sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Giovanni Gentile, a adesão ao fascismo. O liberal de Mussolini

Giovanni Gentile e o Partido Nacional Fascista (Partito Nazionale Fascista - PNF)

Giovanni Gentile
Em 2 de novembro de 1922, Giovanni Gentile, já uma personalidade de altíssima expressão no panorama cultural italiano, é nomeado ministro da Educação no primeiro gabinete de Mussolini. Na primavera de 1923, ele justifica sua adesão formal ao PNF evidenciando a conformidade do fascismo com o liberalismo da direita no Risorgimento no qual ele se identificava, e e que segue com "o liberalismo da liberdade na lei e portanto, no Estado forte e no Estado concebido como realidade ética". Gentile vê se concretizar na nova realidade política a sua "Antiga fé" (ópera gentiliana editada em 1923), destinada a resgatar o caráter dos italianos e libertá-los da velha doença do ceticismo e da indiferença. Por esta "Antiga fé", ele se sente "precursor" do fascismo. Mais exatamente: da nova filosofia idealista, do sindicalismo soreliano, do reencontro do sentimento religioso, do empenho ético da guerra, em outras palavras, todo o fermento ideal e moral das primeiras décadas do século XX - que reage ao desgaste da ideologia iluminista, democrática e socialista da velha Europa - encontra uma saída natural na marcha sobre Roma e na energia despertada pelo Fascismo. Isso caminha dessa forma, e salta aos olhos de Gentile, da intérprete da vida nacional, a tarefa na qual todos os italianos que não querem mais ficar "sentados na janela", deveriam agora se empenhar.

Giovanni Gentile e o fascismo

O Fascismo parece para Gentile não uma ideologia ou um sistema fechado, mas sim um processo histórico, um ideal a ser realizado. Como tal, ele é útil para a contribuição daquela crítica construtiva que reconhece sua função nacional, e deve lutar para combater "a democracia dos advogados criadores de caso", "o socialismo radicaloide e humanitária", "o liberalismo do Estado negativo e agnóstico", no momento que o Fascismo - como qualquer movimento histórico sério - é o "sentimento religioso" a ser restaurado na mente e na consciência coletiva. Esta visão da política como uma fé, que o filósofo já tinha desenvolvido e defendido em anos anteriores, vislumbra no fascismo seu retorno mais profundo.

Por outro lado, que o fascismo não seja um episódio acidental na vida de Gentile, é comprovado o empenho público e da ação de colaboração e de estímulo exercido em relação ao regime durante todo o período dos anos 20. Além do cargo de Ministro da Educação nos anos de 1922-1924, ele é Presidente da Comissão dos Quinze -, então dos Dezoito - para a reforma constitucional, fundador em 1925 do Instituto fascista de Cultura, Presidente do Conselho de Educação de 1926 a 1928, membro do Grande Conselho até 1929 e seguidor de Mussolini também até a última aventura da República social. Em momentos críticos, que também atravessou Gentile - especialmente quando sua reforma escolar é alterado ou quando se estipula os Pactos Lateranenses com um compromisso que nega a essência de seu conceito de um Estado ético - não para separar as suas próprias responsabilidades das de Mussolini, ele reafirma sua fé no fascismo com o qual continua até o fim em identificar o próprio futuro da nação.

Pagherà la sua ferma adesione al regime con la vita, ucciso il 15 aprile 1944 a Firenze da un commando partigiano aderente ai GAP.

Pagou sua adesão ao regime com sua própria vida, morreu em 15 de abril de 1944 em Florença, por um comando guerrilheiro (partisan) aderente ao GAP.

29/03/2014. Por Matteo Anastasi

Matteo Anastasi (Roma, 1989), formou-se com honras em História na Universidade Europeia de Roma e, novamente com honras, em Relações Internacionais na Luiss Guido Carli. Para Europinione lida com história e com a parte estrangeira. Ele também colabora com a Cronache Internazionali e a Mediterranean Affairs e é co-fundador do think tank de política internacional "Il Termometro – Blog di opinioni e discussioni" (O Termômetro - Blog de opinião e discussão".

Fonte: Europinione (Itália)
http://www.europinione.it/giovanni-gentile-ladesione-al-fascismo/
Link alternativo:
http://holocaust-doc.blogspot.com/2016/02/giovanni-gentile-ladesione-al-fascismo.html
Título original: Giovanni Gentile, l’adesione al fascismo
Tradução: Roberto Lucena

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Morre o último sobrevivente do campo de Treblinka. Samuel Willenberg

Samuel Willenberg faleceu aos 93 anos. Esteve no campo de concentração onde morreram cerca de 875.000 pessoas.

Sobrevivente do Holocausto, Samuel Willenberg mostra
um mapa do campo de extermínio de Treblinka.
Foto do ano de 2010. (Foto: AP)
Samuel Willenberg, o último sobrevivente do campo de concentração de Treblinka (Polônia), faleceu. Informaram allegados. Tinha 93 anos.

Cerca de 875 mil pessoas pereceram nesse campo da morte durante o genocídio nazi.

Willenberg foi membro de um grupo de prisioneiros judeus que em 1943 atearam fogo ao campo e fugiram para os bosques próximos. Centenas deles conseguiram fugir, mas a maioria foi abatida por soldados nazis ou capturados por aldeões poloneses.

Os nazis e seus colaboradores mataram cerca de 6 milhões de judeus durante a Segunda Guerra Mundial.

Willenberg, numa entrevista com a AP em 2010, narrou como lhe dispararam na perna enquanto montava por cima de companheiros mortos até saltar a mureta do campo de concentração. depois da guerra conseguiu se estabelecer em Israel.

Fonte: AP/El Comercio (Peru)
http://elcomercio.pe/mundo/europa/murio-ultimo-sobreviviente-campo-nazi-treblinka-noticia-1880599
Título original: Murió el último sobreviviente del campo nazi Treblinka
Tradução: Roberto Lucena

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Neonazismo - Os Soldados de Odin aterrrorizam a Finlândia

Patrulhas urbanas neonazis vigiam as ruas ante a onda de refugiados.

