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domingo, 28 de setembro de 2025

A Cidade Proibida (China) e outros monumentos (Muralha etc), sugestão de vídeos de canal

Dando sequência a esse post sobre o ´"Ultimo imperador" da China e a sugestão do filme "O Último Imperador" do Bertolucci (comentários no próprio post):
"O último Imperador da China (Puyi)" (https://holocausto-doc.blogspot.com/2025/09/o-ultimo-imperador-da-china-puyi.html)

eu disse que faria um post extra pra sugerir vídeos de um canal, pois ficaria muita informação pra um post só.

Colocarei aqui a sugestão então pra que assistam os vídeos do canal "2aMais na China" (do Dieter e da Deyse, pessoal muito simpático, o canal tirou o "da China" do nome mas se chamava assim antes), casal que teve uma experiência de 4 a 5 anos na China, de 2015 a 2019 (vieram pouco antes da explosão da Covid, fim de 2019, mas tem vídeo em 2020 ainda), e continuo achando um dos melhores relatos (ou melhor) documentado em vídeo da China no período (e continua bem atual os vídeos), edição, texto, as observações do casal (que saíram do Brasil com visões não tão positivas sobre a China e mudaram a percepção com o tempo, fato bem relevante pro registro dos vídeos).

Descobri o canal em agosto de 2020 (citando de memória), ou redescobri porque já havia visto alguma coisa antes e não havia dado "atenção" (a gente acaba criando certa animosidade com vídeo de canal de brasileiros fora porque tem muita tranqueira no Youtube), fiquei bem doente no período (coisa rápida mas foi pesada, algum mal estar, infecção intestinal, não foi diagnosticado, foram 4 a 5 dias pesados ou 1 semana, nem lembro direito mais, em plena pandemia) e os vídeos do canal ajudaram muito na melhora de ânimo no período. Sou grato à dupla por isso e pelo registro em vídeo que fizeram e compartilharem essa experiência, já deixei meu agradecimento em algum vídeo do casal, ou mais de um).

No vídeo sobre Natal mostram as igrejas cristãs na China (há outros vídeos de religião na China, templos de Taoismo, budista, se for o caso depois eu coloco um desses aqui), a arquitetura da igreja católica da China (arquitetura interessante, puxa pra arquitetura do local).

Eu sugeriria que quem pudesse ou tiver curiosidade que "maratone" todos os vídeos do canal do casal, mas só vou colocar aqui quatro vídeos: da "Cidade Proibida" (onde os imperadores da China viviam, e onde se passa parte do filme de "O último Imperador", da vida dele, há outro vídeo também da "Cidade Proibida", vasculhem o canal), da "Muralha da China" (há mais de um vídeo sobre a Grande Muralha da China, escolhi obviamente só um praqui), do "Templo do Céu" (construção que é mais antiga que o Brasil...) e um vídeo de Natal na China (tem outro vídeo no canal sobre o Natal na China, mais antigo, mas vou colocar só um deles aqui).

Há vídeos fora de série no canal, de verdade, vale muito a pena assistir (vídeos de Hong Kong, Pequim/Beijing e cia). Pena que a dupla tenha parado com os registros filmados, até os do Brasil, mas fizeram uma obra sensacional (minha opinião e a de muita gente) registrando a vida na China de 2015 a 2019 e a transformação naquele país no período. Vídeos em português (áudio), pra quem não entende português/espanhol, ative as legendas em inglês e de outros idiomas no Youtube.

domingo, 21 de setembro de 2025

O último Imperador da China (Puyi)

Só lembrando, texto integral abaixo sobre o último imperador da China feito pela BBC, mas... como a BBC (mídia pública britânica) "dá uma no cravo e dez na ferradura" (a expressão é outra Link1, fiz a adaptação porque a "ferradura" da BBC é vir com dez notícias enviesadas atacando o que não agrada à "agenda" dela, e no meio delas solta alguma matéria razoável ou boa, que é o caso da matéria em questão), e eu ia fazer uma adaptação pra sugerir o filme "O último Imperador", ficará pra outro post.

Fazer resumo daquilo (do filme) seria complicado (e "spoiler") e desnecessário depois de ler a matéria que será transcrita abaixo. Ainda é um filme espetacular (venceu 9 Oscar), super produção, e serve pra conhecer um pouco ou algo da China e também do período que vivemos, por isso veio forte à lembrança do filme nas últimas semanas ou meses vendo os links sobre a invasão japonesa da China etc, se procurarem os posts passados irão achar matérias sobre filmes da invasão japonesa à China (pensei nesse post, e no próximo que farei, há semanas, só que é impossível transpor tudo praqui). Pro pessoal que gosta de primeira guerra e segunda guerra mundial, filme sensacional (vai muito além do contexto desses conflitos embora se passe neles também).

"Mas a matéria abaixo não é "spoiler"? "Sim" e não... depende de como assistirem o filme (de como interpretam)... o filme sobre a figura do Puyi (nome do imperador) e sobre a China não detalha tudo do período (não tem como), tem partes "meio" datadas (o estilo) ou que eu tiraria do filme (soam caricaturas, o excesso de danças etc mas entendo porque colocaram), revendo o filme dá pra compreender melhor o filme hoje do que quando se viu da primeira vez, se você assistiu isso há mais de uma década e muita gente não assistiu (engraçado uma parte "falar tanto" de China no Youtube e eu nunca ter visto sugestão desse tipo de filme)... é um filme de 1987, do contexto da Guerra Fria ainda.

Mas deixa eu colocar o trailer do filme do Bertolucci aqui, haverá outro post sobre isso aqui, de forma curta, como complemento.

