunhas oculares. É dever, portanto, salvaguardar esta memória, não apenas pessoal, mas coletiva.

As particularidades e horrores do Holocausto não devem ser esquecidos, é parte da função da História e dos historiadores (assim como profissionais de diversas outras áreas do saber) preservarem a memória. O genocídio choca não apenas por seus números, mas também pelos seus métodos e frieza. Para Boris Fausto (2006, p.141),
“[...] nem a discriminação genérica, nem os pogroms, nem mesmo a expulsão dos judeus da Península Ibérica, para ficar em um exemplo histórico ancestral, equivalem aos objetivos de um regime que, desde o início da Segunda Guerra Mundial, decidiu erradicar da face da terra o “bacilo judaico”, embora levasse algum tempo para encontrar a fórmula mais eficaz de extermínio.”

Métodos e concepções divergentes referentes tanto a metodologias quanto à própria historiografia sempre existirão, e isto é um indício do caráter saudável da pesquisa histórica. Porém, é necessário sempre estar atento contra falsificações que pretendem não apenas distorcer a história, mas também a sociedade. Combater preconceitos é algo inerente ao ofício do historiador. Além disso, a problematização da história ajuda-nos a lançar novos olhares sobre o passado, de forma com que a compreensão não somente do passado, mas também do presente seja afetada.

É este ato, de repensar, redescobrir e reescrever a história que deixa a memória e a disciplina vivas, desde que seja feita com compromisso social e seriedade profissional.

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Referências Bibliográficas

“A história do livro mais perseguido do Brasil”. Equipe de reportagem do RS “O jornal do Jockymann”. Porto Alegre: Revisão, 1991.

ARENDT, Hannah. “Entre o passado e o futuro”. 5ª. Ed. São Paulo: Perspectiva, 2001.
COSTA, Emilia Viotti da. “Da monarquia à república: momentos decisivos”. 7ª ed. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1999.

CASTAN, S.E. “Acabou o Gás!... O fim de um mito: O Relatório Leuchter sobre as alegadas Câmaras de gás de Auschwitz Birkenau e Majdanek”. 5ª ed. Porto Alegre: Revisão, 1989.
_______. “Holocausto Judeu ou Alemão: Nos bastidores da mentira do século”. 13ª ed. Porto Alegre: Revisão, 1987.
_______. “SOS para Alemanha: Separada, Ocupada, Submissa”. Porto Alegre: Revisão, 1990.
COHN, Norman. “A conspiração mundial dos judeus: mito ou realidade? Análise dos protocolos e outros documentos”. São Paulo: IBRASA, 1969.

FAUSTO, Boris. “A interpretação do Nazismo na visão de Norbert Elias”. MANA 4(1): 141-152, 1998. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/mana/v4n1/2429.pdf Acesso em julho de 2006.

FUHRMANN, Leonardo. “Nazistas atacam no Sul”. Disponível em: http://www.pazagora.org/impArtigo.cfm?IdArtigo=324 , Acesso em Julho de 2007.

JESUS, Carlos Gustavo Nóbrega de. “Anti-semitismo e nacionalismo, negacionismo e memória: Revisão Editora e as estratégias da intolerância”. São Paulo: Ed. UNESP, 2006.

“Lei nº. 10.639” de 09 de janeiro de 2003, disponível para consulta no site http://www.sinprosp.org.br/arquivos/especiais/LEI_No_10639.pdf ", Acesso em dezembro de 2007.

MILMAN, Luis. & VIZENTINI, Paulo Fagundes. (org.) “Neonazismo, negacionismo e extremismo político”. Porto Alegre: Editora da Universidade (UFRGS); CORAG, 2000.

OLIVEIRA, Sérgio. “Hitler: Culpado ou Inocente?” , Porto Alegre: Revisão, 1989.
_________. “Sionismo x Revisionismo: Fantasia x Realidade”. Porto Alegre: Revisão, 1993.
SCHAFF, Adam. “História e verdade”. 5ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991.