Membros do grupo neonazi "Soldados de Odin",
durante uma manifestação em Joensuu (Finlândia)
no passado 8 de janeiro. Reuters
Há um ano, nada é igual em Kemi, uma pequena cidade da Lapônia finlandesa com apenas 20.000 habitantes. A avalanche de refugiados que chegaram através da fronteira com a Suécia transbordou as autoridades locais e aumentou a inquietação entre os vizinhos. Um mal-estar que alentado o nascimento dos "Soldados de Odin", uma patrulha urbana de jovens neonazis que pretende proteger os finlandeses dos "intrusos islâmicos", os quais lhes culpam pelo aumento da criminalidade e da insegurança no país nórdico. A imagem do movimento alemão Pegida (Patriotas Europeus contra a Islamização do Ocidente), descrevem-se como "uma organização patriótica que luta por uma Finlândia branca" e em suas manifestações hasteavam faixas com o lema "os refugiados não são bem-vindos".

Com suas jaquetas negras decoradas com uma bandeira finlandesa e um viking nas costas, os Soldados de Odin (o principal deus da mitologia nórdica) converteu-se da noite para o dia numa preocupação de primeira ordem para o governo, que teme enfrentamentos violentos entre radicais e refugiados.

Mika Ranta, o organizador das patrulhas em Kemi, define-se a si mesmo como nacional-socialista (nazi), mas argumenta que os Soldados de Odin são um grupo ao qual pertence "todo tipo de gente". O certo é que os serviços secretos finlandeses vinculam a muitos deles com grupos extremistas. Ainda que digam contar com organização em 23 cidades, a Polícia reduz sua presença a cinco. Em declarações à Imprensa local no outubro passado, Ranta explicou que "despertamos numa situação onde mal viviam diferentes culturas, o que provocou medo e preocupação na comunidade". "O maior problema - acrescenta - foi quando nos inteiramos através do Facebook de que solicitantes de asilo se posicionaram em colégios de primário fazendo fotos de garotas".

Como ocorreu em Colônia e outras cidades alemãs e em Estocolmo, as denúncias de agressões sexuais duplicaram durante o último ano na Finlândia, passando de 75 para 147, se bem que não se conhece a identidade dos autores. De fato, na virada de ano passada, uma "caguetagem" e a hábil atuação policial impediram que se reproduzissem os tristes ocorridos da capital renana.

O clima de inquietação obrigou ao primeiro-ministro finlandês, o centrista Juha Sipila, a assegurar que o Governo não permitisse que essas patrulhas neonazistas suplantem as Forças de Segurança nas ruas. "A polícia é a responsável da lei e da ordem no país. As patrulhas civis não podem assumir a autoridade da Polícia", assegurou na televisão pública YLE. Na mesma linha, o ministro do Interior, o conservador Petteri Orpo, insistiu de que os Soldados de Odin "não fortalecem a segurança, senão que, pelo contrário, reforçam o estado de ânimo hostil". "Este tipo de patrulhas têm claramente uns atributos racistas e xenófobos e sua ação não melhora a segurança. Agora a Polícia deve utilizar seus escassos recursos ao seguimento de sua ação", lamentou Orpi. O ministro quis desautorizar assim o chefe da Polícia Nacional, Seppo Kolehmainen, que previamente havia sugerido que os Soldados de Odin poderiam ser úteis para alertar os agentes de possíveis delitos.

A contundência da tripartite de direitas que governa a Finlândia desde maio não é tão unânime como se poderia pensar. Enquanto que o ministro das Finanças e líder conservador, Alexander Stubb, aposta claramente pela ilegalização de "todas as patrulhas de rua racistas", os populistas "Verdadeiros Finlandeses" defendem a liberdade dos cidadãos para se organizar. Assim, o ministro da Justiça, Jari Lindström, assegura que "o fato de que detrás desse movimento se encontram pessoas que cometeram delitos e cumpriram penas de prisão certamente desperta interesse, mas o grande problema é que os cidadãos sentem que falta segurança". Contudo, a classe política, não oculta que a possível ilegalização do movimento poderia ser um beco sem saída se torna vulnerável os princípios constitucionais.

O Partido dos Finlandeses, antes conhecido como "Verdadeiros Finlandeses", recorre a esta equidistância para frear a queda de intenção de votos que lhes concedem as sondagens para entrar no Governo. Sua marca, entretanto, foi feita sentir nesses meses com o endurecimento das leis de imigração. Os refugiados maiores de idade, por exemplo, são obrigados a trabalhar para sufragar os custos de sua estada no país nórdico. Finlândia, como o resto dos países europeus, viu-se superada pela onda de imigrantes procedentes do Oriente Médio e África. Durante o ano passado, recebeu 32.500 solicitações de asilo frente a 4.000 em 2014, o que a situa como o quarto país da UE que mais refugiados recebeu em relação à sua população. Depois de três anos de recessão, o país nórdico, que conta com uma população imigrante substancialmente baixa que a de seus vizinhos nórdicos (6% frente a 15% da Suécia), afronta um duro reto para a integração de asilados.

Com Facebook como plataforma, a sociedade civil tem respondido a ameaças extremistas dos Soldados de Odin com as "Irmãs de Kyllikki", que faz referência a um personagem do poema épico "Kalevala". "Nosso objetivo é ajudar a pessoas e construir um diálogo com todos os finlandeses e também com os imigrantes", assegura uma das fundadoras do grupo, Niina Ruuska. Seria revelador saber se Odin, deus da guerra, mas também da sabedoria, que segundo a lenda pode ver todo desde seu trono em Asgard, está satisfeito com a usurpação de seu nome por uns poucos.

