Retornando a 2015, nesta publicação, conduzi Mattogno a se esforçar em sua ridícula tarefa (feita aqui, pág. 281-282) de neutralizar o relatório de imprensa de Rosenberg de 18 de novembro de 1941. Agora gostaria de expandir isso citando uma observação feita por Alex J. Kay, neste livro, que inclui uma excelente discussão sobre o papel de Rosenberg no processo de planejamento de ocupação da URSS até julho de 1941. Em 20 de junho de 1941, Rosenberg usou o termo "evacuação" para se referir à fome, não à deportação, dos russos étnicos, a quem Hitler havia decidido que não deveriam sobreviver ao bombardeio das principais cidades, principalmente Leningrado e Moscou (e posteriormente Kiev).
O trecho de Rosenberg veio no discurso apresentado no Tribunal Militar Internacional como 1058-PS; Hartley Shawcross leu o seguinte extrato ao tribunal em 27 de julho de 1946:
O objetivo de alimentar o povo alemão está neste ano, sem dúvida, no topo da lista das alegações da Alemanha no Oriente, e os territórios do sul e do Cáucaso do Norte terão de servir como um balanço para a alimentação do povo alemão. Não vemos absolutamente nenhuma razão para qualquer obrigação da nossa parte em alimentar também o povo russo com os produtos desse excedente de território. Sabemos que esta é uma necessidade desprovida de todos os sentimentos. Uma evacuação muito extensa será necessária sem qualquer dúvida, e é certo que o futuro dará anos muito difíceis para os russos [tradução em National Conspiracy and Aggression, III, pág. 716-717].
O uso por Rosenberg da "expulsão" como um eufemismo para a morte em massa, portanto, teve origem na contribuição de Rosenberg aos planos de fome pré-Barbarossa, iniciada por Backe, mas não explicitamente aprovadas por Rosenberg até este discurso de "evacuação". Como Kay mostra (aqui, pág. 689), Rosenberg estava usando "evacuação" para eufemizar as mortes de 30 milhões de pessoas.
Fonte: Holocaust Controversies
http://holocaustcontroversies.blogspot.com/2017/12/more-on-biological-eradication.html
Texto: Jonathan Harrison
Título original: More on "Biological eradication (biologische Ausmerzung)"
Tradução: Roberto Lucena
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quinta-feira, 14 de dezembro de 2017
sexta-feira, 18 de dezembro de 2015
Guerra e extermínio no Leste. Hitler e a conquista do espaço vital 1933-1945 - Christian Baechler (livro)
O peso da herança e a parte da ideologia nazista
Os dois primeiros capítulos do livro nos permite medir o grau de importância do preconceito contra os eslavos. Ele é anterior à aparição da ideologia nazi, mas será explorado com sucesso por ela. E tudo isso apesar do fato de que desde a Idade Média, alemães e eslavos viveram juntos em muitas partes da Europa Oriental.
Se o mito do "Drang nach Osten" ("Empurrar para o leste") é relativamente bem conhecido, o livro mostra a evolução dos sentimentos alemães em relação a poloneses e russos. A manutenção da unidade da Prússia e depois do Império, conduz a uma política repressiva em relação a eles. Os poloneses são estereotipados como inferiores e sujos .... Uma caricatura que vai piorar após a Primeira Guerra Mundial e da restauração de um estado polonês às custas dos territórios alemães. O caso dos russos é mais complexo, na verdade, a Rússia e a Prússia foram aliadas ao longo do século 19. Os contatos entre as elites são numerosos. A Rússia parece mesmo um pouco com a Alemanha, como um poder que está por ascender. No entanto, torna-se um inimigo em potencial quando termina a tradicional aliança. Portanto, o russo passa a ser caracterizado com uma série de semelhanças com o polonês (sujeira etc ...).
A ideologia nazista retornará os diversos estereótipos e lhes sobreporá uma visão racial. Os eslavos representam a principal força de trabalho a ser explorada neste espaço vital que tanto a Alemanha necessita. Mas a germanização dessas terras não será acompanhada por eles (eslavos), eles estão destinados a ser governados, não são qualificados como aptos a ser germanizados. Também os russos, na ideologia hitlerista, são apresentados como dominados por judeus e submissos ao comunismo, duas razões adicionais para eliminá-los.
O começo da implementação da política nazista
Os capítulos seguintes analisam a evolução das relações entre a Alemanha nazista e seus vizinhos, e da implementação da política nazista na Polônia ocupada. O autor nos leva aqui ao coração do processo de decisão do Terceiro Reich. Como em outras áreas, existem muitas organizações com poderes rivais mal definidas que concorriam e dependia dos principais oficiais nazistas: Himmler, Goering, Rosenberg .... O debate entre funcionalistas e intencionalistas se encontra aí também, mas o autor escolhe o caminho do meio.
Segue-se, portanto, do interior da política nazista para a Polônia. A Polônia recusa a adesão no pacto anti-Komintern, o que iria torná-la um estado vassalo da Alemanha nazi, quando Hitler então decide eliminá-la como Estado. O benefício da hesitação de todas as democracias ao longo dos anos 30 é o que deseja Stálin para ganhar tempo e espaço.
Uma vez conquistada a Polônia, coloca-se em prática a implementação de uma política dirigida contra os judeus e as elites: intelectuais, dirigentes, clérigos... O espaço polonês se destina a ser colonizado, seus habitantes devem ter reduzidos seus status ao trabalho manual servil. Vários projetos vão surgindo, tudo inacabado, mas alguns ainda levam à transferência da população, "evacuada" para abrir espaço para os colonos alemães. Os colonos são geralmente transferidos dos "Volskdeustche" (alemães étnicos) de outros países e são arbitrariamente distribuídos para os novos locais de residência, na maioria das vezes como chefes da exploração em fazendas agrícolas. O destino dos judeus poloneses é objeto de debate amargo entre o Gauleiter dos territórios anexados ao Reich e Frank, que é chefe do Governo Geral.
A Barbarossa e suas consequências
A maior parte do livro trata do destino da URSS. Todos os aspectos são abordados. Quais as motivações ideológicas e econômicas do ataque na preparação e implementação deste plano militar. A ocasião permite ao autor mostrar como o Estado-maior alemão aceitou, sem vacilar, a maioria das diretivas à imagem do tratamento aos comissários. Ele não esquece do sofrimento de milhões de prisioneiros de guerra que morreram em condições terríveis. Mas mostra também as diferenças que aparecem entre os militares (e até mesmo entre os políticos) sobre o destino dos diversos povos da URSS, quando o desfecho do conflito se torna mais incerto.
A ocupação nazista do espaço soviético é o tema de um capítulo específico. Os aspectos práticos da ocupação nazista são revistos, a exploração dos territórios e o destino reservado à população. No melhor dos casos, ela seria explorada como trabalho escravo. Muitas vezes são vítimas das operações militares: despojados de suas casas, de sua comida e tudo o que pode servir são forçados a abandonar. A população também paga um preço alto na luta contra partisans, que acabam por justificar, os olhos dos alemães, essas atrocidades. O capítulo dedicado ao extermínio dos judeus soviéticos é a oportunidade que o autor avalia as diferentes teorias a respeito de sua gênese.
A evocação dos vários planos de reestruturação do espaço soviético e da hierarquia racial de seus ocupantes, permite ver o quão longe chegou a imaginação de vários teóricos nazistas. Tudo foi planejado para a seleção de indivíduos para reter apenas os mais propensos a ser "germanizados" para a criação de colônias agrícolas da SS... Novamente, não há concorrência, ou mesmo oposição entre os projetos de uns e outros.
Enfim, a atitude dos alemães frente ao que acontecia na Europa Oriental permite mostrar que as atrocidades foram amplamente conhecidas. Mas sua magnitude subestimada, ao mesmo tempo em que as faixas mais jovens que não conhecem o assunto sobre o regime nazista, aderem largamente ao tema pela propaganda.
Conclusão
Uma síntese recente sobre os temas que estão sendo discutidos: a data de decisão da implantação do extermínio, a atitude do exército e da população alemã frente as atrocidades... As 400 páginas do livro (acompanhado de uma centena de páginas de notas) deve ser lido com interesse. Além disso, o autor preocupa-se em recordar os principais pontos no final de cada capítulo.
O professor primeiramente encontrou no livro material para fundamentar seu curso sobre as guerras do século XX e o totalitarismo nazista. Tema que foi objeto de análise do documento da prova do 1°S durante a sessão de junho de 2012 (discurso de Himmler em Posen em 1943).
Artigo de François Trébosc, professor de história da geografia no liceu Jean Vigo, Millau
Christian Baechler. Guerre et extermination à l’est. Hitler et la conquête de l’espace vital 1933-1945. Tallandier. 2012; 528 páginas
Quarta-feira, 12 de setembre de 2012, por François Trebosc
Fonte: La Cliothèque
http://clio-cr.clionautes.org/guerre-et-extermination-a-l-est-hitler-et-la-conquete-de-l-espace.html
http://holocaust-doc.blogspot.com.br/2015/09/christian-baechler-guerre-et-extermination-a-lest-hitler-et-la-conquete-de-lespace-vital-1933-1945.html
Título original: Christian Baechler - Guerre et extermination à l’est. Hitler et la conquête de l’espace vital 1933-1945
Tradução: Roberto Lucena
Os dois primeiros capítulos do livro nos permite medir o grau de importância do preconceito contra os eslavos. Ele é anterior à aparição da ideologia nazi, mas será explorado com sucesso por ela. E tudo isso apesar do fato de que desde a Idade Média, alemães e eslavos viveram juntos em muitas partes da Europa Oriental.
Se o mito do "Drang nach Osten" ("Empurrar para o leste") é relativamente bem conhecido, o livro mostra a evolução dos sentimentos alemães em relação a poloneses e russos. A manutenção da unidade da Prússia e depois do Império, conduz a uma política repressiva em relação a eles. Os poloneses são estereotipados como inferiores e sujos .... Uma caricatura que vai piorar após a Primeira Guerra Mundial e da restauração de um estado polonês às custas dos territórios alemães. O caso dos russos é mais complexo, na verdade, a Rússia e a Prússia foram aliadas ao longo do século 19. Os contatos entre as elites são numerosos. A Rússia parece mesmo um pouco com a Alemanha, como um poder que está por ascender. No entanto, torna-se um inimigo em potencial quando termina a tradicional aliança. Portanto, o russo passa a ser caracterizado com uma série de semelhanças com o polonês (sujeira etc ...).
A ideologia nazista retornará os diversos estereótipos e lhes sobreporá uma visão racial. Os eslavos representam a principal força de trabalho a ser explorada neste espaço vital que tanto a Alemanha necessita. Mas a germanização dessas terras não será acompanhada por eles (eslavos), eles estão destinados a ser governados, não são qualificados como aptos a ser germanizados. Também os russos, na ideologia hitlerista, são apresentados como dominados por judeus e submissos ao comunismo, duas razões adicionais para eliminá-los.
O começo da implementação da política nazista
Os capítulos seguintes analisam a evolução das relações entre a Alemanha nazista e seus vizinhos, e da implementação da política nazista na Polônia ocupada. O autor nos leva aqui ao coração do processo de decisão do Terceiro Reich. Como em outras áreas, existem muitas organizações com poderes rivais mal definidas que concorriam e dependia dos principais oficiais nazistas: Himmler, Goering, Rosenberg .... O debate entre funcionalistas e intencionalistas se encontra aí também, mas o autor escolhe o caminho do meio.
Segue-se, portanto, do interior da política nazista para a Polônia. A Polônia recusa a adesão no pacto anti-Komintern, o que iria torná-la um estado vassalo da Alemanha nazi, quando Hitler então decide eliminá-la como Estado. O benefício da hesitação de todas as democracias ao longo dos anos 30 é o que deseja Stálin para ganhar tempo e espaço.
Uma vez conquistada a Polônia, coloca-se em prática a implementação de uma política dirigida contra os judeus e as elites: intelectuais, dirigentes, clérigos... O espaço polonês se destina a ser colonizado, seus habitantes devem ter reduzidos seus status ao trabalho manual servil. Vários projetos vão surgindo, tudo inacabado, mas alguns ainda levam à transferência da população, "evacuada" para abrir espaço para os colonos alemães. Os colonos são geralmente transferidos dos "Volskdeustche" (alemães étnicos) de outros países e são arbitrariamente distribuídos para os novos locais de residência, na maioria das vezes como chefes da exploração em fazendas agrícolas. O destino dos judeus poloneses é objeto de debate amargo entre o Gauleiter dos territórios anexados ao Reich e Frank, que é chefe do Governo Geral.
A Barbarossa e suas consequências
A maior parte do livro trata do destino da URSS. Todos os aspectos são abordados. Quais as motivações ideológicas e econômicas do ataque na preparação e implementação deste plano militar. A ocasião permite ao autor mostrar como o Estado-maior alemão aceitou, sem vacilar, a maioria das diretivas à imagem do tratamento aos comissários. Ele não esquece do sofrimento de milhões de prisioneiros de guerra que morreram em condições terríveis. Mas mostra também as diferenças que aparecem entre os militares (e até mesmo entre os políticos) sobre o destino dos diversos povos da URSS, quando o desfecho do conflito se torna mais incerto.
A ocupação nazista do espaço soviético é o tema de um capítulo específico. Os aspectos práticos da ocupação nazista são revistos, a exploração dos territórios e o destino reservado à população. No melhor dos casos, ela seria explorada como trabalho escravo. Muitas vezes são vítimas das operações militares: despojados de suas casas, de sua comida e tudo o que pode servir são forçados a abandonar. A população também paga um preço alto na luta contra partisans, que acabam por justificar, os olhos dos alemães, essas atrocidades. O capítulo dedicado ao extermínio dos judeus soviéticos é a oportunidade que o autor avalia as diferentes teorias a respeito de sua gênese.
A evocação dos vários planos de reestruturação do espaço soviético e da hierarquia racial de seus ocupantes, permite ver o quão longe chegou a imaginação de vários teóricos nazistas. Tudo foi planejado para a seleção de indivíduos para reter apenas os mais propensos a ser "germanizados" para a criação de colônias agrícolas da SS... Novamente, não há concorrência, ou mesmo oposição entre os projetos de uns e outros.
Enfim, a atitude dos alemães frente ao que acontecia na Europa Oriental permite mostrar que as atrocidades foram amplamente conhecidas. Mas sua magnitude subestimada, ao mesmo tempo em que as faixas mais jovens que não conhecem o assunto sobre o regime nazista, aderem largamente ao tema pela propaganda.
Conclusão
Uma síntese recente sobre os temas que estão sendo discutidos: a data de decisão da implantação do extermínio, a atitude do exército e da população alemã frente as atrocidades... As 400 páginas do livro (acompanhado de uma centena de páginas de notas) deve ser lido com interesse. Além disso, o autor preocupa-se em recordar os principais pontos no final de cada capítulo.
O professor primeiramente encontrou no livro material para fundamentar seu curso sobre as guerras do século XX e o totalitarismo nazista. Tema que foi objeto de análise do documento da prova do 1°S durante a sessão de junho de 2012 (discurso de Himmler em Posen em 1943).
Artigo de François Trébosc, professor de história da geografia no liceu Jean Vigo, Millau
Christian Baechler. Guerre et extermination à l’est. Hitler et la conquête de l’espace vital 1933-1945. Tallandier. 2012; 528 páginas
Quarta-feira, 12 de setembre de 2012, por François Trebosc
Fonte: La Cliothèque
http://clio-cr.clionautes.org/guerre-et-extermination-a-l-est-hitler-et-la-conquete-de-l-espace.html
http://holocaust-doc.blogspot.com.br/2015/09/christian-baechler-guerre-et-extermination-a-lest-hitler-et-la-conquete-de-lespace-vital-1933-1945.html
Título original: Christian Baechler - Guerre et extermination à l’est. Hitler et la conquête de l’espace vital 1933-1945
Tradução: Roberto Lucena
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sexta-feira, 20 de novembro de 2015
'Descendentes precisam saber que história da África é tão bonita quanto a da Grécia'
Quando começou a se interessar pela história da África, o poeta, diplomata e historiador Alberto da Costa e Silva ouviu: "Por que você, um diplomata, um homem tão letrado, não vai estudar a Grécia?"
Justamente porque todo mundo estudava a Grécia, explica, ele resolveu estudar a África. Hoje, é o principal africanólogo brasileiro, autor de clássicos como A Enxada e a Lança: a África antes dos Portugueses e A Manilha e o Libambo: a África e a Escravidão, de 1500 a 1700. E, aos 84 anos, prepara um novo livro para completar sua trilogia sobre história africana.
Formado em 1957 pelo Instituto Rio Branco, Costa e Silva serviu em vários países e foi embaixador na Nigéria. É membro da Academia Brasileira de Letras, autor e organizador de mais de 30 livros. Por sua obra, recebeu em 2014 o Prêmio Camões, o mais prestigiado da língua portuguesa.
Filho do poeta piauiense Antônio Francisco da Costa e Silva, nasceu em São Paulo e viveu no Ceará até aos 12 anos, quando mudou-se para o Rio de Janeiro. Cresceu entre livros e costuma dizer que, como no verso do poeta francês Charles Baudelaire (1821-1867), seu berço "ao pé da biblioteca se estendia".
Foi entre livros, quadros e esculturas, no apartamento em que guarda lembranças de vários lugares do Brasil e do mundo, que ele recebeu a BBC Brasil às vésperas do Dia da Consciência Negra para falar da história do continente pelo qual se apaixonou.
BBC Brasil: Como o Brasil aprendeu a história da África?
Alberto da Costa e Silva: A história da África durante muito tempo foi uma espécie de capítulo de antropologia e etnografia do continente africano. Eram livros que árabes e europeus escreveram sobre suas viagens. Data do fim da Segunda Guerra Mundial a consolidação a história da África como disciplina à parte, semelhante à história da Idade Média europeia, ou à história da China.
Entre 1945 e 1960 seu estudo começa a ganhar grandes voos, tanto na África quanto na Europa, sobretudo Inglaterra e França. Curiosamente o Brasil esteve ausente disso. Os historiadores brasileiros sempre viam a história das relações Brasil-África com a África figurando como fornecedora de mão de obra escrava para o Brasil, como se o africano que era trazido à força nascesse num navio negreiro.
Era como se o negro surgisse no Brasil, como se fosse carente de história. Nenhum povo é carente de história. E a história da África é uma história extremamente rica e que teve grande importância na história do Brasil, da mesma maneira que a história europeia.
De maneira geral, quando se estuda a história do Brasil, o negro aparece como mão de obra cativa, com certas exceções de grandes figuras, mulatos ou negros que pontuam a nossa história. O negro não aparece como o que ele realmente foi, um criador, um povoador do Brasil, um introdutor de técnicas importantes de produção agrícola e de mineração do ouro.
BBC Brasil: O senhor poderia citar alguns exemplos?
Costa e Silva: Os primeiros fornos de mineração de ferro em Minas Gerais eram africanos. Fizemos uma história de escravidão que foi violentíssima, atroz, das mais violentas das Américas, uma grande ignomínia e motivo de remorso. Começamos agora a ter a noção do que devemos ao escravo como criador e civilizador do Brasil.
Quando o ouro é descoberto em Minas Gerais, o governador de Minas escreve uma carta pedindo que mandassem negros da Costa da Mina, na África, porque "esses negros têm muita sorte, descobrem ouro com facilidade". Os negros da Costa da Mina não tinham propriamente sorte: eles sabiam, tinham a tradição milenar de exploração de ouro, tanto do ouro de bateia dos rios quanto da escavação de minas e corredores subterrâneos. Boa parte da ourivesaria brasileira tem raízes africanas.
Tenho a impressão de que todos temos dentro de cada um de nós um africano. Podemos não ter consciência disso, mas é permanente.
Temos de estudar o continente africano não como um capítulo à parte, um gueto. A história da África está incorporada à história do mundo, porque ela foi parte e é parte da história do mundo. Que a história do negro no Brasil não seja isolada, como se o negro tivesse sido um marginal. O negro foi essencial na formação do Brasil.
BBC Brasil: Qual a importância de um personagem como Zumbi?
Costa e Silva: Havia um suplemento juvenil do jornal A Noite, sobre grandes nomes da história, e eu me lembro perfeitamente de um caderno sobre Zumbi. Zumbi está aliado de tal maneira à ideia de liberdade que é difícil escrever sobre ele sem ser apaixonado.
Zumbi não é um nome, é um título da etnia ambundo, significa rei, chefe. Palmares era como um Estado africano recriado no Brasil. Na África era muito comum isso. Em torno de um núcleo de poder forte se aglomeravam vários povos e formavam um novo povo. Isso é uma hipótese.
BBC Brasil: O senhor vê um aumento do interesse dos brasileiros pela questão negra?
Costa e Silva: Tenho a impressão de que todos temos dentro de cada um de nós um africano. Podemos não ter consciência disso, mas é permanente. Há naturalmente hoje em dia uma percepção mais nítida do que é a África, a escola começa a dar uma visão mais clara.
Mas ainda apresenta visões distorcidas. Uma vez uma professora veio me dizer que era absurdo que apresentássemos Cleópatra como uma moça branca, quando ela era negra. É um equívoco isso. Cleópatra não era negra nem mulata. Era grega. Os Ptolomeus, uma dinastia grega, governavam o Egito e não se misturavam.
BBC Brasil: Na África também havia escravos, não?
Costa e Silva: Escravidão houve em todas as culturas no mundo. Todos nós somos descendentes de escravos. Houve escravidão em toda a Europa, na Indonésia, entre os índios americanos, na Inglaterra. Na África havia todos os tipos de escravidão, e até hoje em certas regiões africanas os descendentes de escravos são discriminados. Quase toda a África teve escravidão.
A escravidão transatlântica, da África para as Américas, a nossa, tem uma diferença básica: pela primeira vez era uma escravidão racial. Era um especial aspecto da perversidade dela. No início não, mas a partir de certo momento, passa a ser exclusivamente negra. Foi o maior deslocamento forçado de gente de uma área para outra que a história já conheceu, e o mais feroz.
Acho que tem de haver cota em tudo. Se você vai se candidatar a um cargo de atendente de hotel de primeira classe, se você for negro, você tem dificuldade.
O Brasil foi o último país das Américas e do Ocidente a abolir a escravidão. O último do mundo foi a Mauritânia (na África), em 1981.
BBC Brasil: Como analisa o racismo hoje no Brasil?
Costa e Silva: Existe racismo, e muitíssimo. No nosso racismo, não temos um partido racista, mas temos repetidas manifestações de racismo no seio da sociedade. É dificílimo, para um negro, ascender socialmente. A discriminação se exerce de forma muitas vezes dissimulada, mas que os marca muito. Mas está mudando. Sinto mudanças.
É importante que os descendentes de africanos saibam que eles têm uma história tão bonita quanto a história da Grécia. Que eles não eram bárbaros, que não são descendentes de escravos. São descendentes de africanos que foram escravizados.
Para mim o importante não é que haja cota na universidade. Acho que tem de haver cota em tudo. Se você vai se candidatar a um cargo de atendente de hotel de primeira classe, se você for negro, você tem dificuldade. O preconceito é discriminatório. Ele não impede você de usar o mesmo banheiro, o mesmo bebedouro, mas dificulta o acesso (do negro) às camadas das classes média e alta.