VIDAL-NAQUET, Pierre. “Os assassinos da memória: O Revisionismo na História”. Campinas: Papirus, 1998.
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1 Aluno do programa de Especialização em História Social e Ensino de História da Universidade Estadual de Londrina e participante do grupo de pesquisa “Grupo de estudos sobre os movimentos autoritários do século XX”. E-mail: odi1984@gmail.com

2 Utiliza-se neste trabalho da seguinte distinção: História (grafado com a inicial maiúscula) refere-se à disciplina, enquanto história (com a inicial em letra minúscula) refere-se à memória de uma maneira geral.

3 Tal livro não é mais editado pela Editora, conforme a mesma nos comunicou. No entanto, existe uma versão da obra disponível em língua francesa e inglesa, no site “Ressources documentaires sur le génocide nazi et sa négation”, (disponível em http://www.anti-rev.org – acesso em março de 2007).

Fonte: Revista eletrônica 'Literatura e Autoritarismo(Dominação e Exclusão Social)
Autor: Odilon Caldeira Neto

sexta-feira, 28 de março de 2008

A História do "revisionismo" do Holocausto - Parte 5

5. Negacionismo e mentira organizada

Os argumentos presentes no discurso negacionista passam longe do rigor e seriedade acadêmica, são elementos panfletários, extremistas. É a negação da memória. Vale novamente lembrar como um dos críticos e combatentes ao negacionismo, Pierre Vidal-Naquet, define os negadores do Holocausto: “Assassinos da Memória” (1998, p.37)3.

É justamente na motivação e nos argumentos dos negadores do Holocausto que encontramos os mais sólidos argumentos para a análise crítica desta prática. O judeu nestes é tratado constantemente como um ser conspiratório, elemento ativo de uma organização secreta diabólica. No negacionismo, o Holocausto é apresentado como uma das maiores e inúmeras formas do “judaísmo internacional” lançar suas garras sobre o mundo, controlando as finanças, os meios de comunicação, a mídia e conseqüentemente, a civilização mundial.

O perigo do negacionismo não está apenas em deformar e negar o Holocausto e diversos outros acontecimentos da história da 2ª Guerra Mundial. Ele age como uma mentira organizada, destinado a destruir tudo o que nega e aos que se opõe aos seus argumentos.

Hannah Arendt (2001, p. 285) alerta para o perigo da mentira moderna. Segundo Arendt, diferentemente da mentira tradicional - cujo maior objetivo é ocultar a verdade -, a mentira moderna busca destruir a verdade, e é neste ponto que mora o perigo do uso da mentira moderna como instrumento político. De acordo com a autora, este tipo de mentira tende a idealizar uma reconstrução da realidade, onde tudo se encaixa perfeitamente a partir da descoberta desta nova verdade, que por sua vez destronou a “antiga”.

O Negacionismo age desta maneira, ao colocar em evidência uma suposta nova realidade, em que a descoberta de um elemento (no caso, a “farsa do Holocausto”) muda toda a trama não somente da 2ª Guerra Mundial, mas também da realidade mundial. Se o Holocausto é uma invenção destinada a manipular as pessoas e governos dos países, a descoberta de sua falsidade quebraria uma teia de relações sustentada em uma grandiosa mentira. Além disto, tornaria visível a existência de um complô que supostamente subjugaria a humanidade em sua história.

Arendt sinaliza ainda que este tipo de mentira organizada tende a criar uma aura de verdade, tão perfeita em si, que tem a capacidade de substituir a realidade. Dessa forma, “uma trama factual sem remendos, falhas ou rachaduras” é bastante interessante para quem busca uma realidade supostamente auto-explicativa.

Sabemos que a história não funciona desta maneira, não segue uma linearidade lógica ou previsível, não deve ser explicada por um, dois ou mesmo três elementos, mas sim a conjunção de inúmeros destes. Para o negacionismo, que age como uma mentira organizada, a história da 2ª Guerra Mundial é explicada a partir da queda de duas supostas mentiras: o início da guerra, que seria então causado pelos próprios judeus, e o fim da mesma, em que o “judaísmo internacional” cria uma mentira com proporções gigantescas (Holocausto) para continuar seus planos de dominação mundial. A realidade política e social não apenas do período bélico, mas também atual explicar-se-ia a partir de uma dicotomia em que o mundo seria dividido entre subjugados (maioria da humanidade) e subjugantes (complô judaico de dominação mundial).