14 de janeiro de 2016. 03:54h Pedro. G. Poyatos.
Colônia Dinamarca Distúrbios Sociedade

Fonte: La Razón (Espanha)
http://www.larazon.es/internacional/los-soldados-de-odin-aterrorizan-finlandia-IO11681889
Título original: Los Soldados de Odín aterrorizan Finlandia
Tradução: Roberto Lucena
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Observações em um post extra (link será colocado aqui). Observação sobre a "confusão" entre os termos refugiados e imigrantes.

A quem se virar com o espanhol (idioma), vale a pena também ler esta matéria do El Mundo sobre o problema. É até mais completa que a matéria traduzida acima (mais extensa, por isso não deu pra traduzir, mas fica a sugestão):
'Soldados de Odín' para velar por Escandinavia (El Mundo)
http://www.elmundo.es/internacional/2016/01/28/56a90f3e268e3e79498b46e4.html

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

A guerra que se avizinha? Sugestão de leitura: "O último verão europeu", de David Fromkin

Como o verão tende a aumentar o calor, no sentido figurado (refiro-me à ampliação da guerra na Síria, detalho mais abaixo), verão aqui no Hemisfério Sul, na Europa é inverno, acho pertinente colocar uma resenha de um livro sobre a Primeira Guerra Mundial e como a coisa foi se desenvolvendo no último verão antes do estouro da Grande Guerra.

A leitura da resenha do livro é pertinente pois os tambores de guerra se avizinham e não aparentam ser mais somente blefes. O livro em questão é este:
"O último verão europeu" - David Fromkin

A quem não está a par do que se passa, leiam as matérias abaixo:
Turquia e Arábia Saudita admitem enviar tropas para a Síria (RTP, Portugal)
Turquia provoca risco de guerra com participação do Irã e Rússia, adverte parlamentar (Sputinik)
Escalada verbal desperta temor de confronto militar direto Rússia-Turquia (EM)
O xadrez geopolítico do conflito sírio: EUA, Rússia, Turquia e Arábia Saudita (Euronews)
Turquia: Atentado contra autocarros militares provoca 28 mortos em Ancara (Euronews)
Turquia desafia NATO, milícias curdas e cessar-fogo na Síria (Euronews)

Talvez se interessem em ler este post antigo (cliquem nos marcadores/tags dele também):
A crise na Ucrânia, os desdobramentos (um resumo)

A Arábia Saudita (o padrinho ideológico do Estado Islâmico/Daesh), mais a Turquia (que tem conflito com os curdos e já andou protegendo o Daesh) podem entrar na Síria agora que o Estado Islâmico se encontra enfraquecido pelas ações dos bombardeios russos mais a ação em terra do exército sírio, pruma contenção da Rússia dentro da Síria em concordância com o governo daquele país.

Qualquer pessoa sã/razoável sabe que se isso ocorrer (entrada da Turquia e Arábia Saudita no conflito) o sangue que vai jorrar disso será pesado, não se confronta uma potência militar como a Rússia achando que haverá um "passeio" pela Síria. O pior é que a Turquia é membro da OTAN, e sendo membro pode arrastar outros países pro conflito (se não é o que os líderes desses países querem), e ninguém sabe qual será o desfecho disso.

Como consequência dos tambores tocando, já fizeram um encontro do petróleo às pressas pra congelar a produção, com isso o preço do petróleo tenderá a voltar a aumentar, principalmente se a guerra na Síria se ampliar (com a entrada dos "novos atores" suicidas):
Arábia Saudita, Rússia, Venezuela e Catar vão congelar produção de petróleo (EBC)
'WSJ': Arábia Saudita, Rússia, Qatar, Venezuela concordam em congelar produção de petróleo (JB/WSJ)

Se o barril de pólvora estourar ainda mais na Síria com a entrada dos exército turco e saudita, o preço do petróleo tenderá a subir mais (a economia saudita está com problemas por conta da baixa artificial acordada pra prejudicar a economia de alguns países, inclusive o pré-Sal brasileiro).

Essa é a consequência direta econômica, fora as demais decorrentes desse embate.

Vejam que as fontes de notícias acima são várias, mesmo brasileiras (e não são as da dita "grande mídia").

Destaco isso pra evitar que algum sectário fanático (pleonasmo, muitas vezes), geralmente da extrema-direita liberal, venha encher o saco falando de "viés" político como se eles não tivessem um viés (bem distorcido e extremado por sinal), ou como se fosse "crime" ter opinião. Quem já discutiu com esse pessoal sabe muito bem que não são "flor que se cheire" e que o componente fanático desse pessoal impede qualquer discussão racional. Por essa razão que sempre faço esses alertas, não tenho paciência em "discutir" com esse tipo de lunático.

Em suma, tirem suas próprias conclusões mas não alimentem a ideia de que não podem ser afetados com essas coisas como "burros empacados", até porque o preço do petróleo afeta tudo, mesmo o preço das mercadorias da quitanda da esquina, e há de fato esse grande confronto se desenrolando fora.

A grande mídia no Brasil continua alienando a população não citando a gravidade do que se passa fora do país. Esses fatos podem não parecer "novidade" pra quem lê notícia avulsa na web (ou em outro meio), mas pra grande massa não é bem assim.

A bem da verdade é que a TV aberta do país, mesmo ainda tendo poder, anda beirando a irrelevância devido a sua forte autodesmoralização. A TV aberta (e parte da fechada) foi engolida pela internet, mesmo de forma ainda difusa, por conta da falta de qualidade e do partidarismo político da grande mídia, que a continuar assim tenderá a se auto-implodir com esse partidarismo fanático e doente que zomba da cara de todos, principalmente do povo.

Reparem que o povo no Brasil sempre fica perplexo (há um surto de pânico numa parte, pois se apavoram com essas coisas porque ficam alheios às notícias, pois a maioria não lê nada e "só ouve" ou "assiste" o Plim-Plim da Globo e afins) quando estoura algum conflito porque não estão a par do que se passa fora do país, pois a grande mídia, com destaque sempre pra Rede Globo, quando repassa esses acontecimentos fora, fazem-no de forma superficial tratando o Brasil como uma "grande ilha" isolada do mundo. É mais ou menos como uma parte "sente" o país, como se estivesse "distante" de tudo e não está, visão bem obtusa por sinal.