Fernanda da Escóssia
Do Rio de Janeiro para a BBC Brasil
20 novembro 2015
Fonte: BBC Brasil
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/11/151120_entrevista_historiador_fe_ab
Justamente porque todo mundo estudava a Grécia, explica, ele resolveu estudar a África. Hoje, é o principal africanólogo brasileiro, autor de clássicos como A Enxada e a Lança: a África antes dos Portugueses e A Manilha e o Libambo: a África e a Escravidão, de 1500 a 1700. E, aos 84 anos, prepara um novo livro para completar sua trilogia sobre história africana.
Formado em 1957 pelo Instituto Rio Branco, Costa e Silva serviu em vários países e foi embaixador na Nigéria. É membro da Academia Brasileira de Letras, autor e organizador de mais de 30 livros. Por sua obra, recebeu em 2014 o Prêmio Camões, o mais prestigiado da língua portuguesa.
Filho do poeta piauiense Antônio Francisco da Costa e Silva, nasceu em São Paulo e viveu no Ceará até aos 12 anos, quando mudou-se para o Rio de Janeiro. Cresceu entre livros e costuma dizer que, como no verso do poeta francês Charles Baudelaire (1821-1867), seu berço "ao pé da biblioteca se estendia".
Foi entre livros, quadros e esculturas, no apartamento em que guarda lembranças de vários lugares do Brasil e do mundo, que ele recebeu a BBC Brasil às vésperas do Dia da Consciência Negra para falar da história do continente pelo qual se apaixonou.
BBC Brasil: Como o Brasil aprendeu a história da África?
Alberto da Costa e Silva: A história da África durante muito tempo foi uma espécie de capítulo de antropologia e etnografia do continente africano. Eram livros que árabes e europeus escreveram sobre suas viagens. Data do fim da Segunda Guerra Mundial a consolidação a história da África como disciplina à parte, semelhante à história da Idade Média europeia, ou à história da China.
Entre 1945 e 1960 seu estudo começa a ganhar grandes voos, tanto na África quanto na Europa, sobretudo Inglaterra e França. Curiosamente o Brasil esteve ausente disso. Os historiadores brasileiros sempre viam a história das relações Brasil-África com a África figurando como fornecedora de mão de obra escrava para o Brasil, como se o africano que era trazido à força nascesse num navio negreiro.
Era como se o negro surgisse no Brasil, como se fosse carente de história. Nenhum povo é carente de história. E a história da África é uma história extremamente rica e que teve grande importância na história do Brasil, da mesma maneira que a história europeia.
De maneira geral, quando se estuda a história do Brasil, o negro aparece como mão de obra cativa, com certas exceções de grandes figuras, mulatos ou negros que pontuam a nossa história. O negro não aparece como o que ele realmente foi, um criador, um povoador do Brasil, um introdutor de técnicas importantes de produção agrícola e de mineração do ouro.
BBC Brasil: O senhor poderia citar alguns exemplos?
Costa e Silva: Os primeiros fornos de mineração de ferro em Minas Gerais eram africanos. Fizemos uma história de escravidão que foi violentíssima, atroz, das mais violentas das Américas, uma grande ignomínia e motivo de remorso. Começamos agora a ter a noção do que devemos ao escravo como criador e civilizador do Brasil.
Quando o ouro é descoberto em Minas Gerais, o governador de Minas escreve uma carta pedindo que mandassem negros da Costa da Mina, na África, porque "esses negros têm muita sorte, descobrem ouro com facilidade". Os negros da Costa da Mina não tinham propriamente sorte: eles sabiam, tinham a tradição milenar de exploração de ouro, tanto do ouro de bateia dos rios quanto da escavação de minas e corredores subterrâneos. Boa parte da ourivesaria brasileira tem raízes africanas.
Tenho a impressão de que todos temos dentro de cada um de nós um africano. Podemos não ter consciência disso, mas é permanente.
Temos de estudar o continente africano não como um capítulo à parte, um gueto. A história da África está incorporada à história do mundo, porque ela foi parte e é parte da história do mundo. Que a história do negro no Brasil não seja isolada, como se o negro tivesse sido um marginal. O negro foi essencial na formação do Brasil.
BBC Brasil: Qual a importância de um personagem como Zumbi?
Costa e Silva: Havia um suplemento juvenil do jornal A Noite, sobre grandes nomes da história, e eu me lembro perfeitamente de um caderno sobre Zumbi. Zumbi está aliado de tal maneira à ideia de liberdade que é difícil escrever sobre ele sem ser apaixonado.
Zumbi não é um nome, é um título da etnia ambundo, significa rei, chefe. Palmares era como um Estado africano recriado no Brasil. Na África era muito comum isso. Em torno de um núcleo de poder forte se aglomeravam vários povos e formavam um novo povo. Isso é uma hipótese.
BBC Brasil: O senhor vê um aumento do interesse dos brasileiros pela questão negra?
Costa e Silva: Tenho a impressão de que todos temos dentro de cada um de nós um africano. Podemos não ter consciência disso, mas é permanente. Há naturalmente hoje em dia uma percepção mais nítida do que é a África, a escola começa a dar uma visão mais clara.
Mas ainda apresenta visões distorcidas. Uma vez uma professora veio me dizer que era absurdo que apresentássemos Cleópatra como uma moça branca, quando ela era negra. É um equívoco isso. Cleópatra não era negra nem mulata. Era grega. Os Ptolomeus, uma dinastia grega, governavam o Egito e não se misturavam.
BBC Brasil: Na África também havia escravos, não?
Costa e Silva: Escravidão houve em todas as culturas no mundo. Todos nós somos descendentes de escravos. Houve escravidão em toda a Europa, na Indonésia, entre os índios americanos, na Inglaterra. Na África havia todos os tipos de escravidão, e até hoje em certas regiões africanas os descendentes de escravos são discriminados. Quase toda a África teve escravidão.
A escravidão transatlântica, da África para as Américas, a nossa, tem uma diferença básica: pela primeira vez era uma escravidão racial. Era um especial aspecto da perversidade dela. No início não, mas a partir de certo momento, passa a ser exclusivamente negra. Foi o maior deslocamento forçado de gente de uma área para outra que a história já conheceu, e o mais feroz.
Acho que tem de haver cota em tudo. Se você vai se candidatar a um cargo de atendente de hotel de primeira classe, se você for negro, você tem dificuldade.
O Brasil foi o último país das Américas e do Ocidente a abolir a escravidão. O último do mundo foi a Mauritânia (na África), em 1981.
BBC Brasil: Como analisa o racismo hoje no Brasil?
Costa e Silva: Existe racismo, e muitíssimo. No nosso racismo, não temos um partido racista, mas temos repetidas manifestações de racismo no seio da sociedade. É dificílimo, para um negro, ascender socialmente. A discriminação se exerce de forma muitas vezes dissimulada, mas que os marca muito. Mas está mudando. Sinto mudanças.
É importante que os descendentes de africanos saibam que eles têm uma história tão bonita quanto a história da Grécia. Que eles não eram bárbaros, que não são descendentes de escravos. São descendentes de africanos que foram escravizados.
Para mim o importante não é que haja cota na universidade. Acho que tem de haver cota em tudo. Se você vai se candidatar a um cargo de atendente de hotel de primeira classe, se você for negro, você tem dificuldade. O preconceito é discriminatório. Ele não impede você de usar o mesmo banheiro, o mesmo bebedouro, mas dificulta o acesso (do negro) às camadas das classes média e alta.
Fernanda da Escóssia
Do Rio de Janeiro para a BBC Brasil
20 novembro 2015
Fonte: BBC Brasil
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/11/151120_entrevista_historiador_fe_ab
domingo, 19 de julho de 2015
Documentário - Racismo: uma história [BBC] (Darwinismo social e eugenia)
O título do vídeo no Youtube está como "BBC] Racismo Científico Darwinismo Social e Eugenia [DUBLADO]", por isso fiz o acréscimo no título do post como um "subtítulo", mas os dois temas citados no título são tratados no documentário "Racismo: uma História" (nome original do documentário). Este está dublado em português. Pra quem quiser entender como o racismo, como ideologia e construção social, foi estruturado (já que muita gente não vai procurar um livro sério, ensaio etc sobre o assunto pra ler), vale a pena assistir o documentário. Isso se o Youtube não remover o vídeo pela turma do "copyright".
Observando a quantidade de comentários, por assim dizer, estúpidos, que abundam na internet (de forma geral) quando se toca no assunto preconceito e racismo, dá pra notar que o analfabetismo científico de boa parte da população é grande e isso é muito grave. Isso é proveniente, sobretudo, do mau ensino do assunto nas escolas do país, que nem exibir um documentário como esse costuma fazê-lo.
Serei obrigado a colocar links dos verbetes da Wikipedia em espanhol (e mesmo esses encontram problemas pois não há o rigor dos verbetes em inglês e grupos de extrema-direita "liberal" os alteram negando e distorcendo informações) porque, como ressaltei entre parênteses pra parte espanhola da Wikipedia, pessoas adulteraram verbetes da Wikipedia em português sobre alguns desses temas como o "Darwinismo social" pra negar e distorcer fatos porque afetam a "imagem" idealizada que eles usam pra defender doutrina política. Só como exemplo, consta que Herbert Spencer, darwinista social (um dos pais desse racismo ideológico) era "crítico" do Darwinismo social, isso é falso. Eu consigo reparar a distorção fácil, mas a maioria vai reparar quando lerem o verbete pela primeira vez? Obviamente, não.
O termo "liberal" citado aqui não tem a mesma conotação que o termo pode ter em outros países. Inclusive eu coloco "aspas" no termo pra destacar a crítica. O que se passa é que vários reacionários brasileiros, gente de extrema-direita (autoritários e sectários), que se diz "democrata" e "negar" o fascismo (dizem que são "contra", 'pero no mucho'), fazem campanhas de negação desses assuntos em cima de uma população/massa altamente sugestionável (mal instruída) que não tem o hábito de verificar ou ler fontes (que prestem). Não sabem distinguir um site/verbete manipulado de uma informação correta (com boas referências). Desculpando o prolongamento do texto de apresentação mas é importante destacar essas questões, ficará mais fácil compreender o vídeo.
Verbete de: Darwinismo social
No próprio verbete em espanhol sobre "Herbert Spencer" (darwinista social, um dos principais), algum liberal (como suspeitava, ao menos deixou o link) de algum desses "Mises Institute", adulterou o verbete colocando isso: "esta afirmación ha sido historiográficamente cuestionada.1". "Questionada" por um site que defende a figura do Spencer por afinidade ideológica com esse pensamento. Esses caras são uma piada (de mau gosto).
Verbetes de: Eugenia, Eugenesia, Eugenesia Nazi, Eugenesia liberal, Eugenesia en Estados Unidos, Movimento eugênico brasileiro, Higiene Racial (proveniente do "Higienismo social")
Observando a quantidade de comentários, por assim dizer, estúpidos, que abundam na internet (de forma geral) quando se toca no assunto preconceito e racismo, dá pra notar que o analfabetismo científico de boa parte da população é grande e isso é muito grave. Isso é proveniente, sobretudo, do mau ensino do assunto nas escolas do país, que nem exibir um documentário como esse costuma fazê-lo.
Serei obrigado a colocar links dos verbetes da Wikipedia em espanhol (e mesmo esses encontram problemas pois não há o rigor dos verbetes em inglês e grupos de extrema-direita "liberal" os alteram negando e distorcendo informações) porque, como ressaltei entre parênteses pra parte espanhola da Wikipedia, pessoas adulteraram verbetes da Wikipedia em português sobre alguns desses temas como o "Darwinismo social" pra negar e distorcer fatos porque afetam a "imagem" idealizada que eles usam pra defender doutrina política. Só como exemplo, consta que Herbert Spencer, darwinista social (um dos pais desse racismo ideológico) era "crítico" do Darwinismo social, isso é falso. Eu consigo reparar a distorção fácil, mas a maioria vai reparar quando lerem o verbete pela primeira vez? Obviamente, não.
O termo "liberal" citado aqui não tem a mesma conotação que o termo pode ter em outros países. Inclusive eu coloco "aspas" no termo pra destacar a crítica. O que se passa é que vários reacionários brasileiros, gente de extrema-direita (autoritários e sectários), que se diz "democrata" e "negar" o fascismo (dizem que são "contra", 'pero no mucho'), fazem campanhas de negação desses assuntos em cima de uma população/massa altamente sugestionável (mal instruída) que não tem o hábito de verificar ou ler fontes (que prestem). Não sabem distinguir um site/verbete manipulado de uma informação correta (com boas referências). Desculpando o prolongamento do texto de apresentação mas é importante destacar essas questões, ficará mais fácil compreender o vídeo.
Verbete de: Darwinismo social
No próprio verbete em espanhol sobre "Herbert Spencer" (darwinista social, um dos principais), algum liberal (como suspeitava, ao menos deixou o link) de algum desses "Mises Institute", adulterou o verbete colocando isso: "esta afirmación ha sido historiográficamente cuestionada.1". "Questionada" por um site que defende a figura do Spencer por afinidade ideológica com esse pensamento. Esses caras são uma piada (de mau gosto).
Verbetes de: Eugenia, Eugenesia, Eugenesia Nazi, Eugenesia liberal, Eugenesia en Estados Unidos, Movimento eugênico brasileiro, Higiene Racial (proveniente do "Higienismo social")
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terça-feira, 7 de outubro de 2014
Os tais "nichos étnicos" no Brasil. Sobre o racismo e preconceito regional contemporâneo no Brasil e sua origem (mais sobre a ideologia de branqueamento do Brasil)
Como disse aqui neste post, e fiquei devendo, segue abaixo o trecho do texto que eu citei no outro post do link que descreve a preocupação das autoridades brasileiras com a vinda de imigrantes pro Brasil e a formação de "nichos étnicos", termo que usei por associação ao que havia lido (o termo está correto) e eu estava crente de que o termo constava do texto original (às vezes acontece da gente cismar com um termo achando que o mesmo estava no texto, sem estar), embora o termo signifique a mesma coisa descrita no texto.
Segue o trecho abaixo em destaque sobre o branqueamento no Brasil e o medo das autoridades de que se criassem "nichos étnicos" que viessem a discriminar a população nativa ou se comportarem como não-nacionais. Embora eu deva ainda continuar procurando os outros PDFs pra ver se bate com esse, o conteúdo se não for o mesmo é muito próximo ao que li (eu diria que o texto é este mesmo) e explica o problema. O texto fala das políticas de branqueamento do Brasil e da "engenharia social" pra remodelar o Brasil em uma "nação branca", ou seja: eugenia. O governo do Império e outros governos brasileiros praticaram eugenia pra "modelar etnicamente o país". Este problema que veio ou surge com a imigração europeia do século XIX e do começo do século XX é a origem (ou uma das) do preconceito regional proferido hoje no Brasil, por gente com posições retrógradas oriunda desses nichos étnicos.
O problema tem nome, por isso precisa ser tratado como tal e não mascarado como boa parte da mídia faz no país. Não é um fenômeno isolado embora pouco explorado pelos pesquisadores (historiadores) do país (taí uma sugestão pra pesquisas: analisar a mutação ou mascaramento do preconceito racial no Brasil em preconceito regional, até o atual ou a formação disso, desde o Brasil monárquico com a política de branqueamento, passando pelo Estado Novo até os dias atuais).
Leiam o trecho:
Autor: Hilton Costa1
Site: A experiência dos africanos e seus descendentes no Brasil (escravidaoeliberdade)
http://www.escravidaoeliberdade.com.br/site/images/Textos3/hilton%20costa.pdf
Com o término do primeiro turno das eleições ontem, houve novamente um surto de preconceito regional no Twitter com "tinturas racistas", confiram os textos:
Aqui o indivíduo com sobrenome italiano: Link1
Aqui o indivíduo com sobrenome espanhol: Link2
Aqui está mesclado (a coisa se dissemina e se torna "senso comum" entre grupos que se consideram "brancos"): Link3
A questão do preconceito regional é uma questão é étnica (eu geralmente uso mais este termo ao invés de "racial"), então ao invés de citar regiões é melhor citar o sobrenome do agressor e a origem do país do sobrenome pois a origem do preconceito se explica melhor por aí (questões étnicas, nichos).
Eu não concordo com a colocação da imagem do semiárido numa das matérias pois estereotipa o problema ao invés de explicar, mas isso é o de menos diante da denúncia.
Se você pensa que o tal preconceito regional, como vocês podem ver acima (por exemplo, em São Paulo), é algo "aleatório", "confuso" e sem origem e "briga de regiões", está totalmente errado. O problema dos links das matérias acima é que nunca abordam a questão da forma que está sendo mostrada aqui no blog (citando que é um preconceito racial e social e não regional propriamente), daí pra quem lê a questão pode achar que é algo "difuso", sem "origem" etc e não é. E como sempre começa o choro (vitimismo) dos agressores dizendo que são "perseguidos". Agridem pra depois ficarem chorando como um bando de crianças na TV dizendo que estão "arrependidos" do gesto e bla bla bla.
Na hora de atacar são valentes, quando são confrontados viram um bando de chorões.
Eu sempre tive noção do que era e da origem desse problema, e não é fácil de abordar pois mexe com uma coletividade (descendentes de imigrantes, que são variados, há os desse tipo e os que são assimilados ao país e não manifestam esse tipo de mentalidade), embora antes fosse só uma ideia e não algo convicto como é hoje. Principalmente depois de ver este documentário "A Cultura do Ódio" (de 1992, o vídeo é antigo e que eu saiba o único do gênero do país, em todo esse tempo não fizeram outro abordando a questão da extrema-direita no Brasil), onde o documentário apresenta um vereador paulista com sobrenome italiano, sugerindo leis de discriminação a "nordestinos" em São Paulo. Acho que está na parte 2.
Traduzindo: ele queria atacar caboclos, mestiços que ele considerava inferiores e os rotula de "nordestinos", mesmo se forem paulistas legítimos com ancestrais naquele Estado. O "nordestino" acaba virando sinônimo de negro, caboclo ou mestiço pro racista de alguns estados. Por isso que o problema deve ser tratado como racismo e não "preconceito regional". Eu já afirmei antes que nunca verei um Collor (branco, sobrenome alemão e de família alagoana, e se identifica com Alagoas) ser tratado desta forma por este tipo de pessoa.
O tal vereador do documentário e muita gente que pensa como ele são racistas mesmo. Engraçado que no Brasil os italianos quando chegaram eram chamados pejorativamente de carcamanos, o indivíduo ignora totalmente que os tataravós ou bisavós dele um dia foram tratado como "escória" ou algo parecido, por serem estrangeiros ou virem de um lugar tido como atrasado (pra época). Parece que a ilustre figura do vídeo e os dos links esqueceram ou ignoram essas coisas.
Na cabeça do indivíduo do vídeo (o vereador), parece que São Paulo seria a "Nuova Italia" ou "la nostra Italia" (mesmo com nomes indígenas em todo canto de São Paulo como Morumbi, Anhangabaú, Araraquara, Pacaembu e por aí vai, são inúmeros os locais com nomes indígenas, rsrsrsrs) e que ele quer tratar os nacionais radicados há séculos no Brasil como "estrangeiros". Só rindo.
Ele não usa o termo alusivo à Itália, isto é uma associação que faço por ser algo óbvio, mas esse ranço (racismo) dele é oriundo de nichos étnicos com racistas no meio. Por que a mídia e a academia no Brasil abafam esta questão (salvo raros casos)? Pra resolver um problema é preciso ir à raiz do mesmo, à origem.
Com tanto tempo no Brasil gente como este vereador do vídeo ainda está nesse ufanismo ridículo com o país de origem dos bisavós, tataravós etc, pra impor aos demais membros da comunidade (país) que este indivíduo é "diferente" pela "origem" europeia de tal país. Não é só ele que pensa desta forma, esse é que é o problema maior. É algo arraigado, que pra combater é preciso entender o que eles manifestam, mesmo de forma confusa (sem dar nomes aos bois pra evitar rechaço da opinião pública).
Era e é um negócio tão ridículo que só o vídeo desmoraliza a figura. O que não entendo é como ele não sofreu agressão depois do vídeo. Eu queria ver se ele teria coragem de dizer aquilo olhando a cara de um pernambucano, daqueles bem "cordiais" (se ele tivesse ideia do perigo, nem abriria a boca pra dizer isso).
Se alguém pensa que isto é algo novo (podem ler o texto acima em destaque sobre as políticas racistas e equivocadas do Império), não é, apenas está sendo desfraldado e escancarado de forma mais aberta agora. Só que isso deve ter um combate efetivo, duro e firme, já que fica mais claro qual é a origem do preconceito (uma certa crença de que fazem parte de um grupo "europeu branco" superior a outros) e não com as choradeiras que li como resposta, segregando (reforçando a ideia de segregação com essa identidade regional forjada, pois ignora o próprio contexto étnico da coisa), sem esclarecer a origem disso e se mostrando ofendido ao extremo com ataques de gente preconceituosa que são racistas (a ideia de discriminação dos posts é étnica mesmo, racista). Deve-se tratar o caso como racismo de fato (preconceito racial) e não preconceito regional, como tem sido abordado por conta da questão regional camuflar o racismo (racismo é a ideia de "hierarquia de grupos étnicos sobre outros" e "nordestinos" são são um grupo étnico e sim quem nasce em uma região.
Por que este assunto é relevante? A quem quiser compreender o que se passa hoje no Brasil e a origem desses preconceitos mais recentes no país, incluindo o regional, precisa ler algo sobre o branqueamento do Brasil nos séc. XIX e começo do séc. XX. A origem está lá e como foi dispersa esses contingentes de imigrantes pelo país (a formação de nichos étnicos, as desigualdades regionais provocadas pela concentração de indústrias em alguns estados por políticas equivocadas de governos federais passados etc). Os governos antigos do Brasil (principalmente os autoritários, Monarquia inclusa) criaram um Frankenstein, que agora se apresenta difícil de viver em harmonia com o país, incitando e fomentando pela mídia partidária de alguns Estados da Federação que deveria ser punida judicialmente por isso.
Já citei aqui e repetirei quantas vezes forem necessárias: sou a favor da regulamentação da mídia no Brasil, nos moldes da Alemanha, Inglaterra e algum outro modelo não citado (falam do da Dinamarca). Oligopolização de meios de comunicação (concentração na mão de poucos e em alguns estados) provoca este tipo de discurso de ódio e discurso com tinturas separatistas.
Atualização: dia 07.10.2014
Como já disse antes aqui: Sobre preconceito regional. Mais sobre História do Brasil (é o que penso do problema), eu não apoiarei manifestações de combate a este tipo de preconceito com imagens que reforcem esta ideia estereotipada regional. Essa ideia de "Nordeste homogêneo", sem divisões, estados, bandeiras, além de estúpida (manifestação de ignorância e preconceito), fomenta a ideia de um "subnacionalismo", como tantos outros que podem surgir em outras partes do país.
Acho louvável que as pessoas se manifestem e se manifestem contra o problema mas sem reforçar estereótipos regionais e generalizar grupos de outros estados. Pra combater o problema só batendo na raiz do mesmo, sem fazer isso, podem esquecer, jamais resolverão (quando não, ampliarão o problema).