Fonte: Revista eletrônica 'Literatura e Autoritarismo(Dominação e Exclusão Social)
Autor: Odilon Caldeira Neto

quinta-feira, 27 de março de 2008

A História do "revisionismo" do Holocausto - Parte 4

4. Negacionismo e Justiça Brasileira

Desde o lançamento de “Holocausto Judeu ou Alemão? Nos bastidores da mentira do século” em 1987, uma extensa batalha judicial perdurou até o ano de 2003. De um lado Siegfried Ellwanger e a Revisão Editora e do outro lado seus críticos. Os maiores adversários da Revisão Editora e do negacionismo no Brasil são grupos de defesa de direitos humanos e entidades judaicas que visam o combate ao anti-semitismo e a proteção da memória dos milhões de vitimas do Holocausto.

Em um primeiro momento, a tática utilizada para barrar tal negacionismo foi um boicote ao mesmo, pois se temia que a abertura de um processo acabasse por trazer publicidade ao negacionismo. Entretanto, ficou constatado que esta prática não era muito válida, pois não trazia resultados substanciais. Após certo tempo esta disputa passou aos tribunais gaúchos (pelo fato da editora situar-se em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul), onde uma verdadeira batalha foi travada. Ellwanger conseguiu uma série de liminares e habeas corpus, até que em determinado momento, a questão chegou ao Supremo Tribunal Federal, em Brasília, onde Ellwanger foi condenado pelo crime de racismo, em ultima instância, com denegação do pedido de habeas corpus nº. 82.424.

Ellwanger fora julgado pelo conteúdo de “Holocausto Judeu ou Alemão?”, além da distribuição (via Revisão Editora) dos seguintes títulos: “O Judeu Internacional”, de Henry Ford, 2ª reedição, 1989; “A História Secreta do Brasil”, de Gustavo Barroso, 1ª reedição, 1990; “Protocolos dos Sábios de Sião”, apostilado por Gustavo Barroso, 4ª reedição, 1989; “Brasil Colônia de Banqueiros”, de Gustavo Barroso, 1ª reedição; “Hitler - Culpado ou Inocente”, de Sérgio Oliveira, 2ª edição, 1990 e “Os Conquistadores do Mundo - Os Verdadeiros Criminosos de Guerra”, de Louis Marschalko, 3ª edição. As obras da editora Revisão foram proibidas de circulação.

Porém, há uma rede de apoio mútuo entre autores e leitores negacionistas, que conta com suporte de diversas organizações anti-semitas. A internet é um meio largamente utilizado para disseminação de material anti-semita e negacionista, inclusive no Brasil.

Páginas de internet neonazistas como valhalla88.com e whitepowersp.org (atualmente fora do ar) exibiam mensagens de apoio a Ellwanger e aos ideais da Revisão Editora. O controle, do ponto de vista jurídico, de sites de internet é bastante complexo, tendo em vista que muitos destes ficam hospedados em servidores estrangeiros - onde práticas como anti-semitismo e racismo não são considerados crimes - justamente por proteção (Jesus, 2006, p. 151). O próprio website da Revisão Editora ficou hospedado durante certo tempo em um conhecido servidor estrangeiro que abriga diversas páginas racistas (www.libreopinion.com).

Atualmente a Revisão Editora não conta com uma página oficial na internet, porém é fácil encontrar os livros a venda em páginas de leilão virtual, sebos e livrarias on-line.

Além do próprio discurso anti-semita e preconceituoso, certos episódios mostram a contribuição dos livros negacionistas para a formação de grupos neonazistas no Brasil. Em maio de 2005, em pleno aniversário de rendição nazista (60 anos), um grupo de cerca de oito skinheads neonazistas atacaram três estudantes judeus com idade entre dezenove e vinte e sete anos. Em investigação (mandado de busca e apreensão), nas casas dos jovens presos pelo crime, foram encontrados diversos materiais de propagandas racistas e discriminatórias, além de exemplares de livros da Revisão Editora (Fuhrmann, 2004). Deste modo, a atenção destinada ao Negacionismo não deve ser referente apenas aos conteúdos dos livros, mas também a toda teia de relações em que eles se inserem.