Trailers do filme "O último Imperador" (Bernardo Bertolucci):

Título da matéria (BBC):

"Como o último imperador da China terminou a vida como um simples jardineiro"
Autor, Redação
Role, BBC News Mundo; 11 setembro 2021

Sua história seria extraordinária de qualquer maneira, pois ele estava destinado a ser o governante absoluto de quase um quarto da população mundial. Mas ele acabou sendo único porque, diferentemente de seus ancestrais, chegou ao século 20 e sofreu as consequências das transformações sociais, políticas e econômicas da época.

Aisin-Gioro Puyi nasceu em fevereiro de 1906 em Pequim, quando seu tio Guangxu era o imperador da China. Este, no entanto, estava em prisão domiciliar havia 8 anos, por ordem de sua tia, Imperatriz Viúva Cixi, a mesma que o havia escolhido para ocupar o trono do Dragão e que permanecera como regente - e de fato governava o país - sob o título de "Santa Mãe, Imperatriz Viúva".

Ela própria determinou, em 13 de novembro de 1908, que a residência oficial dos imperadores e sua corte, bem como o centro cerimonial e político do governo chinês, fossem transferidos para a Cidade Proibida, no centro de Pequim.

O escolhido como sucessor do moribundo governante Guangxu foi Puyi, que apesar da pouca idade, se lembra do encontro com a formidável Cixi, cujo "rosto abatido e aterrorizante" viu através de uma cortina cinzenta.

"Dizem que comecei a gritar alto quando a vi e comecei a tremer incontrolavelmente. Cixi mandou alguém me dar alguns doces, mas eu os joguei no chão e gritei 'Quero minha babá, quero minha babá!', para grande desgosto dela", recordaria ele anos depois.

Guangxu morreu em 14 de novembro, e no dia seguinte, foi a vez de Cixi.

Em 2 de dezembro, dois meses após seu terceiro aniversário, Puyi foi chamado de "Sua Majestade o Imperador", "O Senhor dos Dez Mil Anos", "O Filho do Céu" depois da realização da "Grande Cerimônia de Entronização".

"Uma cerimônia que estraguei com minhas lágrimas", escreveria ele tempos depois em sua autobiografia, que também serviria de fonte para o filme O Último Imperador (1987), do cineasta italiano Bernardo Bertolucci.

Puyi se tornou o décimo-segundo imperador da dinastia Qing e o mais jovem na longa história imperial chinesa.

Sua dinastia

Puyi era descendente das tribos Manchu que venceram os Ming e fundaram a dinastia Qing em 1644, sob a qual a China dobrou de tamanho, ao incluir Xinjiang no extremo oeste, assim como a Mongólia e o Tibete, criando praticamente o formato territorial que a China tem até hoje. Um selo imperial do período Kangxi da dinastia Qing

Crédito, Getty Images
"Um selo imperial do período Kangxi da dinastia Qing"

A nova dinastia tolerou uma diversidade de povos e religiões e criou grandes empreendimentos culturais.

No século 18, a China era indiscutivelmente a maior economia do mundo, um país próspero com uma cultura rica. Seus imperadores viviam no coração de sua opulenta capital, Pequim, cercados por guardas imperiais e famílias nobres manchus.

Mas no século 19 a dinastia Qing começou a enfraquecer, incapaz de defender a China de agressões militares de forças britânicas, americanas, francesas, alemãs e japonesas.

Em 1850, um chinês cristão convertido, Hong Xiuquan, proclamou-se líder de uma nova dinastia, o Reino Celestial Taiping, e marchou com seus seguidores contra Qing, ganhando amplo apoio à medida que avançava.

A guerra civil que se seguiu durou 14 anos, e cerca de 20 milhões de pessoas perderam a vida em um conflito que acabou envolvendo soldados europeus.

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"Rebelião de Taiping, uma obra de meados do século 19"

A Rebelião de Taiping foi um dos eventos mais importantes na China no século 19, assim como o "Levante dos Boxers", também conhecido como "Levante de Yihétuan", uma rebelião de aldeões das províncias do Norte que estavam desesperados e famintos e passaram a responsabilizar estrangeiros por sua situação, expulsando mercadores e missionários.

O movimento teve início em 1898, cercou Pequim no verão de 1900, mas acabou sendo derrotado de forma brutal em setembro de 1901.

Era esta China que o pequeno Puyi governaria. Seus representantes, que regiam em seu nome, eram o pai de Puyi, príncipe Chun, e depois, a tia, Imperatriz Viúva Longyu.

O mundo lá fora

Em outras épocas, a fraqueza da dinastia Qing teria levado ao surgimento de outra, mas o século 20 ampliou o leque de possibilidades.

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"1909: Príncipe Chun, regente e controlador da nação, com seu filho mais novo ajoelhado e Puyi (1906-1967), Imperador da China, ao seu lado"

Enquanto Puyi era formado para o seu papel de governante e rodeado de privilégios que incluíam até ser dono de outras pessoas, como os eunucos que cuidavam dele e tinham que obedecer a cada um de seus caprichos, uma revolução estava sendo forjada contra o poder de sua dinastia. Para muitos chineses, esses governantes tinham perdido o mandato divino.

Em 1911, estourou a Revolução Xinhai ou Revolução Hsinhai, que acabaria pondo um fim ao Império e inaugurando a República da China. Em 12 de fevereiro de 1912, a Imperatriz Viúva Longyu, tia de Puyi, selou o "Édito Imperial de Abdicação do Imperador".