Qual a finalidade de usar um chapéu de vaqueiro se a pessoa não usa isto no dia a dia? Ou se a maioria das pessoas na região e nos Estados não usam isto? É só pra fazer figura? Por que a TV impôs que todos usam isto?
É isso que eu chamo de reprodução de estereótipos. Por mais bem intencionado que seja a manifestação, é algo que reforça o preconceito e não combate, além de ser algo forçado.
Segue o trecho abaixo em destaque sobre o branqueamento no Brasil e o medo das autoridades de que se criassem "nichos étnicos" que viessem a discriminar a população nativa ou se comportarem como não-nacionais. Embora eu deva ainda continuar procurando os outros PDFs pra ver se bate com esse, o conteúdo se não for o mesmo é muito próximo ao que li (eu diria que o texto é este mesmo) e explica o problema. O texto fala das políticas de branqueamento do Brasil e da "engenharia social" pra remodelar o Brasil em uma "nação branca", ou seja: eugenia. O governo do Império e outros governos brasileiros praticaram eugenia pra "modelar etnicamente o país". Este problema que veio ou surge com a imigração europeia do século XIX e do começo do século XX é a origem (ou uma das) do preconceito regional proferido hoje no Brasil, por gente com posições retrógradas oriunda desses nichos étnicos.
O problema tem nome, por isso precisa ser tratado como tal e não mascarado como boa parte da mídia faz no país. Não é um fenômeno isolado embora pouco explorado pelos pesquisadores (historiadores) do país (taí uma sugestão pra pesquisas: analisar a mutação ou mascaramento do preconceito racial no Brasil em preconceito regional, até o atual ou a formação disso, desde o Brasil monárquico com a política de branqueamento, passando pelo Estado Novo até os dias atuais).
Leiam o trecho:
A política imigratória brasileira pode ser abordada por inúmeros ângulos, a quantidade considerável de trabalhos que a possui por tema denotam isso. Todavia, à época da sua implementação, destacavam-se três maneiras de problematizá-la. Uma defendia a entrada de colonos europeus como uma estratégia para inserir na visão de mundo dos brasileiros a mentalidade do trabalho livre, da pequena propriedade rural, assim como um meio de plantar cá a semente da indústria. A imagem tinha do trabalhador europeu era a de naturalmente melhor que o nacional de mais apto ao trabalho livre. Esta corrente, enfim, acreditava no efeito pedagógico da imigração, na sua capacidade de melhorar o Brasil e seu povo, mas não descartava o investimento nos nacionais. Assim, questões básicas como educação, redistribuição de terras e políticas de amparo para os ex-escravos caminhavam em conjunto com a defesa da vinda de europeus. O nome mais conhecido desta vertente, possivelmente é o de Joaquim Nabuco. Outro argumento proposto defendia a vinda dos imigrantes para aumentar o contingente populacional branco, o que também aparece na corrente anterior, e isso, “naturalmente”, ampliaria as possibilidades de desenvolvimento do país. Há, portanto, uma pronta responsabilização das populações não-brancas pelas mazelas do Brasil.Trecho extraído de: Hierarquias brasileiras: A abolição da escravatura e as teorias do racismo científico.
E mais, seguindo as postulações do darwinismo social no processo de concorrência natural entre as espécies, os mais aptos prevaleceriam - neste caso, as populações brancas permaneceriam e as demais desapareceriam. Em algumas regiões esta proposição de fato se realizou, mas de modo artificial, com populações sendo expulsas à força ou mesmo exterminadas. Por fim, a terceira maneira dava conta de trazer um contingente populacional branco para, como nos dois casos anteriores, “desafricanizar” o Brasil e melhorar a “raça brasileira”. Pois, aplicando as máximas da sobrevivência do mais apto à miscigenação, acreditava-se que após cruzamentos sucessivos da população brasileira com os colonos europeus, os caracteres brancos prevaleceriam, transformando o Brasil num país de população branca. Esta era, em certa medida, a crença de Silvio Romero, apesar da sua desconfiança no formato dado à política imigratória brasileira. As duas últimas argumentações em prol da imigração diferem de maneira marcante, justamente, naquilo que diz respeito à miscigenação. A segunda a condena
enquanto a terceira localiza nela uma solução.
É evidente o pressuposto comum de todas estas vertente: a superioridade do elemento branco/europeu sobre os demais. As diferenças entre elas estão em como tal superioridade seria útil ao Brasil. Pois, ao mesmo tempo em que a imigração era vista como uma possibilidade de redenção do país, ela também poderia ser sua perdição, sua aniquilação através da fragmentação. Nesse sentido, concordavam alguns letrados importantes do contexto, como Nina Rodrigues, Silvio Romero e Euclides da Cunha. Todos eles estavam preocupados com a constituição da nação, de uma nação forte e imponente segundo os parâmetros (europeus) da época. Logo, eles viam o assentamento de um contingente significativo de indivíduos da mesma “raça” em localidades próximas, com um clima considerável favorável por ser semelhante ao que imigrantes estavam acostumados na Europa, como um perigo iminente à nação.
Ocorre, então, uma situação interessante na qual é possível encontrar favoráveis à imigração européia, mas contrárias à sua concentração em áreas próximas. O temor era o da constituição de nichos estrangeiros dentro da nação, de modo que o desejo era por colonos que se incorporassem à vida nacional. O “Brasil diferente” almejado afinal não deveria ser tão diferente, por isso a assimilação à vida nacional dos colonos europeus era ponto pacifico.17
A política de imigração brasileira é parte da política do branqueamento e sem dúvida uma expressão nítida da influência do racismo científico na composição da visão de mundo dos brasileiros, uma vez que expressa a descrença no brasileiro como tipo apto ao
desenvolvimento, por um lado, e a crença nos tipos brancos/europeus como superiores, por outro. E uma das formas de materialização disto pode ser observada no senso comum. Como foi dito o Brasil melhor, o Brasil ideal, o Brasil que deu certo na visão de mundo vigente no país é aquele, supostamente, mais perto da Europa, mais branco. O Brasil do sul. Essas medidas todas nos fazem retomar o argumento de Mariza Corrêa, quando a autora afirma que as diferenças sociais existentes entre brancos e negros no Brasil não são reflexo do acaso, do desenvolvimento “natural” das forças produtivas, nem da existência (um dia) da escravidão, a exclusão dos negros e descendentes de vários setores da vida pública brasileira igualmente não advém de uma legislação específica. “(...) Essa exclusão parece ter sido também o resultado de uma atuação coerente, apoiada por um racismo ‘científico’, que legitimou iniciativas políticas (...) como no caso dos privilégios concedidos à imigração que tiveram como consequência uma entrada maciça de brancos no país(...)”.18
Com efeito, o período pós-abolição é marcado pelo fim da desigualdade jurídica entre os membros da sociedade brasileira com a extinção da escravidão. Ao mesmo tempo pela busca em se manter o mesmo padrão de relações sociais altamente hierarquizadas através de um discurso e de uma atuação intelectual coerente, ativa e responsável, em grande medida, pela internalização de atributos de superioridade por uns e de inferioridade por outros. Desta feita, as hierarquias brasileiras, elementos importantes à constituição da visão de mundo vigente no país tanto no período do pós-abolição quanto ainda hoje são devedoras, em muito, dos pressupostos do racismo científico.
Autor: Hilton Costa1
Site: A experiência dos africanos e seus descendentes no Brasil (escravidaoeliberdade)
http://www.escravidaoeliberdade.com.br/site/images/Textos3/hilton%20costa.pdf
Com o término do primeiro turno das eleições ontem, houve novamente um surto de preconceito regional no Twitter com "tinturas racistas", confiram os textos:
Aqui o indivíduo com sobrenome italiano: Link1
Aqui o indivíduo com sobrenome espanhol: Link2
Aqui está mesclado (a coisa se dissemina e se torna "senso comum" entre grupos que se consideram "brancos"): Link3
A questão do preconceito regional é uma questão é étnica (eu geralmente uso mais este termo ao invés de "racial"), então ao invés de citar regiões é melhor citar o sobrenome do agressor e a origem do país do sobrenome pois a origem do preconceito se explica melhor por aí (questões étnicas, nichos).
Eu não concordo com a colocação da imagem do semiárido numa das matérias pois estereotipa o problema ao invés de explicar, mas isso é o de menos diante da denúncia.
Se você pensa que o tal preconceito regional, como vocês podem ver acima (por exemplo, em São Paulo), é algo "aleatório", "confuso" e sem origem e "briga de regiões", está totalmente errado. O problema dos links das matérias acima é que nunca abordam a questão da forma que está sendo mostrada aqui no blog (citando que é um preconceito racial e social e não regional propriamente), daí pra quem lê a questão pode achar que é algo "difuso", sem "origem" etc e não é. E como sempre começa o choro (vitimismo) dos agressores dizendo que são "perseguidos". Agridem pra depois ficarem chorando como um bando de crianças na TV dizendo que estão "arrependidos" do gesto e bla bla bla.
Na hora de atacar são valentes, quando são confrontados viram um bando de chorões.
Eu sempre tive noção do que era e da origem desse problema, e não é fácil de abordar pois mexe com uma coletividade (descendentes de imigrantes, que são variados, há os desse tipo e os que são assimilados ao país e não manifestam esse tipo de mentalidade), embora antes fosse só uma ideia e não algo convicto como é hoje. Principalmente depois de ver este documentário "A Cultura do Ódio" (de 1992, o vídeo é antigo e que eu saiba o único do gênero do país, em todo esse tempo não fizeram outro abordando a questão da extrema-direita no Brasil), onde o documentário apresenta um vereador paulista com sobrenome italiano, sugerindo leis de discriminação a "nordestinos" em São Paulo. Acho que está na parte 2.
Traduzindo: ele queria atacar caboclos, mestiços que ele considerava inferiores e os rotula de "nordestinos", mesmo se forem paulistas legítimos com ancestrais naquele Estado. O "nordestino" acaba virando sinônimo de negro, caboclo ou mestiço pro racista de alguns estados. Por isso que o problema deve ser tratado como racismo e não "preconceito regional". Eu já afirmei antes que nunca verei um Collor (branco, sobrenome alemão e de família alagoana, e se identifica com Alagoas) ser tratado desta forma por este tipo de pessoa.
O tal vereador do documentário e muita gente que pensa como ele são racistas mesmo. Engraçado que no Brasil os italianos quando chegaram eram chamados pejorativamente de carcamanos, o indivíduo ignora totalmente que os tataravós ou bisavós dele um dia foram tratado como "escória" ou algo parecido, por serem estrangeiros ou virem de um lugar tido como atrasado (pra época). Parece que a ilustre figura do vídeo e os dos links esqueceram ou ignoram essas coisas.
Na cabeça do indivíduo do vídeo (o vereador), parece que São Paulo seria a "Nuova Italia" ou "la nostra Italia" (mesmo com nomes indígenas em todo canto de São Paulo como Morumbi, Anhangabaú, Araraquara, Pacaembu e por aí vai, são inúmeros os locais com nomes indígenas, rsrsrsrs) e que ele quer tratar os nacionais radicados há séculos no Brasil como "estrangeiros". Só rindo.
Ele não usa o termo alusivo à Itália, isto é uma associação que faço por ser algo óbvio, mas esse ranço (racismo) dele é oriundo de nichos étnicos com racistas no meio. Por que a mídia e a academia no Brasil abafam esta questão (salvo raros casos)? Pra resolver um problema é preciso ir à raiz do mesmo, à origem.
Com tanto tempo no Brasil gente como este vereador do vídeo ainda está nesse ufanismo ridículo com o país de origem dos bisavós, tataravós etc, pra impor aos demais membros da comunidade (país) que este indivíduo é "diferente" pela "origem" europeia de tal país. Não é só ele que pensa desta forma, esse é que é o problema maior. É algo arraigado, que pra combater é preciso entender o que eles manifestam, mesmo de forma confusa (sem dar nomes aos bois pra evitar rechaço da opinião pública).
Era e é um negócio tão ridículo que só o vídeo desmoraliza a figura. O que não entendo é como ele não sofreu agressão depois do vídeo. Eu queria ver se ele teria coragem de dizer aquilo olhando a cara de um pernambucano, daqueles bem "cordiais" (se ele tivesse ideia do perigo, nem abriria a boca pra dizer isso).
Se alguém pensa que isto é algo novo (podem ler o texto acima em destaque sobre as políticas racistas e equivocadas do Império), não é, apenas está sendo desfraldado e escancarado de forma mais aberta agora. Só que isso deve ter um combate efetivo, duro e firme, já que fica mais claro qual é a origem do preconceito (uma certa crença de que fazem parte de um grupo "europeu branco" superior a outros) e não com as choradeiras que li como resposta, segregando (reforçando a ideia de segregação com essa identidade regional forjada, pois ignora o próprio contexto étnico da coisa), sem esclarecer a origem disso e se mostrando ofendido ao extremo com ataques de gente preconceituosa que são racistas (a ideia de discriminação dos posts é étnica mesmo, racista). Deve-se tratar o caso como racismo de fato (preconceito racial) e não preconceito regional, como tem sido abordado por conta da questão regional camuflar o racismo (racismo é a ideia de "hierarquia de grupos étnicos sobre outros" e "nordestinos" são são um grupo étnico e sim quem nasce em uma região.
Por que este assunto é relevante? A quem quiser compreender o que se passa hoje no Brasil e a origem desses preconceitos mais recentes no país, incluindo o regional, precisa ler algo sobre o branqueamento do Brasil nos séc. XIX e começo do séc. XX. A origem está lá e como foi dispersa esses contingentes de imigrantes pelo país (a formação de nichos étnicos, as desigualdades regionais provocadas pela concentração de indústrias em alguns estados por políticas equivocadas de governos federais passados etc). Os governos antigos do Brasil (principalmente os autoritários, Monarquia inclusa) criaram um Frankenstein, que agora se apresenta difícil de viver em harmonia com o país, incitando e fomentando pela mídia partidária de alguns Estados da Federação que deveria ser punida judicialmente por isso.
Já citei aqui e repetirei quantas vezes forem necessárias: sou a favor da regulamentação da mídia no Brasil, nos moldes da Alemanha, Inglaterra e algum outro modelo não citado (falam do da Dinamarca). Oligopolização de meios de comunicação (concentração na mão de poucos e em alguns estados) provoca este tipo de discurso de ódio e discurso com tinturas separatistas.
Atualização: dia 07.10.2014
Como já disse antes aqui: Sobre preconceito regional. Mais sobre História do Brasil (é o que penso do problema), eu não apoiarei manifestações de combate a este tipo de preconceito com imagens que reforcem esta ideia estereotipada regional. Essa ideia de "Nordeste homogêneo", sem divisões, estados, bandeiras, além de estúpida (manifestação de ignorância e preconceito), fomenta a ideia de um "subnacionalismo", como tantos outros que podem surgir em outras partes do país.
Acho louvável que as pessoas se manifestem e se manifestem contra o problema mas sem reforçar estereótipos regionais e generalizar grupos de outros estados. Pra combater o problema só batendo na raiz do mesmo, sem fazer isso, podem esquecer, jamais resolverão (quando não, ampliarão o problema).
Qual a finalidade de usar um chapéu de vaqueiro se a pessoa não usa isto no dia a dia? Ou se a maioria das pessoas na região e nos Estados não usam isto? É só pra fazer figura? Por que a TV impôs que todos usam isto?
É isso que eu chamo de reprodução de estereótipos. Por mais bem intencionado que seja a manifestação, é algo que reforça o preconceito e não combate, além de ser algo forçado.
terça-feira, 3 de setembro de 2013
Trabalho escravo/forçado no nazismo - bibliografia
O William perguntou aqui sobre material a respeito de trabalho escravo/forçado empregado pelas empresas alemães no período do nazismo. Há alguns pdfs de livros sobre o tema pela web. Em todo caso, segue abaixo links com a bibliografia sobre o tema, algumas informações e indicações de alguns livros. Não consta (exceto se houver citação nas referências nos links) livros em alemão.
Sobre o conjunto de empresas alemãs que empregaram mão de obra escrava durante o nazismo segue o link com uma lista grande delas (citei lista grande pois não vi o nome de algumas corporações como a Volkswagen na lista):
1. German Companies Participating in the Forced/Slave Labor Compensation Fund
2. German Firms That Used Slave or Forced Labor During the Nazi Era
Aqui abaixo tem uma lista de livros (referências) no verbete em inglês sobre trabalho escravo no nazismo:
Forced labour under German rule during World War II
Bibliografia sobre o assunto do site do USHMM (Museu Memorial do Holocausto):
Forced Labor (Forced Labor and Big Business e outras seções)
Texto interessante de Florian Ruhs sobre o trabalho forçado de eslovenos pelo III Reich:
Foreign Workers in the Second World War. The Ordeal of Slovenians in Germany
Site em inglês sobre o trabalho escravo no nazismo, 1939-1945:
Nazi Forced Labor – Background Information
Christopher R. Browning é historiador de renome sobre Holocausto e nazismo e tem livro só sobre a questão do trabalho escravo no nazismo:
1. Remembering Survival: Inside a Nazi Slave-Labor Camp
2. Nazi Policy, Jewish Workers, German Killers
Aqui tem um PDF de um simpósio sobre o assunto no USHMM com o C. Browning e vários outros historiadores só tratando do assunto, tem a lista de referências (livros) ao fim de cada capítulo, 134 páginas:
Forced and Slave Labor in Nazi-Dominated Europe (Symposium Presentations)
Em português, tradução de texto do Holocaust History Project (site) sobre o tema:
Corporações e cooperação com os nazistas
Artido do Le Monde (em inglês), de Frederic F Clairmont, sobre o trabalho escravo na Volkswagen:
Volkswagen’s history of forced labour
Trabalho escravo no programa espacial alemão da era nazista:
1. Andre Sellier. A History of the Dora Camp: The Untold Story of the Nazi Slave Labor Camp That Secretly Manufactured V-2 Rockets
2. Dora and the V2. Slave labor in the space age
Uso de trabalho escravo pela Shell (holandesa) e pela I.G. Farben (alemã) no nazismo, texto de John Donovan, em seis partes (tem todos os links no texto, essa é a sexta parte):
Royal Dutch Shell and the Nazi Part 6: I.G. Farben, Royal Dutch Shell and Nazi slave labor
Trabalho escravo no nazismo por países, site em inglês (referências do texto no final do mesmo):
Forced Labor by Jews under National Socialism
Um dos cabeças do emprego de mão-de-obra escrava no leste foi este aqui:
Odilo Globocnik, forgotten co-author of the Holocaust (by Joseph Poprzeczny)
Tem uma lista bibliográfica nesse artigo:
Exploiting the enemy: The economic contribution of prisoner of war labour to Nazi Germany during WWII (by Johann Custodis)
A questão da Ford e da GM dos EUA com o trabalho escravo no nazismo:
Ford and GM Scrutinized for Alleged Nazi Collaboration (By Michael Dobbs)
A Ford lucrou com trabalho escravo na Alemanha nazi
Ford 'profited from Nazi slave labour' (BBC)
Banco Suíço (UBS) explorou mão-de-obra escrava do nazismo
Swiss bank exploited Nazi slaves (BBC)
Trabalho escravo na BMW, site:
Munich-Allach: Working for BMW
Lista de firmas alemãs famosas que usaram trabalho escravo, Krupp, Bayer, Volkswagen, Daimler-Chrysler (Daimler-Benz), Opel, Hugo Boss (contém links de textos na matéria):
The Awful Truth, Sal vs BMW
Hugo Boss sobre o uso de trabalho escravo no nazismo:
1. 'Hitler's Tailor' Hugo Boss apologises for using slave labour to make Nazi uniforms
2. Hugo Boss comes clean on Nazi past
Lista de livros:
Livro: The Wages of Destruction: The Making and Breaking of the Nazi Economy (link scribd)
Autor: Adam Tooze
Livro: The Architecture of Oppression: The SS, Forced Labor and the Nazi Monumental Building Economy
Autor: Paul B. Jaskot
Livro: Business of Genocide: The SS, Slave Labor, and the Concentration Camps
Autor: Michael Thad Allen
Livro: Hitler's Slave Lords: The Business of Forced Labour in Occupied Europe
Autor: Michael Thad Allen
Livro: Less Than Slaves: Jewish Forced Labor and the Quest for Compensation
Autor: Benjamin B. Ferencz
Livro: Odilo Globocnik, Hitler's Man in the East
Autor: Joseph Poprzeczny
Livro: Jewish forced labor under the Nazis: economic needs and racial aims, 1938-1944 (link do H-net)
Autor: Wolf Gruner
Livro: Hitler's British Slaves
Autor: Sean Longden
Livro: Architects of Annihilation: Auschwitz and the Logic of Destruction
Autor: Götz Aly, Susanne Heim
Livro: Hitler's Foreign Workers: Enforced Foreign Labor in Germany Under the Third Reich
Autor: Ulrich Herbert
Atualização 1: 12.10.2013
Livro: Nazi Steel: Friedrich Flick and German Expansion in Western Europe, 1940-1944
Autor: Marcus O. Jones
Livro: Creating the Nazi Marketplace: Commerce and Consumption in the Third Reich
Autor: S. Jonathan Wiesen
Sobre o conjunto de empresas alemãs que empregaram mão de obra escrava durante o nazismo segue o link com uma lista grande delas (citei lista grande pois não vi o nome de algumas corporações como a Volkswagen na lista):
1. German Companies Participating in the Forced/Slave Labor Compensation Fund
2. German Firms That Used Slave or Forced Labor During the Nazi Era
Aqui abaixo tem uma lista de livros (referências) no verbete em inglês sobre trabalho escravo no nazismo:
Forced labour under German rule during World War II
Bibliografia sobre o assunto do site do USHMM (Museu Memorial do Holocausto):
Forced Labor (Forced Labor and Big Business e outras seções)
Texto interessante de Florian Ruhs sobre o trabalho forçado de eslovenos pelo III Reich:
Foreign Workers in the Second World War. The Ordeal of Slovenians in Germany
Site em inglês sobre o trabalho escravo no nazismo, 1939-1945:
Nazi Forced Labor – Background Information
Christopher R. Browning é historiador de renome sobre Holocausto e nazismo e tem livro só sobre a questão do trabalho escravo no nazismo:
1. Remembering Survival: Inside a Nazi Slave-Labor Camp
2. Nazi Policy, Jewish Workers, German Killers
Aqui tem um PDF de um simpósio sobre o assunto no USHMM com o C. Browning e vários outros historiadores só tratando do assunto, tem a lista de referências (livros) ao fim de cada capítulo, 134 páginas:
Forced and Slave Labor in Nazi-Dominated Europe (Symposium Presentations)
Em português, tradução de texto do Holocaust History Project (site) sobre o tema:
Corporações e cooperação com os nazistas
Artido do Le Monde (em inglês), de Frederic F Clairmont, sobre o trabalho escravo na Volkswagen:
Volkswagen’s history of forced labour
Trabalho escravo no programa espacial alemão da era nazista:
1. Andre Sellier. A History of the Dora Camp: The Untold Story of the Nazi Slave Labor Camp That Secretly Manufactured V-2 Rockets
2. Dora and the V2. Slave labor in the space age
Uso de trabalho escravo pela Shell (holandesa) e pela I.G. Farben (alemã) no nazismo, texto de John Donovan, em seis partes (tem todos os links no texto, essa é a sexta parte):
Royal Dutch Shell and the Nazi Part 6: I.G. Farben, Royal Dutch Shell and Nazi slave labor
Trabalho escravo no nazismo por países, site em inglês (referências do texto no final do mesmo):
Forced Labor by Jews under National Socialism
Um dos cabeças do emprego de mão-de-obra escrava no leste foi este aqui:
Odilo Globocnik, forgotten co-author of the Holocaust (by Joseph Poprzeczny)
Tem uma lista bibliográfica nesse artigo:
Exploiting the enemy: The economic contribution of prisoner of war labour to Nazi Germany during WWII (by Johann Custodis)
A questão da Ford e da GM dos EUA com o trabalho escravo no nazismo:
Ford and GM Scrutinized for Alleged Nazi Collaboration (By Michael Dobbs)
A Ford lucrou com trabalho escravo na Alemanha nazi
Ford 'profited from Nazi slave labour' (BBC)
Banco Suíço (UBS) explorou mão-de-obra escrava do nazismo
Swiss bank exploited Nazi slaves (BBC)
Trabalho escravo na BMW, site:
Munich-Allach: Working for BMW
Lista de firmas alemãs famosas que usaram trabalho escravo, Krupp, Bayer, Volkswagen, Daimler-Chrysler (Daimler-Benz), Opel, Hugo Boss (contém links de textos na matéria):
The Awful Truth, Sal vs BMW
Hugo Boss sobre o uso de trabalho escravo no nazismo:
1. 'Hitler's Tailor' Hugo Boss apologises for using slave labour to make Nazi uniforms
2. Hugo Boss comes clean on Nazi past
Lista de livros:
Livro: The Wages of Destruction: The Making and Breaking of the Nazi Economy (link scribd)
Autor: Adam Tooze
Livro: The Architecture of Oppression: The SS, Forced Labor and the Nazi Monumental Building Economy
Autor: Paul B. Jaskot
Livro: Business of Genocide: The SS, Slave Labor, and the Concentration Camps
Autor: Michael Thad Allen
Livro: Hitler's Slave Lords: The Business of Forced Labour in Occupied Europe
Autor: Michael Thad Allen
Livro: Less Than Slaves: Jewish Forced Labor and the Quest for Compensation
Autor: Benjamin B. Ferencz
Livro: Odilo Globocnik, Hitler's Man in the East
Autor: Joseph Poprzeczny
Livro: Jewish forced labor under the Nazis: economic needs and racial aims, 1938-1944 (link do H-net)
Autor: Wolf Gruner
Livro: Hitler's British Slaves
Autor: Sean Longden
Livro: Architects of Annihilation: Auschwitz and the Logic of Destruction
Autor: Götz Aly, Susanne Heim
Livro: Hitler's Foreign Workers: Enforced Foreign Labor in Germany Under the Third Reich
Autor: Ulrich Herbert
Atualização 1: 12.10.2013
Livro: Nazi Steel: Friedrich Flick and German Expansion in Western Europe, 1940-1944
Autor: Marcus O. Jones
Livro: Creating the Nazi Marketplace: Commerce and Consumption in the Third Reich
Autor: S. Jonathan Wiesen
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quinta-feira, 30 de maio de 2013
Hitler sobre os povos bálticos e eslavos
Quando Goebbels expressou seu desprezo pelos povos bálticos e da Ucrânia simplesmente seguia as opiniões de seu Führer. Que igual a ele, não fazia distinção entre bálticos ou eslavos, aliados ou inimigos. Todos são simplesmente subumanos.