Fonte: Revista eletrônica 'Literatura e Autoritarismo(Dominação e Exclusão Social)
Autor: Odilon Caldeira Neto

quarta-feira, 26 de março de 2008

A História do "revisionismo" do Holocausto - Parte 3

3. Revisão Editora e discurso Anti-semita

Em sua obra inicial, Ellwanger defende a tese de que os verdadeiros culpados, interessados e causadores da 2ª Guerra Mundial foram os judeus, a partir de ações advindas de um governo mundial secreto. Dessa forma, a partir do momento que se coloca o judaísmo como causador da guerra, toda a ação do governo nacional-socialista – inclusive a perseguição sistemática a estes - configurar-se-ia, portanto, como uma legítima reação.

Ellwanger apresenta como prova de tal argumento uma suposta declaração de guerra dos judeus aos alemães. Tal prova, porém, trata-se de um recorte da matéria “A Judéia declara guerra à Alemanha”, publicada no jornal inglês “Daily Express”, famoso por seu caráter sensacionalista. O texto apresenta as reações de judeus norte-americanos e ingleses frente às perseguições anti-semitas ocorridas na Alemanha. Como forma de pressionar o governo alemão ou mesmo chamar a atenção da opinião pública dos países em questão, chegou-se a propor um boicote aos produtos alemães. Porém, a forma como foi usada a expressão “declara guerra” passa longe de uma real declaração de guerra (do ponto de vista bélico e político) dos judeus ao povo e ao governo alemão.

A expressão “declara guerra” trata-se de um artifício usado constantemente na mídia em geral, principalmente em jornais. Como exemplo, vale lembrar as inúmeras “declarações de guerra” do governo brasileiro aos altos juros e a inflação durante as seguidas crises econômicas nacionais. Porém, a forma apresentada por Ellwanger não leva em consideração nenhuma destas implicações, de suma importância. Retira-se todo o contexto em que a matéria foi escrita, o momento político e econômico, além de não mencionar que já estava em prática parte da política anti-semita do governo nacional-socialista, como o boicote aos estabelecimentos comerciais judaicos e banimento destes do serviço público e civil.

Além de tudo, tal “declaração” data de março de 1933, ano em que Hitler assumiu o cargo de chanceler na Alemanha, anos antes do início da 2ª Guerra Mundial. O que se vê no argumento de Ellwanger é uma total distorção desta matéria. Uma simples manchete, proveniente de um tablóide, transformou-se numa “autêntica” declaração de Guerra.

Atos explícitos de racismo e preconceito como a “Noite dos Cristais”, (em que milhares de alemães, comandados e incitados por oficiais nazistas saem às ruas para depredar e incendiar estabelecimentos comerciais de propriedade de judeus e sinagogas), são tratados pelo autor como manifestações legítimas de indignação e reação a uma latente escravização do povo alemão pela maquiavélica comunidade judaica.

Para Ellwanger o que provocava a revolta no povo alemão devia-se muito aos resultados da 1ª Guerra Mundial. Isto não é nenhuma novidade para qualquer pessoa interessada no fenômeno nacional-socialista alemão. Um dos maiores motivos de ascensão do nazismo e sua aceitabilidade popular foram justamente os preconceitos e as feridas que ainda estavam abertas no povo alemão, muitas delas provenientes do Tratado de Versalhes, onde segundo os nazistas, o Império Germânico tinha sido covardemente roubado e humilhado. Tal argumento é bastante usado por Ellwanger, que adiciona ainda o que ele chama de espoliação pós-2ª Guerra, causada pelo “Holoconto”.

A situação precária em que se encontrava a Alemanha pós-1ª Guerra era causada, em grande parte, pelo que Ellwanger (e diversas outras categorias de anti-semitas) chama de “judaísmo internacional”. É o velho preconceito anti-semita que cria o mito de dominação mundial dos judeus, dominação essa que se daria via conspiração política, econômica e cultural. Além da própria suposta dominação judaica, contava muito o fato dos judeus “não se misturarem” aos alemães.