"A imperatriz viúva estava sentada em uma sala ao lado do palácio, enxugando os olhos com um lenço enquanto um velho gordo (o primeiro-ministro Yuan Shikai) se ajoelhava diante dela em uma almofada vermelha, com lágrimas rolando em seu rosto. Eu estava sentado à direita da viúva e me perguntava por que os dois adultos choravam", relata Puyi em suas Memórias.

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"As viúvas imperatrizes Longyu (primeira à direita) e Cixi (Tzu-hsi, 1835-1908, centro) com damas da corte em 1904"

Eles choravam porque acabava, formalmente, seu governo e os 267 anos de poder da dinastia Qing.

Mas ele, aos 6 anos, estava alheio a essas realidades.

E assim permaneceu, pois com o avanço da revolução, todos estavam em território desconhecido: com o fim de 2 mil anos de sistema imperial, ninguém sabia exatamente o que fazer com a casa imperial deposta.

Enviá-los para a Manchúria ou deixá-los em Pequim?

No fim, decidiram tratá-lo como faziam com reis estrangeiros, permitindo-lhe viver na Cidade Proibida, desfrutando do luxo de seu palácio imperial e seus jardins.

Por isso, para Puyi, pouca coisa mudou: ele nem mesmo foi informado por um tempo de que não era mais imperador e continuou a gozar de privilégios hoje difíceis de imaginar.

"Na época em que a China passou a ser uma república, e a humanidade avançou para o século 20, eu ainda vivia como um imperador, respirando a poeira do século 19", escreveu ele.

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"Cidade Proibida, considerada foi sua primeira prisão"
Em 1917, ele chegou a ser renomeado como imperador pelo general pró-monárquico Zhang Xun, que deu um golpe e assumiu o posto de "regente do Império". Mas isso durou apenas duas semanas, e Puyi e sua corte não foram responsabilizados pelo ocorrido.


Prisioneiro cruel

Puyi cresceria naquele ambiente estranho, isolado do mundo exterior, separado de sua família, sem nenhuma outra referência exceto a babá, Wang.

Mas ele continuou a ser tratado como uma divindade, a quem ninguém poderia perturbar, mesmo quando ele se comportava, segundo seu próprio relato mais tarde, de maneira nefasta.

"Chicotear os eunucos fazia parte da minha rotina diária. Minha crueldade e amor ao poder já eram fortes demais para que a persuasão surtisse algum efeito."

Em 1919, no entanto, Reginald Johnston, um acadêmico britânico contratado pela corte Qing para ser tutor de Puyi, o descreveu assim às autoridades britânicas: "Um menino muito 'humano', com vivacidade, inteligência e senso de humor. Além disso, tem excelentes modos e é totalmente isento de arrogância".

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"O imperador, aos 11 anos"

"Ainda que o imperador não pareça ser malcriado, pelas bobagens e futilidades que o cercam, temo que não haja esperança de que ele saia ileso dos perigos morais nos próximos anos de sua vida. (...) A menos que ele possa ser mantido longe da influência das hordas de eunucos e outros funcionários inúteis que atualmente são quase seus únicos companheiros", escreveu Johnston.

Assim, Puyi gradualmente se tornou um adolescente cujos atos de rebeldia consistiam em caminhar fora da Cidade Proibida, usar óculos e cortar sua tradicional trança Manchu. No entanto, ele ainda era obrigado a obedecer tradições, como por exemplo a das "grandes núpcias" do imperador.

"Casei-me com um total de quatro esposas ou, usando os termos usados na época, uma imperatriz, uma consorte secundária e duas consortes menores. Mas, na verdade, elas não eram esposas reais e estavam ali apenas para decoração", escreveu Puyi.

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"Procissão de presentes de casamento de Puyi, Imperador Xuantong da China (1906-1967), para sua noiva Lady Gobulo, Imperatriz Xiaokemin (1906-1946)"

Do lado de fora, o país ainda procurava respostas para as convulsões do fim do sistema imperial.

Em 1924, o comandante militar Feng Yuxiang chegou ao poder e expulsou Puyi e sua comitiva da Cidade Proibida.

Imperador de novo

Aos 19 anos, refugiou-se com os japoneses, que, ao invadirem a Manchúria em 1931, o proclamaram imperador de Manchukuo, um estado fantoche criado a partir das três históricas províncias da Manchúria (nordeste da China).

À época, a propaganda japonesa descreveu o nascimento de Manchukuo como um triunfo pan-asiático, reunindo as "cinco raças" de japoneses, chineses, coreanos, manchus e mongóis.

Isso, segundo eles, marcaria nada menos do que o nascimento de uma nova civilização e um ponto de inflexão na história mundial, como explica Edward Behr em seu livro O Último Imperador (1987).

Assim como o Estado, Puyi também era uma marionete, já que Manchukuo era rigidamente controlado por Tóquio, que o utilizava como base de expansão na Ásia.

Ali, a vida de Puyi se transformou em um pesadelo.

Obcecado pelo fato de que a grande maioria de seus súditos o detestava, já que Manchukuo era "um dos países mais brutalmente governados do mundo", de acordo com Behr, ele vivia como um prisioneiro virtual em seu palácio, com pouco mais a fazer do que assinar decretos aprovados pelos japoneses.

Sua tendência para a crueldade foi exacerbada e ele atormentava seus servos, não apenas com as usuais chicotadas, mas também cortando a quantidade de comida.

Além disso, ele se tornou budista, místico e vegetariano.

Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-45), ele permaneceu firme com seus amos japoneses. Como ele mesmo admitiu, fez tantas declarações pró-Japão que nenhum aliado o aceitaria se fugisse de Manchukuo.