O problema é que não somos uma "grande ilha", tampouco uma ilha e muito menos estamos isolados do mundo (globalizado), sentimos os efeitos externos no país. Entendendo o que se passa é menos difícil encarar o problema. Em que pese a burrice histérica e histórica de parte da população (a parte fanatizada, manipulável) repetindo as palavras de ordem atual de disco arranhado: "PT, PT, PT" (só sabem dizer isso, repetiram tanto que isso virou uma caricatura).

Sem mais delongas, segue abaixo a resenha do livro "O último verão europeu" (a tradução da resenha), que saiu no Brasil (com capa diferente mais acima, e que retrata os bastidores do período próximo ao estouro da Primeira Guerra Mundial e o conflito de interesses das potências da época. Tem muita coisa parecida com o que se passa atualmente, por isso me veio à mente a indicação desse livro. Caso eu note que o texto acima ficou extenso demais e atrapalha a leitura da resenha, dividirei o texto em dois posts. Porque tem gente que fica "pisando em ovos" quando eu critico esse pessoal "liberal" do Brasil, que de liberal não têm nada (quem acompanha o blog já deve ter lido as críticas que faço a esses grupos, ver na parte de História do Brasil).
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A mesma interrogação cem anos depois: "O último verão europeu: quem começou a Grande Guerra em 1914?" de David Fromkin

Nesses tempos em que cada dia do ano tem suas onomásticas e celebrações, faz-se necessário reflexionar porque alguns acontecimentos estão inscritos em nosso calendário o marcando com sua recordação - ou talvez seu rastro de certo modo não tenha terminado ainda - nosso presente apesar de ter ocorrido, como é o caso dos tratados nesse livro, já há mais de um século.

O relato já conhecido diz que em 28 de junho de 1914, o arquiduque Francisco Fernando da Áustria, herdeiro do trono do Império Austro-húngaro, foi assassinado junto a sua mulher em Sarajevo, capital da Bósnia-Herzegovina, território que formava parte do império. O assassino, capturado no momento e que aparentemente atuava por iniciativa individual, era de nacionalidade sérvia. Justo um mês depois, em 28 de julho, o Império Austro-húngaro declarava guerra ao Reino da Sérvia, estado independente até 1878, que havia formado parte do Império.

No dia seguinte, a Rússia mobilizava suas tropas na fronteira do império, fato que leva a Alemanha a acusá-la de estar se preparando para entrar em conflito com seu aliado e lhe declara guerra em 1 de agosto. Dois dias depois, em 3 de agosto, a Alemanha declarava guerra também contra a França por sua aliança com a Rússia. Para atacar a França, as tropas alemãs ocuparam, contra a vontade de seu governo, a Bélgica em 4 de agosto, o que motivou a intervenção do Império Britânico declarando guerra à Alemanha.

Que ocorreu entre 28 de junho e o 28 de julho para que o assassinato acabasse dando pé a uma declaração de guerra? Que outros fatores houve além do assassinato do arquiduque? Poderia ter sido evitada? O que motivou o que até então fora conhecido como o maior conflito bélico jamais vivido pela humanidade - "A Grande Guerra"?

A história não é uma ciência exata nem um discurso linear, senão - em função da informação mais ou menos veraz e objetiva que dos fatos acontecidos tenhamos - uma reinterpretação mais ou menos certeira - mas nunca absoluta - sobre os mesmos. Neste marco de volubilidade, David Fromkin recolhe aspectos que apresenta como já analisados pelos historiadores, outros que tardaram mais em se conhecer e alguns por aclarar. De maneira minuciosa, detalha antecedentes bélicos, posicionamentos geoestratégicos e situação socioeconômica de cada uma das potências; personalidades envolvidas, motivações pessoais e relações entre eles,... Sua apresentação e concatenação ordenada dos fatos, junto a uma redação fluída e assertiva, dá-lhe solidez e verossimilhança dos acontecimentos que aborda em suas páginas e que em seu julgamento são as que geraram o clima necessário para que em dado momento, os detonantes necessários desatassem a tormenta perfeita que já não tinha como voltar atrás e que se transformaria na Primeira Guerra Mundial.

Nas mãos dos especialistas, fica a valorização se se tiveram em conta se as informações e dados considerados são os adequados e se estão corretamente unidos e interpretados. Como leitor, seu relato supõe um puzzle (quebra-cabeça) de peças bem alinhavadas que são lidas de maneira apaixonada e com a tensão de quem teve a oportunidade de viver aqueles dias em tempo real.

Um relato que não fica tão só em 1914, senão que abre a porta ao debate. Na análise de Fromkin e tal como expõe de maneira precisa, esta foi uma pugna sobre a liderança mundial, os equilíbrios de poderes e as definições de fronteiras entre nações e estados. Um conflito não resolvido em 1918 e que se prolongaria até 1989 com duas guerras mais, a Segunda Guerra Mundial e a Guerra Fria.

E enquanto seguimos buscando explicação ao que se passou no início do verão de 1914 (inverno no Hemisfério Sul), não perdemos de vista uma data no calendário. Resta pouco mais de um mês para o 1 de setembro e seu efeméride correspondente com a previsível avalanche de análise do que se passou então também, no 75o aniversário do início da II Guerra Mundial.

Fonte: blog lucasfh1976
https://lucasfh1976.wordpress.com/2014/08/09/la-misma-interrogante-cien-anos-despues-el-ultimo-verano-de-europa-quien-comenzo-la-gran-guerra-en-1914-de-david-fromkin/
Título original: La misma interrogante cien años después: “El último verano de Europa: ¿quién comenzó la Gran Guerra en 1914?” de David Fromkin
Tradução: Roberto Lucena

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Diário britânico Guardian exibe o racismo no Brasil

O título original do texto é esse, eu encurtei (resumi) porque título muito grande pode ficar disperso:
Diário britânico Guardian exibe denúncia de atriz Nayara Justino, que perdeu papel de Globeleza “por ser muito negra”



Sugerido pelo TC

Da Redação

O vídeo acima foi produzido pelo diário britânico Guardian.