Segundo Ellwanger, o que se via na Alemanha pré-nazista era a maioria esmagadora da população alemã subjugada por uma minúscula parcela de judeus, praticamente uma ordem escravocrata. Além de controlar a mídia e os bancos alemães e europeus (afinal de contas, o problema eram os judeus como um todo, não apenas os que viviam na Alemanha), esses judeus não eram verdadeiramente alemães, pois viviam isolados em comunidades, casando-se só entre eles e empregando e beneficiando-se mutuamente, de maneira excludente ao povo alemão, o real necessitado. Coloca-se então, o judeu (ou “judaísmo internacional”) como um ser alienígena dentro de uma sociedade, um câncer social a ser execrado. Dessa maneira, vivendo à parte da sociedade, os judeus conseguiam praticar todas suas ações de dominação e manipulação mundial, em que o “mito” do Holocausto seria uma dentre tantas outras.

Além de “Holocausto: Judeu ou Alemão?”, Ellwanger publicou outros títulos com o mesmo teor editorial negacionista e anti-semita. Em “S.O.S para Alemanha – Separada, Ocupada, Submissa”, ele analisa as reações contrárias a seu livro inicial, além de apresentar supostas provas da existência de um complô que visa manter a mentira do Holocausto, complô este a cargo do governo secreto judaico.

Ellwanger é a figura principal da Revisão Editora, porém Sergio Oliveira também tem alguns títulos lançados, onde o discurso preconceituoso contra os judeus é igualmente perpetuado. Em “Sionismo x Revisionismo – Fantasia x Realidade”, Oliveira busca traçar um paralelo entre o desenvolvimento da disciplina historiográfica e o surgimento do “revisionismo” do Holocausto. Diferentemente de Ellwanger, Sérgio Oliveira aparenta ter uma maior preocupação em soar acadêmico e legitimar seu discurso com uma pseudo-metodologia. Porém, esta pretensão não consegue esconder um velado discurso anti-semita.

Em “Hitler – Culpado ou inocente?”, Oliveira nega a existência das Câmaras de Gás, e ainda que grande parte das mortes judaicas ocorridas no período durante a 2ª Guerra Mundial foram obras dos próprios judeus. Essas mortes seriam apenas mais uma das artimanhas do suposto governo judaico mundial secreto de conseguir o seu ideal maior: a criação do Estado de Israel. Oliveira compartilha ainda da idéia de Ellwanger que afirma que os “verdadeiros” causadores da 2ª Guerra Mundial foram os judeus. Na conclusão de seu livro, afirma que as mortes de judeus na guerra não ultrapassaram a cifra de 500 ou 600 mil pessoas e reafirma a tese de que os judeus foram os reais vilões da história:

“Em primeiro lugar, é preciso compreender que essas mortes ocorreram numa situação muito especial: os judeus estavam em guerra contra a Alemanha (grifo nosso) nacional-socialista, seja através de ações concretas de sabotagem ao esforço de guerra alemão ou empreendimentos de guerrilhas, seja por meio de uma ação sub-reptícia dos agentes sionistas infiltrados nos governos inimigos da Alemanha [...] Estando em guerra, os judeus haveriam de apresentar sua quota de sacrifício em vidas humanas, como de resto ocorreu com todos os beligerantes que tomaram parte do conflito.” (Oliveira, 1989, p. 135)

Tanto na obra de Siegfried Ellwanger, quanto de Sérgio Oliveira, o discurso negacionista referente às Câmaras de Gás faz relação ao já citado “Relatório Leuchter”. Ellwanger inclusive publicou um livro em que apresenta este relatório, sob o título de “Acabou o Gás!... O Fim de Um Mito - O Relatório Leuchter”. Dentre todos os títulos negacionistas distribuídos e publicados pela Revisão Editora, “Holocausto: Judeu ou Alemão?” é o que contêm mais edições (cerca de 30 edições, de acordo com dados da própria editora) e vendagens (Equipe de reportagem do RS, 1991, p.82), além de ser constantemente elogiado como uma das mais completas obras negacionistas existentes, afirmação logicamente provinda dos próprios negacionistas.