[Noite de 17-18 de setembro de 1941]
Os povos eslavos não foram destinados a viver uma vida própria. Eles sabem disso e lhes faríamos mal em persuadi-los do contrário. Fomos nós que criamos em 1918 os países bálticos e a Ucrânia. Mas hoje não temos nenhum interesse em manter os estados bálticos nem em criar uma Ucrânia independente. Temos igualmente que impedir sua volta ao cristianismo. Seria um grande erro, seria como lhes dar uma forma de organização.
Tampouco sou partidário de que haja uma universidade em Kiev. Mais vale não lhes ensinar a ler. Não vão nos querer porque lhes torturemos com escolas. Só o fato de lhes dar uma locomotiva para conduzir seria um grande erro. E que tolice, de nossa parte, realizar uma distribuição de terras! Apesar de tudo isto, faremos com que os indígenas vivam melhor do que já viveram até agora. Entre eles encontraremos material humano necessário para cultivar a terra.
Proveremos de cereais a todos os que na Europa carecem deles. A Crimeia nos dará os frutos do sul, o algodão e a borracha (40.000 hectares de plantações serão suficientes para assegurar nossa independência).
Os pântanos de Pripet nos manterão abastecidos de juncos.
Aos ucranianos lhes forneceremos lenços, pedras de cristal e tudo aquilo que os povos colonizados gostam.
Livro: Las conversaciones privadas de Hitler (Bormann-Vermerke); Tradução de Alfredo Nieto, Alberto Vilán, Renato Lavergne e Alberto Clavería. Editora Crítica, Barcelona 2004. pg. 27. Em inglês o título do livro é Hitler's Table Talk, organizado por Hugh Trevor-Roper, historiador britânico. Em formato ebook.
Fonte: blog antirrevisionismo (Espanha)
http://antirrevisionismo.wordpress.com/2008/07/02/hitler-sobre-los-pueblos-balticos-y-eslavos/
Tradução: Roberto Lucena
[Noite de 17-18 de setembro de 1941]
Os povos eslavos não foram destinados a viver uma vida própria. Eles sabem disso e lhes faríamos mal em persuadi-los do contrário. Fomos nós que criamos em 1918 os países bálticos e a Ucrânia. Mas hoje não temos nenhum interesse em manter os estados bálticos nem em criar uma Ucrânia independente. Temos igualmente que impedir sua volta ao cristianismo. Seria um grande erro, seria como lhes dar uma forma de organização.
Tampouco sou partidário de que haja uma universidade em Kiev. Mais vale não lhes ensinar a ler. Não vão nos querer porque lhes torturemos com escolas. Só o fato de lhes dar uma locomotiva para conduzir seria um grande erro. E que tolice, de nossa parte, realizar uma distribuição de terras! Apesar de tudo isto, faremos com que os indígenas vivam melhor do que já viveram até agora. Entre eles encontraremos material humano necessário para cultivar a terra.
Proveremos de cereais a todos os que na Europa carecem deles. A Crimeia nos dará os frutos do sul, o algodão e a borracha (40.000 hectares de plantações serão suficientes para assegurar nossa independência).
Os pântanos de Pripet nos manterão abastecidos de juncos.
Aos ucranianos lhes forneceremos lenços, pedras de cristal e tudo aquilo que os povos colonizados gostam.
Livro: Las conversaciones privadas de Hitler (Bormann-Vermerke); Tradução de Alfredo Nieto, Alberto Vilán, Renato Lavergne e Alberto Clavería. Editora Crítica, Barcelona 2004. pg. 27. Em inglês o título do livro é Hitler's Table Talk, organizado por Hugh Trevor-Roper, historiador britânico. Em formato ebook.
Fonte: blog antirrevisionismo (Espanha)
http://antirrevisionismo.wordpress.com/2008/07/02/hitler-sobre-los-pueblos-balticos-y-eslavos/
Tradução: Roberto Lucena
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quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013
As marcas do nazismo no Brasil
Muitas pessoas preferem esquecer o passado, ainda mais quando ele é doloroso. Quando se trata de um fenômeno cruel como o nazismo, alguns preferem abafar a História por vergonha do mal que fizeram. Muito se fala do que foi o nazismo na Europa e das suas dolorosas consequências, mas quando se trata de discutir a influência dessa ideologia no Brasil, o assunto morre. Para resgatar a memória de quem sofreu com a expansão da ideologia nazista em terras brasileiras, a Revista de História da Biblioteca Nacional revirou documentos e descobriu a história retratada em “Entre a suástica e a palmatória“.
O vídeo é fruto de uma reportagem especial feita depois de viagens a Campina do Monte Alegre, no interior de São Paulo, e Foz do Iguaçu, no Paraná. A investigação descobriu a existência de duas fazendas no interior de São Paulo que não escondiam a sua simpatia pela ideologia nazista ao longo dos anos 30 e 40. As fazendas pertenciam aos Rocha Miranda, família de prestígio na cidade. Materiais de arquivo mostram que os Rocha Miranda implantaram no seu dia-a-dia a suástica, símbolo máximo do movimento nazista. Tijolos, gado e documentos eram marcados com o desenho. Na fazenda ao lado, a influência nazista foi além: os Rocha Miranda selecionaram 50 meninos órfãos, na sua maioria negros, e colocaram as crianças para trabalhar em regime de escravidão.
A reportagem entrou em contato com pessoas que viveram na época, incluindo dois sobreviventes do grupo de jovens que trabalhavam na fazenda dos Rocha Miranda: Aloísio Silva, que suportou a exploração até ser libertado em 1945, e Argemiro Santos, que fugiu da fazenda aos 14 anos. Veja o depoimento dos dois no vídeo abaixo:
Observação: este assunto já foi reproduzido aqui (Entre a suástica e a palmatória - Fazenda nazi), texto original aqui, só que não lembro se deixei o vídeo de fora do post pra colocar neste ou se não constava antes. Em todo caso o vídeo sobre a história da fazenda está acima.
Peço desculpas ao remetente por não ter podido responder um email que chegou na época da primeira matéria sobre fazenda creio que de alguém de lá comentando para publicar algo sobre o assunto. Várias matérias sobre o assunto foram reproduzidos no blog. Pra acessar todas as matérias sobre a fazenda basta clicar na tag fazenda nazista.
O vídeo é fruto de uma reportagem especial feita depois de viagens a Campina do Monte Alegre, no interior de São Paulo, e Foz do Iguaçu, no Paraná. A investigação descobriu a existência de duas fazendas no interior de São Paulo que não escondiam a sua simpatia pela ideologia nazista ao longo dos anos 30 e 40. As fazendas pertenciam aos Rocha Miranda, família de prestígio na cidade. Materiais de arquivo mostram que os Rocha Miranda implantaram no seu dia-a-dia a suástica, símbolo máximo do movimento nazista. Tijolos, gado e documentos eram marcados com o desenho. Na fazenda ao lado, a influência nazista foi além: os Rocha Miranda selecionaram 50 meninos órfãos, na sua maioria negros, e colocaram as crianças para trabalhar em regime de escravidão.
A reportagem entrou em contato com pessoas que viveram na época, incluindo dois sobreviventes do grupo de jovens que trabalhavam na fazenda dos Rocha Miranda: Aloísio Silva, que suportou a exploração até ser libertado em 1945, e Argemiro Santos, que fugiu da fazenda aos 14 anos. Veja o depoimento dos dois no vídeo abaixo:
Observação: este assunto já foi reproduzido aqui (Entre a suástica e a palmatória - Fazenda nazi), texto original aqui, só que não lembro se deixei o vídeo de fora do post pra colocar neste ou se não constava antes. Em todo caso o vídeo sobre a história da fazenda está acima.
Peço desculpas ao remetente por não ter podido responder um email que chegou na época da primeira matéria sobre fazenda creio que de alguém de lá comentando para publicar algo sobre o assunto. Várias matérias sobre o assunto foram reproduzidos no blog. Pra acessar todas as matérias sobre a fazenda basta clicar na tag fazenda nazista.
sábado, 8 de dezembro de 2012
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 04
6. Negro Contra Negro
Em 1921, o Estado do Mato Grosso ofereceu concessões de terras para empresários americanos. Quando souberam do recrutamento de trabalhadores afro-americanos para ocupar tais terras, imediatamente, o presidente do Estado, um bispo católico, cancelou as concessões. O Itamarati, em medida preventiva, deliberou negar vistos diplomáticos para esses potenciais imigrantes.30 Dada a preocupação da elite em evitar o "enegrecimento" do país, dois deputados federais Andrade Bezerra (PE) e Cincinato Braga (SP) apresentaram o Projeto de Lei nº 209 no Congresso, após o episódio, em 1921, propondo a proibição da entrada de imigrantes negros. Sem apoio político suficiente, o projeto foi arquivado; todavia, a idéia permaneceu viva. Dois anos depois, um outro deputado federal, Fidélis Reis (MG), apresentou uma nova versão do projeto cuja essência continuava sendo a barreira de cor.31 A repercussão na opinião pública teve desdobramentos na "imprensa negra", que mediante uma série de artigos não escamoteou sua posição sobre a matéria:
Assim, quando se cogitou a imigração de negros norte-americanos para o Brasil, a "imprensa negra" reagiu com repulsa. Os motivos eram diversos. Um dos argumentos era que tais negros transplantariam o ódio racial para nosso país, representando uma "ameaça à harmonia e à paz da nação". Como a fusão das raças implicaria, necessariamente, o desaparecimento do negro, a entrada de negros americanos iria retardar este processo:
Os autores destes artigos avaliavam o negro norte-americano como refratário à miscigenação; logo, sua presença no país colocaria em risco o projeto de branqueamento, embora cientes de que a imigração estava orientada politicamente por uma conotação racista: contra negros, índios e asiáticos, os articulistas defendiam a entrada de imigrantes como necessidade. Portanto, a questão devia ser colocada nos seguintes termos: qual era o imigrante mais conveniente para resolver o problema do negro?33
Apesar da dúvida quanto à qualidade étnica dos estrangeiros que entraram no estado de São Paulo, era praticamente consensual a rejeição da "immigração de pretos". Os vários grupos étnicos aceitos pela política imigratória do estado renovavam a esperança de branqueamento. Por isso, a seleção racial passava estritamente pelo critério: ser de "raça branca", independente da origem nacional do imigrante.
Considerações Finais
O fenômeno do branqueamento tinha a "proeza" de ocultar o racismo anti-negro que trazia na sua essência Este fenômeno foi levado a cabo de maneira acentuada pela elite paulista no início do século XX, sendo difundido intensamente pelo discurso científico e previsões estatísticas. Já sua dimensão ideológica, penetrou e foi compactuada ou absorvida por uma fração da comunidade negra, sob a forma de branqueamento: "estético", "biológico" e "social". O paradigma branco de beleza, comportamento, moral, mentalidade, etiqueta e cultura, foram assimilados e reassimilados, total ou parcialmente, por alguns membros daquela comunidade. O embuste racial chegou ao extremo de alguns negros repudiarem a hipótese do Brasil e, em particular, São Paulo, receber imigrantes do mesmo grupo racial, fossem estadunidenses ou africanos, pois temiam o "enegrecimento" do estado.
Como escreve Iray Carone, o branqueamento foi "uma pressão cultural exercida pela hegemonia branca, sobretudo após a Abolição da Escravatura, para que o negro negasse a si mesmo, no seu corpo e na sua mente, como uma espécie de condição para se integrar (ser aceito e ter mobilidade social) na nova ordem social" (Bento & Carone, 2002:14). Em linhas gerais, essa também é a explicação de Florestan Fernandes, para quem só é possível entrar no "mundo dos brancos" passando por um "processo de abrasileiramento que é, inapelavelmente, um processo sistemático de embranquecimento" (Fernandes, 1972:16).35 Contudo, é necessário repensar essa interpretação corrente de conceber branqueamento como sinônimo ou pré-requisito da integração do negro na sociedade de classes. Segundo Maria Aparecida Silva Bento, "isso decorre do fato de que essa sociedade de classes se considera, de fato, como um mundo dos brancos no qual o negro não deve penetrar" (Bento & Carone, 2002:52). Já Angela Figueiredo vai mais longe, postulando que "quase todos nós nascemos embranquecidos, visto que há uma predominância dos aspectos da cultura branca se é que assim podemos denominá-la em nossa sociedade, e só enegrecem ou se tornam negros ao longo dos anos os que optam por incluir em suas vidas os aspectos identificados com a cultura negra e se tornam curiosos em conhecer o seu passado" (Figueiredo, 2002:104).
De toda sorte, foi possível inferir que a ideologia do branqueamento no início do século XX em São Paulo deformou as relações raciais: contribuiu para desenvolver, no branco, um certo complexo de superioridade e, no negro, em contraposição, um complexo de inferioridade. Os brancos, independente da classe social, produziram uma auto-representação positiva e concebiam seus valores como naturalmente superior. Já alguns negros, construíram uma auto-imagem negativa e passaram a se avaliar como inferiores.36 Na verdade, estabeleceu-se um círculo vicioso: quanto mais profundos os traumas do racismo, mais o negro ajustava seu comportamento e atitudes de acordo com a ideologia do branqueamento; quanto maior os ataques racistas, mais profundos eram os traumas. Nesse sentido, a interiorização da ideologia do branqueamento pelo negro deve ser entendida como um mecanismo psicossocial, utilizado para evitar as agruras do racismo à paulista.
Referências Bibliográficas
Neste link do texto original no Scielo.
*Este texto é a versão parcial e reajustada de um dos capítulos da minha dissertação de mestrado, intitulada Uma História Não Contada. Negro, Racismo e Trabalho no Pós-Abolição em São Paulo (1889-1930), FFLCH/USP, 2001. Agradeço às valiosas sugestões dos(as) pareceristas da revista para a melhoria deste artigo.
NOTAS
30. Ao consultar o arquivo do Itamarati, Jeff Lesser constatou que, em 1921, "o ministro das Relações Exteriores, José Manoel de Azevedo Marques, temendo a entrada de afro-americanos no País, instruiu a Embaixada do Brasil em Washington e os consulados a recusar vistos para todos os imigrantes negros destinados ao Brasil" (Lesser, 1994:85).
31. Uma análise desses projetos encontra-se em Skidmore (1976:212-16) e em Souza Ramos (1996:65-8). Como afirma este autor, para a elite "o risco da imigração de negros norte-americanos, para além de sua suposta inferioridade racial, consistia na possibilidade de que não se fundissem, seja fisicamente ao trabalhador nacional, seja simbolicamente à cultura brasileira" (ibidem:79).
32. "Fomos sempre, intransigentemente, contrarios á entrada dos negros norte-americanos no Brasil, isso porque não era um individuo que buscava agasalho em nossa Patria, mas um bando de homens que prentendia invadir a nossa terra, trazendo além da differença de costumes, de habitos, de tradições e de lingua, o odio indomavel à raça branca existente nos negros yankees" (Getulino, Campinas, 24/2/1924:1). Ver, também, 30/9/1923.
33. Quando Ford resolveu montar uma unidade exploratória dos recursos minerais e reservas naturais no norte do país em 1929, voltou aos noticiários a polêmica da imigração de negros americanos. Os jornais eram radicalmente contra que se importasse trabalhadores negros. "Os comentários a respeito da propalada emigração de negros americanos para o Pará (concessões do Tapajos) promovida pela empresa Ford parece que foram precipitadas (Progresso, São Paulo, 28/7/1929).
34. "Colonias extrangeiras" (Progresso, São Paulo, 31/1/1930:1).
35. Tal assertiva, igualmente, encontra-se em Cardoso & Ianni (1960:224).
36. Roger Bastide destacou a ambigüidade da ideologia racial construída pelos negros: "há pois uma ambivalência nessas ideologias, um flutuação entre o racismo puro, o orgulho da cor, e um sentimento de inferioridade, que leva à imitação do branco, à adoção dos seus pontos de vista, e à tentativa de apresentar a imagem de um negro branco" (Bastide & Fernandes, 1959:167).
Fonte: Scielo (Estud. afro-asiát. vol.24 no.3 Rio de Janeiro 2002)
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-546X2002000300006&script=sci_arttext
Autor: Petrônio José Domingues
Ver também:
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 03
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 02
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 01
Em 1921, o Estado do Mato Grosso ofereceu concessões de terras para empresários americanos. Quando souberam do recrutamento de trabalhadores afro-americanos para ocupar tais terras, imediatamente, o presidente do Estado, um bispo católico, cancelou as concessões. O Itamarati, em medida preventiva, deliberou negar vistos diplomáticos para esses potenciais imigrantes.30 Dada a preocupação da elite em evitar o "enegrecimento" do país, dois deputados federais Andrade Bezerra (PE) e Cincinato Braga (SP) apresentaram o Projeto de Lei nº 209 no Congresso, após o episódio, em 1921, propondo a proibição da entrada de imigrantes negros. Sem apoio político suficiente, o projeto foi arquivado; todavia, a idéia permaneceu viva. Dois anos depois, um outro deputado federal, Fidélis Reis (MG), apresentou uma nova versão do projeto cuja essência continuava sendo a barreira de cor.31 A repercussão na opinião pública teve desdobramentos na "imprensa negra", que mediante uma série de artigos não escamoteou sua posição sobre a matéria:
A imigração negra norte-americana prejudica a solução do problema negro brasileiro e ameaça a harmonia da raça e a paz da nação.
Estamos alistados no exercito daquelles que combatem em todo e qualquer terreno, a invasão do negro norte-americano no nosso paiz.
Apoiamos francamente attitude patriotica assumida pelo governo ante a grave ameaça da immigração negra, e a combateremos pela pena e pela palavra porque ella representa, indiscutivelmente, o maior prejuiso para a solução do problema negro brasileiro. (Getulino, Campinas, 23/9/1923:1)32
Assim, quando se cogitou a imigração de negros norte-americanos para o Brasil, a "imprensa negra" reagiu com repulsa. Os motivos eram diversos. Um dos argumentos era que tais negros transplantariam o ódio racial para nosso país, representando uma "ameaça à harmonia e à paz da nação". Como a fusão das raças implicaria, necessariamente, o desaparecimento do negro, a entrada de negros americanos iria retardar este processo:
A vinda dos negros norte-americanos será o golpe de morte para aquela obra mathematica, do desapparecimento gradativo da raça negra no Brasil. (Getulino, Campinas, 23/9/1923:1)
Os autores destes artigos avaliavam o negro norte-americano como refratário à miscigenação; logo, sua presença no país colocaria em risco o projeto de branqueamento, embora cientes de que a imigração estava orientada politicamente por uma conotação racista: contra negros, índios e asiáticos, os articulistas defendiam a entrada de imigrantes como necessidade. Portanto, a questão devia ser colocada nos seguintes termos: qual era o imigrante mais conveniente para resolver o problema do negro?33
Não cuidamos de saber se, por exemplo, a imigração russa nos e prejudicial ou util. Ignoramos se nos convem ou não que para aqui afluam correntes de israelitas. Nesse ponto, podemos dizer que apenas somos unanimes quando se trata da immigração de pretos.34
Apesar da dúvida quanto à qualidade étnica dos estrangeiros que entraram no estado de São Paulo, era praticamente consensual a rejeição da "immigração de pretos". Os vários grupos étnicos aceitos pela política imigratória do estado renovavam a esperança de branqueamento. Por isso, a seleção racial passava estritamente pelo critério: ser de "raça branca", independente da origem nacional do imigrante.