Mas foi isso que ele acabou forçado a fazer em 11 de agosto de 1945, quando finalmente percebeu que o Japão não estava ganhando a guerra e embarcou em um trem com sua corte e os tesouros da dinastia Qing.

Em 16 de agosto, um dia após a rendição do Japão, ele abdicou como imperador de Manchukuo e declarou, em seu último decreto, que o estado era parte da China.

Puyi acabou preso pelo Exército Vermelho soviético quando tentava voar para o Japão.
Imperador Manchukuo Puyi (à direita) sendo questionado pelo general russo Pritoul (à esquerda) após sua prisão

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Legenda da foto, Imperador Manchukuo Puyi (à direita) sendo questionado pelo general russo Pritoul (à esquerda) após sua prisão

Os soviéticos, que inicialmente não o reconheceram, levaram-no para a cidade de Chita, na Sibéria. Foi mantido preso, mas com conforto e mais privilégios do que os outros prisioneiros, algo pelo qual ele era grato ao mandatário Joseph Stálin.

Ali, receberia como todos os outros uma formação comunista.

A casa

Enquanto isso, a China ainda estava faminta por ideias e poderia ter tomado muitas direções diferentes.

Depois de décadas de conflitos internos, invasão japonesa e guerra civil, o Partido Comunista, com sua então estreita afiliação com a União Soviética de Stálin, conseguiu prevalecer.

Em 1949, Mao Tsé-Tung proclamou a Nova República na Praça Tiananmen (ou Praça do Portão da Paz Celestial), cujo nome vem do portão sul da Cidade Proibida, morada dos imperadores, aquela de onde apareciam as procissões quando o imperador deixava seu trono para realizar rituais para agradar os deuses. Ali os comunistas penduraram retratos de seus heróis.

Depois de quase 40 anos de guerra e instabilidade, a China estava em paz.

E para Puyi, que fora um daqueles imperadores cuja função era manter as relações diplomáticas entre os humanos e o mundo celestial, chegara a hora de voltar para casa, mesmo que não quisesse.

Ele temia o destino que o esperava no império do proletariado, mas Mao Tsé-Tung nada mais fez do que enviá-lo a um campo de reeducação.

Ele passaria 10 anos lá, onde pela primeira vez teve que fazer, sem ajuda, coisas como escovar os dentes e se vestir, além de trabalhar e aprender sobre o comunismo. Puyi, em seus últimos anos

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Legenda da foto, Puyi, em seus últimos anos

Durante séculos, o Estado chinês girou em torno do imperador, a personificação do poder no coração do estado, o ser semidivino destinado a proteger as pessoas de colheitas ruins e inundações devastadoras.

Em 1960, Mao Tsé-Tung, uma nova versão desses seres poderosos, concedeu ao último imperador da China um indulto especial: cidadania e liberdade.

A partir de 1964, o homem que já governou o país mais populoso do mundo passou a trabalhar como assistente de jardinagem no Jardim Botânico de Pequim e, depois, como editor no departamento de literatura da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês.

E ele também escreveu uma autobiografia, De Imperador a Cidadão, que foi endossada por altos funcionários do Partido Comunista Chinês.

Puyi indicou ter aprendido lições da Educação Socialista Gratuita, a julgar por declarações em seu livro e outras que deu em ocasiões como no casamento com Li Shuxian, uma enfermeira de hospital, em 1962, quando proclamou: "Vamos nos lembrar deste dia e continuar a aprender com a classe trabalhadora por todos os nossos futuros dias juntos. (...) Eu odeio a primeira metade da minha vida, porque foi uma experiência humilhante ser um explorador e um parasita."

Fonte: BBC em português (Brasil)
https://www.bbc.com/portuguese/internacional-58531866

Continuação do post, sugestão de canal sobre a China:
"A Cidade Proibida (China) e outros monumentos (Muralha etc), sugestão de vídeos de canal"
https://holocausto-doc.blogspot.com/2025/09/a-cidade-proibida-china-e-outros-monumentos-historicos-muralha-etc-sugestao-de-videos-de-canal.html

domingo, 14 de setembro de 2025

"Por trás da Unidade 731: a carnificina contra a humanidade pela guerra e o militarismo"

Eu havia salvo o link desse vídeo abaixo da CGTN (TV estatal chinesa, em inglês) pra colocar depois em post separado sobre o post desse filme ("731 Biochemical Revelations" ("731 Revelações Bioquímicas"). Próximo filme chinês com temática de guerra atrai a atenção da mídia japonesa"), pra não ficar com excesso de informação em um post único, só que não estava conseguindo localizar o link...

O Google (dono do Blogger, dessa plataforma de blog) não mostra o resultado na busca pelo "link"... e o mecanismo de busca do Google é bem "preciso" (quando querem...), como essas coisas não acontecem aleatoriamente, o "esforço de guerra" norte-americano contra a China pelo visto tá bem forte... apesar de deixarem essa TV estatal chinesa operar no Youtube (até quando? Os EUA baniram a RT junto com a União Europeia, a RT russa).

Por isso que acho frágil demais a China usar uma plataforma norte-americana de vídeos (Youtube/Google), em pleno atrito com os Estados Unidos (a potência em declínio), pra difundir esses conteúdos ou se comunicar com o mundo, o BRICS precisa ter uma plataforma própria de comunicação à parte dos entulhos (Big Techs) dos EUA, que manipulam resultados, omitem, censuram... nesses dias o "shadowban" do blog foi "cortado" (aliviado...) e houve mais de 6 mil acessos em 2 ou 3 dias... algo que era normal no passado virou algo "excepcional" com o controle feito por essas plataformas do Google. Quer dizer, a maioria desses acessos maiores não veio do Google... (o Google informa as estatísticas de acesso internamente no blog, é assim que a gente sabe os países que acessam, proporção, interesses etc).