Para complementá-lo é preciso acrescentar que a elite brasileira importou da Europa a pseudociência que atestava a superioridade dos brancos em relação aos negros. Ela tinha sido formulada para justificar o massacre colonial cometido pelos europeus na partilha da África. Por isso, os negros não tinham alma, eram bárbaros, não tinham História.

A elite brasileira, de forma tragicômica, importou as teorias e derivou delas a tese do branqueamento da população brasileira. Foi a política oficial que trouxe imigrantes de várias partes do mundo, para livrar o Brasil do sangue negro.

Os descendentes de escravos, abandonados pelo Estado depois da abolição, mergulharam definitivamente numa segunda escravidão. Os resquícios do “quanto mais negro, pior” e da mulata como objeto do desejo sexual dos europeus foram incorporados à brasilidade machista, racista e colonizada.

Fonte: The Guardian/Viomundo
http://www.viomundo.com.br/denuncias/guardian-exibe-denuncia-de-atriz-nayara-justino-que-acredita-ter-perdido-o-papel-de-globeleza-por-ser-muito-negra.html

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Observações do post "Sobre a Ordem dos Comissários: instruções da guerra de aniquilação nazista na União Soviética"

Antes de repassar as observações do post que também dá título parcial a este post (separarei o texto original com um traço), irei transcrever, quando for possível, algumas observações de outros posts pra não alongar os posts originais, já que algumas observações acabam saindo do tema do post e citando questões políticas atuais no país ou no mundo.

Mas por quê, às vezes (ou muitas vezes), estas observações "saem pela tangente" do tema original do post? (a quem quiser pular esta observação extra, as observações originais do post estão após o traço abaixo e tem informação sobre segunda guerra)

Porque não é possível, por mais esforço que se faça, ignorar a realidade ao redor (do que se passa no país e no mundo) num ambiente de polarização política extrema.

Desde o "Vem pra rua" de 2013 (a "revolução colorida" que não se concretizou, mas faz estrago até hoje) a radicalização política no Brasil, que já era grande, degringolou de vez com grupos reacionários (que se autodenominam como "liberais" ou "liberais-conservadores", e alguns usam o termo "libertários", mas são todos uma coisa só: autoritários, vira-latas, estúpidos e anacrônicos) atacando tudo que consideram "inimigo". E se querem radicalizar, vão ter obviamente um contraponto ou resposta.

Essa polarização política pesada (radicalização) não ocorre só no Brasil, em praticamente quase todo mundo está ocorrendo radicalização política, alguns mais outros menos, mas ocorre em todo mundo.

Só que a polarização no Brasil é agravada ainda mais pela atuação partidarizada da "grande mídia" (o oligopólio de mídia, com destaque pra Rede Globo ou Organizações Globo) e principalmente pelo fato da vulnerabilidade da maior parte da população por aceitar passivamente o que esta grande mídia (que ascendeu na ditadura de 21 anos do país) repassa como "verdade" em questões atuais do país.

Esse não é um "problema" pequeno, é algo extremamente sério e não dá pra ignorar ou deixar de lado.

Evitei ao extremo não sair do tema segunda guerra, mas... uma vez que muita gente não mantém distância dos temas atuais (tentam misturá-los) e uma outra parte fica "calada" (quieta) pra não tomar posição, por covardia (mesmo quando deve), então não sou obrigado a respeitar qualquer um desses lados (não levarei em conta qualquer um desses dois lados pra tomar posições).

Quando pessoas começam a "cercar", enchendo a paciência com temas atuais porque querem usar A, B ou C como "escudos" pra algum fim político (no Orkut isso ocorreu), a tentativa de distanciamento de questões atuais (pra evitar trazer gente tosca, fanática e ignorante panfletando besteira pra junto) vai literalmente pro ralo.

E ninguém se iluda, eu não faço questão alguma de agradar A, B ou C porque alguém aparenta ser "educado" ao mesmo tempo que defende extremismo, ou porque comunidade A ou B tem posição "x" em relação ao Oriente Médio e coisas afins.

Sou humano (porque questões nacionais não devem ficar acima da condição humana), mas sou cidadão brasileiro, e minha visão política de mundo é de cidadão brasileiro (carregada do nativismo de minha terra natal, nativismo que também ocorre em todos os estados do país, uns mais outros menos), mesmo que eu saiba qual é o ponto de vista de outros países.

Não abro mão disso em hipótese alguma discutindo com outros brasileiros. Porque há brasileiros com crise de identidade nacional aguda (tanto brasileiros fora do Brasil como dentro do país), mas isso é problema dessas pessoas, não meu. Não sou "clínica de autoajuda" pra gente com esse tipo de problema.

Que fique claro que quando faço as observações acima, estou me referindo estritamente a discussões em português, principalmente com brasileiros, porque eu não percebo esse tipo de crise de identidade ou "grilo" (de grilado) que sempre remete a um complexo, ou mesmo preconceito agudo porque "fulano" é de tal país, estado, região, cidade (tirando o antissemitismo característico dos "revis") nas discussões em inglês como no blog Holocaust Controversies, no Rodoh etc.

Observações do post "Sobre a Ordem dos Comissários: instruções da guerra de aniquilação nazista na União Soviética" logo abaixo.
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Observação 1: quem quiser ler mais sobre a diretiva de Hitler, conferir o link do blog Avidanofront:
Ordem do führer sobre a administração das regiões do leste novamente ocupadas
Quem quiser ver o documento em inglês:
Himmler’s Memorandum on the Treatment of Alien Peoples in the East, 25 May 1940

E se alguém achar que isso é o texto mais pesado sobre a questão, tem coisas piores, que envolvem o nazi Erhard Wetzel (figura pouco citada e conhecida) sobre o Generalplan Ost. É curioso o cinismo dos ditos "revis" com a dimensão da guerra de extermínio praticada pelos nazistas, eles praticamente evitar citar essa questão do extermínio no leste europeu.