Considerações Finais
O fenômeno do branqueamento tinha a "proeza" de ocultar o racismo anti-negro que trazia na sua essência Este fenômeno foi levado a cabo de maneira acentuada pela elite paulista no início do século XX, sendo difundido intensamente pelo discurso científico e previsões estatísticas. Já sua dimensão ideológica, penetrou e foi compactuada ou absorvida por uma fração da comunidade negra, sob a forma de branqueamento: "estético", "biológico" e "social". O paradigma branco de beleza, comportamento, moral, mentalidade, etiqueta e cultura, foram assimilados e reassimilados, total ou parcialmente, por alguns membros daquela comunidade. O embuste racial chegou ao extremo de alguns negros repudiarem a hipótese do Brasil e, em particular, São Paulo, receber imigrantes do mesmo grupo racial, fossem estadunidenses ou africanos, pois temiam o "enegrecimento" do estado.
Como escreve Iray Carone, o branqueamento foi "uma pressão cultural exercida pela hegemonia branca, sobretudo após a Abolição da Escravatura, para que o negro negasse a si mesmo, no seu corpo e na sua mente, como uma espécie de condição para se integrar (ser aceito e ter mobilidade social) na nova ordem social" (Bento & Carone, 2002:14). Em linhas gerais, essa também é a explicação de Florestan Fernandes, para quem só é possível entrar no "mundo dos brancos" passando por um "processo de abrasileiramento que é, inapelavelmente, um processo sistemático de embranquecimento" (Fernandes, 1972:16).35 Contudo, é necessário repensar essa interpretação corrente de conceber branqueamento como sinônimo ou pré-requisito da integração do negro na sociedade de classes. Segundo Maria Aparecida Silva Bento, "isso decorre do fato de que essa sociedade de classes se considera, de fato, como um mundo dos brancos no qual o negro não deve penetrar" (Bento & Carone, 2002:52). Já Angela Figueiredo vai mais longe, postulando que "quase todos nós nascemos embranquecidos, visto que há uma predominância dos aspectos da cultura branca se é que assim podemos denominá-la em nossa sociedade, e só enegrecem ou se tornam negros ao longo dos anos os que optam por incluir em suas vidas os aspectos identificados com a cultura negra e se tornam curiosos em conhecer o seu passado" (Figueiredo, 2002:104).
De toda sorte, foi possível inferir que a ideologia do branqueamento no início do século XX em São Paulo deformou as relações raciais: contribuiu para desenvolver, no branco, um certo complexo de superioridade e, no negro, em contraposição, um complexo de inferioridade. Os brancos, independente da classe social, produziram uma auto-representação positiva e concebiam seus valores como naturalmente superior. Já alguns negros, construíram uma auto-imagem negativa e passaram a se avaliar como inferiores.36 Na verdade, estabeleceu-se um círculo vicioso: quanto mais profundos os traumas do racismo, mais o negro ajustava seu comportamento e atitudes de acordo com a ideologia do branqueamento; quanto maior os ataques racistas, mais profundos eram os traumas. Nesse sentido, a interiorização da ideologia do branqueamento pelo negro deve ser entendida como um mecanismo psicossocial, utilizado para evitar as agruras do racismo à paulista.
Referências Bibliográficas
Neste link do texto original no Scielo.
*Este texto é a versão parcial e reajustada de um dos capítulos da minha dissertação de mestrado, intitulada Uma História Não Contada. Negro, Racismo e Trabalho no Pós-Abolição em São Paulo (1889-1930), FFLCH/USP, 2001. Agradeço às valiosas sugestões dos(as) pareceristas da revista para a melhoria deste artigo.
NOTAS
30. Ao consultar o arquivo do Itamarati, Jeff Lesser constatou que, em 1921, "o ministro das Relações Exteriores, José Manoel de Azevedo Marques, temendo a entrada de afro-americanos no País, instruiu a Embaixada do Brasil em Washington e os consulados a recusar vistos para todos os imigrantes negros destinados ao Brasil" (Lesser, 1994:85).
31. Uma análise desses projetos encontra-se em Skidmore (1976:212-16) e em Souza Ramos (1996:65-8). Como afirma este autor, para a elite "o risco da imigração de negros norte-americanos, para além de sua suposta inferioridade racial, consistia na possibilidade de que não se fundissem, seja fisicamente ao trabalhador nacional, seja simbolicamente à cultura brasileira" (ibidem:79).
32. "Fomos sempre, intransigentemente, contrarios á entrada dos negros norte-americanos no Brasil, isso porque não era um individuo que buscava agasalho em nossa Patria, mas um bando de homens que prentendia invadir a nossa terra, trazendo além da differença de costumes, de habitos, de tradições e de lingua, o odio indomavel à raça branca existente nos negros yankees" (Getulino, Campinas, 24/2/1924:1). Ver, também, 30/9/1923.
33. Quando Ford resolveu montar uma unidade exploratória dos recursos minerais e reservas naturais no norte do país em 1929, voltou aos noticiários a polêmica da imigração de negros americanos. Os jornais eram radicalmente contra que se importasse trabalhadores negros. "Os comentários a respeito da propalada emigração de negros americanos para o Pará (concessões do Tapajos) promovida pela empresa Ford parece que foram precipitadas (Progresso, São Paulo, 28/7/1929).
34. "Colonias extrangeiras" (Progresso, São Paulo, 31/1/1930:1).
35. Tal assertiva, igualmente, encontra-se em Cardoso & Ianni (1960:224).
36. Roger Bastide destacou a ambigüidade da ideologia racial construída pelos negros: "há pois uma ambivalência nessas ideologias, um flutuação entre o racismo puro, o orgulho da cor, e um sentimento de inferioridade, que leva à imitação do branco, à adoção dos seus pontos de vista, e à tentativa de apresentar a imagem de um negro branco" (Bastide & Fernandes, 1959:167).
Fonte: Scielo (Estud. afro-asiát. vol.24 no.3 Rio de Janeiro 2002)
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-546X2002000300006&script=sci_arttext
Autor: Petrônio José Domingues
Ver também:
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 03
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 02
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 01
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quarta-feira, 5 de dezembro de 2012
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 03
4. A Ideologia do Branqueamento nos Contos da "Imprensa Negra"
Enquanto representação do real, a literatura tem a capacidade de captar os sentimentos e desejos mais ocultos da alma humana de uma época, que não são codificados racionalmente. Já como mecanismo ideológico, a literatura cumpre o papel de transmitir os valores ideológicos da dominação, seja de classe, de gênero ou de raça.
Tendo em vista um recorte racial, é possível sustentar que alguns escritores da "imprensa negra", no início do século XX, submetiam os textos ficcionais à orientação mais geral da ideologia do branqueamento. Na amostragem qualitativa coletada, explicaremos de que maneira este fenômeno perpassava todo o universo mágico dos contos destes autores.
Em um conto intitulado Episódio da Revolta da Ilha de São Domingos o autor descreve como os negros se insurgem contra a opressão escravista, conquistam a liberdade e resolvem vingar-se de todas as atrocidades cometidas pelos brancos. "Então matam, incendeiam, arrazam (sic) tudo que no seu caminho encontram". Todavia, é na parte central, quando é iminente a morte de uma camponesa "linda, loura, mais loura que uma filha de Albion", que podemos desvelar o imaginário branqueador do texto.
A multidão de negros revoltosos prende a família de camponeses brancos. O líder dos revoltosos lança-se com um punhal sobre a cabeça da camponesa, mas, subitamente, um outro negro intervém:
Surpreendido com a atitude do companheiro de luta, o líder dos revoltosos lembrou ao destemido apaixonado da lei de justiçamento para todo aquele que desrespeita sua autoridade. Então, este negro, em um ato de coragem, entrega-se no lugar de sua "loura" e, imediatamente, é aprisionado ao pé de uma árvore. Sem cerimônias, o infeliz foi executado, cumprindo:
Do ponto de vista do imaginário, o personagem negro é inferiorizado em relação ao branco. Quando discriminado, aquele promete vingar-se, na primeira oportunidade, das ofensas da "loura". Ao libertar-se dos grilhões, entretanto, o negro releva todas as humilhações que sofreu da musa de seus sonhos. Mais: expressa sua paixão avassaladora por ela. Em um gesto de amor, renuncia à sua própria vida para salvá-la.
A estrutura do conto é idílica. Estamos diante do que podemos denominar do amor impossível: um homem negro jamais seria correspondido afetivamente por uma mulher branca. O personagem negro representa a figura do anti-herói. Seu final é infeliz e trágico. Em um sentido amplo, a morte do rejeitado simboliza a extinção da raça negra, ao passo que a preservação da vida da mulher celebra o triunfo da "raça branca". Em outra perspectiva, podemos aventar que apenas na morte o negro se iguala ao branco, ou seja, quando ele deixa de existir, não significando mais nenhum tipo de ameaça no mundo real. Somente assim haveria o reconhecimento de sua humanidade. No final, cumpria-se a profecia do branqueamento.
O conto "Quando o Coração Falla" narra a história de um negro, mais uma vez sem nome, que na adolescência, em 1899, foi convidado por alguns amigos para assistir a uma opereta na casa de espetáculo da comunidade italiana e se apaixona pela atriz principal da companhia, "a bela, garbosa e minuscula Cesira".
Em uma das apresentações, o negro foi convidado para procurá-la no camarim do teatro. Sem delongas, assim o fez:
Ao terminar o espetáculo, o negro acompanhou-a até o hotel, causando admiração entre seus amigos:
A estrutura do conto é semelhante à receita do anterior. Um homem negro se apaixona por uma mulher branca e insanamente alimenta o sonho de conquistá-la. Porém, devido a uma fatalidade não descrita ele tem que se afastar dela, mas jamais consegue esquecê-la, ou seja, a musa encantadora, de "pescoço torneado e branco", continua a hipnotizá-lo, sobretudo pelo seu padrão de beleza, que, daquele dia em diante, nortearia sua preferência na escolha de novos relacionamentos. Cesira passou a ser o seu ideal de mulher. Estamos diante de um caso de amor inter-racial impossível. Um dos aspectos mais importantes da "ideologia da brancura", detectado implicitamente, consiste no fato de o negro apenas sentir-se plenamente realizado com uma branca. Impossibilitado de realizar seus planos, ele amargura na dor da saudade.
Em outro conto, batizado de "A Quem me Entender", um negro, convidado pelos amigos, vai a uma "simples, mas encantadora reunião familiar". No local da tertúlia, estava conversando despretensiosamente com os convidados, mas, de repente, olhou para uma mulher (branca, provavelmente loira) que, inexplicavelmente, o fascinou. Foi amor à primeira vista. Ascendeu no seu coração um sentimento platônico.
No entanto,
Verifica-se que, novamente, o personagem negro é um sujeito sem nome; desprovido de identidade. A ausência de identidade, transportada para toda a coletividade, é o requisito básico da invisibilidade do negro. Essas características demonstram de forma cabal o ideal de branqueamento dos autores dos contos escritos para os jornais da "imprensa negra".
O último conto analisado dessa breve seleção é "O Lenço de Maria". Ambientado na época da escravidão, narra a história de um escravo que ama sua sinhá. Depois de sofrer algum tempo em função da paixão reprimida, Halibrach resolve abrir o seu coração, em um passeio pela fazenda, e declara-se para Maria:
Embora sensibilizada com seu escravo, a Sinhá não oculta o caráter utópico daquele voluntarioso caso de amor. O sentimento que aflora é de piedade pela humilhante atitude daquela infeliz criatura. Frustrado com a reação de seu amor, Halibrach resolve atentar contra sua própria vida.
Reproduz ficticiamente a fórmula consagrada do amor inter-racial impossível. Para Halibrach, um negro com nome de branco, sem Maria nada mais faz sentido. A "linha de cor" a separá-los é indelével. O seu fim é trágico: morre em prol de sua branca. É curioso observar que o personagem negro recebe um nome justamente no episódio em que seu papel social de sujeição ao branco é nitidamente identificado (ibidem).26
Constatamos que a versão idílica do amor impossível do homem negro pela mulher branca pauta a mensagem simbólica dos textos. Isso revela que os contos eram um artifício de projeção do imaginário do negro no início do século XX, ou seja, o "inconsciente coletivo" negro transferia no outro mulher branca desejos, qualidades, virtudes, enfim, valores positivos desprezados ou recusados para si.
5. O Desaparecimento do Negro
Alguns artigos da "imprensa negra" eram explicitamente favoráveis ao desaparecimento do negro. Apesar de reconhecerem a contribuição indígena e africana na formação da nacionalidade, o multirracialismo era concebido como obra do passado. No Brasil, em geral, e em São Paulo, especialmente, estaria forjando-se um sistema unirracial. A construção da unidade racial, sob o eufemismo de "fusão das raças", passaria pela diluição do sangue negro, ou seja, pela sua extinção.27 A vontade destes negros era expressa da seguinte maneira:
A nacionalidade nesse novo sistema racial não seria incolor, mas branca. A campanha ideológica da elite negra em prol do branqueamento era requisito necessário para solucionar "A Questão da Raça". Este foi o título de um artigo do jornal Auriverde:
O sistema racial estadunidense era evocado incessantemente para realçar as vantagens do modelo racial brasileiro, supostamente democrático. Lá, o negro enclausurou-se em guetos, tornando-se impermeável e conflituoso o contato com o branco; aqui, o negro foi aceito de braços abertos, fundindo-se no branco. A eventual "pieguice" do brasileiro facilitava o processo de branqueamento em curso, como assinala o artigo "O Sentimentalismo Brasileiro":
Desta vez, o sistema racial brasileiro era colocado face ao estadunidense para sinalizar qual seria o destino do negro. Embora fosse sentimentalista, o brasileiro era insensível à morte do povo negro. Mais: ele compartilhava do projeto de extermínio não declarado daquele segmento da população. Daí a pergunta: "o nosso sentimentalismo não é homicida?". Segundo o articulista, a execução do negro brasileiro, cuja extinção estava prevista para trinta ou cinqüenta anos, operaria "por atacado" enquanto a do negro americano aconteceria "a varejo".
A absorção biológica do negro pelo branco, gerada pela mestiçagem, seria acelerada pela imigração branca. Esta é a tônica do artigo "Desaparecerão os Pretos do Brasil?":
Para o articulista, o branqueamento era causado, também, pela atitude do negro brasileiro que, ao contrário de seus "irmãos" americanos, fazia questão de casar com mulher branca. A estimativa de tempo para extinção do negro, novamente, era apresentada: setenta e cinco anos. A imigração européia era avaliada como fonte de higienização racial do negro. Este fenômeno adquiria maior velocidade em São Paulo, conforme apuramos em "Saneamento Étnico da População Paulista":
O artigo assegura que o projeto racial da elite paulista não foi obra do acaso. Com a entrada de milhares de imigrantes europeus, implementou-se em São Paulo a operação "saneamento étnico", baseada na eliminação de raças diversas, inclusive a negra, pela infusão do sangue ariano.
NOTAS
26. O curioso é que não se observavam enredos centrados em relacionamentos amorosos envolvendo homem brancos e mulheres negras.
27. Sobre essa questão, consultar Seyferth (1996).
28. O artigo "Fusão das Raças" era emblemático: "Como apressar a fusão das raças no nosso país? Sera these utópica e idealista, ou corresponde realmente esse anseio a uma necessidade nacional?! Não há tergiversar que salta a vista, ser problema nacional a fusão das raças, no Brasil. Um povo só se faz nação unida quando dispõe de principios homogeneos civis, políticos ou religiosos, mas a nação só se faz forte só se funde em irmandade de sangue, sentido-se uma em todo e em cada indivíduo. [...] com a diversidade das raças que para elle [Brasil] emigram, um dique e um limite, tendem a accentuar diversamente, os habitos e o futuro dos varios elementos da federação. E a crescer essa diversidade, na razão directa della, virá o enfraquecimento nacional" (Getulino, Campinas, 7/10/1923:1).
29. A denúncia do ideal de branqueamento impetrada pela elite política ou intelectual continuava: "Miguel Pereira e Belisario Penna affirmaram que e o Brasil um vasto hospital. E nos tememos affirmar que esse vasto hospital deriva da doença mais grave, que é o preconceito de raça e de côr, enfim a dor da mentalidade dos nossos dirigentes, deixando que pereça toda uma gente que e precisa ser substituída, porque é mestiça, porque é negra e devera ser branca, custe o que custar, mesmo a custa do esfacelamento do Brasil, pela vasa do aryanismo internacional immigrado" (O Clarim da Alvorada, São Paulo, 9/6/1929:1).
Fonte: Scielo (Estud. afro-asiát. vol.24 no.3 Rio de Janeiro 2002)
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-546X2002000300006&script=sci_arttext
Autor: Petrônio José Domingues
Ver também:
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 04
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 02
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 01
Enquanto representação do real, a literatura tem a capacidade de captar os sentimentos e desejos mais ocultos da alma humana de uma época, que não são codificados racionalmente. Já como mecanismo ideológico, a literatura cumpre o papel de transmitir os valores ideológicos da dominação, seja de classe, de gênero ou de raça.
Tendo em vista um recorte racial, é possível sustentar que alguns escritores da "imprensa negra", no início do século XX, submetiam os textos ficcionais à orientação mais geral da ideologia do branqueamento. Na amostragem qualitativa coletada, explicaremos de que maneira este fenômeno perpassava todo o universo mágico dos contos destes autores.
Em um conto intitulado Episódio da Revolta da Ilha de São Domingos o autor descreve como os negros se insurgem contra a opressão escravista, conquistam a liberdade e resolvem vingar-se de todas as atrocidades cometidas pelos brancos. "Então matam, incendeiam, arrazam (sic) tudo que no seu caminho encontram". Todavia, é na parte central, quando é iminente a morte de uma camponesa "linda, loura, mais loura que uma filha de Albion", que podemos desvelar o imaginário branqueador do texto.
A multidão de negros revoltosos prende a família de camponeses brancos. O líder dos revoltosos lança-se com um punhal sobre a cabeça da camponesa, mas, subitamente, um outro negro intervém:
Mas, oh milagre! Outro preto obsta que seu chefe consumma aquelle acto! Porque! Porque elle ama. Ama com toda a sua alma aquela moça.
Então ella o reconheceu e suas faces que estavam lividas tornaram-se vermelhas como o carmin, teve vergonha, tinha-o insultado e agora ella via claramente aquella scena em que ella lhe dissera, no auge da raiva, que negro não era gente, elle jurou vingar-se.
Ela agora estava arrependida de o ter dito. Então negro não era gente? Por que? Seriam talvez os brancos melhores que os pretos? E ella, que sem dizer palavra, soffreu naquelle momento como soffreram os virtuosos apostolos de Christo. (O Menelick, São Paulo, 1/1/1916)
Surpreendido com a atitude do companheiro de luta, o líder dos revoltosos lembrou ao destemido apaixonado da lei de justiçamento para todo aquele que desrespeita sua autoridade. Então, este negro, em um ato de coragem, entrega-se no lugar de sua "loura" e, imediatamente, é aprisionado ao pé de uma árvore. Sem cerimônias, o infeliz foi executado, cumprindo:
[...] a terrível lei que era imposta a todos que desejavam a vida de quem quer que fosse a morte e elle docemente morreu, morreu como um bravo, morreu por amor de uma branca, cumprindo assim dum modo sublime o seu juramento.
E agora junto ao cadaver puderam dizer: que os negros são tão gente como os brancos. (idem)
Do ponto de vista do imaginário, o personagem negro é inferiorizado em relação ao branco. Quando discriminado, aquele promete vingar-se, na primeira oportunidade, das ofensas da "loura". Ao libertar-se dos grilhões, entretanto, o negro releva todas as humilhações que sofreu da musa de seus sonhos. Mais: expressa sua paixão avassaladora por ela. Em um gesto de amor, renuncia à sua própria vida para salvá-la.
A estrutura do conto é idílica. Estamos diante do que podemos denominar do amor impossível: um homem negro jamais seria correspondido afetivamente por uma mulher branca. O personagem negro representa a figura do anti-herói. Seu final é infeliz e trágico. Em um sentido amplo, a morte do rejeitado simboliza a extinção da raça negra, ao passo que a preservação da vida da mulher celebra o triunfo da "raça branca". Em outra perspectiva, podemos aventar que apenas na morte o negro se iguala ao branco, ou seja, quando ele deixa de existir, não significando mais nenhum tipo de ameaça no mundo real. Somente assim haveria o reconhecimento de sua humanidade. No final, cumpria-se a profecia do branqueamento.
O conto "Quando o Coração Falla" narra a história de um negro, mais uma vez sem nome, que na adolescência, em 1899, foi convidado por alguns amigos para assistir a uma opereta na casa de espetáculo da comunidade italiana e se apaixona pela atriz principal da companhia, "a bela, garbosa e minuscula Cesira".
Em uma das apresentações, o negro foi convidado para procurá-la no camarim do teatro. Sem delongas, assim o fez:
Não, Cesira, não creio! Vejo que tudo isto é um sonho. É demasiada felicidade para mim!... Faça-me ouvir com tua voz maviosa, o que há pouco me dissestes... Não creio que tambem tu esperavas por este instante supremo. Repita-me que muito me queres... E frenetico, acariciava seus perfumados cabellos fios de ouro, beijava-lhe a face encantadora, os olhos negros, o pescoço torneado e branco, e... tornava a extasiar-me fitando-a demoradamente (O Clarim da Alvorada, São Paulo, 3/2/1924:1)
Ao terminar o espetáculo, o negro acompanhou-a até o hotel, causando admiração entre seus amigos:
Assim, por muitos e interminaveis dias, durou o nosso hydillio, até que por uma fatalidade fomos obrigados a nos separar.
Dessa data são decorridos 24 annos e, guardo ainda indelevel, na memoria e no coração, a lembrança desses dias. (idem)
A estrutura do conto é semelhante à receita do anterior. Um homem negro se apaixona por uma mulher branca e insanamente alimenta o sonho de conquistá-la. Porém, devido a uma fatalidade não descrita ele tem que se afastar dela, mas jamais consegue esquecê-la, ou seja, a musa encantadora, de "pescoço torneado e branco", continua a hipnotizá-lo, sobretudo pelo seu padrão de beleza, que, daquele dia em diante, nortearia sua preferência na escolha de novos relacionamentos. Cesira passou a ser o seu ideal de mulher. Estamos diante de um caso de amor inter-racial impossível. Um dos aspectos mais importantes da "ideologia da brancura", detectado implicitamente, consiste no fato de o negro apenas sentir-se plenamente realizado com uma branca. Impossibilitado de realizar seus planos, ele amargura na dor da saudade.
Em outro conto, batizado de "A Quem me Entender", um negro, convidado pelos amigos, vai a uma "simples, mas encantadora reunião familiar". No local da tertúlia, estava conversando despretensiosamente com os convidados, mas, de repente, olhou para uma mulher (branca, provavelmente loira) que, inexplicavelmente, o fascinou. Foi amor à primeira vista. Ascendeu no seu coração um sentimento platônico.
No entanto,
"[...] passada aquella ephemera chimera, em que fiquei totalmente subjugado por seus attrahentes olhos azues, bem poucas vezes a tenho visto. Em compensação, noticias suas jamais deixei de tel-as, portanto quanto mais tempo não a vejo mais impaciente e com saudades permaneço". (O Clarim da Alvorada, São Paulo, 3/3/1924:1)
Verifica-se que, novamente, o personagem negro é um sujeito sem nome; desprovido de identidade. A ausência de identidade, transportada para toda a coletividade, é o requisito básico da invisibilidade do negro. Essas características demonstram de forma cabal o ideal de branqueamento dos autores dos contos escritos para os jornais da "imprensa negra".