"Ah, mas os acessos são pequenos em relação ao Youtube"... de fato, em relação a um canal "grande", seria, só que tem mais views que muito canal de "informação" daquela plataforma (Youtube)... (e mesmo assim, tem um pessoal que fica em um pedestal sem citar etc), sem ajuda de terceiros, de divulgação por terceiros, exceto colegas ou quem acessa e gosta, no "boca a boca" (como tem gente da China que lê esse espaço, não queiram saber das picuinhas e hostilidades dessas "mídias brasileiras" com mídias com menor "visibilidade", ou que desagradam certa "agenda" deles... ou mesmo vaidades, mesmo na questão palestina, de Gaza, que eu achava que essa coisa atenuaria, apaziguaria, continua do mesmo jeito... senão pior), e o site/blog é um espaço de leitura, de fixação de conteúdo (de estudo e cia).

Youtube opera mais na lógica do "entretenimento", tirando vídeos de documentário, noticiário etc, sites escritos não necessariamente (principalmente os de política e história)... por isso que acho engraçado editoras e cia tentarem divulgar livros por Youtube quando público 'leitor' (que compra livros, de fato) acessa conteúdos escritos, em sua grande maioria, de nichos etc... (é tão óbvia a coisa que chega a ser ridículo ressaltar isso).

Só um pequeno adendo, sobre esse tema "segunda guerra na China", no Pacífico, eu já tentei contato pedindo conteúdo (produzido pela China) sobre segunda guerra na China, meses atrás, por gente da China que apareceu em certas mídias aqui do país e nada... estou externando a coisa agora depois de meses, da próxima eu tentarei contato com gente direto da China, assim se corta esse comportamento ridículo (hostil). Se não leram mensagem, peço desculpas antecipadas, mas acho que leram (fora a dificuldade em contactar).

Mas prosseguindo, em todo caso, eu havia guardado esse link da CGTN (e tem outro vídeo resumo no post do filme sobre "Unidade 731") porque foi a melhor explicação resumida da guerra bacteriológica do Japão na China na segunda guerra mundial.

A quem quiser assistir (sem mais delongas), o vídeo ficará aberto (obviamente) só que tem legendas em inglês. Você pode tentar colocar em português ou outro idioma nas configurações do vídeo no Youtube:

Watch: Behind Unit 731 – The butchery of humanity by war and militarism


Tem mais vídeos que eu localizei da CGTN sobre o tema, vou listar abaixo como venho fazendo (em tabelas) com os vídeos de canais alternativos de fora sobre o genocídio de Gaza. Ou seja, terá atualização no post (gradual ou não).

domingo, 31 de dezembro de 2017

Hitler e as "raças asiáticas"

Em dezembro de 1942, Hitler realizou uma reunião sobre os Países Baixos com Mussert, Seyss-Inquart, Himmler, Lammers, Schmidt e Bormann. As notas da reunião, escritas por Bormann, foram publicadas em 1976 na coleção "De SS en Nederland Documenten uit de SS-archieven 1935-1945", que recentemente foi disponibilizada através da NIOD e Wikimedia Commons aqui em dois arquivos "pdf". O primeiro arquivo, das páginas 893-899, reproduz o registro da reunião de Bormann.

Em uma de suas principais passagens, Hitler retrata a guerra no Oriente como uma luta de vida ou morte, porque os bolcheviques exterminariam todos os estratos europeus (pág. 895). Hitler também deixa claro que sua oposição aos bolcheviques é racial, não política ou ideológica: a Alemanha está contra as raças asiáticas que pretendam destruir a civilização europeia e impor mistura racial (pág. 894).

Essas observações podem ser comparadas com outras fontes. Hitler foi, em parte, ecoando a formulação de Diewerge "Quem deveria morrer - alemães ou judeus?". No mesmo dia em que Bormann produziu suas anotações, Goebbels escreveu em seu diário: "O judeu deve pagar por seu crime, assim como nosso Führer profetizou em seu discurso no Reichstag; a saber, pela extinção da raça judaica na Europa e possivelmente no mundo inteiro." Crucialmente, no entanto, os comentários de Hitler não eram apenas antissemitas, mas apontavam a vontade de exterminar toda a vida "asiática" em seu caminho, pois era incompatível com sua visão da civilização europeia. Eles, portanto, convergem com os objetivos de fome de maio de 1941, nos quais os nazistas estavam dispostos a condenar à morte trinta milhões de pessoas (ver, por exemplo, Kay, pág. 689), e o plano de destruir totalmente as principais cidades soviéticas e tornas as áreas inabitáveis (veja aqui).

Fonte: Holocaust Controversies
http://holocaustcontroversies.blogspot.com/2017/12/hitler-and-asiatic-races.html
Texto: Jonathan Harrison
Título original: Hitler and the "Asiatic Races""
Tradução: Roberto Lucena

domingo, 12 de janeiro de 2014

Diretor chinês coloca na tela Julgamento de Tóquio

O julgamento de Tóquio, efetuado pelo Tribunal Militar Internacional Aliado para o Extremo Oriente contra os 28 maiores criminosos de guerra japoneses, foi transportado à tela pelo diretor chinês, Gao Qunshu. O filme, com nome homônimo, entrou em circuito nacional no dia 31 de agosto.

O famosíssimo julgamento da história da humanidade, que estendeu de maio de 1946 a julho de 1948, cravou vários recordes históricos: 818 sessões, 48 mil páginas de registros taquigráficos, 419 testemunhas, mais de 4.000 provas documentais e 1.131 páginas de sentença.