Cinismo e muitas vezes ignorância e estupidez também já que o conhecimento de boa parte deles do evento é precário ou totalmente distorcido, o que não apaga a ideia asquerosa por detrás desse apego desmedido deles com o que eles visualizam ou identificam como 'nazismo'.

Antes de ser algo caricato como a gente costuma ironizar a cretinice de alguns deles, no fundo esse pessoal é adepto do darwinismo social, como também o é alguns grupos que se denominam "liberais", mas que evitam a citação do termo "darwinismo" explicitamente por motivos óbvios (seriam facilmente rotulados de racistas), embora tenham uma aversão cínica e profunda com a questão do combate ao preconceito e racismo no Brasil e um ódio de classe profundo contra pobres (é essa uma das raízes do darwinismo social).

Ao contrário do que muita gente pensa, esse tipo de ideia de exclusão e racista é bem difundida em algumas cidades brasileiras. A "aparição" de grupos denominados "neonazis" no Brasil, ao contrário do que a mídia propaga como sendo "algo absurdo", infelizmente não é. O que ocorre é que esta mesma mídia e governos não têm interesse de esclarecer nada do assunto e nem de se aprofundar no problema da origem do racismo moderno no Brasil (que tem ligação direta com o evento da imigração pro Brasil no século XIX e começo do século XX), assunto que nem sequer é citado em colégios quando deveria ser obrigatório a discussão disso. E um adendo, refiro-me tanto à mídia de direita e de esquerda. Só vi uma vez citarem algo relativo a isso no site Viomundo, mas era só sobre São Paulo. Ou seja, o assunto sobre branqueamento no Brasil (que é o que dá base a esse racismo atual no país, as crenças racistas, além da herança racista colonial) sequer é discutido por conveniência, pra manter esses preconceitos regionais (preconceitos com conotação racista) inalterados.

Mas como dizia, a aparição desses bandos ditos "neonazis" no Brasil não é algo tão "absurdo" assim, apesar da adoção de símbolos do fascismo alemão por eles sempre soar ridículo pois o Brasil é um país com predominância da cultura portuguesa, indígena e negra, não excluindo as contribuições dos outros povos que pra cá migraram, mas essa também é a base étnica da maior parte do país, inclusive em regiões que a mídia propagam como "brancas" ou sem ligação com essas três culturas e povos (apesar de falarem português o tempo todo... vejam só...) porque há um sentimento de aversão dessas cidades com Portugal, negros e indígenas.

A mídia brasileira, de uns tempos pra cá, andar querendo "escandinavizar" o Brasil, talvez pra suprir seus complexos e sentimentos obscuros (que não tem coragem de externar), embora mantenha pro público externo a imagem do Brasil "tropical" formulada no Estado Novo do país (com contribuição da Disney) que perdura até hoje.

Como já deu pra notar, minha opinião sobre a mídia brasileira não é lá muito boa (e também de boa parte da mídia estrangeira). Digamos que, fizeram por onde ter essa imagem negativa, a "birra" não surgiu do nada. Em geral, a imagem da mídia hoje no mundo não é muito boa, pra não dizer que é terrível.
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Observação 2: Quem quiser baixar o livro (PDF), vá ao link do site do Centro de História Militar do Exército dos EUA.

Fiz questão de frisar a fonte pra servir como uma amostra pros fanáticos de direita do Brasil, com uma obsessão em repetir discurso da guerra fria.

A quem assistiu a abertura da Copa e leu o texto que coloquei aqui sobre ela (eu não profetizei...), viram uma demonstração desse fanatismo e radicalização imbecil nos xingamentos que esses fanáticos bitolados (e sem qualquer pingo de educação), na parte mais cara do estádio (com ingressos mais caros, setor "VIP" da baixaria e da elite Zé Povinho, o populacho medonho, a gentalha abastada brasileira), proferiram contra a presidente do país, quando não caberia numa cerimônia de abertura se comportarem tão grotescamente daquela forma achando que estavam "abafando", independente de divergência política.

Seria igualmente errado se o fato ocorresse com um presidente com outro retrospecto ideológico, eleito democraticamente. Há que se saber separar divergências de fanatismo e sectarismo, que é o que esse pessoal está fazendo há bastante tempo insuflados por certa mídia irresponsável, inconsequente e corporativa do país. Queimaram-se lindamente pro mundo inteiro ver.

Nem a principal potência rival da URSS (que não existe mais) possui um sectarismo e fanatismo tão estreitos com esses assuntos como o que se verifica na direita brasileira e latinoamericana (e ibérica), ou na maior parte dela. Sectarismo que mistura uma dose de paranoia, idiotice, má educação, prepotência e fanatismo religioso (obscurantismo).
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Observação 3: tem uma parte do texto (nas notas 45 e 46) que diz o seguinte:
"A ocupação era para ser permanente. Este era o objetivo final do que Hitler queria fazer, e nada nem ninguém estava autorizado a interferir com a realização deste empreendimento.45 Esta foi uma luta de ideologias, não de nações."
Pois bem, essa era também minha opinião anterior sobre o evento, mas analisando a coisa hoje eu discordo da minha opinião anterior. Esta foi uma guerra ideológica sim, entre o fascismo (nazismo) e o socialismo da URSS, mas também uma guerra entre nações e de aniquilação.