O último conto analisado dessa breve seleção é "O Lenço de Maria". Ambientado na época da escravidão, narra a história de um escravo que ama sua sinhá. Depois de sofrer algum tempo em função da paixão reprimida, Halibrach resolve abrir o seu coração, em um passeio pela fazenda, e declara-se para Maria:
[...] atirando-se de joelhos aos seus pés implorou a felicidade que tanto almejava.
A moça commovida pelas apaixonadas phrases que se escapavam dos labios de seu escravo, levou o lenço aos olhos para enxugar duas lágrimas! (Getulino, Campinas, 30/9/1923)
Embora sensibilizada com seu escravo, a Sinhá não oculta o caráter utópico daquele voluntarioso caso de amor. O sentimento que aflora é de piedade pela humilhante atitude daquela infeliz criatura. Frustrado com a reação de seu amor, Halibrach resolve atentar contra sua própria vida.
Maria, exclamou Halibrach louco, minha não serás nunca, porém, eu tambem não mais serei do mundo!
Halibrach que vaes fazer?
Senhora, vou matar-me...
Oh! não, não!
Sim Maria adeus! E que esse lenço humedecido com tuas lagrimas me acompanhe ao silencio da tumba!
E, arrebatando das mãos da moça o perfumoso lenço que ella trazia desapareceu por entre os arvoredos do jardim!
Pela manhã, quando o sol brilhante repraiava os seus raios, doirando a selva das campinas, um corpo gelido repousava sobre um canteiro de saudades! Era Halibrach morto!Porem, elle não foi assim tão infeliz nos seus amores, porque levou para a gelidez do tumulo o lenço ainda humido das lagrimas de Maria! (idem)
Reproduz ficticiamente a fórmula consagrada do amor inter-racial impossível. Para Halibrach, um negro com nome de branco, sem Maria nada mais faz sentido. A "linha de cor" a separá-los é indelével. O seu fim é trágico: morre em prol de sua branca. É curioso observar que o personagem negro recebe um nome justamente no episódio em que seu papel social de sujeição ao branco é nitidamente identificado (ibidem).26
Constatamos que a versão idílica do amor impossível do homem negro pela mulher branca pauta a mensagem simbólica dos textos. Isso revela que os contos eram um artifício de projeção do imaginário do negro no início do século XX, ou seja, o "inconsciente coletivo" negro transferia no outro mulher branca desejos, qualidades, virtudes, enfim, valores positivos desprezados ou recusados para si.
5. O Desaparecimento do Negro
Alguns artigos da "imprensa negra" eram explicitamente favoráveis ao desaparecimento do negro. Apesar de reconhecerem a contribuição indígena e africana na formação da nacionalidade, o multirracialismo era concebido como obra do passado. No Brasil, em geral, e em São Paulo, especialmente, estaria forjando-se um sistema unirracial. A construção da unidade racial, sob o eufemismo de "fusão das raças", passaria pela diluição do sangue negro, ou seja, pela sua extinção.27 A vontade destes negros era expressa da seguinte maneira:
O que devemos fazer é [...] o seguinte:
Não pretendemos perpetuar a nossa raça, mas, sim, infiltramo-nos no seio da raça privilegiada a branca, pois, repetimos, não somos africanos, mas puramente brasileiros. (O Bandeirante, São Paulo, 9/1918:3)28
A nacionalidade nesse novo sistema racial não seria incolor, mas branca. A campanha ideológica da elite negra em prol do branqueamento era requisito necessário para solucionar "A Questão da Raça". Este foi o título de um artigo do jornal Auriverde:
Como esta surge como força negativa e anarchica, como a collaboração negra é considerada deprimente, o negro se isola, se individualiza e cria uma civilização sua, dentro da civilização alheia.
E por isso, o problema negro é considerado o problema mais serio da América do Norte.
O Brasil, abrindo-se para todas as raças e acceitando o negro como acceitou resolveu com muito mais simplicidade o problema racial.
O negro está desaparecendo, está fundido no caminho dessa fusão, tem elle intensamente collaborado para a grandeza material e moral do Brasil.
Portanto, neste ponto, não invejamos a civilização yankee, por que, nesse ponto, obtivemos vantagens... (Auriverde, São Paulo, 29/4/1928:3)
O sistema racial estadunidense era evocado incessantemente para realçar as vantagens do modelo racial brasileiro, supostamente democrático. Lá, o negro enclausurou-se em guetos, tornando-se impermeável e conflituoso o contato com o branco; aqui, o negro foi aceito de braços abertos, fundindo-se no branco. A eventual "pieguice" do brasileiro facilitava o processo de branqueamento em curso, como assinala o artigo "O Sentimentalismo Brasileiro":
Nós brasileiros costumamos orgulhar-nos da nossa bondade de coração, da nossa piedade e sentimentalismo generosos. Convictamente affirmamos em dose mais elevada que os outros povos.
Pretendendo ser mais humanos que os americanos, nós não lynchamos os negros, mas fizemos a extinguirmos completamente a raça negra, abandonando-a á ignorância, á degradação ao analphabetismo, á promiscuidade, á cachaça, á syphillis, a ociosidade.
Qual é o preferível é sentimentalismo brasileiro ou a brutalidade americana?
O nosso sentimentalismo não é homicida?
Daqui a trinta ou cincoenta annos a raça negra está extinta no Brasil graças ao nosso sentimentalismo.
Os americanos lyncham cincoenta negros por anno. Nós matamos a raça negra inteira no Brasil. (O Clarim D'Alvorada, São Paulo, 28/9/1929:4)
Desta vez, o sistema racial brasileiro era colocado face ao estadunidense para sinalizar qual seria o destino do negro. Embora fosse sentimentalista, o brasileiro era insensível à morte do povo negro. Mais: ele compartilhava do projeto de extermínio não declarado daquele segmento da população. Daí a pergunta: "o nosso sentimentalismo não é homicida?". Segundo o articulista, a execução do negro brasileiro, cuja extinção estava prevista para trinta ou cinqüenta anos, operaria "por atacado" enquanto a do negro americano aconteceria "a varejo".
A absorção biológica do negro pelo branco, gerada pela mestiçagem, seria acelerada pela imigração branca. Esta é a tônica do artigo "Desaparecerão os Pretos do Brasil?":
Muitos carecemos de renovar o nosso sangue por meio de correntes immigratorias européias. Porque o preto brasileiro, que do contrario de seu collegas norte-americanos, faz questão em se casar com mulher branca. Daqui a três quartos de seculo pertencera ao passado. (Progresso, São Paulo, 13/2.29)
Para o articulista, o branqueamento era causado, também, pela atitude do negro brasileiro que, ao contrário de seus "irmãos" americanos, fazia questão de casar com mulher branca. A estimativa de tempo para extinção do negro, novamente, era apresentada: setenta e cinco anos. A imigração européia era avaliada como fonte de higienização racial do negro. Este fenômeno adquiria maior velocidade em São Paulo, conforme apuramos em "Saneamento Étnico da População Paulista":
Não passaram despercebidos aos paulistas de quarenta anos atrás que, em vez de tentar agravar com o adicionamento de elementos de raças diversas, julgaram ser seu dever sanear e melhorar eugenicamente sua população pela introdução de grandes contigentes de sangue ariano. (Progresso, São Paulo, 24/11/1929)29
O artigo assegura que o projeto racial da elite paulista não foi obra do acaso. Com a entrada de milhares de imigrantes europeus, implementou-se em São Paulo a operação "saneamento étnico", baseada na eliminação de raças diversas, inclusive a negra, pela infusão do sangue ariano.
NOTAS
26. O curioso é que não se observavam enredos centrados em relacionamentos amorosos envolvendo homem brancos e mulheres negras.
27. Sobre essa questão, consultar Seyferth (1996).
28. O artigo "Fusão das Raças" era emblemático: "Como apressar a fusão das raças no nosso país? Sera these utópica e idealista, ou corresponde realmente esse anseio a uma necessidade nacional?! Não há tergiversar que salta a vista, ser problema nacional a fusão das raças, no Brasil. Um povo só se faz nação unida quando dispõe de principios homogeneos civis, políticos ou religiosos, mas a nação só se faz forte só se funde em irmandade de sangue, sentido-se uma em todo e em cada indivíduo. [...] com a diversidade das raças que para elle [Brasil] emigram, um dique e um limite, tendem a accentuar diversamente, os habitos e o futuro dos varios elementos da federação. E a crescer essa diversidade, na razão directa della, virá o enfraquecimento nacional" (Getulino, Campinas, 7/10/1923:1).
29. A denúncia do ideal de branqueamento impetrada pela elite política ou intelectual continuava: "Miguel Pereira e Belisario Penna affirmaram que e o Brasil um vasto hospital. E nos tememos affirmar que esse vasto hospital deriva da doença mais grave, que é o preconceito de raça e de côr, enfim a dor da mentalidade dos nossos dirigentes, deixando que pereça toda uma gente que e precisa ser substituída, porque é mestiça, porque é negra e devera ser branca, custe o que custar, mesmo a custa do esfacelamento do Brasil, pela vasa do aryanismo internacional immigrado" (O Clarim da Alvorada, São Paulo, 9/6/1929:1).
Fonte: Scielo (Estud. afro-asiát. vol.24 no.3 Rio de Janeiro 2002)
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-546X2002000300006&script=sci_arttext
Autor: Petrônio José Domingues
Ver também:
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 04
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 02
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 01
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segunda-feira, 3 de dezembro de 2012
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 02
3. A Ideologia do Branqueamento no Meio Negro
3.1. O branqueamento de ordem moral e/ou social
É plausível assinalar que o ideal de branqueamento entrou na ofensiva em São Paulo no início do século XX, sendo desenvolvido intensamente pelos publicistas e alcançando, entre outras coisas, penetração no meio negro. Como assinalamos anteriormente, neste instante analisaremos a dimensão ideológica do branqueamento.
Para legitimar sua dominação, parafraseando Karl Marx, a "raça branca" precisa que as demais raças e grupos étnicos, inclusive os negros, assimilem seus valores e passem a se comportar, pensar, sentir e agir conforme sua ideologia racial.5 Por isso, a hipótese desenvolvida no curso deste artigo é a seguinte: uma fração da população negra em São Paulo no início do século XX aceitou conceber-se nos moldes impostos pela ideologia racial da elite branca, uma vez que avaliavam, em larga escala, o processo de branqueamento como fenômeno natural e inevitável. A análise de uma das principais lideranças da comunidade negra da época é sintomática:
Investigaremos de que maneira tais negros, em vez de despirem o caráter racista desta ideologia, passaram a propagá-la no interior da própria comunidade.
O branqueamento moral e/ou social estava fundado na aquisição ou assimilação6 pelo negro de atitudes e comportamentos presumivelmente "positivos" do branco. Para conquistar a "Segunda Abolição", por exemplo, um articulista que se apresentava como antigo militante negro escreveu um artigo no jornal da "imprensa branca",7 apregoando a necessidade de os negros se espelharem nas ações políticas dos brancos:
Segundo o autor deste artigo, o negro não tinha personalidade própria, era incapaz de forjar um projeto político e ideológico alternativo. Daí a necessidade da adoção do estilo de vida do branco, acompanhado de sua maneira de ser, estar e ver o mundo. Mais: o negro devia seguir todas as normas do código de conduta moral do "branco".
O patrulhamento da comunidade era permanente. Em "Carta Aberta" publicada no jornal da "imprensa negra",8 Alfinete (12/10/1918), este era o tom:
No início do século XX, os "freges" eram bailes públicos que reuniam a "escória" da sociedade: negros e brancos das camadas populares, vadios, gatunos, prostitutas, cáftens. Eram espécies de gafieiras, das quais se destacava o Bando Prêto, onde predominava o maxixe.9 O casal dançava agarrado, rebolando, em movimentos sensuais, ritmados ao som da música. Nos "freges" quebravam-se as normas sociais do "bom tom". A bebida, a licenciosidade, o despudor, a descontração e libertinagem reinavam. Daí a veemência com que estes bailes eram reprovados.
Na ótica dos negros branqueados social e moralmente, o salão Lyra era um desses antros de depravação na cidade, devendo ser evitado pelas mulheres negras: "a nossa raça deve procurar outra convivência...". Elas deviam se recusar a freqüentar espaços cujos bailes executavam músicas de "preto", como o maxixe. Quem não obedecesse, seria severamente punido: "Foram eliminadas deste Centro, as Senhoritas Benedicta Vasconcellos e Bicota, por frequentarem os bailes publicos de maxixe, no Colombo" (O Alfinete, 9/3/1919).
O Centro Recreativo Smart (uma associação recreativa negra) aplicava sanções rigorosas para quem não cumprisse o estatuto do clube. Pelo simples fato de terem freqüentado bailes que executavam músicas de "preto", essas mulheres foram expulsas da entidade. Os bailes públicos de maxixe eram considerados incompatíveis com os ditames do puritanismo da elite negra.10 Os ataques eram impiedosos com:
Desta vez, a ira voltava-se para as "damas" que no carnaval vestiam-se de mulheres de apaches:
Em Paris, apache era a patuléia, um indivíduo perigoso e cruel, explorador de mulheres; malfeitor, ladrão. E como os negros da elite se espelhavam nos centros culturais da civilização européia, sobretudo a França, compreende-se o preconceito "anti-apacheano". Apesar de ser uma simples fantasia e fazer parte das festividades carnavalescas, não se admitia que mulher negra assumisse um personagem que, no plano simbólico, subvertia a moral branca.
As ofensivas moralistas se dirigiam, da mesma maneira, às manifestações musicais genuinamente negras, como o samba:
O artigo emprega definições extremamente pejorativas para caracterizar ritmos e dança de "preto": "grotescos", "bárbaros", "selvagens" etc. Negava-se tudo que tivesse referência ao mundo negro: forma de andar, falar, dançar, gingar, forma de se vestir, cabelo, tradições culturais e religiosas.11 O repúdio a tais valores culturais era, provavelmente, um recurso de diferenciação social da plebe negra.
Ao assimilarem os valores sociais e/ou morais da ideologia do branqueamento, alguns negros avaliavam-se pelas representações negativas construídas pelos brancos. Era necessário ser um "negro da essencia da brancura".12 Por isso, desenvolveram um terrível preconceito em relação às raízes da negritude. Aliás, a recusa da herança cultural africana e o isolamento do convívio social com os negros da "plebe" eram duas marcas distintivas dos negros "branqueados socialmente":
Os ataques, agora, eram desferidos contra o consumo de álcool:
Para se afirmar nos valores considerados nobres pela sociedade inclusiva, o negro não devia ingerir bebida alcóolica, assim como não devia jogar, drogar-se, freqüentar o ambiente da malandragem. Pelo contrário, devia defender sem tréguas a moral e os bons costumes da classe dominante, ser religiosamente católico, honrado, regrado e cumpridor de seus deveres. Condenava-se a boêmia, a prostituição, as religiões de matriz africana, a prática da capoeira, o samba, enfim, o negro devia possuir um comportamento puritano.
É importante salientar que todas as prédicas moralistas supracitadas neste tópico foram extraídas dos jornais da denominada "imprensa negra". Pelo prisma de Roger Bastide, a imprensa negra vai ser no Brasil o principal instrumento do puritanismo "preto":
Continuando amparados nas reflexões de Roger Bastide, constatamos que o puritanismo se apresenta, antes de mais nada, nas manifestações exteriores da etiqueta burguesa. Historicamente, o comportamento puritano está vinculado ao desenvolvimento da burguesia e sua adoção tornou-se um critério de ingresso dos indivíduos na pequeno-burguesia (ibidem:72). O puritanismo, aliás, praticamente passou a definir o estilo de vida da pequeno-burguesia. Por isso, a fração mais elitizada dos negros paulistas o incorporou com tanta veemência ao seu estilo de vida. O puritanismo da elite negra paulista, reiteramos, foi um mecanismo sobretudo de distinção social, que é típico de grupos em ascensão.
Por sinal, o discurso puritano não era uma característica exclusiva da imprensa negra na época.14 Perpassava, outrossim, pela imprensa alternativa dos anarquistas e das "colônias" étnicas radicadas em São Paulo. Tanto nas associações culturais e recreativas negras quantos nas anarco-sindicalistas e dos imigrantes, a moralização dos costumes, a valorização da educação, o combate ao alcoolismo, o controle do comportamento dos indivíduos, estendia-se das páginas dos jornais até os bailes.15
3.2. Branqueamento estético
A carga ideológica do branqueamento se expressava totalmente no terreno estético. O modelo branco de beleza, considerado padrão, pautava o comportamento e a atitude de muitos negros assimilados.16 Coletamos alguns anúncios e depoimentos que mostravam o desejo do negro de eliminar seus traços negróides, a fim de se aproximar, no plano das aparências, ao branco (nariz afilado, cabelos lisos, lábios finos, cútis clara).
Um exemplo do "branqueamento estético" foram as consecutivas inserções publicitárias nos jornais, tanto da "imprensa negra" quanto da "imprensa branca". Voltado para atender às vontades dos consumidores negros, o enfoque era sempre o mesmo:
O alisamento significaria a felicidade do negro, a realização de seu sonho mais profundo; seria a porta de entrada ao mundo moderno de pessoas elegantes. Daí a adjetivação contundente da invenção: "maravilhosa!...".
Depois de um ano, este anúncio permanecia sendo veiculado no jornal O Clarim D'Alvorada, ganhando cada vez mais espaço, levando a pensar que o produto tinha uma imensa aceitação e, por conseguinte, a empresa fabricadora do produto conquistara o mercado consumidor negro. O título do anúncio continuava sendo enfático:
O sentido mágico da pasta era ter o poder de subverter a lei natural do negro, seu cabelo crespo. Estava em crescente aumento o número de produtos e serviços que prometiam ao negro alcançar o padrão de beleza dominante. Além de pastas e cremes, toda uma rede de salões "afro" alimentavam este sonho:
A simulação de um diálogo cotidiano entre duas mulheres negras, que se encontraram fortuitamente, era a base da propaganda de salão situado no centro da cidade:
Um instrumento específico, com efeito, pressagiava a façanha do alisamento capilar:
Nem mesmo um branco da elite tradicional paulista ficou indiferente ao fenômeno:
No entanto, o "branqueamento estético" não se restringia ao alisamento dos cabelos, atingia a principal marca definidora de raça no Brasil: a cor da pele. Alguns produtos prometiam a proeza de transformar negro em branco mediante a despigmentação, ou seja, através do "clareamento" da pele:
A procedência alemã da fórmula já garantia a qualidade do creme. A beleza alemã, ou melhor, ariana, era considerada exemplar, a qual deveria ser importada pela comunidade negra. Outra questão, não menos importante, é observar no texto de anúncio o aviso de que o produto milagroso iria substituir o uso do pó de arroz como método de "clareamento" da cútis. Não foi fortuito este aviso, porque era comum, sobretudo entre as mulheres negras, passar pó de arroz no rosto em festas requintadas, que exigia esmero na beleza plástica, conforme podemos notar no anúncio publicitário:
Publicado na segunda página de um jornal da "imprensa branca", o creme de poderes miraculosos seria utilizado para "branquear" a pele ou "aderir o pó de arroz" no rosto. Já o periódico A Cigarra, revista de maior circulação no Estado de São Paulo na época, prometia para suas leitoras a "Arte de ser Bella":
Segundo a mensagem sub-reptícia do anúncio, para ser bela era necessário clarear a pele. E o uso do creme proporcionaria a "transparência" e o rejuvenescimento. A ideologia do "branqueamento estético" foi um fetiche muito eficaz na alienação do negro. Oficializou a brancura como padrão de beleza e a negritude como padrão de fealdade. Representou um entrave para a formação positiva da auto-estima do negro, pois este passou a alimentar um certo autodesprezo. Ora, na ausência de modelos positivos em que pudesse se espelhar, o negro recusava sua própria natureza, desembocando, muitas vezes, em crise de identidade étnica, descaracterizando-se, na busca pela supressão dos traços raciais afro.
O negro não se sentia mais africano e sim "latino" ou "ocidental". A negação da ancestralidade africana deve ser entendida como um mecanismo simbólico de fuga étnica. Combinado à alienação, o recurso do "branqueamento estético" transmitia à subjetividade do negro a sensação de estar cada vez mais parecido com o modelo sancionado como superior. Portanto, foi uma tentativa de superação da inferioridade que sua cor e seus caracteres físicos representavam.
3.3. Branqueamento biológico
A ideologia do branqueamento, em certas circunstâncias, apresentava desdobramento no terreno biológico. A premissa era de que o negro melhoraria biologicamente sua raça casando com alguém mais claro. Este instrumento ideológico incidia nas relações intrafamiliares. Para se desvencilhar dos recalques, os pais incentivavam os filhos a casarem com pessoas não-negras o ideal seria de cor branca na esperança de que seus netos, bisnetos, e assim por diante, parecessem cada vez menos com a filiação afro-negra. Se a criança nascesse mais clara que os pais, consideravam uma vitória, porém, caso a criança fosse mais escura, sentiam-se derrotados.
Pelo fato de o discurso em prol do branqueamento ser um fenômeno que emergia na vida cotidiana da família, não conseguiríamos detectá-lo em outras fontes senão pelo resgate da história oral com negro(a)s que viveram em São Paulo no segundo quartel do século XX. Daí o papel insubstituível desencadeado pelos depoimentos de famílias negras sobre um assunto tabu. Mas por que era tabu? Porque a doutrinação desta modalidade de branqueamento apenas se registrava no âmbito da vida privada, ou seja, na sociabilidade do lar, nos ensinamentos dos pais, nos exemplos dos parentes, que jamais tomavam o escopo de discurso público:
Ao incorporarem os mandamentos do "branqueamento biológico", os pais das famílias negras realizavam uma vigilância rigorosa dos filhos. Desde os amigos do bairro até os namorados passavam pelo crivo da aprovação eugênica. "Casei em 1926 com um amigo de infância, ele era bonito e não era preto, preto chega eu" (Bosi, 1994:386).
Outrossim, esse comportamento da mulher negra foi registrado, em 1925, pelo olhar do cronista Sylvio Floreal: "As pretinhas não querem casar a não ser com mulatos". Já as "mulatinhas, [...] só aspiram casar com homem branco" (Floreal, 1925:165).21
O peculiar desta ideologia foi transformar o discriminado em agente reprodutor do discurso discriminatório, colocando o negro a serviço de uma prática racista.22 Pelo enfoque estritamente psicológico, o coroamento do racismo se materializa quando a vítima assume o papel de seu próprio algoz. Em última instância, estamos diante de um quadro favorável ao "raçacídio", que consistiria no suicídio coletivo de uma comunidade étnica,a médio e longo prazos, com armas ideológicas impostas de fora para dentro e aceitas pelos membros desta comunidade.