Gao Qunshu juntou duas histórias no filme: o relato de Mei Ru´ao, o único juiz chinês no tribunal e as dores de uma família comum japonesa durante a guerra. Segundo ele, a maior dificuldade da filmagem se encontrou na procura de fontes materiais.

"Os registros históricos existentes na China sobre o Julgamento de Tóquio são muito limitados. Visitamos quase todas as bibliotecas que possuem registros a respeito. Tenho que confessar que as fontes mais valiosas para o filme vem de uma série de livros publicados no Japão".

Conforme o diretor, 80% dos diálogos do longa ocorrem nos idiomas Inglês e Japonês. O roteiro do filme foi revisado, palavra por palavra, por historiadores, linguistas e juristas. Isso, segundo Gao, é um reflexo de respeito à história.

"O roteiro foi revisado por historiadores e linguistas. Há muitos termos referentes à lei, que exigem uma alta precisão das palavras. É importantíssimo para um diretor de filme assumir sua responsabilidade ao transportar a história à tela. O julgamento existiu e assumiu uma importância indiscutível na história da humanidade".

O elenco da longa é formado por atores do continente chinês, Taiwan, Hong Kong, Japão e EUA. De acordo com Gao, os atores japoneses, que dão vida aos criminosos de guerra, atuaram de maneira muito profissional.

"Decidimos desde o começo selecionar atores japoneses para interpretar os criminosos de guerra. O objetivo é garantir a credibilidade do filme. E eles (atores japoneses) aceitaram interpretar os papéis".

Formado em jornalismo, Gao Qunshu foi repórter e diretor de novelas. O Julgamento de Tóquio é a sua primeira produção cinematográfica e arrecadou 4,5 milhões de yuans apenas nos primeiros três dias de estreia. A conclusão do filme, no entanto, foi dificultada por uma crise financeira provocada pela retirada de um dos investidores da produção. Gao só conseguiu prosseguir o filme com 5 milhões de yuans obtidos após a hipoteca dos direitos autorais de uma das suas novelas inéditas.

"Fiz tudo o que podia diante de um tema histórico tão sério e pesado", concluiu Gao.

Fonte: Site da CRI (Rádio Internacional da China)
http://portuguese.cri.cn/101/2006/09/18/1@51596.htm

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Taiwan revela que diplomata salvou centenas de judeus

Um diplomata de Taiwan, Ho Feng-shan, salvou centenas de judeus na Áustria ocupada pelas tropas alemãs durante a Segunda Guerra Mundial, informou hoje o ministério das Relações Exteriores da ilha.

Ho Feng-shan, denominado como o Schindler chinês, desenvolveu uma política de ajuda aos judeus, que havia sido impulsionada pelo então presidente do parlamento de Taiwan, Sun Ke, e referendada pelo generalíssimo Chiang Kai-Shek, adiantou a diplomacia do país.

Documentos descobertos por acaso mostram que a República da China, o nome oficial de Taiwan, foi um dos poucos países do mundo que ajudou os judeus a escapar ao Holocausto nazi durante a Segunda Guerra Mundial, assinalou o diretor do departamento de Assuntos da Ásia Ocidental, Ali Yang.

A República da China, que nessa época controlava a China Continental, concedeu vistos a judeus nas zonas ocupadas pelas tropas de Hitler, mas muitos dos documentos ficaram em território da China quando Chiang Kai-dhek, o seu governo e as suas tropas se refugiaram em Taiwan, depois da derrota frente a Mao Zedong, em 1949.

Os documentos revelados recentemente mostram que Ho, que foi cônsul em Viena entre 1938 e 1940, concedeu vistos a todos os judeus que os requisitaram para facilitar a sua viagem para Xangai.

A iniciativa de Ho a favor dos judeus da Europa só foi tornada pública após a sua morte, em 1997, altura em que a organização judaica Yad Vashem lhe concedeu o título de “Justo entre Nações”.

A mesma honra foi atribuída por esta organização ao diplomata português Aristides de Sousa Mendes, em 1966.

Aristides de Sousa Mendes, que morreu em 1954, ignorou as ordens do Governo de Portugal na época e, enquanto cônsul em Bordéus, França, concedeu, em 1940, vistos a mais de trinta mil refugiados que tentavam escapar ao exército nazi, dos quais 12 mil eram judeus.

* Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico

Fonte: Agência Lusa/IOnline (Portugal)
http://www.ionline.pt/conteudo/69079-ii-guerra-mundial-taiwan-revela-que-diplomata-salvou-centenas-judeus

domingo, 13 de setembro de 2009

Humanidade Sem Raças? - Libelo contra o racismo

Livro sistematiza argumentos do geneticista Sergio Pena pela desracialização da humanidade
Por: Bernardo Esteves

O geneticista Sergio Pena, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), é uma referência nacional na discussão da questão racial. Ele tem vindo a público com freqüência para mostrar como a visão da humanidade dividida em raças, cristalizada em parte da sociedade, é totalmente incompatível com as descobertas recentes da genética. Pena acaba de voltar a esse debate com o lançamento do livro Humanidade sem raças?

A obra, um verdadeiro manifesto contra o racismo, reúne os veementes argumentos do geneticista para combater a racialização da humanidade. Essa discussão não é novidade para os leitores de “Deriva Genética”, a coluna que o autor publica na segunda sexta-feira do mês na CH On-line – a denúncia da inexistência das raças do ponto de vista biológico é um tema recorrente em seus textos.