A própria ideia racista de ocupação e aniquilação de povos no leste (por estes serem inferiores ou descartáveis por ideias racistas, na concepção nazista) não é propriamente algo original da guerra anticomunista da segunda guerra, esta guerra também foi uma guerra de colonização, uma guerra "racial" (étnica) de aniquilação, só que dessa vez na Europa, como as ocorridas nas colonizações feitas na África e nas Américas.

sábado, 6 de fevereiro de 2016

Relatório Salitter (Riga, Letônia)

Relatório do oficial de polícia Salitter, que comandou os guardas de transporte de judeus deportados de Duesseldorf para Riga em 11 de dezembro de 1941 [1]

Duesseldorf, 26 de dezembro de 1941 Relatório Confidencial sobre a evacuação dos judeus para Riga ... 11-17 novembro de 1941. O transporte de judeus planejado para 11 de dezembro de 1941 incluiu 1.007 judeus das cidades de Duisburg, Krefeld e várias pequenas cidades e comunidades das áreas industriais de Rhinelandand Westfalia. Duesseldorf apresentou apenas 19 judeus. O transporte foi composto por judeus de ambos os sexos, de várias idades - desde bebês até pessoas de 65 anos. A partida do transporte estava prevista para às 09:30. Os judeus foram, portanto, trazidos para a rampa de carregamento já prontos para embarcar às 4:00 da manhã. Entretanto, o Reichsbahn não podia ter o trem pronto tão cedo, alegadamente devido à falta de pessoal, então o carregamento dos judeus só começou às 9:00 da manhã.

O carregamento foi feito com grande pressa, tanto quanto o Reichsbahn insistiu que o trem devia sair na hora certa. Portanto, não é surpresa que alguns carros estavam superlotados (de 60-65 pessoas), enquanto outros tinham apenas 35-40 passageiros. Essas circunstâncias causaram problemas ao longo de toda a viagem para Riga, desde judeus sozinhos que tentaram várias vezes entrar em carros menos movimentadas. E por mais que o tempo permitisse, em alguns casos foi permitido fazer alterações, como também havia mães que tinham sido separadas de seus filhos. No caminho da área de desembarque para do matadouro para a plataforma, um judeu do sexo masculino tentou cometer suicídio, atirando-se na frente do bonde. Mas ele bateu no para-choque do carro de rua e ficou apenas ligeiramente ferido. Ele se recuperou durante a viagem, e percebeu que não podia evitar compartilhar do destino de the evacuados. Uma mulher judia idosa se afastou da plataforma sem que ninguém percebesse - estava chovendo e muito escuro - entrou numa casa próxima, tirou a roupa e sentou-se num vaso sanitário. No entanto uma mulher da limpeza notou o caso e ela foi levada de volta para o transporte.

... O carregamento do trem terminou às 10:15 e ... o trem deixou a estação Duesseldorf-Derendorf por volta das 10:30 .... Devido a um sistema de aquecimento com defeito, a pressão de vapor não atingia os últimos carros do comboio. Por causa do frio, a roupa dos esquadrões de guarda não secavam. (Choveu durante todo o transporte). Assim, tive que lidar com guardas que não conseguiam cumprir seu serviço devido à doença. ... [O trem chegou à Lituânia em 12 de dezembro] Normalmente, a viagem de comboio a partir deste ponto para Riga levaria 14 horas, mas como não havia apenas uma faixa de trilho e nosso trem tinha apenas uma segunda prioridade, a viagem foi muitas vezes mantidos por longos períodos de tempo. ... Chegamos em Mittau na Letônia às 19:30 [13 de dezembro]. Estava frio e a neve caindo. Chegamos em Riga às 21:50. O trem foi mantido na estação por uma hora e meia. ...

O trem ficou parado sem calor. A temperatura exterior era de menos 12 graus centígrados .... À 01:45, voltamos para o trem e mais seis guardas letões foram encarregados de ver o trem. Porque era meia-noite, escuro e a plataforma estava coberta com uma espessa camada de gelo, então foi decidido transferir os judeus para o gueto de Sarnel apenas no domingo de manhã. Conclusões: as provisões [para os guardas] eram boas e suficientes. Para os homens foram fornecidos dois cobertores, utensílios de cozinha e fogões de campo, roupas quentes, peles e botas quentes, que provaram ser muito úteis e foram recomendados para transportes futuros. As pistolas e munições fornecidos eram suficientes porque não havia perigo de ataques por partidários na Lituânia e Letônia. ... as duas luzes de busca serviram bem a seu propósito .... a assistência da Cruz Vermelha foi louvável ...

Para prover os judeus com água, era essencial que a Gestapo entrasse em contato com o Reichsbahn e coordenasse uma hora de parada todos os dias numa estação ferroviária no Reich. Devido à tabela de tempo, o Reichsbahn estava relutante em cumprir a vontade do comandante dos transportes. Os judeus ficaram geralmente na estrada por 14 horas ou mais antes do transporte partir e de ter se esgotado todas as bebidas que eles tinham para eles. Quando eles não são supridos com água durante a viagem, eles tentam, apesar da proibição, deixar o trem em cada ponto possível ou pedir a outros para obter água. É também essencial que o Reichsbahn preparasse os trens pelo menos 3-4 horas antes da partida, para que o carregamento dos judeus e seus pertences, de modo que o carregamento de judeus pudesse ser conduzido de forma ordenada. A Gestapo tem que se certificar que o Reichsbahn colocou o carro (vagão) para o destacamento de guarda no centro do comboio. ... Isto é essencial para a supervisão do transporte .... Durante frio extremo, deve-se ter certeza de que o aquecimento do trem funciona. Os homens do pelotão de guarda não me deram nenhum motivo para eu reclamar. Com exceção do fato de que tive que pedir a alguns deles para agir mais energicamente contra os judeus que queriam desobedecer minhas ordens, todos eles se comportaram bem e cumpriram bem seu dever. Não houve incidentes de doenças ou quaisquer outros problemas. Assinado: Salitter (ver mais), Hauptmann (Capitão) da Schupo (Link2).

[1]. Ver também "Deportation to Riga" -- testemunho de Hilde Sherman que foi deportado no mesmo transporte.