O branqueamento via casamento, às vezes, estava intimamente vinculado, no imaginário social, à ascensão do negro. Essa foi a relação que Maria Cristina fez:
Para uma sociedade de classe com mentalidade racista, o casamento misto, em particular do negro com alguém do segmento branco, representava tanto o aprimoramento da raça quanto a premiação pela vitória conquistada: a mobilidade social. A esposa ou marido brancos simbolizavam, de forma combinada, uma melhoria dupla: de raça e de classe social. Já o casamento dentro da própria comunidade étnica era concebido como ameaça, como se apreende das lembranças de Ana Pacheco:
Contrariando a vontade familiar, Ana Pacheco casou-se com um negro, contribuindo para "empretecer" ou "enegrecer" ainda mais os descendentes. Na fase de namoro, o relacionamento com um negro não provocou tanta contestação como no momento em que foi anunciado o casamento. Ora, o casamento significava a constituição da família, a qual, mais cedo ou mais tarde, seria complementada pelo nascimento de filhos. Daí a preocupação dos tios João, Benedito e da mãe. As futuras gerações de negros, segundo os parentes, teriam que se distanciar ao máximo de sua origem racial. A saída apontada pelas famílias negras, geralmente, era bem intencionada: imaginavam que os filhos e os netos dos casamentos com pessoa mais clara levariam uma vida com menos dor, sofrimento e com mais chances de vencer na vida.
As frustrações raciais geradas pela ideologia do branqueamento causavam o sentimento de inferioridade no negro. Este chegava ao extremo de pensar que a cor da pele fosse alguma deformação patológica, cuja cura não tinha ainda sido descoberta:
O "branqueamento biológico" também poderia ser alcançado por métodos artificiais, "quando se descobrir a droga que poderá lavar a pele" (Progresso, São Paulo, 13/1/1929:4).
Havia casos cujos negros atentavam contra seu próprio corpo e empregavam recursos estapafúrdios para clarear a pele. Acreditavam que comendo barro, ingerindo muito leite, passando alvejante no corpo, tomando banhos demorados com muito sabão, não ficando exposto ao sol, diariamente, era suficiente para "desnegrecer", vale dizer, eliminar a alta pigmentação da pele e, por conseguinte, o complexo de inferioridade. Esta vertente do branqueamento legitimava ideologicamente o eventual genocídio biológico do negro.
NOTAS
4. Apesar de o segmento negro (pretos e pardos) na cidade, em 1920, ser aproximadamente 9% da população total, o índice de natimorto (nascidos mortos) era de 12,7% em 1918; 12,4% em 1922; 13,35% em 1924; 15,9% em 1926 e 15,99% em 1928. Portanto, é possível afirmar que a mortalidade infantil, tendo por base os índices de natimortos, entre 1918 e 1928, era maior entre a população negra, exceto para o ano de 1920, cujo índice foi de 5,8%. Ver Ellis Junior (1932:9-10).
5. "Os pensamentos da classe dominante são também, em todas as épocas, [...] o poder espiritual dominante. A classe que dispõe dos meios da produção material dispõe também dos meios da produção intelectual, de tal modo que o pensamento daqueles aos quais são negados os meios de produção intelectual está submetido também à classe dominante" (Marx e Engels, 1998:48). Originalmente, Marx desenvolveu essa reflexão para explicar o mecanismo ideológico da dominação de classe, ou seja, mostrar como as idéias da classe dominante são hegemônicas sob o conjunto da sociedade. Como entendemos que a dominação não se revela estritamente no terreno classista, realizamos um recorte étnico-racial para operar e compreender este mecanismo de dominação ideológica.
6. Neste artigo, assimilação pode ser definida, em síntese, pelo "tipo de mudança étnica pela qual as pessoas se tornam parecidas". Assimilação é um processo que "pressupõe que a minoria irá se adequar aos modos" de vida da maioria étnica ou racial (Cashmore, 2000: 84-5). Esta definição é apropriada para designar a situação de grupo étnico minoritário, a qual se encontrava o negro na época. Nas estimativas apresentadas por Fernandes (1978:108), os "negros" e "mestiços" representavam na população total da capital, no mínimo 11% em 1910; 9% em 1920; e 8,5% em 1934.
7. A "imprensa branca" é uma referência aos jornais regulares da grande imprensa, de ampla circulação, produzidos majoritariamente por brancos e voltados para o público não-negro.
8. A "imprensa negra" é uma referência aos jornais alternativos que surgiram em São Paulo no pós-abolição, produzidos por negros e dirigidos à comunidade negra. Dentre esses jornais, são citados neste artigo O Alfinete, A Sentinella, O Patrocínio, Progresso, O Clarim D´Alvorada, O Bandeirante, O Menelick, Auriverde e Getulino. Sobre o assunto consultar Ferrara (1986).
9. "Apareceu na segunda metade do século XIX no Rio de Janeiro. Resultou da fusão da tabanera pela rítmica, e da polca pela andadura, com adaptação da síncopa africana. Outros o fazem uma prolação do lundu, mesclado com a toada. Era dança de salão, de par unido, exigindo extrema agilidade pelos passos e figuras rápidas, mobilidade de quadris [...]. Foi por algum tempo expoente da nossa dança urbana, tendo cedido lugar ao samba [...]" (Câmara Cascudo, 1988:486).
10. "O segmento negro em São Paulo no início do século XX não constituía um bloco homogêneo. Em linhas gerais, era possível dividi-lo em duas amplas camadas: de um lado, os negros da elite; de outro, a massa negra plebléia. A elite negra ou negros evoluídos eram provenientes dos estratos intermediários da estrutura de classes: jornalistas, funcionários públicos, técnicos, profissionais liberais ou especializados, em suma, os negros letrados e/ou classificados socialmente. O termo elite negra não significa uma minoria detentora dos meios de produção material. O termo tem três sentidos específicos: primeiro; político, porque este grupo se configurou como dirigente políticos da comunidade e eram aceitos como tal pelos brancos; segundo, educacional e cultural, porque este grupo era fundamentalmente alfabetizado e considerado culturalmente evoluído; terceiro, ideológico, porque este grupo reproduzia muitos dos valores ideológicos da classe dominante. Foi este estrato da população que mantinha os jornais da imprensa negra. O segundo setor, o plebeu, era constituído por desempregados, malandros, trabalhadores braçais, doméstico(a)s, biscateiros, indigentes, prostitutas, em suma, pelos negros desqualificados socialmente" (Domingues, 2001:163-4).
11. Como observou Carlos Hasenbalg (s/d:5) "a pressão no sentido de branqueamento resulta em que negros e mulatos fazem o melhor possível para parecer mais brancos e procuram com energia dissimular ou desenfatizar suas origens negróides. Naturalmente, a hierarquização das pessoas em termos de sua proximidade a uma aparência branca ajudou a fazer com que indivíduos de pigmentação escura desprezem a sua origem africana".
12. Esta foi a forma como o articulista se referiu a José Carlos do Patrocínio, filho de José do Patrocínio (Progresso, 15/2/1930).
13. Carta enviada para Sr. Redactor por Zelindo (O Alfinete, 28/8/1921).
14. Como assevera Otávio Ianni, puritanismo "trata-se de um modo de ser e comportar-se asceticamente, com relação a algumas solicitações habituais da vida social. Não é exclusivo dos negros. A comunidade, habitualmente, conta com tais indivíduos; são pessoas que personificam alguns ideais considerados elevados pela consciência coletiva" (Cardoso & Ianni, 1960:214).
15. Encontramos o discurso moralizante, de condenação ao álcool, aos jogos, bailes, também na imprensa operária, conforme "O Alcool e sua Acção" (Tribuna Operária, Santos, 7/8/1909:4) e na imprensa anarquista, de acordo com "Crítica ao Carnaval" (Terra Livre, São Paulo, 22/3/1910:3) e "O Flagello do Alcoolismo" (ibidem:4).
16. Nas reflexões de Wilson do Nascimento, "o abandono dos valores éticos e estéticos de sua própria cultura é, pois, o coroamento do processo de assimilação. E, na verdade, as instâncias ética e estética são o que existe de mais elevado em cada cultura. Ao abandonar tais valores, o assimilado está, para sua cultura de origem, desde então, morto". Ver Nascimento (1985:44).
17. O Clarim D'Alvorada, São Paulo, s/d. Este anúncio reiteradamente era veiculado: "20$000 Importancia única para se adquirir um dos famosos pentes de aço, para alisar cabellos sem dor e sem perigo telephonem, hoje mesmo, para 2-1706 ou nesta redacção: rua Major Diogo, 131" (ibidem, 24/11/1929:2).
18. Apesar de muitos desses produtos terem uma finalidade terapêutica, eram usados com a perspectiva de "desnegrecimento".
19. Em anúncio publicitário, veiculado em outro número da mesma revista, o tom era semelhante: "Angelica. A Angelica é a agua que faz a cutis branca em poucos momentos sem prejudical-a, tornando-a suave e fresca. Casa Lebre & Cia. Rua 15 de Novembro" (A Cigarra, São Paulo, nº XI, 7/10/1914).
20. Memória da Escravidão em Famílias Negras no Estado de São Paulo (MEFNESP), entrevista com Geraldinha Maria Patrício da Luz, Caixa 5, Vol. 30, São Paulo, 1987, p. 9.
21. Apesar do desejo da "brancura" de algumas mulheres negras e "mulatas", não podemos superestimar a existência de casamentos inter-raciais em São Paulo, pelo menos na década 20, como foi assinalado pelo próprio Sylvio Floreal, que foi testemunha ocular do processo em curso: "Mas a verdade triste é que o número das mulatinhas que conseguem casar de accôrdo com o seu sonho de brancura é tão resumido, que melhor fôra que elas, castigadas pelas rudes experiencias e levadas como tem sido, pela via de amargura da perdição, abandonassem essa tão desastrada mania! Entretanto, tal mania instalada na ansia e nos caprichos dessas creaturinhas, constitue a razão de ser de suas vidas" (ibidem:167).
22. "Eu sempre fui solteira, por duas razões: não queria ter filho preto, porque sofre muito, e também não gostava de homens da minha cor". Cf. Bernardo (1998:62).
23. MEFNESP, entrevista com Maria Cristina Tejeda, Caixa 5, Vol. 33. São Paulo, 1987, p.56.
24. MEFNESP, entrevista com Ana Pacheco de Oliveira Almeida, Caixa 3, Vol. 24, Jaboticabal (Córrego Rico), 1987, p. 34-37-51-52. Os argumentos usados pelo tio João Domingos para abominar o noivo tinha uma forte conotação preconceituosa. Operava-se o que se classifica como expurgo. Como recurso para sentir-se menos negro, o tio João Domingos projetava e transferia no marido da sobrinha tudo aquilo que ele odiava em si mesmo. Frustado em suas expectativas, o tio João Domingos desloca suas ofensas para a sobrinha, Ana Pacheco, tachando-a, entre outras coisas, de suja. Esta adjetivação negativa para se referir à pessoa negra estava em oposição à estereotipia positiva de limpo, normalmente ligado à "raça branca". Como assevera Wilson do Barbosa, "quando a alienação gerada pela assimilação não produz os frutos desejados, o ódio dos assimilados dirigir-se-á contra a comunidade negra, testemunha indesejável e fonte efetiva de seu êxito apenas parcial. Destrói-se em cada negro aquilo que ainda há de negro em si próprio" (Barbosa, 1985:43).
25. MEFNESP, entrevista com Maria Francisca Bueno, 106 anos, moradora de Rio Claro.
Fonte: Scielo (Estud. afro-asiát. vol.24 no.3 Rio de Janeiro 2002)
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Autor: Petrônio José Domingues
Ver também:
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 01
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 03
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 04
3.1. O branqueamento de ordem moral e/ou social
É plausível assinalar que o ideal de branqueamento entrou na ofensiva em São Paulo no início do século XX, sendo desenvolvido intensamente pelos publicistas e alcançando, entre outras coisas, penetração no meio negro. Como assinalamos anteriormente, neste instante analisaremos a dimensão ideológica do branqueamento.
Para legitimar sua dominação, parafraseando Karl Marx, a "raça branca" precisa que as demais raças e grupos étnicos, inclusive os negros, assimilem seus valores e passem a se comportar, pensar, sentir e agir conforme sua ideologia racial.5 Por isso, a hipótese desenvolvida no curso deste artigo é a seguinte: uma fração da população negra em São Paulo no início do século XX aceitou conceber-se nos moldes impostos pela ideologia racial da elite branca, uma vez que avaliavam, em larga escala, o processo de branqueamento como fenômeno natural e inevitável. A análise de uma das principais lideranças da comunidade negra da época é sintomática:
Até é lícito afirmar se há em São Paulo, muito mais acentuada que no resto do Brasil, uma ideologia no tocante à população escura, preta; [...] a tendência é, por conseguinte, a branquificação, fato não só histórico como biológico, concorde ao comportamento tradicional da sociedade brasileira. Há, portanto, um entendimento tácito, de absorção das pequenas minorias raciais e de, por meio de cruzamentos até estimulados, diluir o sangue negro. Em pouco mais de dois séculos, talvez, esteja concluído o processo assimilador [...]. (Raul Joviano do Amaral, O Negro na População de São Paulo apud Fernandes, 1978: 112)
Investigaremos de que maneira tais negros, em vez de despirem o caráter racista desta ideologia, passaram a propagá-la no interior da própria comunidade.
O branqueamento moral e/ou social estava fundado na aquisição ou assimilação6 pelo negro de atitudes e comportamentos presumivelmente "positivos" do branco. Para conquistar a "Segunda Abolição", por exemplo, um articulista que se apresentava como antigo militante negro escreveu um artigo no jornal da "imprensa branca",7 apregoando a necessidade de os negros se espelharem nas ações políticas dos brancos:
Seguir os brancos nas suas conquistas e iniciativas felizes [...] será o marco inicial da segunda redempção dos negros [...].
Salientamos que a sua liberdade não foram elles [negros] que conseguiram. As tentativas que emprehenderam mallograram desastrosamente. E da mão do branco que odiavam receberam a liberdade dos seus sonhos! (Folha da Manhã, São Paulo, 12/1/1930).
Segundo o autor deste artigo, o negro não tinha personalidade própria, era incapaz de forjar um projeto político e ideológico alternativo. Daí a necessidade da adoção do estilo de vida do branco, acompanhado de sua maneira de ser, estar e ver o mundo. Mais: o negro devia seguir todas as normas do código de conduta moral do "branco".
O patrulhamento da comunidade era permanente. Em "Carta Aberta" publicada no jornal da "imprensa negra",8 Alfinete (12/10/1918), este era o tom:
O Salão Lyra Ah! diariamente realisam-se bailes de maxixe que na maioria dançam mulheres brancas, que não se deixam de compartilhar as nossas patricias a nossa vergonha, e, a nossa raça ficar completamente desmoralisada.
Não se deve frequentar o celebre salão Lyra.
A nossa raça deve procurar outra convivência...
No início do século XX, os "freges" eram bailes públicos que reuniam a "escória" da sociedade: negros e brancos das camadas populares, vadios, gatunos, prostitutas, cáftens. Eram espécies de gafieiras, das quais se destacava o Bando Prêto, onde predominava o maxixe.9 O casal dançava agarrado, rebolando, em movimentos sensuais, ritmados ao som da música. Nos "freges" quebravam-se as normas sociais do "bom tom". A bebida, a licenciosidade, o despudor, a descontração e libertinagem reinavam. Daí a veemência com que estes bailes eram reprovados.
Na ótica dos negros branqueados social e moralmente, o salão Lyra era um desses antros de depravação na cidade, devendo ser evitado pelas mulheres negras: "a nossa raça deve procurar outra convivência...". Elas deviam se recusar a freqüentar espaços cujos bailes executavam músicas de "preto", como o maxixe. Quem não obedecesse, seria severamente punido: "Foram eliminadas deste Centro, as Senhoritas Benedicta Vasconcellos e Bicota, por frequentarem os bailes publicos de maxixe, no Colombo" (O Alfinete, 9/3/1919).
O Centro Recreativo Smart (uma associação recreativa negra) aplicava sanções rigorosas para quem não cumprisse o estatuto do clube. Pelo simples fato de terem freqüentado bailes que executavam músicas de "preto", essas mulheres foram expulsas da entidade. Os bailes públicos de maxixe eram considerados incompatíveis com os ditames do puritanismo da elite negra.10 Os ataques eram impiedosos com:
[...] as negras sem-vergonhas que fazem ponto nos quatro cantos entre as ruas Silva Pinto da Graça e Três Rios, embriagam-se e depois fazem uma algazarra do diabo, tudo por causa de macho. Criam vergonha, suas negras sem cabellos. (A Sentinella, 10/10/1920)
Desta vez, a ira voltava-se para as "damas" que no carnaval vestiam-se de mulheres de apaches:
Echos do carnaval. Moças que se fantasiam de mulheres de apaches.
Apaches é um individuo vagabundo e ladrão, que vive nas tabernas, premeditando assaltos e crimes.
Que serão as mulheres dos apaches? Nada mais nem nada menos do que uma desgraçada rameira e ladra que só serve para vergonha da cidade em que habita.
Estou certo que esse meu appello, ha de ficar gravado no coração dos paes de muitas moças e meninas, jamais permittindo que as suas filhas ou parentes, enverguem essas fantasias, que muito depõem contra nosso meio social. (Horacio da Cunha, O Alfinete, 9/3/1919)
Em Paris, apache era a patuléia, um indivíduo perigoso e cruel, explorador de mulheres; malfeitor, ladrão. E como os negros da elite se espelhavam nos centros culturais da civilização européia, sobretudo a França, compreende-se o preconceito "anti-apacheano". Apesar de ser uma simples fantasia e fazer parte das festividades carnavalescas, não se admitia que mulher negra assumisse um personagem que, no plano simbólico, subvertia a moral branca.
As ofensivas moralistas se dirigiam, da mesma maneira, às manifestações musicais genuinamente negras, como o samba:
O negro ainda conserva a dança característica de rythmos grotescos e barbaros, que nos foram transmitidos pelos africanos ao som dos "batuques", "quigengues" e "pandeiros", instrumentos de sonoridades insípidas, mas bem rythmadas, que os fazem pular, voltear, numa sensualidade selvagem, verdadeiramente africana. E assim atravessam uma noite toda ao clarão de uma fogueira, que ao amanhecer só resta braseiro e cinza. (O Patrocínio, 19/10/1930, Piracicaba)
O artigo emprega definições extremamente pejorativas para caracterizar ritmos e dança de "preto": "grotescos", "bárbaros", "selvagens" etc. Negava-se tudo que tivesse referência ao mundo negro: forma de andar, falar, dançar, gingar, forma de se vestir, cabelo, tradições culturais e religiosas.11 O repúdio a tais valores culturais era, provavelmente, um recurso de diferenciação social da plebe negra.
Ao assimilarem os valores sociais e/ou morais da ideologia do branqueamento, alguns negros avaliavam-se pelas representações negativas construídas pelos brancos. Era necessário ser um "negro da essencia da brancura".12 Por isso, desenvolveram um terrível preconceito em relação às raízes da negritude. Aliás, a recusa da herança cultural africana e o isolamento do convívio social com os negros da "plebe" eram duas marcas distintivas dos negros "branqueados socialmente":
Parece incrível [...] que possa existir pessoas que, não obstante ser de origem Africana, julgam-se Franceza: como acontece com a Senhorita A. C. da Rua dos Gusmões, que apezar de não pertencer a raça Caucasiana julga-se branca, e escurece os pretos. (O Alfinete, 22/9/1918)
Os ataques, agora, eram desferidos contra o consumo de álcool:
Li há dias num jornal de Sorocaba que uma sociedade recreativa d'aquela cidade deliberou, em reunião, abolir o uso de bebidas alcoolicas por occasião de suas festas, permittindo tão somente o uso das bebidas sem alcool, como sejam: Nectar, Sisi, Gazosa e etc.
Abolindo o alcool do seio das nossas sociedades, e mesmo das mezas do nosso lares, muito conseguiremos em favor da nossa classe de côr.
Creio não haver nisto offensa alguma, pois, simplesmente o ideal de quem estas linhas subscreve, é ver os seus irmãos no lado d'aquelles que sabem presar a sua côr, amar a virtude e despresar o vício.13
Para se afirmar nos valores considerados nobres pela sociedade inclusiva, o negro não devia ingerir bebida alcóolica, assim como não devia jogar, drogar-se, freqüentar o ambiente da malandragem. Pelo contrário, devia defender sem tréguas a moral e os bons costumes da classe dominante, ser religiosamente católico, honrado, regrado e cumpridor de seus deveres. Condenava-se a boêmia, a prostituição, as religiões de matriz africana, a prática da capoeira, o samba, enfim, o negro devia possuir um comportamento puritano.
É importante salientar que todas as prédicas moralistas supracitadas neste tópico foram extraídas dos jornais da denominada "imprensa negra". Pelo prisma de Roger Bastide, a imprensa negra vai ser no Brasil o principal instrumento do puritanismo "preto":
Os sociólogos norte-americanos estudaram muito bem esse puritanismo nos Estados Unidos; viram nele o sinal da ascensão racial, a característica da formação de uma classe média, a linha de separação da plebe de cor, preguiçosa, alcoolizada, supersticiosa, imoral e da aristocracia da raça, instruída, trabalhadeira, vivendo na dignidade e na respeitabilidade. Fenômeno análogo produz-se no Brasil. (Bastide, 1951:71)
Continuando amparados nas reflexões de Roger Bastide, constatamos que o puritanismo se apresenta, antes de mais nada, nas manifestações exteriores da etiqueta burguesa. Historicamente, o comportamento puritano está vinculado ao desenvolvimento da burguesia e sua adoção tornou-se um critério de ingresso dos indivíduos na pequeno-burguesia (ibidem:72). O puritanismo, aliás, praticamente passou a definir o estilo de vida da pequeno-burguesia. Por isso, a fração mais elitizada dos negros paulistas o incorporou com tanta veemência ao seu estilo de vida. O puritanismo da elite negra paulista, reiteramos, foi um mecanismo sobretudo de distinção social, que é típico de grupos em ascensão.
Por sinal, o discurso puritano não era uma característica exclusiva da imprensa negra na época.14 Perpassava, outrossim, pela imprensa alternativa dos anarquistas e das "colônias" étnicas radicadas em São Paulo. Tanto nas associações culturais e recreativas negras quantos nas anarco-sindicalistas e dos imigrantes, a moralização dos costumes, a valorização da educação, o combate ao alcoolismo, o controle do comportamento dos indivíduos, estendia-se das páginas dos jornais até os bailes.15
3.2. Branqueamento estético
A carga ideológica do branqueamento se expressava totalmente no terreno estético. O modelo branco de beleza, considerado padrão, pautava o comportamento e a atitude de muitos negros assimilados.16 Coletamos alguns anúncios e depoimentos que mostravam o desejo do negro de eliminar seus traços negróides, a fim de se aproximar, no plano das aparências, ao branco (nariz afilado, cabelos lisos, lábios finos, cútis clara).
Um exemplo do "branqueamento estético" foram as consecutivas inserções publicitárias nos jornais, tanto da "imprensa negra" quanto da "imprensa branca". Voltado para atender às vontades dos consumidores negros, o enfoque era sempre o mesmo:
Uma invenção maravilhosa!...
"O cabelisador". Alisa o cabello o mais crespo sem dôr.