A novidade de Humanidade sem raças? é reunir os argumentos de Pena e sistematizá-los em um discurso coeso, além de trazer novas considerações e discussões detalhadas de vários exemplos históricos. O livro consolida o pensamento sobre a questão racial que o geneticista vem amadurecendo ao longo de anos, em suas colunas, artigos na imprensa e palestras pelo país afora.
Genealogia do racismo

Para levar a cabo seu raciocínio, Pena propõe retraçar uma genealogia do racismo – conceito que, assim como a própria noção de “raça” é uma construção humana relativamente recente. A divisão da humanidade em raças, explica ele, remonta ao início do século 18 – o naturalista sueco Carl Linnaeus I(1707-1778) foi o primeiro a propor tal classificação formal. Essa visão deu origem ao racismo científico no século 19, em que alguns cientistas condenaram a mistura das raças, o que culminou com a nefasta experiência da eugenia nazista no século 20.

Ao final da Segunda Guerra, continua o autor, surgiu um novo modelo, que propunha dividir a humanidade em populações. Embora partisse de premissas menos condenáveis, ele acabou perpetuando a ideologia do racismo ao se converter em um modelo “populacional de raças”. O problema persistia.

Pena propõe uma mudança de paradigma que permita superar essa visão, socialmente perniciosa e biologicamente equivocada. O autor é muito feliz ao mostrar como a única divisão da humanidade que a genética permite embasar é em seis bilhões de indivíduos. Ou “cada homem é uma raça”, como bem resumiu o escritor moçambicano Mia Couto, que Pena gosta de citar.

Sociedade desracializada

Lembrando a seu leitor que não há “natureza humana” fixa e preestabelecida, o geneticista convida-o a juntar-se a ele na luta pelo fim do racismo. “Devemos fazer todo esforço possível para construir uma sociedade desracializada, na qual a singularidade do indivíduo seja valorizada e celebrada e na qual exista a liberdade de assumir, por escolha individual, uma pluralidade de identidades”, conclama.

Humanidade sem raças? é um livro breve, com 63 páginas de texto, que pode ser lido de uma só sentada. É uma leitura contundente, que assume ares de dever cívico nas circunstâncias atuais. Num momento em que a discussão sobre as cotas raciais para universidades volta à esfera pública, os argumentos de Sergio Pena são essenciais para alimentar o debate sobre a questão racial no Brasil.

Livro: Humanidade Sem Raças?
Autor: Sergio D. J. Pena
Páginas: 72

Bernardo Esteves
Ciência Hoje On-line

Fonte: Instituto Ciência Hoje
http://cienciahoje.uol.com.br/resenhas/libelo-contra-o-racismo

Ver também:
Será que existem raças humanas? Investigadores do Instituto Gulbenkian respondem

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Recordações de infância de uma exilada em Xangai

Recordações de infância de uma exilada em Xangai
Seleção e tradução do alemão de
Ana María Cartolano.

Entre as crianças que depois do longo exílio em Xangai regressaram a Alemanha em 1947, a bordo do Marine Lynx, estava Sonja Mühlberger. Havia vindo ao mundo em 26 de outubro de 1939 em Xangai, onde seus pais haviam fugido em fins de março desse mesmo ano. Seu pai havia sido liberado do campo de concentração de Dachau com a condição de abandonar a Alemanha imediatamente. Em abril de 1997, Sonja escreveu pela primeira vez sobre algumas de suas experiências de infância em Xangai:

"Em princípio vivíamos da comida do asilo, nem muito boa nem muito substanciosa. Mas ao menos uma vez ao dia havia algo para comer, graças ao auxílio de organizações de ajuda judaico-norte-americanas e de algumas famílias influentes. Por exemplo para mim, que era muito pequena, me colocaram num jardim de infância, construído pela família Sassoon(1) para filhos de emigrados, porque minha mãe havia conseguido trabalho como ajudante de modista. Seu salário era a comida diária. Para mim, que era uma criança, tudo isto não pesava tanto como para meus pais. Como eu me alimentava mal não sentia a fome que com frequência eles deviam sofrer. Mais tarde meu pai, como alguns outros emigrados, começaram a trabalhar como vendedor de ovos no negócio de um chinês, e ao mesmo tempo aprendeu a falar chinês(o dialeto de Xangai). Num escuro quarto traseiro sem janelas, meu pai se sentava numa banqueta, com uns canastros (cestos) grandes de ambos lados; tomava um dos canastros quatro ovos ao mesmo tempo entre seus dedos, apontava-os para refletir frente a uma lâmpada e os punha noutro canastro grande, ou os descartava num menor; eu me sentava a seu lado e o observava. Algumas vezes me sentava sobre o porta-bagagem(bagageiro)da bicicleta, as suas costas, quando ia ao campo comprar ovos ou uns poucos frangos.

Também usava essa bicicleta para repartir os ovos, e frequentemente, para abastecer seus clientes, tinha de subir muitas escadarias com canastros pesados. E com essa mesma bicicleta me levava ao jardim de infância, mais tarde até a escola, e ía me buscar na saída.

(...) Durante dois anos freqüentei a escola Kadoorie, era um curso exclusivamente de garotas no qual também havia três garotas chinesas. A língua que se falava em classe era o inglês. Tínhamos que falar em inglês também nos recreios, mas quando estávamos suficientemente longe das professoras, falávamos em alemão entre nós.

Muitas vezes minha mãe lía para mim contos de fadas alemães de um livro que não sei de onde tirou. Quando uma vez perguntei o que era um bosque ela me disse que eu devia imaginar uma árvore, e depois outra, e assim sucessivamente, e que isso era um bosque. Só depois da abertura do gueto pudemos visitar o Parque Jessfield onde havia mais árvores, e eram maiores, que no pequeno Waysidepark(parque) situado nas proximidades do edifício onde vivíamos.