Fonte: Revista eletrônica 'Literatura e Autoritarismo(Dominação e Exclusão Social)
Autor: Odilon Caldeira Neto

terça-feira, 25 de março de 2008

A História do "revisionismo" do Holocausto - Parte 2

2. Revisionismo Histórico e a negação do Holocausto

A prática de revisão da História é constantemente aplicada, não somente sobre a própria metodologia, mas também sobre objetos e fatos em si, gerando inúmeras compreensões resultantes destas reflexões, sejam elas convergentes ou divergentes. É necessário ressaltar que esta prática de revisionismo atende aos padrões acadêmicos, que “exigem” de qualquer tipo de pesquisa, a existência de um referencial teórico e metodologia aplicada não somente para legitimar a pesquisa, mas também para qualificá-la.

É necessário abordar estas características do legítimo Revisionismo Histórico para se estabelecer contato com o auto-intitulado “Revisionismo” do Holocausto, ou Negacionismo, como é costumeiramente chamado nos meios acadêmicos e legais, distinção esta feita justamente para que haja uma diferenciação entre revisionistas e negadores do Holocausto. Segundo Pierre Vidal-Naquet (1998, p.12), notório combatente das práticas de falsificações históricas do Negacionismo, as primeiras células negacionistas surgiram na própria Alemanha sob o julgo nacional-socialista.

A partir de fortes indícios de um iminente fim de guerra, autoridades nazistas ordenaram a destruição de uma série de documentos e provas. Tal processo era nada mais que uma artimanha encontrada por estes oficiais para esconder, diminuir ou até mesmo negar os crimes cometidos durante a 2ª Guerra Mundial, dentre os quais o maior genocídio organizado e friamente sistematizado de uma série de categorias de “indesejáveis" ao governo nazista, como judeus, ciganos, homossexuais, negros, comunistas, entre outros – o Holocausto.

A passagem do negacionismo da plataforma política (como ato interno e restrito aos meios oficiais) para o meio público e acadêmico teve como principal idealizador e fundador Paul Rassinier, um ex-prisioneiro dos campos de concentração nazista de Buchenwald e Dora-Nordhaussen (Milman, 2000, p.120).

Rassinier, antigo militante da extrema-esquerda francesa era, durante a 2ª Guerra Mundial, membro da Seção Francesa da Internacional Socialista (SFIO) e redator de um jornal clandestino (“La IV. é Republique”). Devido às suas atuações, foi preso em 1944 pela Gestapo e enviado para os campos de concentração.

Livre, após o fim da guerra, retornou à França e começou uma peregrinação por diversas organizações políticas extremistas, tanto de esquerda quanto de direita. Afastou-se gradativamente das tendências esquerdistas, para se aliar a figurões da extrema-direita (Vichystas e colaboracionistas, inclusive) francesa e assumiu gradativamente um caráter fortemente anti-semita, antes mascarado como anti-sionismo ou anti-imperialismo.

O ano de 1951 marca a expulsão de Rassinier da SFIO, após a publicação de seu segundo livro, “A mentira de Ulisses”, em que o autor defende a tese de que a 2ª Guerra Mundial havia sido provocada por um complô judeu internacional de dominação mundial. Tal teoria remete facilmente aos moldes de teoria da conspiração largamente perpetuados pelo livro “Os Protocolos dos Sábios de Sião”, uma espécie de bíblia do anti-semitismo, que influenciou uma gama variada de anti-semitas, desde o governo Czarista (que foi, aliás, quem encomendou esta fraude) até Adolf Hitler (Cohn, 1969, p.195), passando por brasileiros como Gustavo Barroso (chefe de milícia da Ação Integralista Brasileira, responsável por uma versão traduzida e apostilada deste) e chegando até os atuais negadores do Holocausto.

Rassinier, em um primeiro momento, empreendeu uma relativização do número de mortos nos campos de concentração para, após isto, negar a existência das câmaras de gás e de qualquer programa sistemático do governo nacional-socialista de assassinato de judeus e outros grupos “indesejáveis”.