Fonte: Yad Vashem site (Shoah Resource Center, The International School for Holocaust Studies)
http://www.yadvashem.org/odot_pdf/Microsoft%20Word%20-%203288.pdf
Título original: Report by Police officer Salitter, who commanded the guards on the transport deporting Jews from Duesseldorf to Riga 11 December 1941
Tradução: Roberto Lucena

Ver mais: «Evidence for the Presence of "Gassed" Jews in the Occupied Eastern Territories» (3, 3) (Holocaust Controversies)

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

O horror de Auschwitz e do holocausto por quem o escreveu na primeira pessoa: Primo Levi

O mais sangrento dos campos de concentração foi libertado há 71 anos. É hoje o Dia Internacional da Lembrança do Holocausto. E poucos como Primo Levi escreveram sobre ele. Viveu-o. Sobreviveu-lhe.
Rene Burri/Magnum
"Isto é o inferno. Hoje, nos nossos dias, o inferno deve ser assim: uma sala grande e vazia, e nós, cansados, de pé, diante de uma torneira gotejante mas que não tem água potável, esperando algo certamente terrível , e nada acontece, e continua a não acontecer nada. Como é possível pensar? Não é mais possível; é como se estivéssemos mortos. Alguns sentam-se no chão. O tempo passa, gota a gota." Primo Levi, “Se Isto é um Homem” (1947)
11 de abril de 1987. Na manhã em que Primo Levi morreu – o relatório da polícia italiana aponta para uma tese de suicídio, relatando que Levi se atirou mortalmente do terceiro andar de casa, em Turim –, Elie Wiesel, autor de “A Noite” (também sobre a experiência de horrores vivida num campo de concentração nazi) e prêmio Nobel da Paz em 1986, escreveu: “Primo Levi não morreu hoje. Morreu há quarenta anos, em Auschwitz.” Levi tinha 67 anos à data do suicido.

Não é (nem nunca foi) uma teoria da conspiração por parte de Wiesel dizê-lo. É antes a constatação de que o homem-Levi, químico, resistente antifascista na frente de guerra, não voltou de Auschwitz homem, mas apenas um corpo, com memória e uma mão com que escrever.

Aos 24 anos foi transportado para Auschwitz. Ele e outros seiscentos e cinquenta judeus italianos. Estávamos em fevereiro de 1944. Deles, só vinte sobreviveram — Levi incluído. Quando se viu, enfim, libertado pelo exército soviético, a 27 de janeiro de 1945, ao fim de 11 meses de privação e indignidade humana, Levi havia envelhecido, não 11 meses, mas décadas. Não só fisicamente. Mas serviu-lhe a experiência, de morte, não a sua mas a que testemunhou dia-a-dia à sua frente, todos os dias, a experiência de sobreviver quase miraculosamente — a resiliência fez o resto –, essa experiência-limite permitiu-lhe escrever, por exemplo, “Se Isto é Um Homem” (a trilogia de Auschwitz completa-se com “A Trégua” e “Os que Sucumbem e os que se Salvam”).

Nem só sobre o holocausto escreveu Primo Levi, mas quando o fez, mais do que procurar culpados ou explicações, narrou. Simplesmente isso: narrou o horror, sem artifícios, com crueza, a vida no mais sangrento dos campos de concentração do Terceiro Reich. O campo foi libertado há 71 anos. E também por isso se assinalada, nesta data e desde 2005, o Dia Internacional da Lembrança do Holocausto.

Mais do que ler a não-ficção de autores como Levi, Wiesel ou Imre Kertèsz, mais do que ver no cinema ou em casa “A Lista de Schindler” e, mais recente, “Filho de Saul”, de Laszlo Nemes (o filme recebeu o Grande Prêmio de Cannes e o Globo de Ouro para Melhor Filme Estrangeiro), mais importante que isso é ler os relatos, sem polimentos literários ou de realização, como os que Levi (a par com Leonardo de Benedetti) escreveu em “Assim foi Auschwitz”. Em 1945, no rescaldo do fim da Guerra e da libertação dos campos de concentração pelos aliados, o exército soviético pediu a Primo Levi e a Benedetti, seu companheiro de campo, que redigissem, em detalhe, como eram as condições de vida lá. O resultado foi um dos primeiros relatórios alguma vez realizados sobre os campos de extermínio. Os textos de Levi, inéditos, finalmente trazidos à estampa no último ano, têm um valor histórico e humano tão importante hoje, 71 anos volvidos sobre o fim da Segunda Guerra, como quando este os escreveu.

Lá, Levi escreveu — o mesmo Levi que, em “Se Isto é Um Homem”, sentia mais culpa por ter sobrevivo (e os outros não) do que culpava os nazis pelo extermino — que “a responsabilidade repousa coletivamente sobre todos os soldados, sargentos e oficiais da SS destacados em Auschwitz”. O livro “Assim foi Auschwitz” serviu também para, ao longo das décadas — e ainda nos nossos dias –, trazer ex-carrascos aos tribunais. Julgá-los. Para que a história os recorde como isso: carrascos. Por outro lado, é também importante perceber que Primo Levi considera que, mais do que o mero extermino de judeus, os campos de concentração serviam para impulsionar a própria economia da Alemanha.
Escrevia Levi: "Os campos não eram um fenômeno marginal: a indústria alemã baseava-se neles; eram uma instituição fundamental do fascismo na Europa e os nazis não o escondiam: mais do que mantê-los, alargavam-nos e aperfeiçoavam-nos."
Num sábado, dia 11 de Abril, em 1987, por volta das 10 horas da manhã, a porteira de um prédio na avenida Corso Rei Umberto, em Turim, tocou à porta do 3.º andar para, como em todos os dias, entregar o correio. Primo Levi abriu-lhe a porta, sorriu-lhe e recebeu-o. Voltou a entrar em casa. Poucos minutos depois o seu corpo estatelava-se no fundo da escada, ao lado do elevador. Morreu instantaneamente. Primo Levi sobreviveu ao holocausto no pior dos campos de concentração. Não sobreviveu aos dias fora dele — mas com ele por dentro, vivo, a remoer-lhe.

Autor: Tiago Palma
27/1/2016, 16:48

Fonte: Observador (Portugal)
http://observador.pt/2016/01/27/horror-auschwitz-do-holocausto-escreveu-na-primeira-pessoa-primo-levi/

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