A princípio tive poucos brinquedos, e a falta deles desenhava roupas para bonecas de papel. Uma vez havíamos ido ver um médico, e na sala de espera pude folhear algumas revistas de moda que me interessaram, assim que eu mesmo comecei a fazer esboços de vestidos para minhas bonecas de papel. A única boneca verdadeira que tive me presentearam aos seis anos; coloquei-a sentada no parapeito de uma das janelas da planta baixa para que pudesse vermos vernos jogar, mas apenas dei uma volta, desapareceu para sempre. Roubaram-na as crianças chinesas que eram todavia mais pobres que nós.

(...) Vivíamos num lugar onde havia uma encruzilhada. à esquerda da casa havia um terreno cheio de escombros, à direita uma casa onde também viviam emigrados; em frente a nossa casa, na esquina, diante do muro da fábrica de cigarros, pela manhã costumavam aparecer várias embalagens colocadas em fila, uma junto a outro.

Quando me levantava e me debruçava à sacada, com frequência ouvia um choramingo. Um dia minha mãe me disse que nos vultos haviam bebês, em sua maioria garotas, que eram abandonados ali durante a noite.

Muitas vezes roguei a mais pais que recolhessem uma daquelas crianças, porque não havia coisa que desejara mais que uma irmã; mas eles não quiseram satisfazer meu desejo: me explicaram que não se sabia se aquelas crianças estavam enfermas e que, ademais, nós não podíamos alimentar a uma criança. Por azar eu sempre podia observar como chegava um garoto num carro que carregavam os corpos sem nenhuma forma de consideração e íam embora com eles. Também podia observar outras coisas desde a sacada. Por exemplo, do outro lado da encruzilhada havia um lugar onde se reuniam os Culis dos "rickshaws" e compravam água quente que, segundo se sabia, passava melhor a sede. Meu pai nunca quis viajar num "rickshaw", achava humilhante ser levado por um homem, se bem que algumas vezes tomava um “pedicab” (um chinês que conduzia uma bicicleta) ou viajava em ônibus.

(...) Teve uma experiência muito ruim antes de nossa partida partida à Alemanha. Meus pais sempre trataram de conservar vivo em mim o amor à Alemanha, sua pátria. E se o fascismo fosse derrotado queriam voltar à Alemanha. Naturalmente eu contei isto a todos os que quiseram me escutar, mas a maioria dos emigrados tinham muitos argumentos contra o regresso a um país onde sua dignidade humana havia sido pisoteada e onde haviam sido assassinados seus parentes e amigos. Estavam muito amargos e pensavam que, apesar de tudo, ali seguiram e estavam as mesmas pessoas, e nisso tinham razão. Mas não pude me esquecer de que sendo uma garota os emigrados alemães me insultaram por essa razão, e até chegaram a cuspir-me; ainda que realmente o que eu menos sabia era que meus pais haviam decidido voltar à Alemanha e não aceitar o oferecimento de emigrar à América.

Integramos o grupo dos que voltaram com o primeiro transporte que levou de regresso a sua pátria a alemães e austríacos. Nosso barco, o transporte de tropas norte-americano Marine Lynx, zarpou de Xangai em 25 de julho de 1947 e chegou a Nápoles em 16 de agosto. Desde ali, os 295 alemães entre os quais meu irmão Peter, com seus dois anos, era o mais jovem, necessitaram ainda de uma semana num trem de carga, até que em 21 de agosto de 1947 entraram na Görlitzer Bahnhof de Berlim. Os homens haviam estendido cordas ante as portas dos vagões, para que nós, as crianças, não pudéssemos cair. Quando o trem parava, nosso amigo Alfred Zacharias, corria a zelar por nossas necessidades, e assim foi que pudemos conseguir até um pouco de palha para dormir no nosso vagão. De vez em quando minha mãe abria alguma lata das que nos tinham proporcionado na UNRRA, e amornava seu conteúdo num esquentadorzinho. Nessa época, a maioria das pessoas se alimentavam com bolachas secas.

Um par de dias depois de nossa chegada, seguindo o desejo de meus pais, viví a experiência de um primeiro dia de classe na escola alemã; apesar de ter frequentado durante dois anos a escola de Xangai, fui inscrita no primeiro grau da escola primária. Durante um tempo, para festejo de meus companheiros, respondi em inglês aos mestres que me interrogavam. Mais tarde também pude fazê-lo em alemão."

Extraído de Leben im Wartesaal. "Exil in Shanghai"(Exílio em Xangai). 1938-1947.
Jüdische Museum im Stadtmuseum Berlin. Berlin: 1997.

Notas
1. A família dos Sassoon era uma família judia de tradição sefardita, estabelecida em Xangai desde o século XIX, que se encontrava entre as dos mais ricos comerciantes da Ásia. Junto aos Sassoon, Kadoorie, Hardoon, que todavia hoje têm importância na Ásia, as famílias Ezra, Shamoon, Baroukh, Toeg, Abraham, Haim e Hillali representavam as personalidades mais cultas da sociedade internacional de Xangai.

Na foto recente(logo acima), Sonja é a primeira da direita para esquerda.
Ver mais fotos no site: http://www.rickshaw.org/childhood.htm

Fonte: Fundación Memoria del Holocausto (Argentina)
http://fmh.org.ar/revista/17/recuer.htm
Texto em espanhol: Ana María Cartolano
Tradução: Roberto Lucena

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