No que diz respeito à negação da existência das Câmaras de Fás, o maior argumento usado pelos autores negacionistas é o chamado “Relatório Leuchter”. Escrito por Fred A. Leuchter Jr., um suposto engenheiro norte-americano especialista em câmaras de gás. Tal relatório afirma que não haveria indícios de gaseamento nos campos de concentração (no caso, Auschwitz-Birkenau e Majdanek). A validade desse relatório é bastante questionável e suas alegações técnicas (assim como a capacidade e legitimidade profissional de Leuchter Jr.) são constantemente refutadas. Cabe ressaltar ainda que os campos de concentração em que Rassinier esteve confinado eram “apenas” campos de prisão e trabalho forçado. Desta forma, não haveria como Rassinier presenciar alguma sequer Câmaras de Gás no período e locais em que esteve preso, por motivos óbvios.

Os ideais de Rassinier influenciaram uma variada gama de anti-semitas, sobretudo na França pós-guerra. A seu exemplo, parte de ex-militantes esquerdistas verteram suas atuações para grupos de extrema-direita. Personagens como Serge Thion, Robert Faurisson, dentre outros, militantes ativos do grupo intitulado como “A velha toupeira”, formaram um pequeno grupo em volta de Rassinier que logo se tornou um centro de irradiação de material negacionista.

Não tardou muito e os ideais negacionistas se espalharam por grande parte da Europa e mais tardiamente a outros locais da América Latina, como o Brasil. Atualmente, há uma rede de negacionistas que abrange vários países, dentre os quais alguns autores que ficaram mundialmente conhecidos, não necessariamente por suas obras, mas principalmente pelas batalhas judiciais em que são réus na maioria das vezes (e em muitas destas, condenados). David Irving, historiador britânico que dispunha de um relativo respeito nos meios acadêmicos como historiador militar e de guerras, viu sua “popularidade” desabar após escrever livros negacionistas e ser preso na Áustria – onde a negação do Holocausto é crime. Ernst Zündel, alemão, foi condenado à prisão em seu país de origem, mas acabou sendo preso primeiramente no Canadá, onde ficou detido por um período de dois anos. Após este tempo, foi transferido para a Alemanha, onde foi julgado novamente e atualmente cumpre pena de cinco anos de prisão por negar o holocausto e incitar o ódio contra judeus.

A chegada do negacionismo no Brasil data do ano de 1987. Em um período de crescente mobilização pelas eleições diretas e pelo fim da ditadura militar, surge então o mais famoso livro negacionista brasileiro: “Holocausto: Judeu ou Alemão? Nos bastidores da mentira do século” de autoria de Siegfried Ellwanger, brasileiro descendente de alemães.

Ellwanger, que assina seus livros com o pseudônimo de S.E. Castan (segundo ele para fugir da perseguição sionista), funda a Revisão Editora Ltda., com sede em Porto Alegre/RS, para promover a distribuição de seu livro inicial, além de uma série de outros títulos com forte teor anti-semita e racista, muito deles de autores negacionistas.

A participação de brasileiros, porém, é pequena na Revisão Editora. Grande parte dos livros negacionistas nacionais são de autoria de Ellwanger ou então de Sérgio Oliveira, ex-sargento do Exército brasileiro durante a ditadura militar.

Fonte: Revista eletrônica 'Literatura e Autoritarismo(Dominação e Exclusão Social)
Autor: Odilon Caldeira Neto

segunda-feira, 24 de março de 2008

A História do "revisionismo" do Holocausto - Parte 1

NEGACIONISMO E ANTI-SEMITISMO NOS TEXTOS DA REVISÃO EDITORA

Resumo: Este trabalho tem por objetivo abordar a chegada do Negacionismo (“Revisionismo” do Holocausto) no Brasil, a partir da fundação da Revisão Editora, assim como as estratégias usadas pelos autores desta editora para negar o Holocausto ocorrido durante a 2ª Guerra Mundial, utilizando alto teor anti-semita em suas argumentações.

1. Introdução

O constante desenvolvimento do campo historiográfico, aliado ao surgimento de novos métodos e teorias, além do auxílio interdisciplinar faz com que a História2 seja palco de debates internos e externos, um contínuo conflito de interpretações.