Uma causa que até agora parecia impossível e que constituia o sonho dourado de milhares de pessoas, já é hoje uma realidade irrefutavel.
Quem teria jamais imaginado que seria possivel alisar o cabello, por mais crespo que fosse, tornando-o comprido e sedoso?
Graças á maravilhosa invenção do nosso "CABELISADOR", consegue-se, em conjuncto com duas "Pastas Mágicas", alisar todo e qualquer cabello, por muito crespo que seja.
Com o uso deste maravilhoso instrumento, os cabellos não só ficam infallivelmente lisos, mas tambem mais compridos.
Quem não prefere ter uma cabelleira lisa, sedosa e bonita em vez de cabellos curtos e crespos? Qual a pessoa que não quer ser elegante e moderna?
Pois o nosso "Cabelisador" alisa o cabello o mais crespo sem dôr. (O Clarim D'Alvorada, São Paulo, 9/6/1929:1)
O alisamento significaria a felicidade do negro, a realização de seu sonho mais profundo; seria a porta de entrada ao mundo moderno de pessoas elegantes. Daí a adjetivação contundente da invenção: "maravilhosa!...".
Depois de um ano, este anúncio permanecia sendo veiculado no jornal O Clarim D'Alvorada, ganhando cada vez mais espaço, levando a pensar que o produto tinha uma imensa aceitação e, por conseguinte, a empresa fabricadora do produto conquistara o mercado consumidor negro. O título do anúncio continuava sendo enfático:
Uma Invenção Maravilhosa!
"O cabelisador"
Alisa o cabello o mais crespo sem dor
Uma causa que até agora parecia impossivel e que constituia o sonho dourado de milhares e milhares de pessoas, já é hoje uma realidade irrefutável.
Quem teria jamais imaginado que seria possivel alisar o cabello, por mais crespo que fosse, tornando-o comprido e sedoso?
Graças á maravilhosa invenção do nosso "cabelisador", consegue-se, em conjunto com duas "Pastas Mágicas", alisar todo e qualquer cabello, por muito crespo que seja. (O Clarim D'Alvorada, São Paulo, 13/5/1930).
O sentido mágico da pasta era ter o poder de subverter a lei natural do negro, seu cabelo crespo. Estava em crescente aumento o número de produtos e serviços que prometiam ao negro alcançar o padrão de beleza dominante. Além de pastas e cremes, toda uma rede de salões "afro" alimentavam este sonho:
Salão para alisar cabelos crespos
Systhema rapido, infallivel e barato
Alisamos qualquer cabello, por mais crespo que seja
São Paulo, Praça da Sé, 14 2º andar sala 4. (ibidem, 25/1/1930)
A simulação de um diálogo cotidiano entre duas mulheres negras, que se encontraram fortuitamente, era a base da propaganda de salão situado no centro da cidade:
Oh! D. Maria, que é que a Sra. fez, que ficou com o cabelo liso, diferente do que se vê ai pela rua?
Ora, D. Thomazia, fui ao Instituto Dulce, e de lá sai assim, como o cabelo liso, sem caspas e sedosos.
Oh, que achado! Por obséquio, diga-me, onde fica essa excelente casa de beleza!...
Ali na Praça Marechal Deodoro, 41.
Hoje mesmo irei lá, e recomendá-lo-ei às minhas amiguinhas.
Obrigada. Até loguinho, sim?! (Progresso, São Paulo, 28/7/1929:2)
Um instrumento específico, com efeito, pressagiava a façanha do alisamento capilar:
Zuavos
NICKELADO é um pente de aço para alisar cabellos e custa apenas 20$000. Vende-se nesta redação. Faz-se demonstrações gratis, as pessoas interessadas.17
Nem mesmo um branco da elite tradicional paulista ficou indiferente ao fenômeno:
Os cânones estéticos, que sempre inspiraram a Nação, são os mesmos que norteiam a todos os povos chamados ocidentais. Daí nos afastarmos, cada vez mais, dos valores africanos. A mais superficial observação demonstra a verdade do que acabamos de afirmar. Não tem mesmo outra origem o esforço desesperado que fazem os mulatos por parecerem, a todo custo, brancos e os pretos para disfarçarem, tanto quanto possível, as características da sua raça. Exemplo: a mania que se apoderou da maioria dos pretos de combater a carapinha, tornando, por meios mecânicos, lisos os seus cabelos. Isto pelo menos em São Paulo, [...] onde tendem a viver em grupo e em oposição aos brancos. (Freyre, 1959, vol. 2: 359)
No entanto, o "branqueamento estético" não se restringia ao alisamento dos cabelos, atingia a principal marca definidora de raça no Brasil: a cor da pele. Alguns produtos prometiam a proeza de transformar negro em branco mediante a despigmentação, ou seja, através do "clareamento" da pele:
Attenção. Milagre!...
Outra grande descoberta deste século, é o creme liquido. Milagre. Dispensa o uso de pó de arroz... Formula Scientifica allemã para tratamento da pelle. Clarea e amacia a cutis. (O Clarim D'Alvorada, São Paulo, 28/9/1930).
A procedência alemã da fórmula já garantia a qualidade do creme. A beleza alemã, ou melhor, ariana, era considerada exemplar, a qual deveria ser importada pela comunidade negra. Outra questão, não menos importante, é observar no texto de anúncio o aviso de que o produto milagroso iria substituir o uso do pó de arroz como método de "clareamento" da cútis. Não foi fortuito este aviso, porque era comum, sobretudo entre as mulheres negras, passar pó de arroz no rosto em festas requintadas, que exigia esmero na beleza plástica, conforme podemos notar no anúncio publicitário:
A's damas da elite
O melhor creme para "esterelizar a cútis", branquear, adherir o pó de arroz, empingens, massagens, evitar panno, espinhas, etc é a pomada "minancora". A mais bella creação dos últimos 50 annos.
Vende-se em todo o Brasil. (Folha da Manhã, São Paulo, 5/1/1929:2).18
Publicado na segunda página de um jornal da "imprensa branca", o creme de poderes miraculosos seria utilizado para "branquear" a pele ou "aderir o pó de arroz" no rosto. Já o periódico A Cigarra, revista de maior circulação no Estado de São Paulo na época, prometia para suas leitoras a "Arte de ser Bella":
Crême de Beauté Oriental. Pelas suas qualidades [...] embranquece, amacia e assetina a cutis, dando-lhe a transparencia da juventude. Preço 3$000. (A Cigarra, São Paulo, nº XIII, 6/7/1915).19
Segundo a mensagem sub-reptícia do anúncio, para ser bela era necessário clarear a pele. E o uso do creme proporcionaria a "transparência" e o rejuvenescimento. A ideologia do "branqueamento estético" foi um fetiche muito eficaz na alienação do negro. Oficializou a brancura como padrão de beleza e a negritude como padrão de fealdade. Representou um entrave para a formação positiva da auto-estima do negro, pois este passou a alimentar um certo autodesprezo. Ora, na ausência de modelos positivos em que pudesse se espelhar, o negro recusava sua própria natureza, desembocando, muitas vezes, em crise de identidade étnica, descaracterizando-se, na busca pela supressão dos traços raciais afro.
Si os nossos antepassados tiveram por berço a terra africana, é preciso que se note, nós temos por berço a Patria este grande Paiz... Não somos africanos, somos brasileiros! (O Bandeirante, São Paulo, 9/1918:2).
O negro não se sentia mais africano e sim "latino" ou "ocidental". A negação da ancestralidade africana deve ser entendida como um mecanismo simbólico de fuga étnica. Combinado à alienação, o recurso do "branqueamento estético" transmitia à subjetividade do negro a sensação de estar cada vez mais parecido com o modelo sancionado como superior. Portanto, foi uma tentativa de superação da inferioridade que sua cor e seus caracteres físicos representavam.
3.3. Branqueamento biológico
A ideologia do branqueamento, em certas circunstâncias, apresentava desdobramento no terreno biológico. A premissa era de que o negro melhoraria biologicamente sua raça casando com alguém mais claro. Este instrumento ideológico incidia nas relações intrafamiliares. Para se desvencilhar dos recalques, os pais incentivavam os filhos a casarem com pessoas não-negras o ideal seria de cor branca na esperança de que seus netos, bisnetos, e assim por diante, parecessem cada vez menos com a filiação afro-negra. Se a criança nascesse mais clara que os pais, consideravam uma vitória, porém, caso a criança fosse mais escura, sentiam-se derrotados.
Pelo fato de o discurso em prol do branqueamento ser um fenômeno que emergia na vida cotidiana da família, não conseguiríamos detectá-lo em outras fontes senão pelo resgate da história oral com negro(a)s que viveram em São Paulo no segundo quartel do século XX. Daí o papel insubstituível desencadeado pelos depoimentos de famílias negras sobre um assunto tabu. Mas por que era tabu? Porque a doutrinação desta modalidade de branqueamento apenas se registrava no âmbito da vida privada, ou seja, na sociabilidade do lar, nos ensinamentos dos pais, nos exemplos dos parentes, que jamais tomavam o escopo de discurso público:
[...] meu pai achava que as filhas tinham que casar com branco e esse era mineiro, a família mora longe "Você não casa, você não casa", tá bom, então não casa.
Mas quando ele descobriu i...a esperar a gente na porta da fábrica [...] ele não queria, ele achava que eu tinha que casar com branco: "Você não vai casar com esse negrinho, [...] só fica fazendo batuque".20
Ao incorporarem os mandamentos do "branqueamento biológico", os pais das famílias negras realizavam uma vigilância rigorosa dos filhos. Desde os amigos do bairro até os namorados passavam pelo crivo da aprovação eugênica. "Casei em 1926 com um amigo de infância, ele era bonito e não era preto, preto chega eu" (Bosi, 1994:386).
Outrossim, esse comportamento da mulher negra foi registrado, em 1925, pelo olhar do cronista Sylvio Floreal: "As pretinhas não querem casar a não ser com mulatos". Já as "mulatinhas, [...] só aspiram casar com homem branco" (Floreal, 1925:165).21
O peculiar desta ideologia foi transformar o discriminado em agente reprodutor do discurso discriminatório, colocando o negro a serviço de uma prática racista.22 Pelo enfoque estritamente psicológico, o coroamento do racismo se materializa quando a vítima assume o papel de seu próprio algoz. Em última instância, estamos diante de um quadro favorável ao "raçacídio", que consistiria no suicídio coletivo de uma comunidade étnica,a médio e longo prazos, com armas ideológicas impostas de fora para dentro e aceitas pelos membros desta comunidade.
O branqueamento via casamento, às vezes, estava intimamente vinculado, no imaginário social, à ascensão do negro. Essa foi a relação que Maria Cristina fez:
É, [...] um preto que tá numa situação financeira boa, ele não vai procurar uma preta, pra melhorar a raça, né, vão, então, aquela riqueza vai progredindo, e tudo, ele vai procurar uma branca, porque ele quer melhorar a cor dos filhos [...].23
Para uma sociedade de classe com mentalidade racista, o casamento misto, em particular do negro com alguém do segmento branco, representava tanto o aprimoramento da raça quanto a premiação pela vitória conquistada: a mobilidade social. A esposa ou marido brancos simbolizavam, de forma combinada, uma melhoria dupla: de raça e de classe social. Já o casamento dentro da própria comunidade étnica era concebido como ameaça, como se apreende das lembranças de Ana Pacheco:
Ninguém queria o casamento, nem meu tio né? (Sr. Benedito). Ele não gostava de preto e meu marido era preto e aí eles não gostavam de preto mesmo.
Minha mãe não gostava. Ela era escura, preta.
Eu não sei porque ela não gostava dele, nem meu tio João Domingos que era rico, morava lá, também não gostava não, ele falava: "Preto não presta menina, é uma raça suja! Olha! Preto quando não caga na entrada, caga na saída e quando não caga na entrada e na saída ele deixa um bilhete: eu volto para cagar", ele falava isso pra mim.
Tio João falava: "Sem-vergonha! Porca! Suja! Cê vai casar com esse negro, sujar a nossa raça né? [...] casar com preto, pretejando a raça cada vez mais".24
Contrariando a vontade familiar, Ana Pacheco casou-se com um negro, contribuindo para "empretecer" ou "enegrecer" ainda mais os descendentes. Na fase de namoro, o relacionamento com um negro não provocou tanta contestação como no momento em que foi anunciado o casamento. Ora, o casamento significava a constituição da família, a qual, mais cedo ou mais tarde, seria complementada pelo nascimento de filhos. Daí a preocupação dos tios João, Benedito e da mãe. As futuras gerações de negros, segundo os parentes, teriam que se distanciar ao máximo de sua origem racial. A saída apontada pelas famílias negras, geralmente, era bem intencionada: imaginavam que os filhos e os netos dos casamentos com pessoa mais clara levariam uma vida com menos dor, sofrimento e com mais chances de vencer na vida.
As frustrações raciais geradas pela ideologia do branqueamento causavam o sentimento de inferioridade no negro. Este chegava ao extremo de pensar que a cor da pele fosse alguma deformação patológica, cuja cura não tinha ainda sido descoberta:
Ele é mais preto, então, qualquer coisinha, ele é negro. Ele falava assim, que se tivesse um remédio para ficar mais claro, ele tomava.25
O "branqueamento biológico" também poderia ser alcançado por métodos artificiais, "quando se descobrir a droga que poderá lavar a pele" (Progresso, São Paulo, 13/1/1929:4).
Havia casos cujos negros atentavam contra seu próprio corpo e empregavam recursos estapafúrdios para clarear a pele. Acreditavam que comendo barro, ingerindo muito leite, passando alvejante no corpo, tomando banhos demorados com muito sabão, não ficando exposto ao sol, diariamente, era suficiente para "desnegrecer", vale dizer, eliminar a alta pigmentação da pele e, por conseguinte, o complexo de inferioridade. Esta vertente do branqueamento legitimava ideologicamente o eventual genocídio biológico do negro.
NOTAS
4. Apesar de o segmento negro (pretos e pardos) na cidade, em 1920, ser aproximadamente 9% da população total, o índice de natimorto (nascidos mortos) era de 12,7% em 1918; 12,4% em 1922; 13,35% em 1924; 15,9% em 1926 e 15,99% em 1928. Portanto, é possível afirmar que a mortalidade infantil, tendo por base os índices de natimortos, entre 1918 e 1928, era maior entre a população negra, exceto para o ano de 1920, cujo índice foi de 5,8%. Ver Ellis Junior (1932:9-10).
5. "Os pensamentos da classe dominante são também, em todas as épocas, [...] o poder espiritual dominante. A classe que dispõe dos meios da produção material dispõe também dos meios da produção intelectual, de tal modo que o pensamento daqueles aos quais são negados os meios de produção intelectual está submetido também à classe dominante" (Marx e Engels, 1998:48). Originalmente, Marx desenvolveu essa reflexão para explicar o mecanismo ideológico da dominação de classe, ou seja, mostrar como as idéias da classe dominante são hegemônicas sob o conjunto da sociedade. Como entendemos que a dominação não se revela estritamente no terreno classista, realizamos um recorte étnico-racial para operar e compreender este mecanismo de dominação ideológica.
6. Neste artigo, assimilação pode ser definida, em síntese, pelo "tipo de mudança étnica pela qual as pessoas se tornam parecidas". Assimilação é um processo que "pressupõe que a minoria irá se adequar aos modos" de vida da maioria étnica ou racial (Cashmore, 2000: 84-5). Esta definição é apropriada para designar a situação de grupo étnico minoritário, a qual se encontrava o negro na época. Nas estimativas apresentadas por Fernandes (1978:108), os "negros" e "mestiços" representavam na população total da capital, no mínimo 11% em 1910; 9% em 1920; e 8,5% em 1934.
7. A "imprensa branca" é uma referência aos jornais regulares da grande imprensa, de ampla circulação, produzidos majoritariamente por brancos e voltados para o público não-negro.
8. A "imprensa negra" é uma referência aos jornais alternativos que surgiram em São Paulo no pós-abolição, produzidos por negros e dirigidos à comunidade negra. Dentre esses jornais, são citados neste artigo O Alfinete, A Sentinella, O Patrocínio, Progresso, O Clarim D´Alvorada, O Bandeirante, O Menelick, Auriverde e Getulino. Sobre o assunto consultar Ferrara (1986).
9. "Apareceu na segunda metade do século XIX no Rio de Janeiro. Resultou da fusão da tabanera pela rítmica, e da polca pela andadura, com adaptação da síncopa africana. Outros o fazem uma prolação do lundu, mesclado com a toada. Era dança de salão, de par unido, exigindo extrema agilidade pelos passos e figuras rápidas, mobilidade de quadris [...]. Foi por algum tempo expoente da nossa dança urbana, tendo cedido lugar ao samba [...]" (Câmara Cascudo, 1988:486).
10. "O segmento negro em São Paulo no início do século XX não constituía um bloco homogêneo. Em linhas gerais, era possível dividi-lo em duas amplas camadas: de um lado, os negros da elite; de outro, a massa negra plebléia. A elite negra ou negros evoluídos eram provenientes dos estratos intermediários da estrutura de classes: jornalistas, funcionários públicos, técnicos, profissionais liberais ou especializados, em suma, os negros letrados e/ou classificados socialmente. O termo elite negra não significa uma minoria detentora dos meios de produção material. O termo tem três sentidos específicos: primeiro; político, porque este grupo se configurou como dirigente políticos da comunidade e eram aceitos como tal pelos brancos; segundo, educacional e cultural, porque este grupo era fundamentalmente alfabetizado e considerado culturalmente evoluído; terceiro, ideológico, porque este grupo reproduzia muitos dos valores ideológicos da classe dominante. Foi este estrato da população que mantinha os jornais da imprensa negra. O segundo setor, o plebeu, era constituído por desempregados, malandros, trabalhadores braçais, doméstico(a)s, biscateiros, indigentes, prostitutas, em suma, pelos negros desqualificados socialmente" (Domingues, 2001:163-4).
11. Como observou Carlos Hasenbalg (s/d:5) "a pressão no sentido de branqueamento resulta em que negros e mulatos fazem o melhor possível para parecer mais brancos e procuram com energia dissimular ou desenfatizar suas origens negróides. Naturalmente, a hierarquização das pessoas em termos de sua proximidade a uma aparência branca ajudou a fazer com que indivíduos de pigmentação escura desprezem a sua origem africana".
12. Esta foi a forma como o articulista se referiu a José Carlos do Patrocínio, filho de José do Patrocínio (Progresso, 15/2/1930).
13. Carta enviada para Sr. Redactor por Zelindo (O Alfinete, 28/8/1921).
14. Como assevera Otávio Ianni, puritanismo "trata-se de um modo de ser e comportar-se asceticamente, com relação a algumas solicitações habituais da vida social. Não é exclusivo dos negros. A comunidade, habitualmente, conta com tais indivíduos; são pessoas que personificam alguns ideais considerados elevados pela consciência coletiva" (Cardoso & Ianni, 1960:214).
15. Encontramos o discurso moralizante, de condenação ao álcool, aos jogos, bailes, também na imprensa operária, conforme "O Alcool e sua Acção" (Tribuna Operária, Santos, 7/8/1909:4) e na imprensa anarquista, de acordo com "Crítica ao Carnaval" (Terra Livre, São Paulo, 22/3/1910:3) e "O Flagello do Alcoolismo" (ibidem:4).
16. Nas reflexões de Wilson do Nascimento, "o abandono dos valores éticos e estéticos de sua própria cultura é, pois, o coroamento do processo de assimilação. E, na verdade, as instâncias ética e estética são o que existe de mais elevado em cada cultura. Ao abandonar tais valores, o assimilado está, para sua cultura de origem, desde então, morto". Ver Nascimento (1985:44).
17. O Clarim D'Alvorada, São Paulo, s/d. Este anúncio reiteradamente era veiculado: "20$000 Importancia única para se adquirir um dos famosos pentes de aço, para alisar cabellos sem dor e sem perigo telephonem, hoje mesmo, para 2-1706 ou nesta redacção: rua Major Diogo, 131" (ibidem, 24/11/1929:2).
18. Apesar de muitos desses produtos terem uma finalidade terapêutica, eram usados com a perspectiva de "desnegrecimento".
19. Em anúncio publicitário, veiculado em outro número da mesma revista, o tom era semelhante: "Angelica. A Angelica é a agua que faz a cutis branca em poucos momentos sem prejudical-a, tornando-a suave e fresca. Casa Lebre & Cia. Rua 15 de Novembro" (A Cigarra, São Paulo, nº XI, 7/10/1914).
20. Memória da Escravidão em Famílias Negras no Estado de São Paulo (MEFNESP), entrevista com Geraldinha Maria Patrício da Luz, Caixa 5, Vol. 30, São Paulo, 1987, p. 9.
21. Apesar do desejo da "brancura" de algumas mulheres negras e "mulatas", não podemos superestimar a existência de casamentos inter-raciais em São Paulo, pelo menos na década 20, como foi assinalado pelo próprio Sylvio Floreal, que foi testemunha ocular do processo em curso: "Mas a verdade triste é que o número das mulatinhas que conseguem casar de accôrdo com o seu sonho de brancura é tão resumido, que melhor fôra que elas, castigadas pelas rudes experiencias e levadas como tem sido, pela via de amargura da perdição, abandonassem essa tão desastrada mania! Entretanto, tal mania instalada na ansia e nos caprichos dessas creaturinhas, constitue a razão de ser de suas vidas" (ibidem:167).
22. "Eu sempre fui solteira, por duas razões: não queria ter filho preto, porque sofre muito, e também não gostava de homens da minha cor". Cf. Bernardo (1998:62).
23. MEFNESP, entrevista com Maria Cristina Tejeda, Caixa 5, Vol. 33. São Paulo, 1987, p.56.
24. MEFNESP, entrevista com Ana Pacheco de Oliveira Almeida, Caixa 3, Vol. 24, Jaboticabal (Córrego Rico), 1987, p. 34-37-51-52. Os argumentos usados pelo tio João Domingos para abominar o noivo tinha uma forte conotação preconceituosa. Operava-se o que se classifica como expurgo. Como recurso para sentir-se menos negro, o tio João Domingos projetava e transferia no marido da sobrinha tudo aquilo que ele odiava em si mesmo. Frustado em suas expectativas, o tio João Domingos desloca suas ofensas para a sobrinha, Ana Pacheco, tachando-a, entre outras coisas, de suja. Esta adjetivação negativa para se referir à pessoa negra estava em oposição à estereotipia positiva de limpo, normalmente ligado à "raça branca". Como assevera Wilson do Barbosa, "quando a alienação gerada pela assimilação não produz os frutos desejados, o ódio dos assimilados dirigir-se-á contra a comunidade negra, testemunha indesejável e fonte efetiva de seu êxito apenas parcial. Destrói-se em cada negro aquilo que ainda há de negro em si próprio" (Barbosa, 1985:43).
25. MEFNESP, entrevista com Maria Francisca Bueno, 106 anos, moradora de Rio Claro.
Fonte: Scielo (Estud. afro-asiát. vol.24 no.3 Rio de Janeiro 2002)
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-546X2002000300006&script=sci_arttext
Autor: Petrônio José Domingues
Ver também:
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 01
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 03
A ideologia do branqueamento no Brasil, o racismo brasileiro - parte 04
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