De acordo com Adam Schaff (1991, p.227), essa constante, antes de negar o terreno objetivo da história, pelo contrário, a confirma. O ato de reescrever e repensar a história é fruto deste desenvolvimento, quebra de paradigmas ou mesmo de “modas” acadêmicas.

O termo Revisionismo Histórico é presença constante dentro deste processo. Abordar um determinado objeto sob uma diferente ótica ou metodologia, normalmente acaba por gerar diferentes compreensões sobre temas e fatos. Dois pesquisadores, ao estudar um mesmo objeto, utilizando-se neste estudo de semelhante arcabouço teórico, certamente acabariam por chegar a conclusões e indagações divergentes em determinados pontos. O ato de reescrever continuamente a história está repleto de exemplos deste tipo, compreensões sobre determinadas épocas estão ligadas diretamente ao mundo atual em que vive o pesquisador, por isso que toda história acaba por se tornar uma história do tempo presente, é função do historiador (e não somente do historiador, assim como de diversas outras áreas do saber) problematizar o passado, a memória, as compreensões e os fatos sob a luz de seu tempo, para buscar soluções e/ou caminhos possíveis.

Voltando ao Revisionismo Histórico, pode-se lembrar da revisão de alguns mitos, visões e conceitos perdurados durantes anos na sociedade e na própria historiografia. Tomamos por exemplo o mito da democracia racial brasileira, segundo o qual no país inexistiriam conflitos de cunho étnico. Teoria padrão em estudos historiográficos e sociológicos durante anos, esta idéia foi objeto de uma série de debates, por pensadores como Emília Viotti da Costa, Sergio Buarque de Holanda, dentre outros.

Com a derrubada do mito da democracia racial brasileira, novas perspectivas de estudos surgiram, assim como a busca de soluções (no âmbito político, inclusive) para problemas da sociedade contemporânea. Indício disto é o caráter atual das discussões sobre implantação ou não de cotas para afro-descendentes em concursos públicos como o vestibular, ou mesmo do ensino obrigatório da história e da cultura afro-brasileira nos Ensinos Fundamental e Médio (Lei nº. 10.639 de 09 de janeiro de 2003).

O Revisionismo Histórico do mito da democracia racial nos leva a observar as mudanças que determinadas visões sobre o passado acarretam sobre o cotidiano. O Revisionismo Histórico configura-se, deste modo, como um fruto deste constante desenvolvimento historiográfico, capaz de indagar não apenas conceitos metodológicos da História e disciplinas afins, mas também de compreensões sobre os mais variados objetos e fatos.

Fonte: Revista eletrônica 'Literatura e Autoritarismo(Dominação e Exclusão Social)
Autor: Odilon Caldeira Neto

80 mil velas pelas vítimas do nazismo

Na quarta-feira, realizou-se, em Viena, na Heldenplatz, ou Praça dos Heróis, uma vigília pelas vítimas do nazismo. Foi acendida uma vela por cada austríaco assassinado pelo regime, incluindo 65 mil judeus. O tributo realizou-se na mesma praça onde, há 70 anos, Hitler celebrou com 250 mil austríacos a anexação da Áustria pela Alemanha. "Eu estou aqui hoje, porque, tenho que admitir, estive aqui quando tinha 14 anos", disse a cidadã austríaca Renate Duchkovitsch, explicando que Hitler sabia como abusar do entusiasmo da juventude.

Mas esta é uma data importante mesmo para aqueles que ainda não tinham nascido nessa altura. "Porque eu acho incrível que a Áustria se tenha reconstruído e que se viva agora em democracia. E é importante ter consciência do que aconteceu, que nunca deve ser esquecido, nem permitido novamente", realçou Andrea Schwindner.

O aniversário da anexação ressuscitou o debate sobre se os austríacos foram vítimas ou cúmplices do nazismo. É que quando, a 12 de Março de 1938, as tropas alemãs invadiram a Áustria, foram recebidas em clima de festa.

Fonte: EuroNews(13.03.2008)
http://www.euronews.net/index.php?article=474877&lng=6&option=1
Imagem:
http://www.truveo.com/%C3%81ustria-relembra-anexa%C3%A7%C3%A3o-pela-Alemanha/id/3526825281

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